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ISSN 1677-9010 / www.aslegis.org.br

Cadernos ASLEGIS

ASSOCIAÇÃO DOS CONSULTORES LEGISLATIVOS E DE ORÇAMENTO E FISCALIZAÇÃO FINANCEIRA DA CÂMARA DOS DEPUTADOS

A HORA E A VEZ DA REFORMA TRIBUTÁRIA

Maria Emilia Miranda Pureza

Cadernos Aslegis, n.33, p. 85-102, jan/abr 2008

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Claudionor Rocha*

Consultor Legislativo da Área de Segurança Pública e Defesa Nacional

A hora e a vez da reforma tributária

Maria Emilia Miranda Pureza

Consultora de Orçamento da Câmara dos Deputados

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Na Exposição de Motivos que acompanha a PEC nº 233, de 2008, o Ministro da Fazen- da ressalta que os objetivos da proposta são:

“simplificar o sistema tributário nacional, avançar no processo de desoneração tribu- tária e eliminar distorções que prejudicam o crescimento da economia brasileira e a competitividade de nossas empresas, prin- cipalmente no que diz respeito à chamada

“guerra fiscal” entre os Estados.” Por meio deste trabalho, buscou-se analisar alguns dos aspectos mais importantes da PEC nº 233, de 2008, à luz dos objetivos que lhe foram traçados.

Reforma tributária, guerra fiscal, princípio do destino, IVA, ICMS, federalismo fiscal, harmonização tributária, benefícios fiscais.

Palavras-Chave Resumo

Among the goals of PEC nº 233 (Tax Re- form Bill), as stated by the Finance Minister in its presentation, are to “simplify the Na- tional Tax System, to proceed in the process of lowering the tax burden and with the eli- mination of the distortions that hinder the economic growth of the Brazilian economy and the competitiveness capacity of our business, specially concerning the fiscal war between states”. This paper analyses the main aspects of the bill in view of its goals.

Abstract:

Tax Reform Bill; fiscal war; fiscal federa- lism; Principle of destination; Tax harmo- nization; fiscal profits.

Keywords:

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I. Considerações Iniciais

A economia brasileira atravessa uma conjuntura particularmente propícia para que se comece a pensar mais seriamente sobre uma reformulação estru- tural do sistema tributário nacional. Os níveis de arrecadação atingem pata- mares extremamente elevados relativamente ao nível médio da renda interna, a atividade econômica atravessa uma fase de expansão puxada pelo maior di- namismo e maiores níveis de lucratividade apresentados pelas maiores em- presas brasileiras ligadas a setores como o metalúrgico, de papel e celulose, de telecomunicações e energia, bem como do setor ligado à atividade financeira.

Aliado a isso, a Receita Federal desenvolveu novas práticas de fiscalização tri- butária, baseadas, de um lado, na adoção de sistemas informatizados capazes de armazenar, sistematizar e efetuar o cruzamento de um volume gigantesco de informações e, de outro, na utilização intensiva da retenção na fonte dos tributos com maior peso arrecadatório. Também as administrações fazendárias estaduais encontram-se melhor aparelhadas, passando a dominar tecnologias que tenderão a, num futuro próximo, viabilizar a unificação de cadastro de contribuintes e o processamento online das operações de circulação de merca- dorias por meio de notas fiscais eletrônicas.

O quadro de substancial melhoria dos principais indicadores fiscais, ao mes- mo tempo em que transmite sinais positivos para as decisões de investimento, tanto no lado real quanto no financeiro, não esconde o fato de que os recordes de arrecadação estão sendo sustentados por um sistema tributário que, ao longo de inúmeras modificações isoladas e pontuais, foi perdendo sua configuração inicial, transformado-se num sistema cada vez mais descoordenado, ineficiente e injusto, no que tange à distribuição do ônus a ser suportado pelas diferentes classes de contribuintes.

É interessante observar que as principais mudanças ocorreram primor- dialmente pela via da legislação infraconstitucional, com a utilização em larga escala do instrumento das medidas provisórias. Observa-se, assim, que uma questão tão delicada e complexa como a formulação do desenho tributário de um país, vem sendo, ao longo dos anos, tratada em processo sumário de apreciação parlamentar, sem que estudos mais aprofundados sobre suas implicações políticas, jurídicas, econômicas e financeiras sejam realizados. A juridicidade e apuro técnico das novas regras tributárias não raro passaram a ser questionadas pelo contribuinte, levando a uma enxur- rada de ações judiciais, cujo desfecho demorado e tardio, agrega um novo problema ao já caótico sistema tributário brasileiro, que é o forte compo-

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nente de insegurança jurídica, contribuindo para agravar a confusa relação ente fisco e contribuinte.

As freqüentes e significativas modificações introduzidas em nosso sistema tri- butário1 nem sempre guardaram uma articulação coerente entre si, porém foram responsáveis por um espetacular crescimento da carga tributária. Esse quadro, longe de representar um processo salutar, na verdade, tem alimentado clamor ge- neralizado no sentido de que o país necessita de uma urgente reestruturação da tributação indireta. O formato e o caráter dessa reforma varia de acordo com os objetivos e interesses de cada interlocutor. Porém de uma forma geral, o discurso dominante vem realçando a necessidade de uma reforma capaz de simplificar e conferir maior racionalidade ao sistema em vigor, propiciando os investimentos produtivos, a redução do grau de informalidade da economia e a melhor distribui- ção da carga tributária entre os diversos agentes e setores econômicos.

