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A questão democrática na transição socialista. Palavras-Chaves: Transição Socialista; Gyorgy Lukács, István Meszáros

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Academic year: 2022

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A questão democrática na transição socialista

Caio Nunes da Cruz

Resumo

Este trabalho visa discutir o processo de transição socialista na URSS durante o período que se inicia após o término da guerra civil e segue até o XX congresso da PUCS e a a publicização dos crimes de Joseph Stalin. Utilizamos os referências teóricos e apresentamos as discussões feitas por Gyorgy Lukács no artigo “O processo de democratização” e István Meszáros em “Para além do capital”, para compreendermos as criticas que estes dois autores fazem ao processo de burocratização que se desenvolveu durante o chamado período stalinista, e como a análise desse período nos ajuda a pensar os limites da transição socialista na URSS frente a construção de uma democracia socialista.

Palavras-Chaves: Transição Socialista; Gyorgy Lukács, István Meszáros

Abstract

This paper aims to discuss the process of socialist transition in the USSR during the period that begins after the end of the civil war and goes on to the 20th Congress of PUCS and the publicizing of the crimes of Joseph Stalin. We use the theoretical references and present the discussions made by Gyorgy Lukács in the article "The process of democratization" and István Meszáros in "Beyond capital", to understand the criticisms that these two authors make to the process of bureaucratization that developed during the call the Stalinist period, and how the analysis of this period helps us to think the limits of the socialist transition in the USSR in front of the construction of a socialist democracy.

Key-Words: Transição Socialista; Gyorgy Lukács, István Meszáros

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1 Introdução

Após o XX congresso do PCUS e a revelação ao movimento comunista internacional dos crimes de Joseph Stalin, no relatório e discurso secreto de Nikita Kruschev se iniciou um grande periodo de crise dentro do movimento comunista como um todo e um período de crise maior dentro dos diversos partidos comunistas do mundo, que diante da apresentação do relatório de Kruschev, foram postos numa condição nada fácil. A produção de uma critica que desse conta de superar as duas principais características que se desenvolveram no período em que Stalin estava frente a URSS: o burocratismo e a falta de democratização da sociedade soviética.

Assim, após a morte de Stalin, a questão democrática voltou a ser objeto de análise e discussão de intelectuais, dirigentes e militantes ao redor do globo. É interessante pensar que mesmo ao desenvolvimento dessa crítica interna não houve um consenso no movimento comunista internacional, pois tanto o ato de Kruschev era visto por muitos como uma forma de traição a ideologia, quanto a defesa da tese de que submeter a figura e o governo de Stalin a crítica, atendia diretamente o interesse do ocidente imperialista, interessados em transformar a figura de Stalin num exemplo universal do horror produzido pelo socialismo.

Não é faltar com a verdade dizer que do ponto de vista ideológico houve um enfraquecimento da posição soviética na correlação de poderes na guerra fria. Agora, os inimigos da URSS, principalmente os intelectuais liberais do ocidente, passaram a desenvolver uma critica ao Stalinismo, qualificando o socialismo soviético como uma forma de regime ditatorial e totalitarista.

Se tais análises já tinham folego mesmo com o rápido crescimento da URSS no cenário político internacional no período da 2 guerra mundial, é nesse momento em que os crimes de Stalin são expostos, que essa crítica liberal retoma folego e pretende se colocar como hegemônica; as análises de intelectuais liberais como Hanna Arendt, que em seu livor “As origens do totalitarismo” (1951) trata a União Soviética como uma forma de totalitarismo, a partir de um mimetismo aná litico, a colocando junto da Itália Fascista e da Alemanha Nazista. Assim, diante de um intenso avanço da crítica liberal sobre o autoritarismo e a falta de democracia na URSS, se fez mais vital o desenvolvimento de uma crítica marxista desse período, que de conta de apreender suas particularidades, e analisar quais os limites que engessaram o desenvolvimento do socialismo e da democracia na União Soviética.

