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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP

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Mercedes Cristina Rodrigues Vera

A culpa na separação e no divórcio

MESTRADO EM DIREITO

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Mercedes Cristina Rodrigues Vera

A culpa na separação e no divórcio

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Direito das Relações Sociais, sob a orientação da Professora Doutora Maria Helena Diniz.

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De modo todo especial, à querida Professora Maria Helena Diniz, minha orientadora, que muito me apoiou, e cujo acompanhamento tornou este trabalho possível.

Aos amigos, colegas pelo carinho estímulo e colaboração permanentes.

Aos meus alunos do Curso de Formação de Oficiais (CFO) da Polícia Militar do Estado de São Paulo, que com suas intervenções e questionamentos, despertaram o interesse pela pesquisa ora concluída.

Aos meus estagiários, pela colaboração nunca negada, e a todos que direta ou indiretamente contribuíram para a conclusão deste trabalho.

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RESUMO

VERA, Mercedes Cristina Rodrigues. A culpa na separação e no divórcio. 2008. xii, 223 p. Dissertação (Mestrado em Direito) Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2008.

Pela atual legislação, a sociedade e o vínculo conjugal podem ser dissolvidos de modo consensual ou litigioso. Desde 04.01.2007, o casal que pretende se separar ou se divorciar consensualmente dispõe de mais uma forma para atingir seu intento, a modalidade extrajudicial, desde que preenchidos certos requisitos.

Na busca das raízes da culpa na separação e no divórcio, realiza uma introspecção no direito romano e no direito canônico, chegando ao direito moderno, que marcou o fim da Idade Média e sofreu, no âmbito do direito de família, severa influência da reforma protestante, que culminou com a secularização do direito, separando em definitivo o Estado da Igreja.

A pesquisa sobre a evolução da culpa na dissolução do matrimônio no ordenamento pátrio inicia-se na vigência das primeiras regulamentações, quando o casamento era considerado uma instituição de caráter indissolúvel, passando à possibilidade de ruptura do vínculo do casamento através do divórcio.

Ante a promulgação da Constituição Federal em 1988, analisa a culpa frente ao princípio fundamental da dignidade da pessoa humana e seus reflexos nas dissoluções matrimoniais, bem como o fortalecimento do conceito de ruptura da vida em comum, frente ao enfraquecimento da idéia de culpa, a motivar as separações judiciais.

Nesse contexto, apresenta o debate doutrinário sobre a conveniência de se manter a culpa no ordenamento jurídico nacional, questionamento que cresce em importância, na medida que se analisam as conseqüências decorrentes da eliminação da culpa do direito de família e a possibilidade de se pleitear a reparação de danos eventualmente sofridos pela violação dos deveres do casamento, entendida essa como ato ilícito necessário à configuração da responsabilidade civil, tanto por danos morais, como materiais.

Conclui ao final que a forte presença da culpa a motivar as ações de separação torna inviável, ao menos no momento atual, a sua total eliminação do panorama jurídico nacional.

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ABSTRACT

VERA, Mercedes Cristina Rodrigues.The guilt in the legal separation and the divorce. 2008. xii, 223 p. Dissertation (Master Degree in Law) Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2008.

According to current legislation, partnerships and conjugal relations may be amicable or litigious dissolved. Since 04 Jan 2007 and after some requirements filled out, a couple that intends a divorce or an amicable separation has the extrajudicial formality as another option for reaching their aim.

During the search for the roots of divorce and separation guilt, an introspection in canon and roman laws was realized. Modern law was reached as Middle Age ended. The family law received a severe influence from the protestant reform and as consequence, the secularization of law and a definitive separation of State and Church took place.

In the research of guilt evolution in matrimony dissolution and under the paternal system, the first regulations were initiated, when the matrimony was still considered an indissolvable institution, and after, the divorce maked the relation rupture possible

Before the promulgation of the Federal Constitution in 1988 an analysis of guilt was realized, facing the fundamental principle of human dignity and its reflex in matrimony dissolutions as well as the strengthening of the idea of conjugal life rupture and the weakness of guilt idea for judicial separations motivation.

In this context, a doctrinal debate takes place considering the convenience of the guilt maintenance in the national juridical system. This questioning grows in importance as the consequences of guilt elimination in family law are analyzed, and the possibility to litigate the reparation of damages eventually suffered from the violation of matrimony duties, and understood as a necessary illicit act in the configuration of civil responsibility for moral and material damages.

We may conclude by saying that the guilt strong presence in the separation acts motivation is unfeasible, at least in this present moment, for its total elimination from the national juridical scenario.

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Dele se encante mais meu pensamento. Quero vivê-lo em cada vão momento

E em seu louvor hei de espalhar meu canto E rir meu riso e derramar meu pranto

Ao seu pesar ou seu contentamento. E assim, quando mais tarde me procure Quem sabe a morte, angústia de quem vive Quem sabe a solidão, fim de quem ama Eu possa me dizer do amor (que tive): Que não seja imortal, posto que é chama Mas que seja infinito enquanto dure.

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PREFÁCIO... XI

CAPÍTULO I − PANORAMA ATUAL DA CULPA NO DIREITO DE FAMÍLIA...1

1.1 Entendimento atual da doutrina sobre a separação litigiosa no Código Civil de 2002 ...1

1.2 Legislação vigente quanto à dissolução da sociedade e do vínculo conjugal...3

1.2.1 Espécie consensual ...4

1.2.1.1 Separação judicial por mútuo consentimento...4

1.2.1.2 Divórcio judicial consensual – indireto e direto...4

1.2.1.3 Separação e divórcio extrajudiciais...5

1.2.2 Espécie litigiosa ...6

1.2.2.1 Separação judicial com culpa ou sanção ...7

1.2.2.2 Separação judicial sem culpa...8

1.2.2.3 Divórcio litigioso ...12

1.3 Projetos de lei em trâmite no Congresso Nacional alusivos à separação judicial culposa ...14

CAPÍTULO II −ANTECEDENTES HISTÓRICOS DA CULPA NO DIREITO DE FAMÍLIA...16

2.1 Direito romano...17

2.1.1 A família romana ...17

2.1.2 O casamento no direito romano ...20

2.1.3 A natureza jurídica do matrimônio romano...22

2.1.4 A dissolução do matrimônio no direito romano ...23

2.1.5 A desagregação da família romana ...25

2.1.6 A culpa no direito romano ...28

2.2 Direito canônico ...29

2.2.1 O surgimento do direito canônico...30

2.2.2 A dissolução da sociedade conjugal no direito canônico ...34

2.2.3 A idéia de culpa no direito canônico...37

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CAPÍTULO III − EVOLUÇÃO DA CULPA NO DIREITO CIVIL BRASILEIRO ...46

3.1 Influência do direito canônico...46

3.2 A entrada da culpa no direito civil brasileiro ...47

3.2.1 A culpa no Código Civil de 1916 ...48

3.2.2. A culpa na Lei do Divórcio...53

CAPÍTULO IV A CULPA ANTE O PRINCÍPIO DO RESPEITO À DIGNIDADE HUMANA...60

4.1 A constitucionalização do direito civil ...60

4.2 Novos rumos do direito de família diante do princípio da dignidade humana .62 4.3 O direito de família na novel codificação civil e a Constituição Federal de 1988 ...65

4.4 A perquirição da culpa e o princípio da dignidade humana...68

CAPITULO V FORTALECIMENTO DA IDÉIA DE RUPTURA E ENFRAQUECIMENTO DA IDÉIA DE CULPA NO ORDENAMENTO JURÍDICO PÁTRIO...73

5.1 Do desquite litigioso à separação judicial litigiosa com culpa ou sem culpa ...74

5.2 Divórcio direto e por conversão...81

5.3 Crescimento do fundamento da falência em detrimento da culpa...84

5.4 Fontes alienígenas da inovação legislativa ...85

5.5 As alterações do novel Código Civil quanto às causas de dissolução da sociedade e do vínculo conjugal ...96

5.6 O enfraquecimento dos efeitos da culpa na separação judicial litigiosa ...108

5.6.1 Fixação da guarda dos filhos menores...109

5.6.2 Uso do nome pelo outro cônjuge ...111

5.6.3 Obrigação alimentar...114

CAPÍTULO VI QUESTÕES POLÊMICAS SOBRE A SEPARAÇÃO JUDICIAL LITIGIOSA...120

6.1 A culpa na dissolução da sociedade conjugal...120

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6.2.1 Corrente contrária à manutenção da separação culposa...122