Na visão do governo federal, esses objetivos seriam plenamente alcançados por meio de uma proposta tão boa quanto politicamente inviável, que contemple um imposto nacional sobre o valor adicionado, alcançando, assim, uma base de cálcu- lo que a Constituição em vigor consagrou à esfera estadual. Além dos entraves de ordem política, esse formato esbarra em obstáculos de ordem jurídica, pois, inega- velmente, tal iniciativa agride cláusula pétrea da norma constitucional que prevê a autonomia de cada um dos entes da federação. A solução para o impasse reside na tributação dual sobre o consumo, no qual conviveriam um IVA Federal e um Estadual, submetidos a regras de incidência harmonizadas e complementares.

De Fernando Collor a Luiz Inácio Lula da Silva, todas as propostas de re- forma tributária apresentadas pelo Poder Executivo buscam, de alguma forma, viabilizar a fórmula da tributação dual, porém, até o momento, sem lograr qual- quer sinal de êxito.

As razões que motivaram o fracasso na adoção da tributação dual são inúme- ras, porém podem ser resumidas nos seguintes aspectos:

1 No conjunto das grandes mudanças no campo tributário cumpre destacar:

a) a extinção do imposto sobre vendas a varejo sobre combustíveis da esfera municipal – em 1993;

b) a criação do Regime de Tributação Simplificado das Micro e Pequenas Empresas (SIMPLES) - em 1996;

c) a desoneração do ICMS na exportação de produtos primários e semi-elaborados e a manutenção de créditos desse imposto na aquisição de bens para o ativo permanente e nas despesas com energia elétrica pela Lei Kandir – em 1996;

d) a adoção do IPTU progressivo e com alíquotas diferenciadas em função da localização e uso do imóvel – 2000;

e) a nova sistemática de incidência do ICMS sobre combustíveis e lubrificantes e sobre o gás natural – em 2001;

f ) as profundas alterações no regime de incidência do PIS/COFINS– a partir de 2003

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a) a dificuldade de conciliar os interesses de duas instâncias de governo – a federal e as estaduais – que historicamente e, por tradição, jamais operaram em regime colaboração;

b) a perspectiva de perda de receita que alguns Estados economicamente mais fortes enfrentariam, caso fosse adotado o sistema de cobrança no destino; e c) agravamento do desequilíbrio fiscal precipitado pelos efeitos das medi- das de estabilização macroeconômica, o que forçou a implementação de ajustes importantes no âmbito das finanças federal, estadual e municipal, retirando espaço para a incursão em “aventuras tributárias”.

Outro aspecto que muito contribuiu para arrefecer o interesse do governo federal em negociar a aprovação da reforma tributária foi a introdução do re- gime de tributação não cumulativo do PIS, em 2003, e da COFINS, no ano seguinte. Ao defender a adoção de uma sistemática de tributação mais moderna e coerente com os padrões internacionais de tributação sobre o consumo, o go- verno, na verdade, encontrou uma oportunidade para elevar suas receitas.

No bojo dessa mini-reforma, o PIS passou de 0,65 para 1,65%, em janeiro de 2003 e a COFINS, de 3% para 7,6%, a partir de fevereiro de 2004; a COFINS sobre instituições financeiras subiu de 3% para 4%, a partir de setembro de 2003; o PIS e a COFINS passaram a incidir sobre as importações, a partir de maio de 2004. Vale lem- brar que nessa mesma época a base de cálculo da CSLL das empresas tributadas pelo lucro presumido foi aumentada de 12% para 32% em setembro de 2003.

Esse fato assegurou um crescimento nominal de 36% (19,6% reais) na ar- recadação do PIS e de 30% (21,7% reais) nas receitas da COFINS durante o primeiro ano de vigência dos respectivos regimes não cumulativos. E mesmo com os inúmeros pacotes de desoneração do PIS/COFINS, a participação conjunta de ambos os tributos no PIB elevou-se em cerca de 0,6 ponto percentual até o ano de 2006. Inegavelmente, a adoção da COFINS e do PIS não cumulativo foi uma conquista emblemática para o Governo Lula, pois representou a concretização de um projeto longamente acalentado pelos mandatários anteriores, tornando, en- fim, possível instituir uma espécie de IVA federal. Nesse contexto, o quadro fiscal e de acomodação das forças políticas recomendava o adiamento de uma reforma tributária mais ampla, pelo menos até que amadurecessem os experimentos imple- mentados no sistema de tributação sobre o consumo e sobre as empresas.

II. O Conteúdo da Reforma Tributária – PEC nº 233/2008

Na Exposição de Motivos que acompanha a PEC nº 233, de 2008, o Ministro da Fazenda ressalta que os objetivos da proposta são: “simplificar o sistema tributário

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nacional, avançar no processo de desoneração tributária e eliminar distorções que pre- judicam o crescimento da economia brasileira e a competitividade de nossas empresas, principalmente no que diz respeito à chamada ‘guerra fiscal’ entre os Estados.”