Podemos pensar que a critica propriamente marxista ao Stalinismo começa, ainda que de

forma vulgarizada, no próprio relatório de Nikita Kruschev. nele, Kruschev expõe os crimes de

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Stalin em especial os expurgos por ele cometidos e acusa o excesso da burocratização do partido bolchevique e das instituições políticas soviéticas; entretanto sua análise das causas desses fenômenos se encerra na figura de Stalin. Kruschev identifica que houve um culto a personalidade de Stalin, e que esse culto iludiu os comunistas e os afastaram do caminho da crítica. Assim, era preciso romper com o personalismo e o culto a personalidade de Stalin. O Relatório ainda que importante pela exposição de seu conteúdo, peca muito em análise, visto que é muito pouco rigoroso, do ponto de vista da análise material da realidade concreta, pois acaba por personificar a raiz de todo mal na figura do grande “pai”. Como nos diz Lukács, "insuficiente se revelou, no XX Congresso em seus descombramentos, uma outra crítica ao período staliniano: a denúncia do chamado culto a personalidade. Também neste caso, a crítica não era errada, mas só insuficiente"

(2008; p.171)

Após 1956, mesmo com as resistências citadas anteriormente, se inicia no movimento comunista internacional o chamado processo de desestalinização.

2 O Processo de desestalinização

Nesse período um grande movimento de crítica ao Stalinismo começa a surgir na Europa ocidental, em especial na Itália, pelas palavras do secretário geral do PCI, Palmiro Togliatti. A frente do maior partido comunista do ocidente, Togliatti, herdeiro e propagador intelectual do antigo secretário geral do partido, Antonio Gramsci, recupera deste ultimo, diversas formulações e conceitos de seus cadernos do carcere, e articulando diversas contribuições sobre o desenvolvimento do socialismo e de uma democracia socialista que Gramsci havia pensado, Togliatti então sintetiza e produz a sua crítica ao Stalinismo. Segundo Luckács, foi

"Palmiro Togliatti, que se recusou a ver no caráter pessoal de Stalin a causa última de uma crise profunda e tão relevante para o desenvolvimento da sociedade socialista. Ele pediu uma séria e profunda análise econômica e histórico-social de todo o período anterior, já que, sem tal análise, não seria possível captar e esclarecer, no sentido do método marxista-leninista, o papel positivo ou negativo desempenhado por Stalin nesta etapa do socialismo"

(2008. p. 107)

Assim, Togliatti pode ser pensado como o intelectual que deu inicio a um movimento de

renovação do socialismo na Europa que ficou conhecido como eurocomunismo, movimento que

para os comunistas mais ortodoxos, era uma expressão revisionista do socialismo. Entretanto,

Togliatti, e o eurocomunismo reintroduziram a questão democrática como uma questão chave ao

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desenvolvimento do socialismo, assim, tanto no caso particular da Itália, como para o resto do movimento comunista, o eurocomunismo representava um novo folego para criticar teoricamente o chamado período Stalinista e assim reparar minimamente as perdas no campo político e ideológico que o socialismo havia sofrido.

O Eurocomunismo, em especial as contribuições de Palmito Togliatti ecoaram muito na intelectualidade comunista brasileira, que nos anos 60 já encontravam dificuldades para repensar a questão democrática nesse processe de desestalinização dos partidos comunistas. A realidade Brasileira demandava dos intelectuais comunistas uma resposta a questão democrática, principalmente a partir da ditadura militar imposta em 1964 no país. O cerceamento ideológico e a intensa repressão a manifestação da sociedade civil organizada colocava a questão democrática como pauta fundamental para o partido comunista brasileiro. Indo de acordo com a declaração de março de 1958 do PCB, que adotou como diretriz política a centralidade da questão democrática na estratégia para a construção do socialismo, rompendo de vez com a tática insurrecional e valorizando a tática de frente única, o PCB na nova conjuntura também precisava ter novos intelectuais dedicados a essa questão.

Foi pela vinda das primeiras traduções de Gramsci e Togliatti e outros autores do eurocomunismo que todo o esforço de se pensar a questão democrática na revolução brasileira foi sintetizada por Carlos Nelson Coutinho em seu ensaio de 1979, “A democracia como valor universal”. No ensaio, Coutinho debate a relação entre democracia e socialismo. O artigo é dividido em duas grandes seções, uma teórica, que elege a democracia como valor universal para a estratégia da construção do socialismo, e uma segunda segunda seção do ensaio, que objetifica historicamente luta dos comunistas brasileiros por uma renovação democrática da sociedade brasileira.

No ensaio de Coutinho, é explicita a influência dos autores italianos, entretanto, não foi somente pelo eurocomunismo que Coutinho foi influenciado em suas reflexões. Junto as primeiras traduções dos autores italianos, vieram ao brasil também traduções do filosofo húngaro Gyorgy Lukács, com textos que reverberaram fortemente no pensamento dos intelectuais contemporâneos de Carlos Nelson Coutinho, em especial os comunistas Leandro Konder e José Paulo Netto.

