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B. DE SPINOZA E O PENSAMENTO JURÍDICO E ÉTICO-POLÍTICO MODERNO E CONTEMPORÂNEO

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B. DE SPINOZA E O PENSAMENTO JURÍDICO E ÉTICO-POLÍTICO

MODERNO E CONTEMPORÂNEO

Aluna: Mariane d'Abadia Moura Orientador: Maurício de Albuquerque Rocha

Introdução

Esta pesquisa tem por objeto o exame da filosofia de B.de Spinoza e sua influência no pensamento jurídico e ético-político contemporâneo. A partir de um estudo aprofundado de suas obras, de modo a permitir uma maior compreensão de sua linguagem, com luz às suas percepções acerca da definição e conceituação do que chamamos de “livre arbítrio”, pretende-se destrinchar a genialidade e complexidade do pensamento do filósofo, demonstrando a força atemporal de seus preceitos, gritantemente evidentes na realidade atual.

Objetivos

Investigar o pensamento de Spinoza e seus efeitos no pensamento jurídico e ético-político moderno e contemporâneo; apresentar os pontos principais de seu pensamento acerca da temática do livre arbítrio, desconstruindo a ideia de potência absoluta do homem sobre suas ações; demonstrar como os afetos operam de forma metódica e natural sob a mente, não se tratando de qualquer vício da natureza humana; desenrolar a dinâmica das superstições sob o animus e como o medo influi diretamente na suposta “autonomia da vontade”, originando a chamada servidão; discorrer o que o filósofo entende como a verdadeira liberdade e como tal conceito pode ser empregado nos campos do Direito e da política; conectar tais considerações à realidade contemporânea, em especial à esfera político-social-jurídica, de modo a levar o leitor a uma maior compreensão dos fenômenos modernos a partir do trabalho aqui exposto.

Metodologia

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Desenvolvimento

A partir da leitura dos prefácios das Partes III, IV e V da Ética de Spinoza, em conjunto com prefácio de seu Tratado Teológico-Político de Spinoza, pudemos compreender o que Spinoza quer dizer ao definir o que chamamos por “livre arbítrio” e o por que dessa expressão ser um conceito vazio por natureza e essência.

A partir da leitura do prefácio das Partes III da Ética de Spinoza, pudemos compreender que o homem não é um “império num império”. Segundo o filósofo, tal concepção é completo engano, proveniente de um raciocínio em que “os Afetos e a maneira de viver dos homens parecem tratar não de coisas naturais, que seguem leis comuns da natureza, mas de coisas que estão fora da natureza” (SPINOZA, Ética, pg.233)

Dessa forma, o senso comum compreende que o homem mais perturba do que segue a ordem da natureza, possuidor de potência absoluta sobre suas ações, o controle completo de suas decisões, determinadas por nenhum outro além dele próprio. Assim sendo, os afetos não proveriam da potência comum da natureza, não havendo nada natural em sua criação e dinâmica, consistindo desse modo nada mais do que vícios da natureza humana, lamentáveis, ridicularizáveis e desprezíveis.

No entanto, ao contrário do engessado pensamento do supersticioso século XVII, Spinoza inova e escandaliza ao afirmar que, na verdade, razão e método são inerentes aos afetos, possuindo estes uma lógica de construção e ação da qual a mente humana, por justamente seguir a ordem da natureza, não consegue escapar: “[...] Assim, pois, os Afetos de ódio, ira, inveja, etc., considerados em si mesmos, seguem da mesma necessidade e virtude da natureza que as demais coisas singulares, e admitem, portanto, causas certas pelas quais são entendidos, e possuem propriedades de qualquer outra coisa cuja só contemplação nos deleita” (SPINOZA, Ética, pg.235)

Ora, tal acepção se torna clara quando consideramos o ditado comum de que o homem não cria nada que não já exista. O modo de pensar, de sentir, de agir humano provém de uma conjunção de fatos, ações e reações que outrora aconteceram e imprimem seus efeitos no presente e futuro. Há um método na forma como hoje cada homem se comporta, método que se estabeleceu desde seu nascimento e que percorreu toda sua esfera de criação, desenvolvimento individual.