Observa-se, assim, que a PEC da Reforma Tributária tem objetivos cla- ramente voltados para o aprimoramento das condições de funcionamento da atividade produtiva, buscando remover disfunções que caracterizam o regime de tributação sobre o consumo. O foco que norteou a elaboração da proposta demonstra a opção pela permanência de um sistema baseado em impostos in- diretos, cujo peso maior continuará recaindo sobre os de sempre: a classe média assalariada e os setores mais pobres da sociedade.

Diante disso, a regressividade gerada pela excessiva prevalência de impostos indiretos e a má distribuição da carga tributária são problemas que não recebem tratamento específico nesta reforma tributária. Em amparo à opção do governo pode-se argumentar que as iniqüidades e injustiças do sistema tributário brasileiro não dependem de reforma constitucional para serem equacionadas. Vale lembrar que a origem destes problemas não está na Constituição que, de sua parte, con- sagrou o princípio da progresividade na tributação da renda e do patrimônio e alçou à categoria de direito fundamental a graduação dos impostos segundo a ca- pacidade econômica do contribuinte. Em vista disso, é um engano imaginar que a reforma constitucional será um remédio milagroso para nossas mazelas sociais, pois qualquer proposição ali aprovada não se efetiva sem o regulamento ordinário e, principalmente, sem a vontade política para fazê-la prosperar.

A reforma proposta busca, na verdade, solucionar problemas, que em grande parte, haviam sido identificados já na primeira proposta de reforma fiscal elabo- rada durante o Governo Collor e encaminhada ao Congresso Nacional em 1991, em que se propunha simplificar a estrutura tributária pela redução do número de tributos e pela unificação de tributos com o mesmo fato gerador e a desoneração da folha de salários, via redução da alíquota da contribuição dos empregadores, e dos investimentos e exportações, via isenção do IVA e eliminação de tributos em cascata. Desde então, e a cada nova reforma tributária elaborada pelo Poder Exe- cutivo, as alterações propostas assumem novas roupagens, ainda que os objetivos a perseguir e os problemas a equacionar sejam praticamente os mesmos.

Na seção seguinte, será efetuada uma análise da proposta à luz dos objetivos a que se propõe e de sua efetividade em alcançá-los.

A. Simplificação do Sistema e Eliminação de suas Distorções

A busca pela simplificação na esfera tributária tem sido identificada com a redução ou “enxugamento” do número de tributos e com a eliminação de

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obrigações acessórias. Sob esse aspecto, a simplificação não é necessariamente uma virtude, especialmente quando se reconhece que, pelo bem da justiça fiscal, há que identificar as especificidades do contribuinte, do setor econômico, de externalidades positivas ou negativas da atividade, dentre outros fatores, que recomendam algum tipo de tributação diferenciada. As obrigações acessórias constituem instrumental relevante para as administrações tributárias no exercí- cio das atividades arrecadadora e fiscalizadora e asseguram a obtenção de dados valiosos para a implementação de políticas tributárias mais condizentes com as características econômicas dos agentes.

Na perspectiva desta proposta, a simplificação seria alcançada, na esfera fe- deral, com a extinção de cinco tributos: COFINS, PIS, Contribuição Social So- bre o Lucro Líquido, Cide-Combustíveis e Salário Educação, e sua substituição por um único imposto incidente sobre operações com bens e prestações de ser- viços.2 Na esfera estadual, a maior simplicidade advirá com a adoção de regime harmonizado de incidência do ICMS, com alíquotas padronizadas e menor grau de autonomia legiferante de cada ente tributante.

Essas medidas representam o elemento fulcral da proposta e seria enganoso acreditar que daí adviria um regime de cobrança mais simplificado. Na verdade, o sentido da proposta reside em conferir racionalidade e maior coordenação sobre a tributação do consumo no país, estabelecendo para a União e para os Estados um regime de incidência sobre o valor agregado nacionalmente regulado. Certamente, a colocação em prática de um sistema harmonizado desse porte, além de representar um grande avanço para o funcionamento da aparato econômico que move o país, deverá demandar uma regulamentação detalhada, capaz de definir com clareza os aspectos operacionais que determinarão o espaço de convivência de cada ente tribu- tante, tanto em sua dimensão verticalizada (União x Estado), quando na horizonta- lizada (Estado produtor x Estado consumidor).

A reforma tributária dedica pouco espaço às regras de instituição do novo Imposto da União sobre Operações com Bens e Prestações de Serviços – uma espécie de IVA federal, explicitando apenas algumas regras mais gerais relativas à incidência sobre importações, a imunidade e a manutenção de créditos para o setor exportador e a incidência por “dentro”, na qual o imposto integra sua própria base de cálculo. Além disso, remete para a lei ordinária a regulamentação

2 A premissa do governo é a de que a aglutinação de tributos não reverterá em queda de arrecadação, pois tudo dependerá da calibragem correta da alíquota do IVA federal. Além disso, orçamento da seguridade não será necessariamente prejudicado com a eliminação de dois de seus principais tribu- tos, pois será assegurada uma vinculação de 38,8% do arrecadação federal para o financiamento da seguridade e de 6,7% para o seguro desemprego e abono salarial. Também haverá vinculações para suprir as despesas financiadas pelo salário educação e CIDE-Combustíveis

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do caráter não cumulativo do imposto, bem como as condições em que a adoção de alíquota zero, isenção, não incidência e imunidade implicarão crédito para compensação nas operações seguintes.