Aqui, nos deteremos sobre uma análise crítica do Stalinismo que surgiu nos escritos de

Lukács e que partem de uma posição diferente da análise do eurocomunismo, oferecendo novos

elementos para a compreensão mais rigorosa da questão democrática no socialismo como condição

para a superação da degeneração burocrática do período Stalinista. Assim, aqui nos deteremos sobre

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essa vertente crítica que surge na Hungria com Lukács e que tem uma continuidade nos escritos de seu assistente, Istvan Meszáros.

O filosofo húngaro Gyorgy Lukács desde os anos 30, quando redige o documento político que orientaria o II congresso do Partido Comunista da Hungria, as famosas “teses de blum”, já apresentava uma reflexão política de folego sobre a questão da transição socialista e a democracia socialista. O documento na época rejeitado pelo comitê executivo da internacional comunista entretanto continua a estar presente nas reflexões do autor, que desenvolveu o conceito de ditadura democrática apresentado nas teses de blum, e que amadureceu sua reflexão ao se transformar em democracia popular e socialista. Influenciado pelo histórico de lutas conselhistas que viveu e presenciou na Hungria e na Alemanha, o autor nunca perdeu de vista o entendimento de que a democracia socialista esta diretamente relacionada com o desenvolvimento dos conselhos operários.

Essa sua visão política toma mais forma em seu ensaio de 1968 “O processo de democratização”, texto que assim como as teses de blum, só encontrou sua publicação muitos anos depois, no caso, o texto de 1968 só foi publicado em 1987. Suas ideias entretanto dialogam diretamente com o período em que o texto é produzido, como dito, o processo de desestalinização dos partidos comunistas.

Lukács, ainda que disciplinado membro do Partido Comunista, sempre submetendo seus trabalhos a decisão do partido, nunca deixou de manter uma postura crítica em sua teoria. Ainda que fosse desqualificado por muitos por se deter sobre os estudos da ética e da literatura, Lukács nunca deixou de pensar e refletir sobre a política socialista. Assim somo seu pensamento, sua obra expressa uma totalidade que mantêm um rigor teórico com a teoria marxista. Lukács, junto a Gramsci, podem ser identificados como parte daquilo que pode ser chamado de segundo momento de refundação comunista do século XX (Del Roio; 2013)

Em seu texto de 1968, Lukács abre a discussão sobre o Stalinismo tratando de método:

“as considerações que faço aqui têm como ponto de partida, na trilha de Marx, o fato de que toda formação econômica, d um ponto de vista ontológico, é algo dotado de uma legalidade necessária e, ao mesmo tempo, de um ser-precisamente-assim histórico: portanto, de acordo com seu ser social, formas superestruturais - como em nosso caso, a democracia - só podem ser constituídas do mesmo pode modo. Por isso, busco aqui tratar a democracia (ou melhor, a democratização, dado que, também nesse caso segundo uma abordagem ontológica, trata- se sobretudo d um processo e não de uma situação estática) de um ponto de vista histórico, como concreta força política ordenadora daquela particular formação econômica sobre cujo terreno ela nasce, opera, torna-se problemática e desaparece. A desistorização aqui como

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alhures, cria sempre fetiches, mas, ao contrário, obscurecem e confundem os próprios processos sociais concretos (e as leis que os regem)”

. (2008; p. 85)

Para ele, o Stalinismo representou uma vulgarização do marxismo, muito por conta de um positivismo economicista que floresceu no governo da URSS sob a direção de Stalin. Para Lukács, é necessário retornar a Marx e Lenin para podermos recuperar a filosofia da práxis com instrumento de análise e transformação da totalidade social. Para o autor, é preciso compreender as três partes que compõem a análise da realidade, sendo elas, o universal, que na sua relação com o particular, produz uma singularidade das coisas. Em nossa análise, devemos buscar compreender os elementos dessa relação que compõem a totalidade. Para o autor, a questão fundamental de sua análise é tentar compreender qual a relação entre a práxis econômica e as instituições políticas de caráter socialista, para compreender como se realiza a democratização socialista da sociedade.

Lukács, diferenciando-se dos eurocomunistas, não busca tratar da democracia enquanto um valor universal. Para ele devemos buscar o fundamento produtivo que organiza a forma política democracia. Concordando com Lenin, para o autor, a democracia grega era uma democracia de escravos. A relação social que é a base econômica da democracia grega é a apropriação do trabalho escravo. Voltando também a Marx, ressalta:

"Marx enunciou com clareza o fundamento econômico desta autodissolução: é a escravidão que forma a base destas sociedades. As lutas democráticas desenvolvem-se sempre e tão- somente no interior de uma minoria privilegiada; as grandes massas propriamente produtivas são, por princípio, excluídas de tais lutas, bem como de qualquer participação ativa na vida social."

