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Empreendedorismo e crescimento econômico

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Academic year: 2021

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Empreendedorismo e crescimento econômico

Márcio Augusto Scherma1 O Global Entrepreneurship Monitor (GEM) é responsável por uma pesquisa mundialmente famosa por mensurar o nível de atividade empreendedora em diversos países do mundo, gerando, para os países que participam por anos seguidos, uma série história bastante completa. Seu principal indicador é a Taxa de Empreendedorismo em Estágio Inicial (TEA), que busca sintetizar a porcentagem da população adulta que iniciou um empreendimento recentemente. Na pesquisa GEM consta que:

“A Taxa de Empreendedorismo em Estágio Inicial, TEA, é a proporção de pessoas na faixa etária entre 18 e 64 anos envolvidas em atividades empreendedoras na condição de empreendedores de negócios nascentes ou empreendedores à frente de negócios novos, ou seja, com menos de 42 (quarenta e dois) meses de existência” 2

No relatório referente ao ano de 2010, o Brasil alcançou 17,5% - a maior TEA desde que a pesquisa é realizada no país (2002). Como em todos os anos anteriores, o Brasil manteve uma TEA superior à média dos países nos quais a GEM é realizada.

Fonte: Relatório GEM 2010, pg. 36

1

Cientista Político e Mestre em Relações Internacionais pela Unicamp. Analista Técnico do Núcleo de Estudos e Pesquisas da Unidade de Gestão Estratégica (UGE) do Sebrae Nacional. O presente artigo não expressa a opinião da instituição, apenas do autor.

2 Relatório GEM 2010, pg. 34 13,5% 12,9% 13,5% 11,3% 11,7% 12,7% 12,0% 15,3% 17,5% 0,0% 2,0% 4,0% 6,0% 8,0% 10,0% 12,0% 14,0% 16,0% 18,0% 20,0% 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 TEA - Brasil

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No Brasil, o resultado de aumento na TEA é em geral interpretado como um dado positivo. Diversas reportagens publicadas pela mídia chamam atenção para as taxas médias de empreendedorismo no Brasil serem altas, o que confirmaria o fato de que “o Brasil é um país empreendedor”, afirmação feita em geral com tom positivo3.

Está implícita nesse julgamento a ideia de que o empreendedorismo contribui significativamente para a economia – tanto no que diz respeito ao crescimento econômico quanto à geração de emprego e renda. E essa relação não é feita sem bases teóricas. Na sua obra clássica de 1911, Joseph Schumpeter4 argumenta que os empreendedores são a força motriz do crescimento econômico, ao introduzir no mercado inovações que tornam obsoletos os produtos e as tecnologias existentes. Assim, a contribuição do empreendedor ao desenvolvimento econômico ocorre fundamentalmente pela inovação que introduz e pela concorrência no mercado.

Vale ressaltar que a pesquisa feita pelo GEM divide os países participantes em três grupos, de acordo com a sua fase de desenvolvimento econômico:

“(i) economias baseadas na extração e comercialização de recursos naturais, doravante tratadas aqui como países impulsionados por fatores; (ii) economias norteadas para a eficiência e a produção industrial em escala, que se configuram como os principais motores do desenvolvimento, doravante nominados países impulsionados pela eficiência; (iii) economias fundamentadas na inovação ou simplesmente impulsionadas por ela” 5

Com esse raciocínio poderíamos imaginar que os países com as maiores taxas de atividade empreendedora são também aqueles de economia mais robusta –

3

Ver, por exemplo: “Empreendedorismo no Brasil supera países desenvolvidos” In:

http://economia.ig.com.br/financas/seunegocio/empreendedorismo+no+brasil+supera+paises+desenvo lvidos/n1300100517001.html; “Brasil supera países do G-20 em empreendedorismo” In:

http://www1.folha.uol.com.br/mercado/907395-brasil-supera-paises-do-g-20-em-empreendedorismo-aponta-sebrae.shtml; e “Taxa de empreendedorismo no Brasil é a maior do G-20, diz Sebrae” In:

http://g1.globo.com/economia/pme/noticia/2011/04/taxa-de-empreendedorismo-do-brasil-e-maior-do-g20-diz-sebrae.html.

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Trata-se da obra “Teoria do desenvolvimento econômico: uma investigação sobre lucros, capital, crédito, juro e o ciclo econômico”, de Joseph A. Schumpeter.

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ou, nas palavras da GEM, as “economias fundamentadas na inovação”. Contudo, analisando a pesquisa, o cenário encontrado não é exatamente este.