6.2.2 Doutrina favorável à permanência da separação culposa...128

6.3 Responsabilidade civil por danos morais na separação litigiosa...132

6.3.1 Teoria contrária à indenização por ato culposo...134

6.3.2 Corrente defensora da reparação de danos morais nas relações de família ...139

6.3.2.1 Corrente amplamente favorável à tese da reparabilidade em todos os tipos de separação e divórcio...139

6.3.2.2 Corrente mais restritiva, que reconhece a incidência do direito à reparabilidade somente nas separações culposas ...153

6.3.3 Indenização por danos morais na ruptura do casamento no direito comparado ...161

6.3.3.1 Direito francês ...161

6.3.3.2 Direito português...165

6.3.3.3 Direito peruano...173

CONCLUSÃO ...175

REFERÊNCIAS...181

ANEXOS ANEXO I − PROJETO DE LEI N. 276/2007...195

ANEXO II − PROJETO DE LEI N. 504/2007 ...205

ANEXO III − PROJETO DE LEI N. 507/2007 ...207

ANEXO IV − PROPOSTA DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO N. 33/2007 ...211

(12)

Este trabalho estuda a culpa no âmbito do direito de família, desde a sua origem, até os dias atuais. Nessa evolução, sua importância cresceu, tendo passado a ser instrumento utilizado para manter a unidade da família formada pelo casamento indissolúvel, que se apresentava como a instituição responsável pela estrutura e estabilidade do Estado.

Por meio de um retrospecto histórico-jurídico-social, é possível identificar três fases distintas, a saber, o surgimento com o direito canônico, o ápice na era medieval, até o início do direito moderno, e o declínio, que se iniciou com o chamado direito pós-moderno, quando houve o rompimento em definitivo com o dogma da indissolubilidade do casamento e a maioria dos países civilizados passou a reconhecer a possibilidade do rompimento do vínculo do casamento.

A culpa, nessa evolução, surge em um primeiro momento como única causa a justificar o pedido unilateral de dissolução da sociedade conjugal. Contudo, em decorrência das transformações pelas quais passou a sociedade, teve seu papel enfraquecido, ocorrendo paralelamente o fortalecimento da idéia de ruptura da vida em comum.

Para que se atingisse esse grau de compreensão, foi necessária uma mudança radical na forma de encarar a família, que de instituição que dava suporte ao Estado, passou a ser vista como meio de realização dos membros que a compõem.

Contudo, paralelamente ao enfraquecimento da culpa e fortalecimento da idéia de ruptura da vida em comum, cresceu a responsabilidade pelos atos praticados pelos cônjuges que venham, de alguma forma, a violar direitos personalíssimos do outro.

(13)

O trabalho se limitou ao estudo da culpa dentro dos institutos da separação e do divórcio, e seus reflexos nas relações conjugais e no âmbito da responsabilidade civil.

Embora, pela redação do artigo 1.830 do Código Civil, a culpa na separação tenha passado a produzir efeitos também no direito sucessório, tal assunto não foi objeto de análise neste trabalho, por adentrar área do direito que foge à amplitude que se pretendeu dar a ele.

Esperamos contribuir de alguma forma para um melhor conhecimento do tema tratado, objetivando auxiliar os profissionais que lidam com o direito de família e colaborar na administração dos conflitos familiares, na busca de uma sociedade mais harmoniosa e solidária, preservando o que há de mais sagrado em cada um de nós: a dignidade da pessoa humana.

São Paulo, março de 2008

(14)

1.1 Entendimento atual da doutrina sobre a separação litigiosa no

Código Civil de 2002

A promulgação da Carta Magna de 1988 provocou profunda mudança no direito de família pátrio, obrigando os operadores do direito a uma releitura de todo ordenamento jurídico, a fim de adequá-lo aos princípios fundamentais esculpidos no artigo 1º da Constituição Federal, em especial o da dignidade da pessoa humana.

Entretanto, verifica-se que os dogmas defendidos pelo direito canônico, no tocante à identificação do culpado pela dissolução da sociedade conjugal, ainda continuam presentes no âmbito do direito de família.

O Código Civil de 2002, ao cuidar do término do casamento e da extinção do vínculo matrimonial, manteve na sistemática adotada pela Lei n. 6.515/77, da dualidade de institutos, separação judicial e divórcio, bem como as modalidades de separação culposa e sem culpa.

Na culposa, a lei exige dos cônjuges a discussão das razões do término da sociedade conjugal, atribuindo ao outro a responsabilidade pelo fim do casamento.

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após o casamento com duração superior a dois anos, desde que reconhecida como de cura improvável, o que torna insuportável a vida em comum.1

Trouxe o Código Civil de 2002 inovações no sentido de praticamente tornar inócuas as sanções impostas ao cônjuge considerado culpado pela separação, como é o caso da fixação dos alimentos (art. 1.702 e parágrafo único do art. 1.704), da dissociação da fixação da guarda dos filhos menores, da culpa pelo rompimento do casamento (art. 1.584), além das novas regras sobre a utilização do nome por ambos os cônjuges (art. 1.578).

Entende parte da doutrina que poderia o legislador ter sido mais audaz e incisivo nas inovações legislativas, em especial quanto à dissolução da sociedade conjugal formada pelo casamento, acolhendo entendimento sedimentado tanto na doutrina, quanto na jurisprudência.

Segundo a maioria dos doutrinadores brasileiros o legislador de 2002 perdeu ótima oportunidade, não só de se adequar o Código às recentes orientações doutrinárias, mas principalmente de harmonizá-lo, especificamente quanto ao casamento, aos princípios constitucionais que tutelam a dignidade e a intimidade da pessoa humana.2

Yussef Cahali assim expressa:

“Diante de uma Lei do Divórcio que se reconheceu desde logo falha, esperava-se que com o novo Código Civil suas deficiências viessem a ser superadas. Este novo Código Civil, porém, infelizmente desmerece a ciência jurídica nacional, representando um fator de agravamento das contradições e ambigüidades da disciplina legal do instituto, expondo-se aos múltiplos projetos e medidas provisórias tendentes à sua revisão.”3

Silvio Venosa, ao comentar os artigo 1.572 e 1.573 do novo Código Civil, que regulamentou a separação-sanção, desabafa: “O Código Civil de 2002

1 Marcelo Truzzi Otero. A separação judicial no Código Civil, Revista Brasileira de Direito de

Família, Porto Alegre, Síntese; IBDFAM, ano 7, n. 34, p. 31, fev./mar. 2006.

2 Marcelo Truzzi Otero. A separação judicial no Código Civil, cit., p. 32.

3 Yussef Said Cahali. Divórcio e separação, 11. ed. rev. ampl. atual. de acordo com o Código Civil

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representou, nesse aspecto, um injustificável e odioso retrocesso. Parece que o legislador do país não se contenta em dar passos à frente, pois lhe apraz também voltar ao passado.“4

Silvio Rodrigues também pondera no mesmo sentido, ao dispor: “Deixou o legislador de 2002 de acolher como regra a expectativa da doutrina brasileira contemporânea em dissociar a separação da sua motivação (culpa ou causa específica).”5

Caio Mário da Silva Pereira assim se posiciona sobre o Código Civil de 2002:

“Desta feita, o legislador demonstrou nítido esforço em adaptar-se às novas conquistas. Sua coragem não foi suficiente para impulsioná-lo aos avanços dos sistemas jurídicos mais adiantados; optou pelo esforço de buscar um questionável equilíbrio em meio às controvérsias já enfrentadas pela Doutrina e pela Jurisprudência no dia-a-dia dos Tribunais. Mirando ao longe as modificações que se faziam necessárias, preferiu recuar numa atitude marcada pela dificuldade de confrontar-se com o novo.”6

1.2 Legislação vigente quanto à dissolução da sociedade e do

vínculo conjugal

Para a análise da culpabilidade na dissolução da sociedade e do vínculo conjugal, e diante da atual legislação que rege da matéria, a seguir consideraremos duas espécies, consensual e litigiosa, e para cada uma arrolaremos as características próprias, tanto para a separação quanto para o divórcio.