Nenhum tratamento específico é oferecido em relação aos critérios que per- mitirão harmonizar o novo imposto federal e o estadual, limitando-se a formali- zar no texto constitucional algo que já se verifica na prática – a absorção da base consumo para a esfera de competência tributária da União, hoje representada pelas contribuições do PIS, Cofins e CIDE, que juntos perfazem cerca de 73%

da arrecadação do ICMS estadual.

A mesma economia, entretanto, não se verifica em relação ao novo ICMS Estadual. O longo art. 155-A prevê importantes mudanças no regime de inci- dência do ICMS, orientadas pelo objetivo básico de unificar a legislação e pa- dronizar alíquotas. Os Estados perdem a autonomia individual atualmente des- frutada para regulamentar a cobrança do imposto, enquanto o Senado Federal assume novas e importantes competências, cabendo-lhe, por meio de Resolução aprovada pela maioria absoluta de seus membros, estabelecer as alíquotas e apro- var ou rejeitar proposta do CONFAZ contendo o respectivo enquadramento por mercadoria. Contudo, a proposta também contemporiza em sua busca pela unifomidade, cedendo espaço para alguma flexibilização.

Assim, o CONFAZ poderá reduzir ou restabelecer a alíquota aplicável a determinada mercadoria, desde que as alterações restrinjam-se aos percentuais fixados na Resolução do Senado. Além disso, lei estadual poderá aumentar ou reduzir as alíquotas de determinada mercadoria, de acordo com a especificação, limites e condições definidos em lei complementar.

A opção pelo princípio do destino nas operações interestaduais já se consa- grou nas propostas de emenda constitucional relativas ao ICMS estadual, porém a PEC 233 contempla a possibilidade de o imposto ser integralmente exigido no Estado de origem. Neste caso, a transferência dos recursos devidos Estado de destino da mercadoria ou serviço poderia ser viabilizada através de uma câmara de compensação. Em qualquer caso, ao Estado de origem fica assegurada uma parcela da arrecadação, correspondente a uma alíquota de 2%, a título de ressar- cimento pelos custos envolvidos na fiscalização.

Ao contrário de todas as suas antecedentes tratando do mesmo tema, a PEC 233 não proíbe a concessão de incentivos fiscais, nem estabelece prazos de vi- gência para os benefícios em vigor, inclusive os concedidos ao arrepio das regras constitucionais; exige apenas que os benefícios fiscais sejam uniformes em todo o território nacional. Com isso, tangencia-se um importante motivo de discór- dia nas discussões que sempre cercaram o ICMS padronizado e remete-se para o

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futuro a resolução de um impasse que tenderá a ser solucionado com o próprio processo de amadurecimento do regime de apropriação do imposto no destino.

Provavelmente, a PEC 233 encontrou, assim, a melhor forma de lidar com o tema dos benefícios concedidos sob a égide do antigo ICMS, pois a prática revelou a fragilidade das vedações constitucionais que buscaram impor limites à ação isolada das administrações fazendárias.

A questão do ressarcimento de perdas decorrentes da implantação do novo ICMS certamente será o tema central das dissensões. A proposta extingue o repasse de 10% da arrecadação do IPI aos estados exportadores de produtos industrializados, bem como suprime o dispositivo que havia alçado a mandamento constitucional a compensação da renúncia de receita decorrente da aprovação da Lei Kandir.

Em contraposição, a proposta prevê a criação de um Fundo de Equaliza- ção de Receitas - FER, cujos recursos serão distribuídos de forma decrescente como compensação pela desoneração das exportações e de forma crescente para compensar as perdas incorridas pelos Estados e DF em decorrência da adoção do novo ICMS. Esse fundo será formado por recursos equivalentes a 1,8% da arrecadação dos impostos federais (IVA-F, IPI e IR, além de IGF e impostos resi- duais, caso implementados) após deduzida a parcela vinculada ao financiamento da seguridade social, abono e seguro desemprego, educação básica e ao paga- mento de subsídios a preços ou transporte de álcool combustível, gás natural e seus derivados e derivados de petróleo, financiamento de projetos ambientais e de programas de infra-estrutura de transportes.

Os repasses aos estados exportadores somaram, em 2007, a cifra de R$ 6,5 bi- lhões, aí considerados a partilha do IPI para estados exportadores (R$ 2,6 bilhões) e os repasses autorizados por conta da Lei Kandir (R$ 3,9 bilhões). Considerando que a Lei Kandir não foi extinta, mas sim desconstitucionalizada, e considerando que os recursos destinados aos compromissos do FER deverão se situar na faixa R$

3,2 bilhões, caso se adote o pressuposto de que a reforma não redundará em queda de arrecadação dos impostos federais, é plausível supor que o volume futuro de repasses aos estados exportadores venha apresentar apenas um ligeiro crescimento em relação à situação atual, o que certamente será considerado insuficiente para atender aos reclamos que advirão dos governos estaduais.

