Faserra
Pós-Graduação em Ergonomia
Erick Menezes Figueiredo
O exercício profissional do músico de orquestra e alguns de seus enfrentamentos ergonômicos diários
Manaus 2016
Erick Menezes Figueiredo
O exercício profissional do músico de orquestra e alguns de seus enfrentamentos ergonômicos diários
Manaus 2016
Trabalho de conclusão de Curso apresentado à Pós-Graduação em Ergonomia, Faculdade Faserra, como pré-requisito para obtenção do título de Especialista, sob a Orientação da Professora MSc Dayana Priscila Maia Mejia.
O exercício profissional do músico de orquestra e alguns de seus enfrentamentos ergonômicos diários
ERICK MENEZES FIGUEIREDO ericklopo@yahoo.com.br
DAYANA PRISCILA MAIA MEJIA Pós-graduação em Ergonomia – Faculdade Faserra
Resumo
Pouco se sabe acerca das questões que por ventura possam afligir os profissionais músicos de orquestras. Vistos em palcos, com instrumentos de aparente complexa operação, a “pomposa circunstância” não dá margem para que tais artistas possam comparar-se a, por exemplo, profissionais da indústria, estes já tão enquadrados em leis que procuram protegê-los ou mitigar possíveis danos às suas saúdes. Considerar que os músicos simplesmente fazem o que gostam, ou que trabalham por prazer, ou ainda que diariamente tocam e ouvem belas músicas e que isso de forma alguma pode ser um fator que envolva riscos ergonômicos parece ser, conforme amplas pesquisas já verificadas, de um reducionismo ingênuo, simplório. Desta forma, a busca em questão, neste trabalho, consiste em melhor compreender, através de outros artigos com a mesma temática, os problemas ergonômicos que possam por ventura acometer os músicos de orquestras.
Palavras-chave: Orquestra; Músicos; Riscos Ergonômicos.
1. Introdução
Não é de hoje que a preocupação com o ofício de músico tem sido objeto de estudo de tantos
pesquisadores da ergonomia. Como a orquestra é um corpo artístico muito antigo, que varia em
termos de número e tipos de músicos, vários estudos já foram realizados tendo como alvo esses profissionais.
O objetivo deste artigo é melhor compreender o trabalho de músicos de orquestra, principalmente no que tangem os aspectos ergonômicos enfrentados no dia-a-dia. São vários os exemplos de problemas apontados em diversas outras publicações, porém, os que serão abordados no presente trabalho são:
- A questão auditiva ao qual os músicos são expostos diariamente e seus possíveis prejuízos;
- Prática intensa de exercícios diários com o instrumento musical próprio (além dos ensaios), o que pode aumentar a chance de lesões musculoesqueléticas;
- A questão social à qual “viver de música não parece ser realmente uma profissão séria, mas um hobby” e o aspecto informal como o trabalho comumente é desenvolvido, o que pode gerar insegurança da parte do músico em realmente não possuir um trabalho fixo.
Segundo Alvarenga
1, é claro que existirá sempre uma discrepância entre o que está prescrito e o que está sendo realizado em uma situação concreta. Estas incongruências aparecerão em todos os níveis de análise, tanto entre tarefa e atividade, quanto entre organização formal e organização informal. E o trabalhar será isto, o preenchimento desta falta que há entre o prescrito e o real. E talvez não haja como prever a maneira com que esta falta será preenchida, justamente por conta da imprevisibilidade do cotidiano do trabalhador, de forma que o sujeito que trabalha deve criar ou encontrar o caminho pelo qual percorrerá entre o prescrito e o real, ou seja, o trabalho se definirá como aquilo que o sujeito terá de acrescentar ao que está prescrito a fim de poder alcançar os objetivos que lhe são dados.
2. Fundamentação teórica
Há vários conceitos que definem o que é uma orquestra, pois tal conceito vem sendo
estabelecido através da história, tendo evoluído com o tempo. O Dicionário Grove de Música
2aponta vários conceitos, que remontam desde a formação da orquestra na antiga Grécia (a
palavra
ὀρχήστρα,que significa “lugar para danças”) até os tempos modernos, havendo
mudanças significativas quanto às características desse grupo de acordo com a época, lugar,
evolução das formas de composições musicais, modernização e acréscimo de instrumentos
musicais, etc. A evolução da orquestra seguiu os períodos históricos e comumente são classificadas em: orquestra barroca, no século XVII; orquestra clássica, no século XVIII;
orquestra do século XIX e orquestra do século XX.
