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O que é jornalismo científico

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Academic year: 2021

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o

QUE

É

JORNALISMO CIENTÍFICO

Luiz Amaral (*)

"O escopo de todo

o

saber científico

é

vulgarizar-se." (Guerreiro Ramos)

A partir do momento em que o Homo sapiens surgiu na face da Terra, mais ou menos em sua forma atual, começa-ram as inovações, cujos desdobramentos parecem sem fim. A longa caminhada da humanidade em sua incessante busca de instrumentos e meios que tornem menos árdua e descon-fortável a sua passagem pelo planeta não tem sido feita, po-rém, sem paciência, dificuldades e sofrimento. "O homem primitivo - lembra-nos o físico Dennis Gabor - estava equipado com o mesmo tipo de cérebro que, mais tarde, foi capaz de escrever a Principia Philosophiae e a Principia Ma-temática mas este cérebro estava quase vazio. Primeiro teve de vir a maior de todas as "invenções": a linguagem. E, depois, as ferramentas, os armamentos e uma primitiva or-ganização social adequada

à

agricultura e

à

domesticação dos animais".

No fundo dessas inovações havia um certo elemento do instinto que impeliu o homem primitivo a produzir mara-vilhosos inventos, como o arco e a flecha, ou para conceber soluções sociais complicadas como o toteismo. Mais tarde, porém, a tecnologia empírica do artesão uniu-se ao conhe-cimento sistemático da natureza e ao método de raciocinar partindo dos fatos e não da fantasia, e daí surgiu a ciência que é conhecimento, no sentido amplo, ou o conjunto de co-nhecimentos humanos sobre a natureza, a sociedade e o (*) Jornalista. Escritor de Livros Didáticos de Jornalismo. Assessor da

Fundação Nacional do Indio - FUNA!.

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pensamento,

adquiridos pela descoberta das leis objetivas dos fenômenos e sua explicação.

A confluencia das tecnicas com a ciência teórica criou a ciência aplicada que, qraoativamente. se tornou sinônima de tecnologia moderna. Para o público, ciência é a ciência aplicada, a tecnologia

Se desce o ét}Jelrecimento do Homo sapiens começaram as inovaçoes, o progresso da ciencia tem conhecido um tal ritmo e uma tal amplitude, nos dias atuais, que, com a ajuda do desenvolvimento dOS meios de comunicação - pro-vocado pela propria ciência - vem trazendo

moníncações

ra-dicais ao nosso modo de viver. Hoje, só existe uma constan-te: a mudança. Vive-se mais e melhor. Gabam-se os cientis-tas, e não sem razão, de que a medicina preventiva elevou os índices de longevidade e de que os especialistas em ci-ências dos solos tornaram a terra mais fértil e capaz de ali-mentar populaçbes jamais imaginadas; de que os meios de comunicaçáo nos elevaram

à

condição de membros de uma mesma aldeia, e que podemos ver, ouvir e falar, instanta-neamente, com as mais distantes regiões do planeta; de que materiais desconhecidos há poucos anos incluiram-se

à

tes-situra de nossa vida, e o trabalho humano braçal tornou-se obsoleta fonte de energia. É verdade, a terra deixou de mar-car o limite da presença humana, e as viagens ao espaço já não exercem, no espírito do público, a mesma atração dos primeiros lançamentos espaciais. Tornamo-nos, também, de-tentores de um poder de destruição jamais imaginado.

Num alerta lançado ao povo norte-americano, há cerca de duas décadas, o jornalista Hillier Krieghbaum dizia que "a apreciação da ciência numa democracia do século XX pode envolver vida e morte. Por isso, é importante para os americanos entender que os cientistas estão tentando fazer e o que estão fazendo."

"A ciência, hoje, não afeta somente um instante do nosso dia-a-dia - completa o cientista francês Jean Rostand. Ela nos persegue, nos policia o tempo todo. Não nos transformamos em alvos involuntários toda vez que uma descarga atômica, sem pedir a nossa opinião, começa a plan-tar lindas partículas em nossos ossos? Temos a obrigação de saber o que nos tramam pelas costas."

É isso aí ... Temos a obrigação de saber o que se passa nos laboratórios, nas universidades, nos centros de pesqui-sa, nos gabinetes daqueles que decidem sobre este ou aque-le tipo de projeto. A atividade científica deixou de' interessar a um pequeno grupo de iniciados para pertencer a toda a

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comunidade. Pols somos todos seus beneficiários, cúmpli-ces ou vítimas.