4 Silvio de Salvo Venosa. Direito civil: direito de família, 5. ed., São Paulo: Atlas, 2005, v. 6, p. 209. 5 Silvio Rodrigues. Direito civil: direito de família, 28. ed. rev. e atual. por Francisco José Cahali, de

acordo com o novo Código Civil (Lei n.10.406, de 10-1-2002), São Paulo: Saraiva, 2004, v. 6, p. 208.

6 Caio Mário da Silva Pereira. Instituições de direito civil: direito de família, Rio de Janeiro:

(17)

1.2.1 Espécie consensual

Tanto a separação quanto o divórcio podem ser feitos pela via consensual.

1.2.1.1 Separação judicial por mútuo consentimento

Separação por mútuo consentimento, ou separação judicial amigável, é aquela que se processa por acordo dos cônjuges, que decidem pôr termo à sociedade conjugal, convencionando as cláusulas e condições que regerão a nova situação.

Não se exige para essa espécie de separação que os cônjuges declarem o motivo que os levou à decisão, bastando que manifestem o desejo de se separarem, para alcançarem seu intento.7

O único requisito exigido, além do mútuo consentimento, é estarem casados há mais de um ano.8

1.2.1.2 Divórcio judicial consensual – indireto e direto

Assim como na separação judicial amigável, o divórcio, quer na modalidade indireta ou na direta, também pode ser requerido por ambos os cônjuges, que de comum acordo decidem romper o vínculo do casamento, convencionando as cláusulas e condições que regerão a nova situação.

Na hipótese do divórcio direto, poderão os cônjuges facultativamente formular pedido judicial, mediante requerimento conjunto, de acordo com o

7 Silvio Rodrigues. Direito civil: direito de família, cit., v. 6, p. 212.

8 “Artigo 1.574 - Dar-se-á a separação judicial por mútuo consentimento dos cônjuges se forem

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procedimento estabelecido nos artigos 1.120 a 1.124 do Código de Processo Civil, sendo exigido, além do mútuo consentimento, que o casal esteja separado de fato há mais de dois anos. Nesse caso, haverá necessidade de produção de prova do decurso do lapso temporal, que normalmente é feito mediante prova testemunhal.9

O divórcio indireto, que foi antecedido de separação judicial – amígável ou não será consensual se o pedido de conversão da separação em divórcio for formulado em conjunto, ou por qualquer um dos cônjuges, com o consentimento do outro.

1.2.1.3 Separação e divórcio extrajudiciais

Desde a promulgação da Lei n. 11.441, de 04.01.2007, que introduziu em nosso ordenamento jurídico a dissolução extrajudicial da sociedade conjugal – separação ou divórcio10 − se tornou inexata a assertiva de que a dissolução da

sociedade ou do vínculo conjugal reclama a intervenção judicial que, no dizer de Sílvio Rodrigues, “representa um processo necessário, sem o qual a sociedade conjugal não se desfaz”.11

Essa Lei veio a alterar o Código de Processo Civil, acrescentando-lhe o artigo 1.124-A, que permite a separação consensual e o divórcio consensual por escritura pública, desde que o casal não tenha filhos menores ou incapazes.12

9 “Artigo 1.580 - (...) § 2º - O divórcio poderá ser requerido, por um ou por ambos os cônjuges, no

caso de comprovada separação de fato por mais de 2 (dois) anos.”

10 Yussef Said Cahali. Separação e divórcio consensual mediante escritura pública, Revista dos

Tribunais, São Paulo, Revista dos Tribunais, ano 96, v. 858, p. 20-29, abr. 2002.

11 Silvio Rodrigues. Direito civil: direito de família, cit., v. 6, p. 208.

12 “Artigo 1.124-A - A separação consensual e o divórcio consensual, não havendo filhos menores

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Apesar de o legislador não ter feito referência expressa sobre a possibilidade de se realizar a conversão da separação em divórcio, entende Yussef Cahali que “o legislador concebeu o divórcio consensual extrajudicial, compreendendo as duas modalidades de dissolução do vínculo matrimonial: divórcio conversão e divórcio direto”.13

Nesse mesmo sentido entende Cristiano Chaves de Farias, esclarecendo que, embora não exista previsão legal expressa, “escaparia à razoabilidade impedir a realização de divórcio-conversão por escritura pública”.14

Dessa forma, tendo tal lei entrado em vigor na data de sua publicação, desde janeiro de 2007 há mais uma espécie de separação e de divórcio consensuais, a extrajudicial, que passa a coexistir com a tradicional separação consensual prevista no artigo 1.574 do Código Civil e o divórcio indireto e direto consensual previsto no artigo 1.580, caput e parágrafo 2º.15

1.2.2 Espécie litigiosa

Separação judicial litigiosa, ou não consensual, é aquela que resulta de sentença que julga procedente ação ordinária promovida por um cônjuge contra o outro, tendo por fundamento hipóteses previstas em lei.16

Esta espécie de separação judicial se subdivide em duas outras, com culpa de um dos cônjuges, ou sem culpa, desde que observadas as causas previstas em lei.17

13 Yussef Said Cahali. Separação e divórcio consensual mediante escritura pública, cit., p. 27. 14 Cristiano Chaves de Farias. O novo procedimento para a separação e o divórcio consensuais e

a sistemática da Lei n. 11.441/2007: o bem vencendo o mal. Revista Magister de Direito Civil e Processual Civil, Porto Alegre, Magister, v. 3, n. 17, p. 20, mar./abr. 2007.

15 “Artigo 1.580 - Decorrido 1 (um) ano do trânsito em julgado da sentença que houver decretado a

separação judicial, ou da decisão concessiva da medida cautelar de separação de corpos, qualquer das partes poderá requerer sua conversão em divórcio. (...) § 2º - O divórcio poderá ser requerido, por um ou por ambos os cônjuges, no caso de comprovada separação de fato por mais de 2 (dois) anos.”

16 Silvio Rodrigues. Direito civil: direito de família, cit., v. 6, p. 222.

17 Tendo em vista o objeto deste trabalho, optamos por classificar as espécies de separação em

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1.2.2.1 Separação judicial com culpa ou sanção

A separação judicial litigiosa será culposa quando um dos cônjuges promove ação imputando ao outro qualquer ato que importe em grave violação dos deveres do casamento e torne insuportável a vida em comum (arts. 1.572, caput e 1.573, incs. I a VI).18

Nesta espécie de separação, a causa, o motivo, é a culpa. Nessas condições, a prova dos autos deverá demonstrar a responsabilidade pelo fim do casamento e as conseqüências daí decorrentes.

O novo Código Civil tratou da separação com culpa e sem culpa no artigo 1.572 e, ao mesmo tempo, no artigo 1.573, I a VI, resgatou o sistema primitivo do legislador de 1916, ao apontar causas específicas para fundamentar a ação e ainda introduzir uma causa genérica permissiva da dissolução, no parágrafo único do artigo 1.573.19

Tem-se assim, como fundamento legal para a separação judicial litigiosa com culpa, os artigos 1.572, caput e 1.573, I a VI, que importam em grave violação dos deveres do casamento estabelecidos no artigo 1.566.20

De acordo com o atual Código Civil, poucas são as conseqüências decorrentes da responsabilidade de um dos cônjuges pelo rompimento do casamento. Hoje, a responsabilidade pela separação é irrelevante para a fixação da guarda dos filhos21, existe previsão legal para fixação de alimentos, ainda que

18 “Artigo 1.572 - Qualquer dos cônjuges poderá propor a ação de separação judicial, imputando

ao outro qualquer ato que importe grave violação dos deveres do casamento e torne insuportável a vida em comum. Artigo 1.573 - Podem caracterizar a impossibilidade da comunhão de vida a ocorrência de algum dos seguintes motivos: I - adultério; II - tentativa de morte; III - sevícia ou injúria grave; IV - abandono voluntário do lar conjugal, durante um ano contínuo; V - condenação por crime infamante; VI - conduta desonrosa.”