(2008; p. 87)

Já a democracia burguesa, tem em sua base econômica a propriedade privada dos meios de produção que produzem o trabalho assalariado. A democracia burguesa entretanto se diferencia da grega pois ela se baseia no indivíduo egoísta, que reproduz seus interesses particulares no mundo, assim, "quando hoje falamos de democracia burguesa, da liberdade que nela se realiza, devemos nos basear naqueles conteúdos e formas que caracterizam especificamente o capitalismo atual." (2008;

p. 95). Para Lukács então uma nova democracia, que supere a burguesa, deve também ser a

expressão política de uma nova configuração do mundo do trabalho. Assim, a democracia socialista

deve estar de acordo com uma economia socialista, onde os trabalhadores, tendo os meios de

produção, passem a gerir autonomamente o movimento da economia. A democracia socialista deve

estar arraigada em toda a sociedade, e para isso a cultura democratizante deve ser incorporada nas

subjetividades dos indivíduos; em outras palavras, a democracia socialista deve se tornar um habito,

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um costume. Como nos diz o autor: “a tarefa da democracia socialista é penetrar realmente na vida material de todos os homens, desde a cotidianidade até as questões decisivas da sociedade, é dar expressão a sua sociabilidade enquanto produto da atividade pessoal de todos os homens” (p. 117)

Diante do entendimento de como deve se objetivar a democratização socialista, o que nos diz o autor sobre o Stalinismo? Para além do positivismo camuflado, o autor análise que o stalinismo foi eficaz no sentido tático, na urgência de se desenvolver as forças produtivas na Rússia e iniciar um processo de rápida industrialização, nisso Stalin foi vitorioso, pois desde a NEP, cumpriu o objetivo de realizar nas palavras de Lukács, uma “acumulação primitiva do socialismo”, isso se deve ao desenvolvimento não clássico da Rússia, então era crucial um desenvolvimento econômico que desse conta de realizar tal empreitada.

Assim, para Lukács houve pontos positivos nesse processo, entretanto isso custou a democratização socialista, criando um burocratismo que se apropriava do poder politico, impedindo o desenvolvimento da democracia socialista como hábito na vida material dos soviéticos. Como nos diz Del Roio: “A Diretriz indicada por Lukács para ativar a democratização socialista pressupões antes de tudo o renascimento do marxismo, o resgate do método de Marx e Lenin na construção de uma pratica social emancipadora”. (2013) Assim, para efetivar esse programa, Lukács defendia uma renovação dos quadros dos partidos, afastando aqueles ainda influenciados pelo Stalinismo. Assim, a recuperação da filosofia da práxis e o trabalho continuo do partido politico para impulsionar essa renovação, fazendo com que a classe ganhasse autonomia em relação ao estado, mas também que os sindicatos ganhassem autonomia, sendo menos corporificados, permitindo assim a reconstrução dos sovietes livres. Por fim, nesse texto, Lukács ainda prevê que é possível dar continuidade ao processo de transição ao comunismo desde que essas condições da democratização socialista estejam aliadas a uma reforma econômica que seja a base material de tipo socialista dessa nova sociedade.

Como vimos, Gyorgy Lukács em seu ensaio de 1968, “O processo de democratização” esta

de acordo com seu tempo, fazendo uma análise profunda do então problema soviético. Entretanto, a

não publicação do texto no período permitiu muitas dessas reflexões ainda que em tempos

posteriores. O que surpreende é a constante disciplina revolucionária do intelectual em mesmo

diante da censura do partido sobre seus escritos, não contrariar as determinações do partido sobre

seus trabalhos, mostrando que sua critica devia ser imanente ao movimento comunista e não se

perdeu em oportunismos que a época podia oferecer. O texto segue atualmente objeto de estudos

para se repensar de forma concreta a questão de democratização socialista e o período Stalinista na

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URSS. Lukács entretanto, abre as portas a crítica e seu assistente, também húngaro, Istvan Meszáros em sua obra “Para além do Capital” avança nas contribuições do antigo mestre e até mesmo propõe uma análise mais radical do que fora o Stalinismo.