Embora o texto da PEC atribua a lei complementar a definição de fonte e montante adicional de recursos a serem destinados ao FER (art. 5º), o regime de ressarcimento de perdas ficará aquém do esperado numa circunstância em que os estados da federação perdem autonomia na cobrança de seu principal imposto.

Contudo, algo que deve ser claramente enfocado ao longo do processo de discussão da reforma é que o mecanismo de ressarcimento de perdas não é um

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fim em si mesmo, no sentido de representar um direito absoluto e imutável.

Cada estado deverá buscar as condições de adaptação às novas regras mediante a utilização dos instrumentos de que ainda dispõem, particularmente pela prerro- gativa concedida aos governos estaduais de elevar ou reduzir a alíquota do ICMS fixada pela norma geral.

O processo de transição do regime atual para o regime proposto é um dos elementos determinantes para o sucesso de qualquer reforma tributária. Pela sua natureza, a implantação do princípio do destino favorece os estados importadores líquidos, ou seja, os estados com perfil mais consumidor, em detrimento dos estados exportadores líquidos. Essa característica se manifesta em razão de que a alíquota interestadual, cobrada pelo estado de origem da mercadoria ou serviço, é reduzida a zero Como o cerne da incidência no destino reside no fim da cobrança da alíquota interestadual do ICMS, é fundamental que a proposta contemple um mecanismo gradual para sua eliminação. A PEC 233 optou por um regime de tributação no destino que não é puro, pois a alíquota interestadual não é “zerada”, sendo assegu- rado ao estado de estado de origem uma tributação residual de 2%, apontada pelos técnicos do governo como não tão elevada que comprometa a adoção do princípio do destino e nem tão baixa que prejudique a fiscalização.

A transição do regime misto atual para o regime de incidência no destino proposto se daria, na PEC 233, por meio de um mecanismo de redução gra- dual das alíquotas interestaduais em vigor que se processaria entre o segundo e o sétimo ano subseqüentes ao da promulgação da emenda constitucional. Du- rante esse período de adaptação, os estados “perdedores”, identificados como os de economia mais pujante e diversificada, poderiam utilizar-se de alguns instrumentos que o texto constitucional lhes assegura, como por exemplo, a elevação de alíquotas por lei estadual, relativamente a mercadorias e serviços listados em lei complementar.

Diante do fato inexorável de que a reforma do ICMS se tornou o elemento essencial da reforma tributária; diante do discurso generalizado e uníssono de que o formato atual do ICMS agrega complexidade, irracionalidade e ineficiên- cia ao sistema tributário brasileiro; e diante dos avanços obtidos na informati- zação e integração, em âmbito nacional, das informações relativas às operações de circulação de mercadorias e serviços, não há como negar que o terreno está preparado para a adoção do novo ICMS, restando aos estados integrarem-se às discussões e ao governo federal ceder algum espaço em favor da federação, supe- rando impasses históricos que em grande parte decorrem da inexeqüibilidade de uma reforma tributária em que todos ganhem.

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B. Fim da Guerra Fiscal

A capacidade de os governos estaduais realizarem política tributária visando a atração de novos investimentos será grandemente prejudicada com a implantação da tributação do ICMS no estado de destino e com a exigência de uniformidade na fixação de alíquotas e na concessão de incentivos. As empresas que se instalaram em determinada região em razão de tratamento fiscal diferenciado deparar-se-ão com uma nova realidade, em que a carga tributária efetivamente incidente sobre seus produtos será aquela verificada no estado de localização de seus consumidores.

Essas regras, obviamente, não eliminam a margem de manobra que ain- da se mantém à disposição dos estados, porém restringem substancialmente o atrativo para o beneficiário e a versatilidade dos instrumentos aplicados pelas administrações fazendárias estaduais. Restaria optar pela concessão de incentivos relativos a impostos sobre o patrimônio e taxas locais, ou mesmo pela concessão subsídios com recursos orçamentários. Neste último caso, o benefício sujeita-se à aprovação anual e torna-se explicitado para o crivo do cidadão.

Nenhum outro aspecto da reforma tributária consegue atrair resistências de forma tão coesa. Independente do estágio de desenvolvimento de cada estado, todos se dedicaram abertamente à disputa por investimentos por meio da guerra tributária e se unem na defesa dos mecanismos existentes, que tenderão a perder sentido ou mesmo ser revogados com a legislação unificada. O que parece se desvendar em tempos recentes é que, nesse grande leilão promovido pelas em- presas – cujos ganhos não necessariamente se revertem em geração de empregos compatível com a renúncia de receita envolvida, o lance final continua ficando com os estados mais ricos, detentores de um diferencial que os estados menos desenvolvidos não dispõem, como a proximidade de mercados, abundância de mão de obra qualificada, infra-estrutura mais desenvolvida, etc.

Se no passado, a guerra fiscal era o instrumento preferencial para enfrentar a desigualdade na distribuição regional da atividade econômica, hoje já se percebe que a fórmula entrou em processo de esgotamento.