19 Silvio Rodrigues. Direito civil: direito de família, cit., v. 6, p. 223.

20 “Artigo 1.566 - São deveres de ambos os cônjuges: I - fidelidade recíproca; II - vida em comum,

no domicílio conjugal; III mútua assistência; IV – sustento, guarda e educação dos filhos; V -respeito e consideração mútuos.”

21 “Artigo 1.584 - Decretada a separação judicial ou o divórcio, sem que haja entre as partes

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para sobrevivência, para o cônjuge faltoso22, e, de acordo com as excludentes

legais, o cônjuge considerado culpado poderá manter o nome de casado.23

1.2.2.2 Separação judicial sem culpa

Introduziu a Lei n. 6.515/77 dois novos casos de separação, um fundado na ruptura da vida em comum, e outro por motivo de doença de um dos cônjuges, de tal magnitude que torne impossível a continuação da vida em comum, sendo conveniente, em ambos os casos, pôr termo à sociedade conjugal.

A inspiração do legislador foi buscada na legislação francesa que, na Lei 75/617, de 11.7.1975, regulamentou o divórcio.

a) Separação por ruptura da vida em comum: nos termos do disposto no artigo 1.572, parágrafo 1º24 (antigo art. 5º, § 1º da Lei n. 6.515/77), a

separação por pedido unilateral de um dos cônjuges poderá ser deferida, desde que o interessado prove que tal ruptura se dá há mais de um ano e que se tornou impossível a reconstituição da união.

Nesta espécie de separação, o deferimento do pedido representa a permissão para atribuir juridicidade a uma situação de fato já cristalizada no tempo25. Não se questiona sobre a responsabilidade pela ruptura da vida em

comum e não há averiguação de culpa. Não adianta o cônjuge demandado alegar

22 “Artigo 1.704 - Se um dos cônjuges separados judicialmente vier a necessitar de alimentos será

o outro obrigado a prestá-los mediante pensão a ser fixada pelo juiz, caso não tenha sido declarado culpado na ação de separação judicial. Parágrafo único - Se o cônjuge declarado culpado vier a necessitar de alimentos, e não tiver parentes em condições de prestá-los, nem aptidão para o trabalho, o outro cônjuge será obrigado a assegurá-los, fixando o juiz o valor indispensável à sobrevivência.”

23 “Artigo 1.578 - O cônjuge declarado culpado na ação de separação judicial perde o direito de

usar o sobrenome do outro, desde que expressamente requerido pelo cônjuge inocente e se a alteração não acarretar: I - evidente prejuízo para a sua identificação; II - manifesta distinção entre o seu nome de família e o dos filhos havidos da união dissolvida; III - dano grave reconhecido na decisão judicial.”

24 “Artigo 1.572 - (...) § 1º - A separação judicial pode também ser pedida se um dos cônjuges

provar ruptura da vida em comum há mais de 1 (um) ano e a impossibilidade de sua reconstituição.

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que o requerente foi o causador da separação, que houve abandono do lar. O elemento objetivo justificador da sentença que decreta a separação é a mera existência de separação fática prolongada.26

Na separação por ruptura da vida em comum, não tem lugar a discussão da culpa, não há sanção alguma ao vencido, mantendo-se o direito ao uso do nome de casado, bem como aos alimentos27, desde que preenchidos os requisitos pertinentes à espécie.

b) Separação judicial por doença mental de um dos cônjuges, ou separação remédio: manteve o legislador de 2002 a previsão contida na Lei do Divórcio, autorizando a separação judicial, quando um dos cônjuges estiver acometido de doença mental grave, manifestada após o casamento, que torne impossível a continuação da vida em comum, e a enfermidade tenha sido reconhecida de cura improvável, conforme dispõe o artigo 1.572, parágrafo 2º.28

Há nesta hipótese também um caso de ruptura de vida em comum, mudando apenas o fundamento da dissolução, que é a superveniência de moléstia mental de cura improvável.29

Inexiste culpa de qualquer dos cônjuges, não sendo cogitáveis sanções quanto ao nome e à pensão alimentícia. Entretanto, a lei traz uma repercussão específica para a separação judicial sob esse fundamento, a fim de conceder benefício ao cônjuge enfermo.

26 Silvio Rodrigues. Direito civil: direito de família, cit., v. 6, p. 229.

27 “Artigo 1.694 - Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os

alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação. § 1º - Os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada.”

28 Maria Helena Diniz. Direito civil brasileiro: direito de família, São Paulo: Saraiva, 2002, v. 5, p.

259. “Artigo 1.572 - (...) § 2º - O cônjuge pode ainda pedir a separação judicial quando o outro estiver acometido de doença mental grave, manifestada após o casamento, que torne impossível a continuação da vida em comum, desde que, após uma duração de 2 (dois) anos, a enfremidade tenha sido reconhecida de cura improvável.”

(23)

O artigo 1.572, parágrafo 3º30 reflete a intenção do legislador em garantir

ao cônjuge enfermo uma maior segurança financeira, mas nas entrelinhas acaba por penalizar o cônjuge requerente por fugir do dever de caridade e de mútua assistência em relação ao outro.

Cria assim um sistema de proteção ao enfermo, dando-lhe, além da meação conforme o regime de bens fixado no casamento, tudo o que remanescer dos bens que trouxe para o casamento.

Contudo, tal sanção só ocorrerá na hipótese do casamento ter adotado o regime da comunhão universal de bens, que é o regime que envolve todo o patrimônio do casal, inclusive os bens adquiridos antes do casamento. Tais bens serão separados do patrimônio comum e reservados ao cônjuge enfermo, sendo o restante partilhado, metade por metade entre os separandos.31

c) Separação judicial por causa genérica – a impossibilidade da vida em comum: inovou o legislador de 2002 no artigo 1.573, embora tenha apontado em seus seis incisos causas específicas para fundamentar a ação de separação judicial culposa nos moldes da redação original do Código Civil de 1916, como dito acima, ao introduzir previsão genérica em seu parágrafo único.

A causa genérica introduzida pelo legislador não preestabelece uma situação fática específica a ser verificada, limitando-se a lei a indicar um conceito vago permissivo da ação. Em qualquer desses casos, a culpa ou responsabilidade pela origem do fato que ensejou a ruptura da vida conjugal é irrelevante.32

Dessa forma, o motivo autorizador do pedido de separação não é necessariamente o comportamento faltoso do outro cônjuge, mas as

30 “Artigo 1.572 - (...) § 3º - No caso do parágrafo 2º, reverterão ao cônjuge enfermo, que não

houver pedido a separação judicial, os remanescentes dos bens que levou para o casamento, e se o regime dos bens adotado o permitir, a meação dos adquiridos na constância da sociedade conjugal.”