Os trabalhos pesquisados avaliaram, em sua maior parte, realidades de músicos que compõe uma orquestra moderna (típica do século XX), que comumente consiste num grupo musical composto de 60 a 80 músicos, todos divididos entre as famílias de cordas, madeiras, metais e percussão.
Atualmente, pode-se dizer que o músico de orquestra é um profissional com mão de obra especializada, uma vez que atua num corpo artístico específico: a orquestra. O instrumento ao qual se dedica apresenta especificidades tais que normalmente tendem a restringir sua atuação como profissional. De maneira clara e direta, pode-se afirmar que cada músico é responsável somente pela execução do seu instrumento, não sendo possível, por exemplo, que músicos violinistas toquem outros instrumentos da orquestra, mesmo de cordas, como violoncelo ou contrabaixo. O mesmo vale para instrumentistas das outras famílias como madeiras e metais.
A profissão de músico, assim como outras do meio artístico, é contemplada pela Classificação Brasileira de Ocupações (CBO). Mesmo reconhecida, a formação desse tipo de profissional, no Brasil, tem-se feito deficiente. É comum que para aprimoramento dos profissionais de orquestras seja necessária realização de cursos nos eixos Sul/Sudeste, mas também fora do país.
Os estudos de orquestras diante de aspectos ergonômicos remontam à década de 80. Costa e Abraão
3, que apontam que a partir desta década, uma especialidade médica se diferenciou no ramo da saúde por pensar, a exemplo da medicina esportiva, nas especificidades físicas das atividades artísticas, seja na dança, no teatro e na música. Os centros de atendimento terapêutico para artes performáticas tomaram impulso pela procura de artistas, entre eles músicos, por ajuda médica frente a quadros de adoecimento que os impediam de continuar plenamente suas atividades. Estudos pontuais e epidemiológicos contribuíram para aflorar problemas musculoesqueléticos e psicológicos relacionados às práticas musicais, até então negligenciadas em suas possíveis relações com as condições de trabalho e mascarados por uma cultura de dedicação sem limites a uma arte para a qual se exige nada menos que a perfeição.
3. Metodologia
A proposta do presente artigo consiste na revisão sistemática, verificando o exercício de músicos de orquestra e alguns dos enfrentamentos que estes profissionais tem no seu dia a dia quanto aos aspectos ergonômicos citados. Várias bases de dados digitais foram pesquisadas, tais como Biomedcentral, SciELO, PerMusi, Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, ScienceDirect, Tuiuti, Música Hodie, abrangendo período de 1994 a 2016.
4. Resultado e discussão
4.1 Os músicos e a audição
A saúde auditiva dos músicos sempre foi um aspecto estudado por pesquisadores, mas que de alguma forma sempre apresentou desafios em termos de haver sua adequada proteção no dia a dia de trabalho, não somente em função dos altos níveis aos quais são expostos, mas também ao ambiente acústico inadequado.
Dentre os fatores que podem influir na saúde auditiva do músico, segundo Costa
4, está a adequação da dimensão física e o tratamento acústico dos espaços de estudo e de performance, que estão diretamente relacionados ao conforto dos sujeitos e à sua saúde. Ainda segundo o autor, a preparação desses espaços pode influir diretamente em casos de perda auditiva (como o caso dos músicos percussionistas e instrumentistas de metais, todos sujeitos a volumes sonoros excessivos) e a desconforto físico, como no caso de instrumentos de grande porte (como piano, arpa, contra-baixo, tímpanos, todos instrumentos que demandam espaços planejados), adentrando aspectos da saúde ocupacional, o do estresse.
Mendes e Moratta
5levantaram revisão literária de exposição profissional à música de conjuntos artísticos como Orquestras Sinfônicas e Grupos Carnavalescos. No referido levantamento, o nível mínimo encontrado foi de 79 dB(A) e o máximo de 117 dB(A), mas o menor nível máximo encontrado foi de 95 dB(A), sendo que a intensidade de 100 dB(A) foi ultrapassada na maioria dos estudos, expondo o músico profissional a risco auditivo. Reid e Holland
6detectaram que o maior nível médio de intensidade foi de 99 dB(A), encontrado no setor de percussão, seguido de nível 97 dB(A) entre os trompetes e 96 dB(A) entre a flauta e o flautim.
Estes níveis encontrados deveriam demandar atenção regulamentadora para a profissão pelos
órgãos competentes, uma vez que a legislação brasileira considera perigosa para a audição uma
exposição de 85 dB(A) ao longo de uma jornada de oito horas de trabalho, segundo NR 15
7.