Mas, como saber o que nos tramam pelas costas? Quem 1I0S vai contar?

Entre os iniciados, mesmo que não pertençam ao mesmo ramo, a comunicação se faz sem maiores problemas. As so-ciedades científicas promovem trocas de informações por meio de reuniões, com uma apresentação mais ou menos for-mal dos resultados, com discussão formal ou não-formal, e por meio de publicação de periódicos especializados, onde se inserem relatos acerca de trabalhos completados ou que se achem em fase de realização. Os trabalhos publicados nos periódicos de sociedades científicas constituem o canal básico de comunicacão formal entre os cientistas.

Além dos relatos de pesquisa, alguns periódicos científi-cos publicam recensões, isto é, discussões ern torno do que jií foi publicado a propósito de um tema especial, levando, por vezes, a conclusões gerais baseadas em toda a evidência já dada a público. Existem outras formas de comunicação. AI· gumas revistas consistem inteiramente em grande número de extratos (abstractsJ publicados em outros veículos, de modo que o material contido em dez ou cinqüenta publicações con-centra-se numa fonte única. Na verdade, a literatura científica é tão vasta no que diz respeito a trabalhos originais, recen-sões, simpósios, extratos e índices que é impossível estar in-teiramente informado sobre todas as publicações.

Portanto, para os cientistas, conhecedores dos códloos, da linguagem científica. do universo de comunicação, da ciên-cia de sua especiên-cialidade, não há maiores problemas, a não ser a disponibilidade financeira para a aquisição das publica-ções.

As dificuldades começam com a transmissão da ciência a não-cientistas, isto é, àqueles aue não tiveram educação ci-entífica elementar e que não estão informados. por exemplo, da distinção entre elementos e compostos, e de outros con-ceitos simples. O problema é importante para justificar uma pesquisa especial, e, a longo alcance, tem sérias implicações para a sociedade.

A comunicação entre o mundo científico e o público passa pela imprensa, seja em que regime for. É uma das funções so-ciais da imprensa orientar o público,

esclarecê-

l

o.

educá-Io.

Mas nem sempre foi assim. O interesse da imprensa pelas notícias científicas é relativamente recente: começou a ganhar expressão a partir da I Guerra Mundial e ampliou-se após 1945

com a repercussão da bomba atômica lançada sobre Hiroxima R. Com. Social, Fortaleza, 16 (1·2): janJdez. 1986

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e Nagasaki. Antes, eram uma raridade notícias científicas, tra-tadas com seriedade, nos jornais e revistas. No Brasil, o inte-resse por esse tipo de matéria data de muito pouco tempo, não por culpa exclusiva dos meios de comunicação, mas pelo comportamento das próprias universidades e centros de pes-quisa, e da realidade científica do país. O que havia - e, em certa medida, ainda há - era uma incompreensão entre cien-tistas e técnicos, e jornalistas.

As invenções do século XIX quase não despertaram a aten-ção dos jornais. Poucos foram os que noticiaram, por exemplo, a invenção do telégrafo por Samuel Morse, e quando foi lan-çado o cabo submarino no Atlântico, ligando Estados Unidos e Europa, alguns editores negaram-se até a acreditar no feito.

Nenhum repórter esteve presente em Kitty Havvk, no dia

17

de dezembro de 1903, quando os irmãos Wright fizeram o fa-moso vôo num aparelho mais pesado do que o ar.

Os memorialistas norte-americanos costumam lembrar que

a

notícia científica carrega, até hoje, a marca do pecado origi-nal: o sensacionalismo. Foi com grande sensacionalismo que

o

jornal Sun, de Nova lorque, publicou, em 1833, uma matéria as-sinada por Richard Adams Locke, descrevendo a vida na lua e dizendo ser ela habitada por homens-morcego.

Quarenta anos mais tarde, em 1869, o Hera/d, também de Nova lorque, dava um golpe publicitário, em nome da ciência. enviando Henry M. Stanley

à

procura do explorador David Li-vingstone, dado por desaparecido nas selvas africanas. Aliás.

Stanley

justificou o investimento com algumas excelentes re-portagens.