(24)

contingências existentes na vida conjugal que, pelas circunstâncias, ensejam a impossibilidade de convivência conjugal.33

No entender de Francisco José Cahali, atualizador da obra de Silvio Rodrigues sobre direito de família, o parágrafo único do artigo 1.573 do Código Civil criou uma nova causa de separação sem culpa do requerido, mais abrangente do que as causas específicas elencadas nos parágrafos 1º e 2º do artigo 1.572, pois permite ao julgador considerar os elementos trazidos pelo interessado como razões de insuportabilidade da vida em comum.34

Foi criada assim nova espécie de separação sem culpa, mas com causa que é apresentada em termos vagos, gerais e abrangentes. Tal inovação no campo da dissolução da sociedade conjugal, segundo Francisco José Cahali, restou inspirada na doutrina contemporânea, caminhando para acolher em nosso sistema o princípio da ruptura da affectio maritalis como causa suficiente à separação judicial.35

A jurisprudência tem dado mostras de compartilhamento desse entendimento, posto que freqüentes as decisões que acolheram seu comando, inclusive, antes mesmo da entrada em vigor do novo Código Civil, em 2003, como se constata nas seguintes ementas:

“SEPARAÇÃO JUDICIAL – Culpa. Se a sentença reconheceu não haver prova de culpa por parte de nenhum dos cônjuges, não pode concluir, contraditoriamente, em decretar a separação judicial por culpa recíproca. Deve ser provido o apelo do cônjuge que não se conformou em lhe ser atribuída uma culpa que não ficou demonstrada, mesmo porque resultam seqüelas nocivas nos planos moral e econômico. A exegese liberal que busca não manter os cônjuges unidos, quando não há mais condições para tal, não pode ir ao ponto de imputar culpa quando não há prova desta culpa, como é óbvio; pode é trabalhar com a noção de insuportabilidade da vida em comum e a partir daí buscar a inevitabilidade da separação judicial. De qualquer forma, não há, a rigor, motivo para tal preocupação, na medida em que o direito brasileiro atual tranqüilamente prevê soluções para desfazimento da sociedade conjugal e do casamento de casais que não mais se

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acertam, independentemente da idéia de culpa. Voto vencido.” (TJRS – AC n. 595.096.702, 8ª C.C., rel. Des. Antonio Carlos Stangler Pereira, j. 09.11.1995, RBDF n. 1, abr./mai./jun. 1999).

“SEPARAÇÃO JUDICIAL – Culpa – Colação de bens doados – Bens reservados – Assistência privada.

1. Estando ausente prova da culpa pela ruptura do casamento, seja do cônjuge-varão seja do virago, mas tendo ambos, na ação e reconvenção postulado a separação judicial, impõe-se seja ela decretada, mesmo sem culpa, pois o casamento já faliu.

2.(...) Recursos principal e adesivo desprovidos.” (TJRS – AC n. 598.564.821, 7ª C.Cív., rel. Des. Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, DOERS, de 01.04.1999, RBDF n. 4, jan./fev./mar./2000).

1.2.2.3 Divórcio litigioso

Divórcio é a dissolução de um casamento válido, que autoriza as pessoas a contraírem novas núpcias, e pode ser realizado pela modalidade indireta ou direta.

a) Divórcio indireto: em decorrência do sistema duplo adotado pela legislação pátria, o divórcio será decretado num segundo momento, sempre antecedido pela separação, que pode ser judicial ou de fato.

Sendo o divórcio antecedido pela separação judicial, que pode ser consensual ou litigiosa, tem-se o chamado divórcio indireto, posto que será concedido mediante conversão da separação judicial em divórcio, nos termos do artigo 1.580, caput e parágrafo1º.36

O divórcio indireto será litigioso quando houver discordância ou recusa do outro cônjuge em consentir com a conversão. Assim, o cônjuge interessado deve formular pedido para que seja a separação judicial convertida em divórcio, posto

36 “Artigo 1.580 - Decorrido 1 (um) ano do trânsito em julgado da sentença que houver decretado a

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que cumprido o prazo de um ano estabelecido em lei, pondo fim ao matrimônio e seus efeitos.37

Em qualquer das modalidades de divórcio indireto, litigioso, consensual ou extrajudicial38, não poderá a sentença que o decreta fazer qualquer referência

à causa que determinou a conversão (art. 1.580, § 2º).

b) Divórcio direto: distingue-se o divórcio direto do indireto, pois o direto resulta de uma separação de fato, que autoriza a conversão direta dessa separação em divórcio, desde que comprovada a ruptura da vida em comum por mais de dois anos.

A separação de fato, sem qualquer intervenção judicial, passa a ter relevância jurídica, produzindo o efeito de ser pré-requisito do divórcio.39

Da mesma forma que a modalidade anterior, o divórcio direto pode adotar tanto a forma litigiosa quanto a consensual, e até mesmo a extrajudicial.40

Não havendo consenso entre as partes, um dos cônjuges pode promover ação de divórcio direta mediante comprovação da separação de fato superior a dois anos, devendo, contudo, apresentar na petição inicial todos os elementos necessários à definição sobre a guarda dos filhos menores, quando houver, e sobre os alimentos, caso já não tenham sido objeto de apreciação judicial anterior através de ação própria, pois em existindo, basta apresentar a decisão então proferida, para que seja possível a decisão que decrete o divórcio, rompendo o vínculo do casamento.

Observe-se que, a partir da promulgação do novo Código Civil, a partilha de bens não mais é exigida para a decretação do divórcio por força do disposto no artigo 1.581.41

37 Maria Helena Diniz. Direito civil brasileiro: direito de família, cit., v. 5, p. 276. 38 Lei n. 11.441, de 04.01.2007.

39 Maria Helena Diniz. Direito civil brasileiro: direito de família, cit., v. 5, p. 280. 40 Lei n. 11.441, de 04.01.2007.

(27)

Contudo, o reflexo de tal liberalidade do legislador será sentido no momento em que qualquer dos cônjuges pretenda convolar novas núpcias, já que a ausência de partilha surge como causa suspensiva de casamento, nos termos do artigo1.523, III.42

Importante notar que em qualquer das modalidades de divórcio, seja ele direito ou indireto, consensual ou litigioso, não se exige a averiguação da culpabilidade de qualquer das partes.

1.3 Projetos de lei em trâmite no Congresso Nacional alusivos à

separação judicial culposa

O deputado Léo Alcântara (PSDB/CE) reapresentou ao Congresso Nacional, em 1º.03.2007, o projeto de lei que recebeu o número PL n. 276/2007, da lavra do falecido deputado Ricardo Fiúza, que tramitara durante a legislatura que se findou em 31.01.2007, tendo por objetivo a alteração do Código Civil, instituído pela Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. A única diferença entre a presente proposição e a anterior é a retirada da proposta de alteração do artigo 1.361, por entender o parlamentar que a matéria já foi satisfatoriamente regulamentada.

O deputado Sérgio Barradas Carneiro (PT/BA) apresentou perante o Congresso Nacional, em 20.03.2007, mais cinco projetos de lei, que receberam os números 504/2007, 505/2007, 506/2007, 507/2007 e 508/2007, que também objetivam a alteração de dispositivos do Código Civil, mas, especificamente, referentes a institutos do direito de família e das sucessões. O mesmo parlamentar, em 25.10.2007, apresentou outro projeto de lei que dispõe sobre a criação do Estatuto das Famílias, que recebeu o número 2.285/2007.43

42 “Artigo 1.523 - Não devem casar: III - o divorciado, enquanto não houver sido homologada ou

decidida a partilha dos bens do casal;”

43 Leonardo Barreto Moreira Alves. O fim da culpa na separação judicial: uma perspectiva

(28)

O Estatuto das Famílias oferce uma nova concepção para a dissolução da sociedade e do vínculo conjugal. Conforme consta da justificativa apresentada ao Congresso Nacional, privilegia o divórcio como o meio mais adequado para assegurar a paz daqueles que não mais desejam continuar casados.

Propõe o Estatuto a mínima interferência do Estado na intimidade do casal, vedando qualquer investigação sobre as causas da separação. Embora mantida a dualidade de procedimentos, separação e divórcio, procura assegurar na guarda dos filhos do casal o melhor interesse dos menores, a fixação ou dispensa dos alimentos entre os cônjuges, a obrigação alimentar do não-guardião aos filhos comuns, bem como a manutenção ou mudança do nome de família. Regulamenta ainda de forma mais detida a separação e o divórcio mediante escritura pública, facilitando o procedimento.