Sendo assim, as paixões, nada mais são do que mais uma constante da equação sob a qual a mente opera, influenciando de forma natural as decisões e escolhas às quais o homem se depara ao longo da vida. Os afetos não são um fato exterior, um vício no percurso do agir racional e lógico, mas sim fruto das próprias construções individuais do ser, operando de forma natural sob o ânimo e não tendo o homem qualquer controle sobre eles tal como não tem sob sua própria criação, tanto na esfera individual, familiar quanto social.

Tendo em vista que os afetos/paixões possuem metodologia na forma como operam e influenciam, método este do qual a mente humana não consegue escapar, temos que os poderosos que conhecem ou detém conhecimento acerca de tal engenhariam controlam e submetem o povo ao medo e regimes de servidão.

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homem submetido aos afetos não é senhor de si, mas senhora dele é a fortuna, em cujo poder ele está de tal maneira que frequentemente é coagido, embora veja o melhor para si, a seguir porém o pior.” (SPINOZA, Ética, pg.371)

Essa temática é uma reiteração do prefácio do Tratado Político Teológico, em Spinoza também destaca: "Se os homens pudessem, em todas as circunstâncias, decidir pelo seguro, ou se a fortuna se lhes mostrasse sempre favorável, jamais seriam vítimas de alguma superstição. Mas, como se encontram frequentemente perante tais dificuldades que não sabem que decisão hão de tomar, e com os incertos benefícios da fortuna que desenfreadamente cobiçam os fazem oscilar, a maioria das vezes, entre a esperança e o medo [...]"

A Fortuna referenciada em ambos os textos por Spinoza, é a mesma caracterizada por Maquiavel como a ordem das coisas em todas as dimensões da realidade que influenciam a política. Essa, combinada a força dos afetos sobre o ânimo humano, expressa a incerteza do porvir, a relatividade do momento futuro, que fazem o homem oscilar entre a esperança e o desespero, o empurrando à fuga nas superstições e assim se submetendo a regimes de servidão.

Em consonância, temos que na Parte IV da Ética o filósofo discorre acerca das noções de perfeição/imperfeição e bem/mal, expondo que estas são obras oriundas da própria capacidade da mente humana de atribuir valor às coisas e daí firmar convicções de que elas assim o são devido a sua natureza.

Os homens tendem, tanto das coisas naturais como das artificiais, formar ideias universais que eles têm como modelo das coisas, e acreditam que a própria natureza as tem como modelo. “E assim, quando veem ocorrer algo na natureza que convém menos com o modelo concebido, que dessa maneira, têm da coisa, creem então que a própria natureza falhou ou pecou e deixou aquela coisa imperfeita. E assim vemos que os homens se acostumaram a chamar as coisas naturais de perfeitas ou imperfeitas mais a partir de um preconceito do que do verdadeiro conhecimento dessas coisas” (SPINOZA, Ética, pg.373)

Sendo assim, aqueles que buscam dominar se fundam exatamente nessa dinâmica valorativa, fazendo uso de instrumentos de controle que impõe modelos e preconceitos a serem estritamente observados seguidos. Dessa forma, temos um sistema análogo ao de ovelhas em um rebanho, em que todas seguem um pastor sem questionar porque o fazem.

Desse modo são estruturados os regimes de servidão que, no caso concreto, se consubstanciam nos Estados Ditatoriais, frutos amargos do medo, produtos quase matemáticos daqueles que impõem regras e normas sem fundamento, mantendo o povo em escuridão, restringindo direitos e negando garantias. Esse Estado que usurpa poder nada mais é do que a semente que se alimenta das superstições que assolam o ânimo humano, e justamente por compreender seu funcionamento é que esses poderosos conseguem frutifica-las e florescer ilusões na mente humana, pensando esta ser “livre” quando na verdade se encontra vítima e serva do medo.

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Liberdade Humana”, uma vez que a liberdade humana, a verdadeira liberdade provém de uma única fonte: o conhecimento.

A liberdade de questionar, indagar, confrontar e requerer mudanças: tal liberdade é plenamente possível e deve ser buscada intermitentemente. Apesar de não ser uma liberdade nata, o homem que entende e compreende a dinâmica dos afetos que opera sobre si, consegue plenamente conquista-la, se livrando amarras externas opressivas que o social, a política e a cultura lhe impõem.

