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Rev. adm. empres. vol.46 número1

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Academic year: 2018

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1 1 4 • ©RAE • VO L. 4 6 • N º 1

RIGOR E QUALIDADE NA PESQUISA

QUALITATIVA NO BRASIL

Por M aria José Tonelli

Professora da FGV-EAESP

E-mail: mjtonelli@fgvsp.br

Marcelo M. F. Vieira e Deborah M. Zouain, professores da FGV-RJ, são os organizadores destes dois volumes dedicados à pesquisa qualitativa em Administração. A obra é extremamen-te oportuna para a área, que cresceu muito em quantidade nos últimos anos, mas que tem sido questionada quanto à qualidade de sua produção (veja Bertero, C.; Caldas, M.; Wood Jr., T. Produção acadêmica em

Admi-nistração no Brasil. São Paulo: Atlas,

2005). As qu estões metodológicas são apontadas como entraves nas di-versas áreas, como estratégia, marke-ting, tecnologia da informação, estu-dos organizacionais, recursos huma-nos à produção de conhecimento que seja consistente e garanta o avanço da teoria e das aplicações práticas úteis para a melhoria das organiza-ções no país.

A coletânea também é relevante por dar apoio ao debate que opõe os resultados obtidos em pesquisa quan-titativa e qualitativa. De fato, como mostram os organizadores logo na introdução, é possível fazer pesquisa qualitativa com rigor e relevância. Essa oposição não se sustenta se con-siderarmos que as ciências humanas tratam de questões de natureza bem diversa das ciências exatas. Parece evidente, mas não é possível obser-var cu lt u r a o rgan izacio n al, p o r exemplo, com microscópios eletrô-nicos essenciais para a observação de culturas de bactérias em biologia. Fe-n ôm eFe-n os difereFe-n tes pedem ferra-mentas apropriadas.

O primeiro volume está dividido em duas partes. A primeira, dedicada às questões teóricas e epistemológi-cas, traz artigos de autores

fundamen-tais para a pesquisa na área. Alketa Peci debate a questão objetividade/ subjetividade a partir do pragmatis-mo norte-americano de W. James e R. Rorty, e apresenta as contribuições de Bruno Latour como um dos autores qu e rejeita essa dicotomia; Sérgio Alves, debate a “A atu alidade da epistemologia weberiana” e da apli-cação dos tipos ideais para a com-preensão da complexidade das or-gan izações; Maria Ceci Misoczky apresenta “leituras enamoradas de Marx, Bourdieu e Deleuze” e Thiry-Cherques trata da fenomenologia de Husserl e Merleau-Ponty como uma abordagem possível para a descrição do cotidiano organizacional. Desta-que ao artigo de Marcelo Milano F. Vieira, que inaugura a coletânea e aponta caminhos para que a utiliza-ção da pesquisa qualitativa tenha

con-PESQUISA QUALITATIVA EM ADM INISTRAÇÃO

De Marcelo Milano Falcão Vieira e Deborah Moraes Zouain (Orgs.). Rio de Janeiro: Editora FGV, 2004, 223p.

PESQUISA QUALITATIVA EM ADM INISTRAÇÃO: TEORIA E PRÁTICA

De Marcelo Milano Falcão Vieira e Deborah Moraes Zouain (Orgs.). Rio de Janeiro: Editora FGV, 2005, 237 p.

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fiabilidade e permita generalização, mostrando que a oposição entre pes-quisa qualitativa e quantitativa não tem razão de ser.

A segunda parte do livro aborda a “aplicação de pesquisa qualitativa em Administração”. Alguns artigos apre-sentam procedimentos de coleta de dados: estudos de casos múltiplos (ar-tigo de Luiz Antonio Jóia), grupo fo-cal (artigo de Marco Aurélio Ruediger e Vicente Riccio) e desenhos (Sylvia Vergara); um artigo debate o uso de métodos qualitativos em pesquisas sobre o comportamento do consu-midor (Ayrosa e Sau erbron n ); e o livro encerra com o artigo de Paulo Figueiredo sobre questões práticas no desenho de pesquisas empíricas rela-tivas a aprendizagem e inovação in-dustrial no Brasil.