Os cinco primeiros projetos de lei são o resultado de sugestões apresentadas pelos integrantes do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), que já haviam sido aprovadas em assembléia realizada em 2003. À época, as sugestões deram origem a outros projetos de lei, de autoria do deputado Antonio Carlos Biscaia, porém, não tendo sido aprovados na legislatura para a qual fora ele eleito, foram, em conseqüência, arquivados, em 31.01.2007.

Para este trabalho, abordaremos apenas os dispositivos dos aludidos projetos de lei que digam respeito aos efeitos decorrentes da separação e do divórcio.

Registramos ainda a apresentação ao Congresso Nacional, pelo deputado Sérgio Barradas Carneiro, em 10.04.2007, por sugestão do IBDFAM, a Proposta de Emenda à Constituição n. 33/2007, que tem por finalidade a eliminação do sistema duplo de institutos, abolindo do cenário nacional a separação judicial, tanto consensual, quanto litigiosa.

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FAMÍLIA

O Brasil foi colonizado por Portugal, que enviou missionários católicos para catequizar o povo autóctone, e que acabaram por disseminar em nossa pátria os ditames canônicos referentes à disciplina do casamento.44

Portugal foi um dos países que mais demorou a acolher as inovações trazidas pelo iluminismo, movimento que pregava a luta da razão contra o autoritarismo e visava abolir velhas tradições jurídicas e o império do direito natural45. Esse atraso na renovação do direito português refletiu diretamente no Brasil, que permaneceu sob a regência das Ordenações Filipinas, constituídas por uma compilação jurídica que traduzia influências do direito romano, do canônico e do germânico, até a promulgação da Constituição Imperial, em 1824.

Em matéria de casamento, o direito pátrio anterior à proclamação da República adotou a doutrina canônica e desconheceu o divórcio no sentido amplo da palavra. Até mesmo a separação de corpos teve seu campo de incidência reduzido, uma vez que não se reconhecia como causas determinantes da separação a heresia e a apostasia, aceitas pelo direito canônico, por se considerar serem causas que haviam caído em desuso.46

Contudo, não foi sempre assim. O papel da culpa na separação, com o passar dos tempos, foi se modificando, tendo sido atenuado na atualidade, ao menos no que tange à tendência observada na política legislativa contemporânea, embora seu espectro continue presente na cultura do direito de família.47

44 Ana Caroline Santos Ceolin. A culpa na dissolução da sociedade conjugal à luz do novo Código

Civil, in Maria Helena Diniz (Coord.), Atualidades jurídicas 4, São Paulo: Saraiva, 2003, p. 30.

45 Renata de Lima Rodrigues. As tendências do direito civil brasileiro na pós-modernidade, Jus

Navigandi, Teresina, ano 9, n. 655, p. 3, 23 abr. 2005. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6617>. Acesso em: 18 set. 2007.

46 Clóvis Beviláqua. Direito de família, 9. ed. atual. pelo Desembargador Isaias Beviláqua, Rio de

Janeiro: Freitas Bastos, 1959,p. 283.

47 Ver a respeito: Gustavo Tepedino. O papel da culpa na separação e no divórcio, in Temas de

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É muito comum no âmbito do direito de família, em decorrência da forte influência exercida pela Igreja Católica na sua regulamentação, encontrar a noção de culpa, que deriva do pecado original, praticado no Jardim do Éden.

Pode-se dizer que a culpa é uma criação da cultura judaico-cristã, diretamente ligada à noção de expiação de pecados, inspirada na idéia do pecado original cometido por Adão e Eva no Paraíso, ao desrespeitarem as ordens divinas, cedendo à tentação da serpente, para se igualar a Deus (Gên 3,1).

Passou-se assim a valorizar a idéia de penalizar a pessoa culpada, criando-se o binômio “culpa-sanção”.48

O direito, desfrutando de seu poder normativo, exerce um papel sancionador, valorizando a discussão da culpa, transformando-a em instituto universal, que passa a permear todos os ramos do direito: penal, constitucional, administrativo, comercial e civil.

2.1 Direito romano

2.1.1 A família romana

Família é um vocábulo que em Roma, além de outros sentidos, significava primeiro um conjunto de pessoas colocadas sob o poder de um chefe – o pater familias − e, segundo, o patrimônio do pater familias.49

A família romana era de base patriarcal e tudo girava em torno de um pater familias, ao qual, sucessivamente, se subordinavam os descendentes alieni juris, até a morte do chefe.

48 Pedro Thomé de Arruda Neto. A “despenalização” do direito das famílias, in Eliene Ferreira

Bastos; Asiel Henrique de Sousa (Coords.), Família e jurisdição, Belo Horizonte: Del Rey, 2006, p. 270.

49 Veja-se a respeito: José Cretella Júnior. Curso de direito romano: o direito romano e o direito

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O pater familias tem o dominium in domo, a potestas. É o dominus, o senhor, a quem está confiada a domus, ou grupo doméstico.

A família romana era constituída de forma muito distinta da que conhecemos na atualidade. José Carlos Moreira Alves50 identifica no direito

romano cinco agrupamentos de pessoas vinculadas pelo parentesco ou pelo casamento, a saber:

a) gens – cujos membros, que se denominavam gentiles, julgavam descender de um antepassado comum, lendário e imemoriável, do qual recebiam o nome gentílico (e era esse nome, e não necessariamente o parentesco consangüíneo, que os unia). Esta forma de agrupamento desapareceu durante o Principado e, com ela, as derradeiras características de organismo político que a família dela herdara;

b) familia comuni iure – na definição trazida por Chamoun51, abraçava um conjunto de pessoas reunidas em vários grupos, chefiados, cada um deles, por um pater familias, mas que se encerrariam numa só família se o pater familias comum estivesse vivo. Este agrupamento desapareceu com a extinção da agnatio. Agnados eram todos os que se acham sob a patria potestas de um mesmo chefe – pater familias. Cognados eram todos os indivíduos ligados pelo sangue. É o laço de sangue que havia entre as pessoas que descendiam uma das outras (filho, pai, avô, bisavô) ou de um descendente comum (irmãos que descendem dos mesmos pais);

c) conjunto de cognados em sentido restrito − eram aqueles que, não sendo agnados uns dos outros, estavam ligados apenas pelo parentesco consangüíneo.

d) familia proprio iure − era o complexo de pessoas que se encontravam sob a potestas de um pater familias.

(32)

e) família natural − agrupamento constituído apenas dos cônjuges e de seus filhos, independentemente de o marido e pai ser, ou não, pater familias da mulher e dos descendentes imediatos.

A domus tinha um tríplice aspecto: grupo religioso (pater é o sacerdote), econômico (pater é o dirigente) e jurídico-político (pater é o magistrado).52

A familia proprio iure era constituída por um complexo de pessoas que viviam sob a patria potestas de um chefe – o pater familias53 – que era aquele que não tinha, na linha masculina, ascendente vivo a que estivesse subordinado54. A patria potestas não se extinguia com o casamento dos filhos que, tivessem a idade que tivessem, fossem casados ou não, continuavam a pertencer à família do chefe.55

Dessa forma, os que viviam sob o poder de um pater familias eram alieni juris, isto é, dependentes desse pater familias56, enquanto os que eram independentes eram os sui juris, isto é, não se encontravam submetidos a nenhum dos poderes domésticos, exerciam por si mesmos os seus direitos, representavam a unidade da família, ainda que mantivessem laços de sangue com algum outro pater familias.57

A familia proprio iure não tinha por objetivo final a procriação, educação dos filhos e nem mesmo o auxílio e cooperação entre os cônjuges, esclarece Chamoun. A família romana era uma comunidade política em miniatura, que se assemelhava ao Estado, tanto que para entrar numa família, o estranho tinha que preencher rigorosas formalidades, como as da conventio in manu e da adoptio.