A observação feita sobre o pecado original da notícia ci-entífica infelizmente continua atual. A imprensa nunca deixou de explorar a charlatanice e, volta e meia, lemos, ouvimos e ve-mos em jornais, revistas, rádio e TV reportagens sobre curas milagrosas e descobertas fantásticas. A medicina é o tema pre-ferido por ser o que atinge mais diretamente a população. O câncer já foi "curado" milhares de vezes.

O panorama histórico brasileiro não é mais consolador. A título de curiosidade, vale a pena registrar o aparecimento, no início do século XIX, de duas publicações de inspiração positi

-vista dedicadas, em parte,

à

ciência: os Anais F/uminenses de

Ciências, Artes

e

Literatura, em 1822, e o Jorna/ Científico.

Econômico e Literário, de 1826, dirigidos por José Vitorino dos

Santos e Souza.

Dos Anais, foi publicado apenas um número, com um

"Plano de Obra" que, segundo Varnhagen, foi escrito por José Bonifácio de Andrada e Silva, uma nota sobre economia

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tíca, um artigo de 28 páginas intitulado "O Banco do Brasil em

1821", uma "Nota sobre a incorporação de Montevidéu e

Pro-víncias Cisplatinas ao Reino Unido de Portugal, Brasil e

Algar-ves" e outra sobre "A Igreja no Brasil".

Quatro anos depois do aparecimento dos Anais, surge o

Jornal Científico, Econômico

e

Literário; ou Coleção de várias

Peças, Memórias, Relações, Viagens, Poesia

e

Anedotas

-este é o título completo, que inclui, ainda, a seguinte

expli-cação: "Misto de instrução e recreio, acomodado a todo o

gê-nero de Leitores. Por dois amadores das Ciências e das Artes".

Ao lado dos dizeres citados, lê-se, ainda: "Ciências e Artes,

Estudo e Aplicação, 1826".

O Jornal Científico resistiu a três edições. Na primeira

delas, datada de 22 de maio de 1826, há um "Discurso

Prelimi-nar", assinado pelos "dois amadores das Ciências e das

Ar-tes", e mais as seguintes matérias:

- Teoria do Universo, ou da Causa Primitiva do

Movi-mento e de seus principais efeitos;

- Ensaios sobre a Origem dos Corpos organizados e

inor-ganizados;

- Sobre o Comércio interior, Canais, Estradas, Pontes e

Calçadas;

- Inventas modernos;

- Agricultura e economia rural;

- Química agrícola; e

- Memória dirigida

à

extinta Assembléia Geral e

Consti-tituinte do Império do Brasil, por um dos Redatores

deste Jornal (Cordeiro), a qual foi remetida

à

Comissão

de Agricultura.

No segundo número, há um artigo sobre a liberdade de

imprensa e outro "Sobre o leite nutritivo da árvore-vaca".

Finalmente; o terceiro e último número começa com a

ex-posição das dificuldades encontradas para a publicação, diante

do pequeno número de subscrições obtidas; há um artigo

inti-tu lado "Destilação por meio do vapor" e um outro sobre a

fal-eíficação de letras do Banco do Brasil.

(Remetemos os interessados ao Tomo IV da Contribuição

à

História da Imprensa Brasileira, do professor Hélio Vianna).

Essas manifestações científicas a que nos referimos

fo-ram seguidas de publicações esporádicas, muito escassas, o

que confirma o desinteresse da imprensa brasileira pela

ci-ência, desde 1808, data da instalação da Imprensa Régia, até

os nossos dias. Embora, nos últimos anos, tenha havido

al-guma mudança de espírito, ainda existe muita coisa por fazer.

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Ressalte-se, por uma questão de justiça, o esforço reali-zado pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, ajudada pelo CNPq, FINEP e a CAPES, para manter em circula-ção as revistas Ciência e Cultura (desde 1948) e Ctêncie Hoje (Iançada há não muito tempo). Outra publicação que merece ser citada é Medicina e Família, da Abril Cultural.

Vejamos as resistências mais notórias

à

divulgação cien-tífica:

- Desinteresse dos jornais - A ciência continua sendo

um tema secundário para os meios de comunicação, diante do fraco retorno que proporciona, em termos de audiência e pu-blicidade. A maior preocupação da imprensa nos países capi-talistas é, sem dúvida, o deve e o haver, a disponibilidade de caixa no fim do mês, o rendimento do capital empregado. E o que rende é a política, o fato policial, o futebol. A ciência só entra no rol dos assuntos quentes quando se trata realmente de um acontecimento excepcional, como o lançamento do Spu-tinik, a ida do homem

à

lua e fatos do gênero. A ciência não faz parte do noticiário normal, ou somente aparece com muita timidez. Temos todos uma parte de responsabilidade nisso, e cabe-nos lutar por mudanças. Compete, sobretudo, à univer-sidade, que não é mais, hoje, um instrumento cultural isolado,

mas uma entidade que se identifica com os problemas que se manifestam ao seu lado.