Em seu monumental livro, Meszáros esta preocupado em desenvolver uma teoria da transição socialista para além do capital, ou seja, preocupado com não somente a superação do capitalismo, mas a superação do processo de produção do capital. Como nos diz

“Assim, a necessidade de uma teoria da transição apareceu com urgência candente, “nem mais nem menos”, como fruto da Revolução de Outubro e, consequentemente, mesclou‐ se com as determinações específicas e os interesses da sociedade soviética. A controvérsia sobre o “socialismo num só país” foi, ela mesma, desde logo, um complexo desconcertante, um assunto, em realidade, que confunde, no qual é suposto que um país subdesenvolvido e devastado, em situação de isolamento e cerco, daria, por si próprio, o grande salto à frente por toda a humanidade. Mas o pior estava por vir. Com a história do stalinismo no movimento operário internacional, esse ponto se tornou ainda mais confuso, na medida em que o “caminho soviético para o socialismo” veio a ser proclamado como modelo compulsório para toda transformação socialista possível, e acriticamente adotado como tal pelos integrantes do Comintern, inclusive pelos maiores partidos comunistas ocidentais, cujas circunstâncias socioeconômicas objetivas careciam da relativa justificativa histórica do “atraso asiático” e do cerco para advogar aquela estratégia.

Como resultado, a teoria da transição infelizmente descambou logo após sua primeira aparição, desembocando, de um lado, no beco sem saída do voluntarismo stalinista, e, de outro, nas suas várias negações abstratas.”

(MESZÁROS, 2011, p. 1068)

Para ele, o capital é composto por um tripé (capital, trabalho, Estado) . Assim, na totalidade da sociedade, tanto em sua esfera politica como econômica o sociometabolismo esta sofrendo um controle do capital, criando uma cisão artificial entre o campo politico e o econômico, submetendo o trabalho aos imperativos estruturais hierárquicos do capital. Para Meszáros então é necessário romper essa dominação do controle sociometabólico pelo capital, assim em toda totalidade do corpo social, se redirecionariam as forças antes controladas hierarquicamente pelo regime do capital. Para ele, somente se pode superar o capital e seus elementos se o movimento socialista se lança numa transição radical de toda a sociedade. Não basta uma revolução política, que negue a atual dominação do capitalismo, mas uma revolução social que desenvolva as novas instituições que substituirão o encargo do controle do capital sobre o sociometabolismo.

Diferente de Lukács, para Meszáros a União Soviética não era socialista, a revolução conseguiu

criar um estado pós-capitalista, entretanto se manteve o imperativo hierárquico do capital, assim o

desaparecimento do estado não foi possível de ser realizado, pois não ocorrera um processo de

democratização substancial do sociometabolismo, que deveria ser levado a sua autogestão pelo

trabalho comunalmente organizado. Mas isto não ocorreu, levando a uma restauração do domínio

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do capital sob a totalidade do corpo social, fazendo então com que a ofensiva socialista se mantivesse no campo negativo da defesa limiar frente ao capital. Para o autor, é preciso então uma reforma tanto politica quanto econômica junto a transição socialista, para que os trabalhadores livremente associados e auto-organizados passem a decidir democraticamente a produção e a reprodução de suas condições materiais de existência. Para Meszáros então é necessário uma crítica radical que leve a uma ofensiva socialista rumo a revolução social, que rompa com a dominação do sociometabolismo pelo capital e assim, supere positivamente a atual sociedade organizada hierarquicamente pelo domínio do capital.

3 Conclusão

A contribuição de Istvan Meszáros e Gyorgy Lukács a teoria da transição socialista nos oferece novos elementos para pensarmos a singularidade do socialismo que se desenvolveu na União Soviética. Ambos os autores aqui tratados, ainda que tenham divergências no entendimento da transição socialista, se unem quanto ao sentido e a importância de valorizar a democratização socialista para que ela se enraíze na sociedade como um todo, e que através da ampliação desse novo tipo de democracia se consiga efetivar o processo de transição socialista para o reino da liberdade.

Como reforça Gyorgy Lukács em seu ensaio: “Portanto, a realização prática da democracia

socialista pressupõe a restauração do método do marxismo. [...] Esta restauração, ao contrário, é

uma questão de vida ou morte para o movimento comunista.” (p. 187)

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REFERÊNCIAS

DEL ROIO, Marcos. Gyorgy Lukács e a democratização socialista. In: Marcos Del Roio (Org).

Gyorgy Lukács e a emancipação humana. São Paulo. Boitempo, 2013. (135-150)

LUKÁCS, Gyorg. O Processo de Democratização. In: José Paulo Netto e Carlos Nelson Coutinho (Orgs). Gyorg Lukács, socialismo e democratização – escritos políticos. 1956-1971. UFRJ, 2008 (83-206)

MESZÁROS, István. Para além do capital : rumo a uma teoria da transição. São Paulo:

Boitempo, 2011.

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