O paterfamilias era o chefe, o juiz e o sacerdote daquele grupo, exercia um poder quase absoluto sobre os filhos, mulher, clientes e escravos, além de ser

52 José Cretella Júnior. Curso de direito romano, cit., p. 110. 53 José Carlos Moreira Alves. Direito romano, cit., v. 2, p. 254. 54 José Carlos Moreira Alves. Direito romano, cit., v. 2, p. 256. 55 José Cretella Júnior. Curso de direito romano, cit.,p. 110.

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o senhor absoluto do patrimônio angariado pela família e do território onde estavam instalados.

Até a época clássica, o Estado não interferia senão esporadicamente na família e a sua jurisdição era paralela à jurisdição doméstica.

A unidade política da família correspondia à unidade econômica e religiosa. Cada família tinha seus próprios deuses, que eram seus antepassados mortos, em honra dos quais se devotava o culto perpétuo.

Contudo, durante o período clássico, a família começou a perder essa unidade política, econômica e religiosa. A autoridade do pater familias sofreu graves atenuações. Cresceu em importância o parentesco natural ou de sangue. O eixo da economia deixou de ser a família e passou a ser o indivíduo. A religião doméstica desapareceu absorvida pela religião do Estado. Deixou assim a família romana de constituir uma comunidade que coexistia paralelamente ao Estado.58

2.1.2 O casamento no direito romano

Segundo Ana Lucia Pedroni, “é em Roma que o casamento começa a interessar historicamente, uma vez que se encontrava organizado em torno do patriarca. Há uma estreita relação entre a organização do casamento e a forma de família reinante na época”. A autora traz a comento conclusão a que chegou Eduardo de Oliveira Leite: “A noção clara ao patriarcalismo, da certeza genética, fica assegurada pelo casamento legítimo, pela união da mulher a um homem só e pela sanção a qualquer tentativa de adultério.”59

O casamento romano criou a família natural. Conforme ensinamentos de Álvaro Villaça, no direito romano não havia disciplina orgânica acerca do casamento. Mas o matrimônio romano era a base da sociedade doméstica.

58 Erbert Chamoun. Instituições de direito romano, cit., p. 152.

59 Ana Lúcia Pedroni. Dissolução do vínculo matrimonial: (des)necessidade da separação judicial

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O matrimônio romano continua Álvaro Villaça, diferentemente do que entendemos hoje, era uma relação social, assumida e reconhecida pelo direito. O matrimônio romano era assentado na longa duração do desejo e do propósito de ser marido e mulher, da consistência e da continuidade da vida em comum.

O Corpus Iuri Civilis traz duas definições de casamento: a primeira, atribuída a Modestino, se encontra no Digesto XXIII, 2, 1, e reza que “as núpcias são a união do homem e da mulher, o consórcio de toda a vida, a comunicação do direito divino e humano”. A outra, encontra-se localizada nas Institutas, I, 9, 1, é de provável autoria de Ulpiano e diz que “núpcias, ou matrimônio, é a união do homem e da mulher, a qual encerra comunhão indivisível de vida”.60

Justas núpcias ou matrimônio, no dizer de Cretella Junior, é o casamento legítimo, contraído de acordo com o direito civil. Os romanos, que por excelência praticavam a monogamia, admitiam o instituto da manus, isto é, o poder do marido sobre a mulher. Com base nessa potestas, conheceram duas espécies de casamentos: o casamento cum manu e o sine manu. Ambas eram formas legítimas de casamento entre os romanos.

Casamento cum manu é aquele em que a mulher cai sob o poder do marido ou do pater familias do marido, caso ele seja alieni juris.61

Casamento sine manu é aquele em que a mulher não cai sob o poder do marido, continuando sob a manus do pater da família de que provém. Se a mulher era sui juris, assim continua sendo, já se era alieni juris, não cai sob a nova manus.62

60 Álvaro Villaça Azevedo. Dever de coabitação: inadimplemento, São Paulo: José Bushatsky,

1976, p. 18.

(35)

2.1.3 A natureza jurídica do matrimônio romano

Nos dizeres de José Carlos Moreira Alves63, havia muita controvérsia

entre os romanistas sobre a natureza jurídica do casamento romano.

A polêmica se iniciou com os glosadores que, se abstendo de definir o casamento, o caracterizavam, a princípio, como contrato sem fundo patrimonial (contractus personarum).

Já os últimos glosadores, sob a influência dos canonistas, passaram a considerá-lo um actus legitimus (ato jurídico).

Os pós-glosadores retomaram a tese de que o casamento romano era um contractus personarum.

Posteriormente, os representantes franceses da escola culta o classificaram como species societatis (espécie de sociedade).

Os jurisconsultos dos séculos XVII e XVIII, em sua quase totalidade, consideravam o casamento romano um contrato, fixando-se, geralmente, no de sociedade.

Pietro Bonfante, inspirado por Manenti, elaborou, ainda no final do século XIX, tese revolucionária sobre a natureza jurídica do casamento romano, que até os dias atuais é seguida pela maioria dos romanistas.

De acordo com a teoria formulada por Bonfante, trazida por Álvaro Villaça64, o matrimônio romano era uma situação de fato que se iniciava, sem quaisquer formalidades, com o simples acordo de vontade do homem e da mulher e que perdurava somente enquanto persistia a intenção dos cônjuges em permanecerem casados, ocorrendo sua dissolução, imediatamente, no momento em que um deles, ou ambos, deixasse de tê-la.

(36)

Nesse mesmo sentido, nos traz Arnoldo Wald65 a idéia romana de

casamento, que muito difere da dominante em nossos dias. Para os romanos, a affectio era um elemento necessário para o casamento. A affectio deveria estar presente não só no momento da celebração do casamento, mas também, e principalmente, enquanto perdurasse esse casamento.

O consentimento das partes por ocasião da celebração do casamento não poderia ser apenas inicial, teria sim que ser continuado, pois, para os romanos, a afeição é que dava sustentação ao casamento. O desaparecimento desse sentimento que um dia uniu o casal, por si só já era causa para a dissolução do casamento.

Tem-se assim que, no direito romano, o matrimônio se iniciava com o acordo de vontades do homem e da mulher de se casarem, e perdurava apenas enquanto esse acordo persistisse. Identificam-se assim dois elementos constitutivos do casamento romano: o elemento subjetivo − a affectio maritallis, que se resumia na intenção contínua dos cônjuges permanecerem casados, e o elemento objetivo – a convivência e a vida em comum.

2.1.4 A dissolução do matrimônio no direito romano

Nos tempos primitivos, ao que parece, o divórcio foi raro, em virtude da severidade de costumes. O marido não repudiava a mulher, a não ser nos poucos casos admitidos pelos costumes. O primeiro divórcio que se tem conhecimento em Roma teve por fundamento a esterilidade da mulher.66

Amaral Gurgel conta relato de Valério Máximo: “Desde a fundação da cidade de Roma até o ano de 520, não se registrara nenhum divórcio. Foi Spurius Curvilius, o primeiro que repudiou sua mulher, por motivo de esterilidade. O caso

65 Arnoldo Wald. O novo direito civil de família, cit., p. 12.

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escandalizou Roma, cujas famílias respeitavam a fé conjugal, instituída na cidade que o piedoso Camillo dizia ser a morada dos deuses.”67

No mesmo sentido discorre Ebert Chamoun, ao esclarecer que “os divórcios eram muito pouco freqüentes no direito antigo. O repúdio da mulher pelo marido era autorizado apenas quando a mulher fosse adúltera, bebesse vinho ou abortasse”.

Continua ainda Chamoun, informando que o casamento romano se dissolvia com o desaparecimento da intenção dos cônjuges de serem marido e mulher. O divórcio, segundo o autor, decorria da natureza consensual do matrimônio e exigia igualmente o firme propósito de separação definitiva.68

Os costumes romanos permitiam o divórcio pelo consentimento mútuo, ou pela vontade de um só (repúdio), sendo ambas as modalidades independentes de qualquer intervenção da autoridade pública estatal.69

Álvaro Villaça70, reportando-se à teoria de Pietro Bonfante, identifica três formas distintas de dissolução do matrimônio romano, a saber:

a) pela morte de um dos cônjuges; b) pela cessação da capacidade;

c) pela cessação da affectio maritalis, sendo que ela poderia ocorrer por iniciativa de um dos cônjuges, quando ocorreria o repudium, ou, quando advinha da vontade de ambos, acontecia o divortium.