O segundo volume também apre-senta artigos teóricos e relatos de pes-quisas no país. Os primeiros capítu-los estão voltados para questões con-ceituais. Martins, no primeiro artigo da coletânea, mostra as múltiplas di-mensões do espaço organizacional e propõe u ma abordagem semiótica das organ izações; Th iry-Ch erqu es discute as diferentes mediações pre-sentes no uso do “modelo estrutura-lista” para a análise de fenômenos sociais. Na seqüência, Faria apresen-ta o uso do “realismo crítico” para pesquisas em estratégia, mostrando os limites da abordagem positivista e interpretativista na seleção de pro-blem as para an álise, e traz com o exemplo o estudo de redes interor-ganizacionais. Guedes traz o tema da “Pesquisa internacional em gestão: abordagem interdisciplinar com múl-tiplos níveis de análise”, em que pro-põe o uso de casos múltiplos anali-sados nos níveis internacional, naci-on al, in du strial e organ izacinaci-on al. Goulart e Carvalho fazem uma sín-tese bastante interessante de ques-tões epistemológicas em pesqu isa

qualitativa e quantitativa, e mostram diferentes procedimentos em coleta de dados. Dellagnelo e Silva apresen-t am as ap licaçõ es d a an álise d e conteúdo em Administração, espe-cialmente a proposta de Bardin na construção de categorias interpreta-tivas de en trevistas, e fin almen te Santos aborda “O método qualitati-vo na investigação de sentidos: uma proposta multipolar para estudos or-ganizacionais”.

Os artigos voltados para a apre-sentação de resultados de pesquisa incluem o trabalho de Cavalcanti, que aborda questões específicas de Ad m in ist r ação Pú blica n o art igo “Estrutura e ação no setor público brasileiro: a “gerência equalizado-ra”. Aqui o autor discute o uso das metáforas na pesquisa e mostra os resultados dos sentidos das ações de gestores p ú blicos. O tr abalh o d e Zou ain e Torres, a partir de u ma pesquisa realizada sobre o processo de inovação tecnológica na Incuba-dora Tecnológica de Campina Gran-de, apresenta questões decorrentes do uso de estudo de caso em pes-quisa qualitativa.

Infelizmente não é possível apre-sentar em detalhes, nesta resenha, a contribuição que todos esses arti-gos trazem, nos dois volumes dessa coletân ea, mas é possível afirmar que os artigos desses autores brasi-leiros suprem sérias lacunas da pes-quisa qualitativa em Administração no Brasil.

Entretanto, duas questões ainda nos inquietam após a leitura dos arti-gos. A primeira é sobre as dificulda-des de se fazer pesquisa qualitativa – com qualidade – no país e a segunda, sobre os ajustes antropofágicos neces-sários para procedimentos de coleta de dados em países em desenvolvi-mento. Os artigos apresentados não discutem profundamente essas ques-tões, ainda que nossas inquietações

sejam atenuadas pelas contribuições dos artigos de Figueiredo (no primei-ro volume) e os de Cavalcanti e de Zouain e Torres (no segundo volu-me), que tratam de questões específi-cas da nossa realidade. Esse aspecto é importante, se considerarmos, como Prasad (veja em Crafting Qualitative Research: Working in the Post-Positivist

Traditions. New York: M. E. Sharpe,

Inc., 2005), o pós-colonialismo, ou seja, a reprodução, sem questiona-mentos e/ou adaptações para os pro-blemas locais, de metodologias ade-quadas apenas para o primeiro mun-do. Mas, apesar deste aspecto, o livro tem o mérito de apresentar pesqui-sas e autores brasileiros!

Outro ponto a ser refletido é que, embora os volumes tragam artigos em áreas como, por exemplo,

mar-keting, trata-se de uma obra que

pri-vilegia as áreas de estratégia e de es-tudos organizacionais. Não há ne-nhum problema nesse recorte, mas questões importantes de outras áre-as d a Ad m in ist r ação, com o, p or exemplo, a tecnologia da informação, não foram contempladas.

Além disso, como os dois volumes não indicam com clareza os artigos de cunho epistemológico e aqueles refe-rentes aos procedimentos de coleta de dados, sugere-se, para futuras re-edi-ções, uma reorganização dos artigos. Essa simples mudança, especialmen-te no segundo volume, poderia ser di-daticamente útil para os leitores, es-pecialmente os alunos de pós-gradu-ação, que, com certeza, vão se bene-ficiar muito com a leitura de todos os textos aqui apresentados.

Para finalizar, ressaltamos a rele-vância desta obra para o desenvolvi-mento da academia em Administra-ção no país. Os artigos aqui reuni-dos fornecem recursos necessários para o esclarecimento de aspectos metodológicos essenciais para o ri-gor na pesquisa qualitativa.

Referências

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