- Retraimento das fontes de informação - A secunda

grande resistência refere-se à dificuldade de acesso às fontes de informação, dificuldade essa que, aliás, não se restringe, no Brasil, às fontes científicas, mas a toda e qualquer fonte de informação.

De um modo geral, os que estão no poder se sentem desobrigados de prestar satisfacão dos seus atos. Eles pare-cem pairar acima da opinião pública, têm um ar de desprezo pelos jornalistas - que no entanto sabem cortejar quando têm algo do seu interesse particular a publicar - e dirigem os órgãos e instituições como coisa sua. Fingem sempre estar

ocupados, atendem à imprensa de pé, nos corredores, à porta dos elevadores, entrando em seus lustrosos automóveis. Pro-tegem-se do público com um simples "nada a declarar" ou com as suas assessorias de comunicação social, cujas funções e s-tão hoje muito deturpadas. Criadas para facilitar a comuni

-cação com o público, normalmente por intermédio da impren-sa, passaram muitas vezes a constituir um anteparo, uma bar-reira, para os repórteres em sua luta pela notícia.

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Por motivos diferentes, o homem de ciência tradicional-mente tem se distanciado, preferindo a clausura e o silêncio de sua torre de marfim ao contato e ao diálogo. Talvez por or-gulho do seu saber ou por se sentir um incompreendido pela sociedade a que pertence. Ou por simples necessidade de afas-tar-se para, em solitário, melhor refletir, concatenar as idéias.

e organizar o raciocínio. Só muito recentemente é que ele co-meçou a sair de sua carapaça protetora para um tímido diálo-go com as moças e rapazes da imprensa, descobrindo a tem-po, felizmente, que o jornal é um instrumento que a ciência deve aprender a usar - e que a ciência é um campo que o jornal precisa aprender a explorar.

Além desses fatores, há outros que dificultam o acesso às fontes de informação científicas: são as questões envolven-do segreenvolven-do militar, segurança nacional - cuja elasticidade e abranqência todos conhecemos - e propriedade industrial. Aí «starnos diante de uma realidade difícil de enfrentar, sobretudo num país em que não estão perfeitamente delimitados e. asse-gurados os direitos e deveres dos jornalistas.

No entanto, existe hoje como que um consenso quanto aos benefícios de uma união - mesmo com algumas rusgas - entre os meios científicos e tecnológicos, e os veículos de comunicação de massa. A divulgação e o livre debate dos fa-tos científicos podem tornar mais proveitosas as conquistas da ciência e da tecnologia por parte da sociedade, melhorar a performance dos projetos e ações de pesquisa perante o público e fazer, por exemplo, com que a comunidade partici-pe conscientemente dos programas de saúde pública, das campanhas preventivas e dos cuidados fundamentais de hi-giene.

- Desconfiança do cientista em relação ao jornalista

-Outra notória resistência é a desconfiança do cientista em re-lação a todo os meios de comunicação social. Os repórteres são acusados de fazer "coberturas" inadequadas e, em alguns casos, falsificar os relatos, as entrevistas. Muitos acham que eles freqüentemente levantam falsas expectativas no público com noticias de "curas", quando tal afirmação é ainda muito prematura.

R. Com. Social, Fortaleza, 16 (1-2): janJdez. 1986

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Outras vezes, acham os cientistas que suas declarações foram deturpadas, truncadas, e que o repórter exagerou, con-fundiu e carregou nas tintas para aumentar o apelo público. Certa vez, fizeram até um teste de "exatidão" com a impren-sa. Diversos cientistas redigiram um press re/ease sobre a

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descoberta de fósseis no período de três décadas. Mais tarde, o paleontologista George G. Simpson, um dos redatores

res-ponsáveis, fez um estudo de aproximadamente 100 reportagens publicadas sobre o assunto, baseadas no texto original. O re-sultado foi desanimador: o índice de exatidão e de fidelidade foi extremamente baixo.