A Constituição de 1988 tentou estabelecer um regime tributário subordinado ao princípio federativo com harmonização tributária, mas que contivesse mecanis- mos voltados para redução da concentração atividade produtiva. Dentro desse ob- jetivo, atribuiu-se ao Senado Federal a faculdade de estabelecer alíquotas mínimas nas operações internas e ao órgão colegiado integrado por representantes de cada estado a competência para deliberar sobre a concessão e revogação de benefícios fiscais. Na prática, as intenções inscritas na Carta Magna não renderam frutos: a prerrogativa atribuída ao Senado jamais foi adotada, enquanto que as decisões no

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CONFAZ foram reiteradamente atropeladas por iniciativas individuais das admi- nistrações fazendárias, de cunho flagrantemente inconstitucional.

A rebeldia e o inconformismo dos governos estaduais em relação ao fim da guerra fiscal é enfrentada no texto da PEC 233 por meio de alguns ins- trumentos coercivos e sanções de elevado calibre. Além da possibilidade de intervenção federal e da retenção de transferências constitucionais e voluntá- rias já previstas em propostas anteriores, a PEC 233 inova ao introduzir, em relação ao estado infrator, a imposição de multas e o seqüestro de receitas.

Em relação ao governador do estado, é prevista a aplicação de multas, a sus- pensão de direitos politicos, a perda da função pública, a indisponibilidade de bens e ressarcimento ao erário, sem prejuízo da ação penal cabível. A prescrição de penalidades à figura do governador do estado, apesar de repre- sentar o instrumento mais efetivo para coibir desvios, soa como um balão de ensaio explosivo, sem qualquer chance de prosperar. De fato, o dispositivo não resistiu ao primeiro embate na disputa, conforme atestam as recentes deliberações no plenário da Comissão de Constituição e Justiça e Redação que o retirou do texto por considerá-lo inconstitucional.

Em lugar da política isolada de fomento dos governos estaduais, a reforma tri- butária defende uma ação coordenada do poder público através de organismos re- gionais já existentes. Para viabilizar uma fonte segura de recursos financeiros a esses organismos, a PEC 233 cria o Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional, a ser formado pelo equivalente a 4,8% das receita de impostos federais (IVA-F, IPI e IR, além de IGF e impostos residuais, caso implementados), após deduzidas as vincu- lações para seguridade social, seguro desemprego e abono salarial, e para cobrir as despesas outrora financiadas pelo salário educação e CIDE – Combustível.

A se manter a premissa de que a reforma é neutra do ponto de vista ar- recadatório, é fácil constatar que a criação do FNDR representará um salto no volume de recursos destinados a programas de desenvolvimento regional, passando dos atuais R$ 5,4 bilhões para R$ 8,5 bilhões, conforme se verifica no quadro a seguir.

Situação Atual Base de Cálculo

arrecadação - 2007

Partilha FCO/FNO/FNE

IR 148.014

IPI 31.876

Total 179.890 5.397

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Situação Futura Base de Cálculo

arrecadação*

Partilha FNDR

IR+CSLL 182.485

IPI 31.876

IVA - Federal 141.972

Total 356.333

( - ) Vinculações 179.235

Total 177.098 8.501

* Baseado no pressuposto de neutralidade arrecadatória da PEC 233

A PEC estabelece que as aplicações do FNDR obedecerão às diretrizes da Política Nacional de Desenvolvimento Regional, para aplicação em áreas menos desenvolvidas do país, fixando-se a destinação mínima de 95% dos recursos para aplicação nas regiões norte, nordeste e centro-oeste. Caberá à lei complementar definir as normas para aplicação e distribuição dos recursos, porém a PEC já defi- ne a priori que 60% dos recursos serão destinados a programas de financiamento ao setor produtivo das regiões norte, nordeste e centro-oeste. O restante poderá ser destinado a programas de desenvolvimento econômico e social de áreas menos desenvolvidas ou transferido a fundos de desenvolvimento dos estados e do DF.

Porém, enquanto a lei complementar não for editada, 72,9% dos recursos serão aplicados em programas de financiamento ao setor produtivo das regiões norte, nordeste e centro oeste, 16,2% serão aplicados por meio do Fundo de Desenvolvimento do Nordeste (FINOR) e 10,9%, por meio do Fundo de De- senvolvimento da Amazônia (FINAM).

Neste ponto, as regras de transição tornam-se bastante confusas, eviden- ciando choques entre si, como o que ocorre com o tratamento a ser dado aos programas de financiamento ao setor produtivo das regiões norte, nordeste e centro-oeste, cujo percentual mínimo de recursos aplicados será de 80%, re- duzindo-se gradativamente até 60% no oitavo ano da promulgação da PEC.

Segundo simulações preliminares isso indica que esses programas deverão sofrer uma redução de R$ 850 milhões entre o início e o final da transição.

Os termos da proposta fortalecem o órgão de desenvolvimento regional atri- buindo a essas entidades a responsabilidade pela fixação das diretrizes norteado- ras da política nacional de desenvolvimento regional. Além disso, os fundos ge- ridos por meio de incentivos fiscais do imposto de renda da pessoa jurídica, que

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quase chegaram a ser extintos no mandato de Fernando Henrique Cardoso, têm seus recursos turbinados para cerca de R$ 1.205 milhões no caso do FINOR e para R$ 800 milhões no caso do FINAM.