Divortium significava dissolução do casamento provocada pela vontade de um dos cônjuges ou de ambos; já repudium significava manifestação unilateral da vontade de dissolver o matrimônio.71

67 J. do Amaral Gurgel. Desquite: theoria e prática, São Paulo: Acadêmica, 1936, p. 5. 68 Erbert Chamoun. Instituições de direito romano, cit., p. 163.

69 Ana Lúcia Pedroni. Dissolução do vínculo matrimonial: (des)necessidade da separação judicial

ou de fato como requisito prévio para obtenção do divórcio no direito brasileiro, cit., p. 25.

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2.1.5 A desagregação da família romana

Ana Lucia Pedroni, com supedâneo em José Eduardo de Oliveira Leite72, esclarece que, até o século III, poucos foram os casos de divórcio na sociedade romana, contudo, a partir desse período, o divórcio pelo consentimento dos dois cônjuges ou pela vontade de um só tornou-se moeda corrente das relações familiares. Assistia-se a partir de então a uma epidemia de separações conjugais.

Em fins da República e início do Alto Império, por volta do ano 27 a.C., o divórcio passou a preocupar o governo, pela freqüência demasiada com que se observava, a ponto de correr na boca romana a frase: há mulheres que contam as datas, não pelos nomes dos cônsules, mas pelos dos maridos. A crise de natalidade atingiu o máximo no Império; os costumes relaxaram-se, a família desagregou-se.73

Augusto, procurando reprimir o mal, promulgou leis com o intuito de moralizar os costumes, não só para reprimir o adultério, como para pôr um freio à grande liberdade dos divórcios. Surgiu assim a Lex Iulia Adulteris, que ordenou, por volta de 18 ou 16 a.C., que o repúdio se fizesse por um libelo, na presença de sete cidadãos romanos púberes, e a Lex Iulia de Maritandis Ordinibus de 18 a.C., proibiu a liberta divorciar-se do patrono contra a vontade dele.74

Esclarece Cretella Junior que sem qualquer limitação legal ao divórcio, em fins da República e início do Império, ameaçava Roma uma série crise de natalidade. Contudo, durante o direito clássico, não se chegou a estabelecer um elenco de causas autorizadoras e punitivas do divórcio.

A primeira intervenção direta do Estado na dissolução do casamento foi feita por Dioclesiano, por volta de 285 d.C., através de uma constituição imperial

72 Ana Lúcia Pedroni. Dissolução do vínculo matrimonial: (des)necessidade da separação judicial

ou de fato como requisito prévio para obtenção do divórcio no direito brasileiro, cit., p. 25.

(39)

(código 5.44), que preceituava: “No caso de indignidade de um dos cônjuges, decidirá o magistrado a quem caberá a guarda dos filhos.”75

Contudo, o combate ao divórcio só teve início no Império cristão.

No ano de 331, durante o governo de Constantino, a mulher podia se divorciar se o marido fosse homicida, envenenador ou violador de sepulcros. Contudo, se o repudiasse sem causa, devia restituir-lhe o dote e todos os presentes e ser deportada. Já o marido podia repudiar a mulher que fosse adúltera, envenenadora e alcoviteira. E se repudiasse sem motivo, devia restituir-lhe o dote e não contrair novas núpcias, podendo a murestituir-lher, nesse caso, invadir a casa dele e apoderar-se do dote da outra mulher.76

Em 439, Teodosio II aboliu essa legislação, limitando-se a cominar sanções contra o cônjuge culpado do divórcio, mas, dez anos mais tarde, voltou a proibir o divórcio “sem justa causa”, apresentando uma longa lista de causas justas; as sanções aos divórcios injustos foram atenuadas.77

Já Justiniano reafirmou a necessidade de formalidade no repúdio e ajuntou novas causas justas de divórcio à lei teodosiana. Em 535, o direito justinianeu distinguia quatro espécies de divórcio:78

a) divortium ex iusta causa: era o divórcio realizado por um dos cônjuges, em virtude de o repudiado ter cometido atos que legitimamente justificassem o repúdio, como, por exemplo, manter concubina no lar conjugal, ou de forma ostensiva na mesma cidade onde estivesse domiciliada sua esposa; quanto à mulher, quando praticasse adultério ou contrariasse a vontade do cônjuge;

b) divortium bona gratia: decorria da vontade de ambos, ou, era pedido por apenas um dos cônjuges, quando justificado por causa legítima, como esterilidade, impotência incurável ou voto de castidade;

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c) divortium sine iusta causa: era o repúdio de um dos cônjuges pelo outro, sem qualquer das causas legítimas que o justificasse;

c) divortium communi consensu: era o divórcio realizado de comum acordo por ambos os cônjuges, sem que ocorresse qualquer das “justas causas”.

Segundo as novelas CXVII, CXXVII e CXXXIV, quando um dos cônjuges se divorciava do outro sem justa causa, ou quando dava justa causa para que o outro o repudiasse, o cônjuge responsável era punido com penas pecuniárias, a saber: a mulher perdia o dote e o homem perdia as doações nupciais, além de penas corporais e prisão perpétua em convento, tanto para os homens, como para as mulheres.79

Mais tarde, Justiniano diminuiu o número de causas legítimas e agravou as penas para o marido. Contudo, essa legislação inspirada pelo cristianismo era sobremaneira inadequada à longa tradição divorcista romana. Quatro anos após haver proibido, foi o divórcio, por mútuo consentimento, restabelecido por Justino II, que ratificou as demais disposições justinianéias.80

O divórcio permaneceu enfrentando a reação do direito da Igreja, que fizera do matrimônio um sacramento, tornando-o, portanto, indissolúvel, e formulara a doutrina de separatio a thoro et mensa, do qual proveio o nosso desquite.81

Verifica-se assim que foram os imperadores cristãos, sob a influência da doutrina da Igreja sobre a indissolubilidade do casamento, que começaram a combater o divórcio, sem, entretanto, chegarem a proibi-lo.

Observa Cretella Junior que a atitude dos imperadores cristãos diante do divórcio era oscilante, porque, se por um lado, de acordo com as normas do cristianismo, defendiam a indissolubilidade do vínculo matrimonial, por outro lado,

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não ousavam oficialmente abolir o instituto, mas apenas restringi-lo, tanto assim que uma constituição de Alexandre Severo, do ano de 224, decreta a nulidade de um pacto proibitório referente ao divórcio entre esposos como sendo contrário ao direito consuetudinário.82

2.1.6 A culpa no direito romano

Durante o período antigo do direito romano, pode-se identificar ao menos três causas autorizadoras do repúdio da mulher pelo homem: o adultério, a esterilidade e o aborto. Uma decorrente do dever de fidelidade, com o objetivo de garantir a paternidade dos filhos havidos dessa união, e as outras duas decorrentes do dever de procriação.

Constata-se dessa forma o surgimento de um novo dever o da procriação − que embora tenha chegado até a era moderna, não resistiu às

concepções da atualidade.

Esse dever decorre da função que a mulher passou a exercer no âmbito doméstico, após a instituição do patriarcalismo. A violação desse dever, que normalmente independia de qualquer conduta da mulher, autorizava o homem repudiá-la, de acordo com os costumes da época, que era o único regramento a que se submetia o casamento.83

A esterilidade e a incapacidade para ultimar uma gravidez eram considerados atos ilícitos, entendidos como um fato violador de uma obrigação ou de um dever preexistente, que autorizava o homem a repudiar sua mulher, por culpa dela, caso ela incidisse em uma dessas duas situações.

82 José Cretella Júnior. Curso de direito romano, cit., p. 134

83 Ver a respeito: Erbert Chamoun. Instituições de direito romano, cit., p. 163; Caren Becker de

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