Tabela 1 – TEA por grupos de países e Brasil - 2010

Fonte: Relatório GEM 2010, pg. 35

A tabela 1 nos mostra que a realidade é, na verdade, inversa: conforme aumenta o grau de maturidade econômica dos países, diminui a TEA, que atinge a menor média justamente no grupo dos países “impulsionados pela inovação”, com uma taxa de 5,5%.

Alguns estudos, contudo, questionam a importância do papel do empreendedorismo na economia. Por exemplo, Aluízio Barros e Cláudia Pereira6 encontraram uma influência negativa do empreendedorismo sobre o crescimento econômico: dos locais pesquisados, aqueles com maior atividade empreendedora apresentaram crescimento menor do PIB nos três anos subsequentes.

Em artigo de 2005, André van Stel, Martin Carree e A. Roy Thurik7 sugerem que o empreendedorismo exerce papéis diferentes em países com estágios de desenvolvimento econômico distintos. Utilizam-se dos dados divulgados pela pesquisa GEM para analisar a importância do empreendedorismo para o crescimento do PIB, vis-à-vis outras variáveis. No estudo, os autores concluíram que:

“There is an impact but not a simple linear one of the TEA rate on GDP-growth. We find that the TEA rate has a negative effect for the relatively poor countries, while it has a positive effect for the relatively rich

6

BARROS, A. & PEREIRA, C. (2008). Empreendedorismo e crescimento econômico: uma análise empírica. In: Revista de Administração Contemporânea, v. 12, n. 4. Curitiba/PR. Disponível em

www.anpad.org.br/periodicos/arq_pdf/a_790.pdf

7 STEL, A; CARREE, M. & THURIK, A. (2005). The effect of entrepreneurial activity on national economic

growth. Disponível em http://publishing.eur.nl/ir/darenet/asset/9869/20070213007IndUn.pdf

Máximo Mínimo Média Todos os países participantes 52,2 2,3 11,7

Impulsionados por fatores 52,2 7 22,8

Impulsionados pela eficiência 27,2 3,9 11,7

Impulsionados pela inovação 10,6 2,3 5,5

BRASIL

TEA (%)

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countries. The results show that entrepreneurship matters. However, the effect of entrepreneurial activity on growth is not straightforward (…).” 8

Diante desse resultado, os pesquisadores levantaram duas hipóteses que auxiliariam a clarificar o processo. A primeira diz respeito ao momento histórico: grande parte do séc. XX é um período de acumulação, de relevância das grandes empresas hierárquicas que dirigiam a economia. No final do séc. XX, há uma guinada na economia, em direção à economia do conhecimento, relativizando assim o papel das grandes corporações – o que pode ter se refletido nesse estudo.

A segunda hipótese versa sobre o fato de que nos países em desenvolvimento os empreendedores demonstram níveis menores de capital humano do que os empreendedores de países desenvolvidos. Assim, a TEA menor em países desenvolvidos refletiria empresas mais inovadoras, enquanto nos países em desenvolvimento seriam os setores tradicionais os responsáveis pelas taxas altas9.

Contudo, a pesquisa GEM não se resume à TEA, mas adentra nesse universo, buscando qualificar este índice classificando os empreendedores em duas categorias: aqueles que empreendem por necessidade e os que o fazem por oportunidade, diferenciando seu impacto na economia. Vejamos:

“Vale lembrar que o empreendedorismo por oportunidade é mais benéfico para a economia dos países, onde os empreendedores que iniciaram o seu negócio por vislumbrarem uma oportunidade no mercado para empreender e como forma de melhorar sua condição de vida tem maiores chances de sobrevivência e sucesso. Em compensação há pessoas que empreendem como única opção, ou seja, pela falta de melhores alternativas profissionais. São os empreendedores por necessidade” 10

Essa diferenciação poderia ajudar a explicar as diferenças na TEA para os grupos de países. Assim, um país como a Bolívia apresenta uma TEA alta –

8

STEL, A; CARREE, M. & THURIK, A. (2005), p. 16.

9

Importante ressaltar que em nenhum dos casos, contudo, os autores defendem a diminuição de investimento na criação de um ambiente propício ao empreendedorismo.

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38,6% em 2010 – pois a falta de oportunidades de emprego assalariado leva às pessoas a consideraram o empreendedorismo como única opção. Contudo, pelas características desses empreendedores e de seus negócios, a elevada taxa não se reflete num crescimento econômico robusto.

Essa informação é uma evidência da validade da segunda hipótese levantada por Stel, Carree e Thurik (2005), de que, nos países em desenvolvimento, o nível geral de capital humano dos empreendedores é menor – daí o maior número de empreendedores por necessidade, geralmente em atividades menos inovadoras, e o impacto na economia não é tão positivo.