Dado o histórico desse tipo de aplicação, em que os benefícios concedidos resultaram em avanços pouco palpáveis do ponto de vista social para essas regi- ões, é de suma importância inserir na lei complementar reguladora mecanismos de controle e avaliação dos resultados de cada programa, estabelecendo regras mais rígidas para inibir o tráfico de influência e o desperdício de recursos.

C . Desoneração Tributária

Segundo o governo, a PEC 233 não se propõe a aumentar a já elevada carga tributária prevalecente no país e nem tão pouco reduzi-la. Porém, identifica-se, na proposta a clara intenção de atenuar o ônus sobre algumas bases fortemente indutoras do crescimento: a folha salarial, as exportações e os investimentos.

Em relação à desoneração sobre a folha salarial, tem-se como medida mais concreta a extinção do salário educação, a partir do segundo ano após a promul- gação da emenda. Além disso, lei de iniciativa do Poder Executivo, a ser enca- minhada no prazo de noventa dias da promulgação da emenda definirá redu- ções gradativas na contribuição previdenciária a cargo do empregador, tendo o governo antecipado a sua disposição de reduzi-la de 20% para 14%. Utilizando uma avaliação bastante conservadora, pode-se afirmar que, para cada redução de 1 ponto percentual na alíquota da contribuição do empregador sobre a folha, estima-se uma perda de R$ 3,8 bilhões na arrecadação, o que redundaria numa perda de receita não desprezível da ordem de R$ 22,8 bilhões, caso se concretize a intenção governamental. Segundo a proposta, a compensação seria feita por meio de um adicional ao IVA Federal a ser integralmente destinado à cobertura das despesas previdenciárias.

Em meio a esse grupo de medidas, inegavelmente, a grande omissão da PEC 233 reside na manutenção das contribuições patronais incidentes sobre a folha de salário destinadas às entidades de serviço social autônomo, que compõem o chamado “Sistema S” 3. Essas contribuições envolvem um volume de arrecada- ção semelhante ao do salário educação, da ordem de R$ 7 bilhões, envolvendo um ônus tributário que varia de 1% até 2,5% sobre a folha de remuneração dos

3 O Sistema S é formado pelas seguintes entidades: Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial – SENAI, o Serviço Social da Indústria – SESI, o Serviço Nacional de Aprendizagem do Comércio – SENAC, o Serviço Social do Comércio – SESC, o Serviço Brasileiro de Apoio às Pequenas e Mé- dias Empresas – SEBRAE, o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural – SENAR, o Serviço Social de Transporte – SEST, o Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte – SENAT e o Serviço Nacional de Aprendizagem do Cooperativismo - SESCOOP

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empregados dos segmentos representados. De difícil viabilidade política, a ex- tinção do Sistema S, é algo que pode ser adiado para embates futuros. Contudo, isso não invalida a necessidade de alteração da norma constitucional, no sentido de que a aplicação desses recursos atendam aos mesmos princípios de transpa- rência, economicidade e eficiência aplicáveis aos demais recursos públicos.

Quanto à desoneração dos investimentos, a PEC 233 altera as regras em vigor relativamente ao prazo para compensação do crédito do ICMS apurado na aquisição de mercadorias destinadas ao ativo permanente das empresas. Pela proposta, este prazo será reduzido de 48 para 8 meses, ao longo do período compreendido entre o segundo e o sétimo ano da promulgação da emenda, permitindo reduzir substancialmente o custo financeiro dos investimentos do setor produtivo.

O mesmo tratamento também seria aplicado para o IVA federal, porém somente após a edição da lei complementar regulamentadora do imposto.

Dessa forma, a PEC 233 é coerente com o objetivo de reforçar as caracterís- ticas do modelo desejado da tributação sobre o consumo, trazendo efetividade à desoneração dos bens de capital, propugnada há mais de dez anos pela Lei Kandir. A grande dificuldade reside justamente no fato de que, tanto lá como agora, não haverá compensações e ressarcimentos suficientes para compensar os Estados por mais este golpe em suas finanças, particularmente num contexto de forte insegurança quanto ao real impacto da reforma do ICMS.

No terreno do discurso, o governo federal acena com a perspectiva de a re- gulamentação do IVA federal incluir novas formas de desoneração sobre a cesta básica e sobre a tributação dos bens de uso e consumo das empresas. Porém, neste caso, podemos estar diante de falsas promessas, uma vez que a renúncia de receita envolvida seria extremamente elevada, a ponto de tornar pouco viável sua compensação por meio de acréscimos impositivos sobre outras bases.

III. Considerações Finais

Um dos aspectos mais interessantes que cercam a evolução do sistema tri- butário brasileiro é a constatação de que os problemas e críticas se repetem ao longo dos anos e revelam que muitas das incertezas e impasses que cercaram o tema no passado, persistem, com maior ou menor vigor, no presente.

A mais recente proposta de reforma tributária elaborada pelo governo fede- ral – a PEC 233 – concentra seu foco na resolução de três problemas fortemente interligados: a excessiva complexidade do sistema, as distorções alocativas que reduzem a competitividade e a eficiência econômicas e a elevada carga suportada pelo empresário desejoso de investir.