A exposição do músico parece ser de complicado equacionamento, uma vez que não é somente o ambiente mal projetado acusticamente que pode ser nocivo para o profissional. Lüders e Gonçalves
8comentam que abordar a questão de que a intensidade sonora elevada da música é o resultado do próprio trabalho do músico, é de certa forma, delicada, pois é justamente a intensidade elevada a fonte de sobrecarga auditiva que afeta sua saúde, ou seja, uma vez que o maior nível sonoro para o ouvido é produzido pelo próprio instrumento, o músico tem que se defender do som que ele próprio emite. Isso parece ser mais uma peculiaridade do ofício de ser músico, o que de certa forma diferencia-se dos trabalhadores industriários, normalmente expostos a emissão sonora de maquinários, não tendo controle absoluto de tais emissões.
4.2 Prática instrumental x adoecimento
O músico muitas vezes pode ser comparado a um atleta, que em termos de dedicação, empenha- se arduamente através de muitas horas em práticas de estudo com seu instrumento musical, assim como o atleta o faz com seu esporte. A associação de dor e mesmo de lesões em função do oficio são, segundo estudos, facilmente atribuídas.
No que concerne à música, a mesma é sempre associada com bem-estar, equilíbrio emocional e diversão (ou entretenimento). Quando se pensa em música, é difícil lembrar de doenças, dores e fatores de risco, mas correntemente, crescem as evidências que mostram que os músicos estão expostos a fatores de risco em seus trabalhos, proporcionando o aparecimento de lesões, afirmam León, Galdino e Prado
9.
Costa e Abrahão
3revelam que estudos epidemiológicos evidenciam o adoecimento expressivo dos músicos, notadamente os de cordas, e os diagnósticos que afetam ou mesmo impedem a continuidade de suas carreiras, tornando frequente o convívio com a dor. E também assinalam uma cultura de silêncio, na qual falar do desconforto pode implicar perdas econômicas e de oportunidades em um mercado restrito. De mãos dadas com o silêncio está a cultura da dedicação, a ideia de que a dor faz parte da profissão. A fusão entre o espaço privado, usado para estudo, e o espaço de trabalho, aí incluídos os ensaios e os concertos, faz emergir a necessidade de gerenciamento das exigências da tarefa e dos limites psicofisiológicos de cada músico.
A grande questão gira em torno da postura dos músicos, que geralmente subordina-se ao design
dos seus instrumentos, o que acaba sendo uma incoerência ergonômica. Já que cada instrumento
possui um design próprio, isso acaba por agregar dificuldade em seu manuseio. As posturas assumidas, muitas vezes antagônicas do ponto de vista ergonômico, deveriam ser revistas frente às patologias musculoesqueléticas que desencadeiam.
O aspecto do design do instrumento está tão associado às possíveis lesões, que dependendo do instrumento, diferentes lesões são detectadas nos músicos. É o que apontam León, Galdino e Prado
9acerca de pianistas, cuja performance envolve movimentos frequentes dos punhos, dedos e pés, havendo riscos de lesões para essas estruturas. Músicos que tocam instrumentos de cordas (violino, harpa e violão) apresentam alto risco de lesão, já que a atividade principal deles ao interagir com os instrumentos corresponde ao ato de pressionar dedos contra as cordas e a patologia associada aos mesmos é a síndrome de De Quervain e síndrome do túnel do carpo.
Os autores ainda comentam acerca da ocorrência de casos de distonia facial entre trompetistas e ao realizarem estudo com 55 músicos com idades entre 12 e 34 anos, 44% afirmaram a presença de desconforto nas costas, corroborando tais dados com outros estudos, que detectaram que mais de 39% dos participantes reportaram sintomas de doenças musculoesqueléticas.
Kaufman-Cohen e Ratzon
10aplicaram ferramenta RULA (Rapid Upper Limb Assessment) e mostraram scores significativamente maiores em músicos que tocam instrumentos de cordas comparados com músicos de sopros (madeiras e metais). A biomecânica que predispõe a desordens musculoesqueléticas é associada principalmente a membros superiores. Uma grande associação dessas desordens e observações clínicas enfatizam a necessidade de investigação que vá além desses fatores de riscos e o estudo de implementação de ações de “estratégias preventivas” para a rotina e os padrões de comportamento de músicos de orquestra. Subtil e Bonomo
11também aplicaram mesma ferramenta, tendo obtido score que variavas entre 4 a 15 para os músicos avaliados. A maioria de 62,5% apresentou risco médio para o desenvolvimento de lesões, seguido por 32,5 % com risco elevado e 5% com risco muito elevado.