O raciocínio seria o seguinte: economias mais desenvolvidas têm um número maior de grandes empresas que abastecem o mercado satisfatoriamente, além de gerarem mais oportunidades de trabalho assalariado. Isso gera níveis menores de empreendedorismo por necessidade, fazendo com que o empreendedorismo por oportunidade concentre-se em setores mais inovadores. Assim, a TEA como um todo diminui, mas está mais qualificada, não sendo necessariamente um dado negativo.

Quanto a esse aspecto o Brasil apresenta desde 2003 mais empreendedores por oportunidade do que empreendedores por necessidade. Em 2010 o país superou a razão de dois empreendedores por oportunidade para cada empreendedor por necessidade.

Contudo, o caso brasileiro aparentemente parece fugir das regras quando analisamos outros aspectos. Enumerando os principais setores que concentram as novas empresas no Brasil, nota-se uma predominância de empresas ligadas ao comércio varejista (29% do total). Em seguida aparecem empresas da indústria de transformação (14%) e alojamento e alimentação (11%). Estas três categorias respondem, assim, por mais de 50% do total 11. Além disso, se observamos a relação entre a TEA e o nível de emprego nos últimos cinco anos, não encontramos o padrão esperado para uma economia em desenvolvimento, segundo o raciocínio anterior (mais oportunidades de emprego, menor TEA). O gráfico 2 mostra esse movimento:

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Gráfico 2 – Relação desemprego e TEA no Brasil (2006-2010)

Fonte: Relatório GEM 2010 e Pesquisa Mensal de Emprego (IBGE)12.

Esses dados aparentemente conflitantes nos levam a crer que não se trata de uma contradição; mas sim de que o Brasil de fato enquadra-se como economia em desenvolvimento, uma vez que apresenta alguns aspectos de economias avançadas e outros de economias fracas. Isso explica, por exemplo, o fato de que o empreendedorismo por oportunidade já é maior, mas os setores ainda são essencialmente tradicionais.

Mais do que isso, apesar do aumento do emprego, houve também um aumento da TEA, numa aparente contradição. Esse ponto em particular pode ser derivado do fato de que os empregos gerados podem não ser atraentes, especialmente em relação ao salário. Num país de alta desigualdade social, as oportunidades de emprego para pessoas de menor nível de escolaridade pagam salários bastante menores13, o que pode torná-las pouco atraentes.

12

Para que fosse possível mensurar o desemprego em 2010, todos os valores da taxa de desemprego têm como referência o mês de agosto.

13 No Brasil, segundo dados do CEMPRE/IBGE de maio de 2011, o assalariado com nível superior

completo recebe até 225% a mais do que os trabalhadores sem faculdade.

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4%

6%

8%

10%

12%

14%

16%

18%

20%

2006 2007 2008 2009 2010 Desemprego TEA

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Tudo isso em vista, ressaltamos que a pesquisa GEM não pode ter como parâmetro único de avaliação a variável da TEA, numa relação “maior é melhor”. Como vimos, uma TEA alta é característica marcante dos países de menor desenvolvimento relativo, enquanto os países de economias desenvolvidas em geral apresentam TEA mais baixa. A qualidade do empreendedorismo parece ser mais importante para o crescimento econômico do que a quantidade de empreendedores por si só.

Portanto, para acompanharmos os rumos dos elementos mais importantes para avaliar o impacto do empreendedorismo no crescimento econômico é imprescindível analisar a relação entre empreendedorismo por oportunidade versus empreendedorismo por necessidade. Além disso, examinar a distribuição das empresas nascentes por atividade econômica agrega uma qualidade ainda maior nessa análise.

Considerando o exposto, conclui-se que, apesar de a relação entre empreendedorismo e crescimento econômico não ser tão simples e direta, há dois papéis muito claros para instituições como o Serviço Brasileiro de Apoio à Micro e Pequena Empresa (Sebrae) e Governos. O primeiro deles é facilitar e desburocratizar o acesso aos meios legais de se iniciar atividades empreendedoras14. O segundo, e talvez o que tenha maior impacto econômico, é trabalhar no aprimoramento do capital humano, desde a educação de base (papel principalmente do Governo) até a educação empreendedora, com foco nas habilidades e conhecimentos necessários para a condução de um negócio próspero (papel principalmente de instituições como o Sebrae).

Dessa forma, são garantidas as condições mínimas para que qualquer pessoa que queira empreender (seja por necessidade ou por oportunidade) possa fazê-lo sem maiores dificuldades e criam-se as bases para um empreendedorismo de oportunidade de maior valor agregado.

14

A criação da figura do “Empreendedor Individual”, por meio da Lei Complementar 128/2008 e a regulamentação da “Lei Geral das Micro e Pequenas Empresas” (LC 123/2006) são boas práticas nesse sentido.

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