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A consecução dos objetivos perseguidos pela reforma tributária, obviamente não é algo trivial, porém a literatura sobre o tema nos remete à conclusão de que a solução mais acertada e mais freqüentemente encontrada na experiência internacional é a da instituição de um IVA harmonizado, que pressupõe elevada coordenação dos subsistemas tributários das unidades de governo do país. Se os termos dessa reforma tributária são ou não suficientes para a consecução dos objetivos almejados é uma questão que procuramos investigar neste trabalho.

A desejada simplificação não pode ser considerada como uma virtude ab- soluta e desejável em si mesma. Muitas propostas de simplificação revelam um desconhecimento de alguns princípios basilares que devem orientar o Poder Público na condução de sua política tributária e que permitem a aplicação de tratamento diferenciado compatível com as especificidades do contribuinte ou do seu setor de atividade.

O maior indutor de complexidade no sistema tributário brasileiro é a insta- bilidade das normas tributárias. As constantes modificações das normas relativas aos principais tributos brasileiros, que ocorrem não só no âmbito da legislação ordinária, como também, e principalmente, na alçada de portarias, regulamen- tos, resoluções e instruções normativas, os quais não raro invadem a esfera im- positiva da lei instituidora, transformaram o regular cumprimento de obrigações tributárias em um trabalho árduo, custoso e somente acessível a especialistas.

A PEC 233 obviamente não terá o condão de eliminar esses inconvenientes, devendo, ao contrário, agravá-los, particularmente, no que tange ao novo imposto federal sobre o consumo. Este imposto já nasceu complexo, em razão das inúmeras vinculações e comprometimentos de sua receita. A única vantagem é que a para- fernália de regulamentações que atualmente se aplicam ao COFINS, PIS, CIDE- Combustíveis e Salário Educação serão reunidas numa única legislação.

A maior simplificação ocorre no âmbito da legislação do novo ICMS. A re- sistência dos governadores em abrir mão de sua autonomia tributária, ainda que represente uma preocupação legítima, encontra-se identificada com um regime de cobrança do ICMS pulverizado e complexo, onde vinte e oito legislações dife- rentes fazem o horror do contribuinte bem intencionado. Entretanto, o que esta proposta de emenda constitucional está mostrando – e aí reside sua superioridade em relação ao sistema atual - é que é possível construir uma fórmula de tributa- ção capaz de resguardar a necessária harmonia, padronização e uniformidade na cobrança do ICMS estadual, sem ferir o pacto federativo. A iniciativa promove sensíveis avanços no sentido da simplificação do sistema e do combate à guerra fiscal, ao mesmo tempo em que estabelece canais transparentes de participação dos governos estaduais na formatação do novo imposto.

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A redução da carga sobre a folha e sobre os investimentos é positiva e mere- ce aplauso. Porém, isso não implica necessariamente na redução da carga global.

Apesar de o texto da PEC prever salvaguardas contra eventuais incrementos de receita causadas pela emenda constitucional, isso não invalida a tese de que será muito difícil separar os efeitos da reforma em si das “circunstâncias especialmen- te favoráveis do desempenho da economia”.

Mantendo a tradição comum a todas as propostas de reforma tributária apre- sentadas pelo Poder Executivo, a PEC 233 está sendo submetida ao crivo do Con- gresso sem qualquer simulação de seu impacto fiscal, sem a indicação de uma provável alíquota do novo tributo federal e da alíquota padrão do novo ICMS estadual. Contudo, estima-se que a alíquota do IVA Federal seja ligeiramente in- ferior à alíquota média do imposto dos estados. Além disso, o conhecimento acu- mulado com a cobrança do PIS e da COFINS não cumulativos, atenuam even- tuais preocupações quanto a uma queda abrupta de arrecadação capaz de agravar ainda mais a insegurança do período de transição para o novo regime.

Enfim, o projeto em análise não é uma proposta que atenda completamen- te a todas as expectativas, porém seu texto apresenta méritos incontestáveis na busca por maior racionalidade e harmonização, atributos de forte apelo junto ao contribuinte, e que podem se contribuir para elevar o grau da equidade fiscal do sistema tributário.

A reforma tributária sempre sofrerá resistências, qualquer que seja o seu teor. Isso ocorre porque não existe reforma tributária que propicie ganhos a curto prazo para todos. Somente no longo prazo, quando seus efeitos sobre o nível de investimentos, da produção, do emprego e da renda se fazem sentir é possível ocorrer uma situação onde não haja perdedores. A reforma tributária possível não virá de um projeto pronto e consolidado. Seu conteúdo deve ser construído e aprimorado a partir de intensa negociação envolvendo não somen- te os poderes constituídos, mas também o contribuinte, o cidadão, este eterno alijado das grandes decisões e, sob esse prisma, a PEC 233 acertou ao remeter para a instância infralegal o detalhamento de alguns itens da proposta, que em outras oportunidades tentou-se de forma vã esgotar na norma constitucional.

Na verdade, a maior flexibilidade e indefinições na delimitação do novo regi- me tributário deverá motivar uma enxurrada de críticas, mas, na prática, pode auxiliar a romper o impasse histórico de quase vinte anos que tem impedido a votação à reforma tributária.

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BIBLIOGRAFIA

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