Outro importante estudo de Kok, Fiocco e Nelissen
12comparou músicos com não músicos (no
caso, estudantes de medicina), onde aplicou-se questionário para os dois grupos acerca de
queixas de dores musculoesqueléticas nos últimos 12 meses. 89,2% dos músicos, comparado
com 77,2% de não músicos, afirmaram apresentarem uma ou mais queixas
musculoesqueléticas, de forma que os músicos têm, significativamente, mais queixas que não
músicos.
Segundo Frank e Mühlen
13, a prevalência geral de queixas musculoesqueléticas relativas à prática instrumental varia, nos trabalhos até hoje publicados, entre 26% e 87% da população de músicos. Os tipos de queixas envolvem, entre outros, intensidades variáveis de dor, fraqueza, rigidez, fadiga e tensão. Chama a atenção que partes específicas do corpo são mais afetadas, por dependência do instrumento tocado. São, por exemplo, locais de queixas mais intensas a coluna lombar de contrabaixistas e a mão esquerda de violinistas e violistas. Mesmo que muitos instrumentos tenham características que os tornem fontes específicas para o aparecimento de certas afecções, não existe um ranking de instrumentos que mostre a frequência absoluta de queixas.
Atualmente existem acessórios modernos, que visam melhorar o design dos instrumentos musicais encontrados na orquestra, como “descanso de ombro” para violinistas, que distribui peso do instrumento sobre os ombros, ao invés de somente um, além de manter as costas eretas.
Frank e Mühlen
13apontem que causas históricas, artísticas e estéticas contribuíram para que essa forma (do instrumento) não sofresse maiores modificações ao longo dos últimos séculos.
A adaptação do corpo humano a essas características, no entanto, é feita à custa do movimento fisiológico. Em geral, a postura em relação ao instrumento é assimétrica e não-ergonômica. Já que esses instrumentos pouco mudaram no decorrer da história, principalmente quanto à postura assumida diante do manuseio dos mesmos, tem-se observado muitos estudos que procuram resolver tais questões com acessórios, sendo que muitos deles estão por ainda ser criados (Leon, Galdino e Prado
9).
4.3 Aspectos sociais de ser músico e a informalidade
Outro fator que contribui para a dificuldade do ser músico, consiste na questão social ao qual
ele é visto perante os outros profissionais. Requião
14e Requião e Rodrigues
15afirmam que a
sociedade associa música ao lazer e ao ócio, ou seja, uma atividade não produtiva ou mesmo
não rentável, não ligada a uma atividade de trabalho. Os próprios músicos afirmam, segundo os
autores, que a sociedade não enxerga tal profissão como de sobrevivência. Coli
16, destaca que
enquanto algumas profissões gozam de grande prestígio e respeito pela sociedade, por
prestarem um serviço público e produtivo, como é o caso dos médicos, engenheiros e
advogados, o trabalho do músico é associado à ociosidade, uma vez que é comumente visto
como entretenimento. Teixeira, Kothe e Pereira
17corroboram tal afirmação, uma vez que
apontam que é rara a associação da música como atividade laboral, mas sim como atividade de
lazer. O autor avaliou um grupo de 11 músicos de cordas, onde vários fatores foram avaliados.
Um deles era a questão da “relevância social do trabalho” dos músicos. Foi o segundo item de menor pontuação, acima somente da questão “remuneração e benefícios”, considerado, no caso, o mais baixo. Isso acaba por reforçar afirmação de Requião
14, que diz que a informalidade é a forma mais comum de trabalho do músico, de forma que este acaba por realizar atividade profissional em outra área, que não a artística. Isso ocorre provavelmente – pelo que parece, segundo a afirmação do autor; com o objetivo de complementação da renda salarial do trabalhador.
De uma forma ou de outra, a questão informal se liga de maneira curiosa com a relevância social do trabalho de músicos de orquestra. As apresentações, seguidas de grande receptividade da parte do público parece promover, nos profissionais, senso de realização, a despeito das dificuldades encontradas no dia a dia. Alvarenga
1corrobora com tal entendimento, afirmando que são “os outros Outros” que fazem parte também do trabalho do músico: os expectadores.
Tal realidade, porém, parece ser algo referente à atuação dos músicos entre as orquestras brasileiras. O mesmo autor aponta relato de músico em entrevista que afirmou que no Brasil a profissão de músico não é muito valorizada, principalmente em comparação à tradição dessa profissão em países Europeus, por exemplo, onde a formação e a atuação desses profissionais é tida em alta conta para tal sociedade.