Daí, trazemos novamente o cenário de um Estado Totalitário. Vimos que em regimes autoritários, os poderosos fazem de tudo para manter a população em ignorância e assim manter seu controle sobre a mesma, uma vez que estes mesmos a temem aventando a possibilidade de que um dia conheçam e percebam os artifícios impetrados e contra eles se rebelem. É mantendo povo sob obscuridades que o Estado Tirano consegue se manter e se fortificar, mandando, desmandando, e traçando os limites e restrições que bem desejar.

Nesse quadro, temos a liberdade distante e o ser humano mergulhado em desesperos e aflições. No entanto, o Direito, como ciência que estuda e pesquisa as mais diversas formas de estabelecer e manter a harmonia social, é o instrumento essencial, a peça-chave para o alcance da liberdade humana.

Ao contrário de um Estado Tirano, em que as leis são direcionadas à restrição e controle de seus subordinados, em um Estado Democrático de Direito as leis são feitas para que os indivíduos conheçam e tenham acesso às suas diversas liberdades. Para que as leis protejam seus cidadãos, o Estado deve fornecer, através das próprias, as circunstâncias e circunstâncias e alicerces necessários ao debate das mesmas, à indagação, a formulação e reformulação daquilo que não condiz com um ordenamento que materialize direitos e garantias fundamentais.

Afinal, dos fundamentos do Estado expostos por Spinoza em seu Tratado Político, o filósofo conclui com evidência que o seu fim último não é dominar nem subjugar os homens pelo medo e submetê-los a um direito alheio; é pelo contrário, libertar o indivíduo do medo a fim de ele viva, tanto quanto possível, em segurança, isto é, a fim de que mantenha da melhor maneira, sem prejuízo para si ou para os outros, o seu direito natural a existir e a agir. Spinoza prossegue: "O fim do Estado, repito, não é fazer os homens passar de seres racionais a bestas ou autômatos: é fazer com que sua mente e o seu corpo exerçam em segurança as respectivas funções, que eles possuam usar livremente a razão e que não se digladiem por ódio, cólera ou insídia, nem se manifestem intolerante uns para com os outros. O verdadeiro fim do Estado é, portanto, a liberdade”(SPINOZA, Tratado Teológico Político,pg.302)

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Sendo assim, temos que a liberdade não representa nenhuma ameaça em relação à paz, à piedade e ao próprio direito dos soberanos, como inclusive é a responsável a preservar tudo isso. Porém, é somente ao compreender que não possuímos o controle absoluto sob nossas escolhas e que por isso podemos ser vítimas dos mais diversos artifícios dos usurpadores do poder, é que podemos nos empenhar em buscar a liberdade, cujo o Direito, como arquiteto da política e da sociedade, deve preparar o campo para que ela seja efetivamente conquistada por todos.

Conclusões

Ao compreendermos preceitos fundamentais à filosofia spinozana, tais como suas concepções sobre a força dos afetos no ânimo humano, livre arbítrio, servidão e liberdade humana, podemos identificar as inovações que o filósofo trouxe aos estudos sobre o homem e a sociedade. Contrariando os que a consideraram uma leitura ateísta, fatalista e blasfêmia no supersticioso século XVII, é possível perceber claramente como a obra de Spinoza estava longe de ser uma forma de confronto à autoridade política. Spinoza, na verdade, deu base ao que veria a ser pensamento ético político moderno e contemporâneo, ao desabar os pilares conceituais que sustentavam o medo, a superstição, a tirania política e a servidão do ser, ao mesmo tempo que sedimentou o que seria a “verdadeira” liberdade, que tem por inerente o conhecimento, o questionamento, a indagação, o pensamento e a expressão, sem nunca ser uma ameaça à paz e bem estar de um Estado legitimamente Democrático de Direito, fundamentado na caridade e na justiça, atribuindo a cada um aquilo que lhe é naturalmente devido e garantindo que a voz de cada cidadão seja ouvida e respeitada.

Referências bibliográficas

1 – SPINOZA, Baruch de. Tratado Teológico Político. Tradução: Diogo Pires Aurélio. Lisboa: INCM, 2004

2 – SPINOZA, Baruch de. Ética. Tradução Grupo de Estudos Espinosanos; coordenação Marilena Chauí .São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2015

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