Porém, a consciência dos próprios profissionais quanto a este aspecto social difere da visão comum da sociedade, tendo Pichoneri
18detectado tal consciência, pois que ao frequentar o dia a dia da Orquestra Sinfônica do Teatro Municipal de São Paulo coletando informações por cerca de dois anos, colheu depoimentos dos profissionais sobre suas formações musicais e a inserção dos mesmos no mercado de trabalho, aos quais num deles cunhou-se o termo “artistas- trabalhadores” em alusão às suas profissões, pois estes não são somente artistas, mas trabalhadores. Mesmo tal consciência emanando das mentes artísticas, o mesmo estudo aponta a dura realidade, pois dos 115 músicos que compunham a supracitada orquestra, 40% deles possuíam contratos estáveis, contra os majoritários 60% que possuíam contratos temporários entre três ou seis meses.
A Classificação Brasileira de Ocupações (CBO) contempla uma série de profissionais da arte,
dentre eles os músicos, porém, o trabalho formal, com acesso à seguridade, é realidade de um
número muito restrito de músicos existentes no país, conforme afirmam Lüdgers e Golçalves
8,
onde cabe a conscientização diante da sociedade de que o oferecimento de prazer estético dados
pelos músicos possa ser considerado a moeda de troca para o seu justo sustento.
Teixeira, Kothe e Pereira
17considera que a relevância social do trabalho se caracteriza pela imagem e relevância da empresa perante a sociedade. Esse mesmo autor, teve como resultado de pontuação em sua pesquisa o índice de 6,78 para a “relevância social do trabalho” dos músicos, segundo os mesmos, sendo o item de terceira maior pontuação entre outros aspectos avaliados.
Diante dessas questões de significado social que o trabalho do músico tem, principalmente no que diz respeito à insegurança ou instabilidade até então atribuídas ao ofício do músico, Segnini
19aponta que há uma espécie de movimento contrário, ou seja, de formalização da profissão, sendo que restritos aos casos de músicos de orquestra. Segundo o autor, as orquestras sinfônicas, pouco a pouco e não sem conflitos, foram transformadas, por meio da ação do próprio Estado, em fundações e organizações sociais, capazes de captar recursos privados para o desenvolvimento de seus programas artísticos. Nesse processo, algumas orquestras foram fechadas e outras reestruturadas. Isso quer dizer que seus músicos foram submetidos a audições, que redundaram em demissões e novas contratações, não mais de acordo com o Estatuto dos Funcionários Públicos, conforme determina a Constituição Federal de 1988, mas na qualidade de funcionários temporários ou celetistas. Ainda segundo o autor, o trabalho (dos trabalhadores de artes e espetáculos, de forma geral) com registro em carteira, considerado formal, compreendia um total de 46% do total de trabalhadores ocupados no país em 2011. Quanto aos músicos, 4% tem acesso a esse tipo de contrato, 24% se declaram “sem carteira” e 70% “por conta própria”.
5. Conclusão
Com base em revisão literária levantada, é possível afirmar que os músicos de orquestra estão
sujeitos a tipos particulares de problemas ergonômicos, apresentando uma demanda especial
quanto ao cuidado que tal profissão requer. Conscientes ou não, os músicos estão sujeitos a
riscos significativos para suas saúdes, o que pode encurtar ou mesmo interromper súbita e
definitivamente suas carreiras artísticas. Pode-se afirmar que não há somente um aspecto que
irá determinar o adoecimento ou não dos músicos, mas uma conjugação deles, que somados,
podem acelerar o processo de adoecimento. A evolução dos estudos que vão desde as questões
físicas acerca do ambiente e suas particularidades acústicas (que podem prejudicar a audição
dos músicos), perpassando questões da saúde musculoesqueléticas dos mesmos (que pode ser
comprometida dependendo do superuso ou mesmo mal uso das estruturas osteomusculares), até a relevância social de suas atividades diante da população (que pode gerar insegurança e exposição à situações de estresse), torna todos esses itens potenciais problemas carentes de resolução.
Nesse sentido, é importante que não só mais estudos preencham lacunas ainda existentes na temática mas também profissionais diversos em atuação de natureza interdisciplinar se unam com intuito de melhorar as condições de trabalho dos músicos deparadas no presente artigo, seja na área privada às quais as instituições e as orquestras estejam ligadas (intermediadas pelo Estado), mas também e principalmente na conscientização da esfera pública, que deve responsabilizar-se e tornar-se ativa quanto a elaboração de políticas públicas que atendam as demandas dos músicos.
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