Mas o panorama no relacionamento entre cientistas e jornalistas tem melhorado bastante nos últimos anos. Cada um começa a compreender melhor o outro, e os dois a compre-enderem a importância do público entender as idéias e os problemas atuais da ciência.

"O

repórter e o cientista têm uma coisa em comum ressaltam dois estudiosos do jornalismo científico, os norte-americanos Campbell e Wolseley - ambos buscam a ver da-de. Ambos estão profundamente preocupados com a exata e honesta interpretação das realidades com que se deparam."

No entanto, há alguns pontos que os diferenciam. O re

-pórter tem um prazo de poucos dias, se não de poucos

minu-tos, para concluir a sua matéria. O cientista pode devotar

toda uma vida a um limitado campo de pesquisa e nunca

completar a sua tarefa.

O repórter é um generalista; o cientista, um especialista. O repórter deve saber um pouco sobre muitos tópicos, o ci-entista deve saber muito sobre um único assunto.

Compreendendo essas diferenças, o cientista pode aju-dar bastante o jornalista a atingir o seu objetivo básico, que é o de ajudar o público a entender a ciência, contando o fato e

interpretando-o.

A linguagem em que

é

tratada a ciência - Se o veículo

de comunicação social permite a difusão potencial das

men-sagens a todos os indivíduos da sociedade, mas utiliza uma

linguagem de difícil compreensão, a difusão real

é

reduzida.

O público retrai-se e dá preferência a outros canais menos ln-telectualizados. Todo o processo de elaboração e transmissão

de mensagens pelo comunicador deve refletir as experiências

culturais (sobretudo as experiências de fala) do público re -ceptor. O comunicador (escritor, jornalista, cineasta, produtor

de rádio e TV) tem a obrigação de estar sintonizado com a 'linquaqern falada pelas pessoas a quem ele se dirige. Na

verdade, a questão do crescimento da audiência de um canal

de comunicação de massas reside na codificação das

mensa-gens, ou melhor, na linguagem utilizada para transmitir as in-formações.

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"Aliás, a falta de sintonização entre o comunicador e o receptor justifica - na opinião do professor José Marques de Meio - o problema da inalterância das tiragens dos jornais brasileiros. Se mudaram no aspecto morfológico, utilizando a imagem fotográfica e transformando a diagramação, e se mu-daram a estrutura do texto, procurando motivar os leitores, os jornais do país conservaram a linguagem. A linguagem de elite. Que reflete as experiências da fala dos grupos superiores da cultura brasileira. E torna-se por isso mesmo, de compreensão inacessível ao cidadão-médio, ao cidadão que não ultrapassou sequer o curso primário."

Nos Estados Unidos e em outros países desenvolvidos, a linguagem é objeto de cuidados especiais nos meios de co-municação. Os jornais diários e as agências informativas nor-te-americanas limitam a redação das notícias, reportagens, edi-toriais, ao idioma-básico da população, ao universo vocabular do leitor-médio. Fora dessas listas mínimas de palavras, ne-nhuma outra se emprega, sob pena de dificultar a legibilidade, de causar transtornos aos leitores na assimilação daqueles conteúdos em que estão especialmente interessados.

Não há dúvida de que esse cuidado, essa atenção, refle-tem a natureza das organizações jornalísticas nesses países, onde o jornal é um produto de consumo de massas e, como tal, deve ser produzido, satisfazendo a todos os anseios das massas de leitores ..

No Brasil, onde o leitor-médio tem um índice de alfabeti-zação inferior e, em conseqüência, merece um texto mais sim-ples para uma leitura mais proveitosa e imediata, as empre-sas jornalísticas se descuram geralmente desse aspecto do produto e não costumam levar as suas preocupações além dos títulos e manchetes. "De um modo geral, não pesquisam não planejam e - anota ainda José Marques de Meio - impro-visam a partir de visões (de elite) dos seus dirigentes e pro-prietários, sem dar muita importância às tendências de con-sumo de massas."

No caso do jornalismo científico, a questão da linguagem

é

agravada pelos próprios jargões utilizados pelos

informan-tes e pelas fontes escritas às quais o jornalista tem de re-correr a cada passo para redigir a sua notícia ou o seu co-mentário.

Por isso é que o jornalista científico tem de ser, ao mesmo tempo, um iniciado na linguagem científica, um de-codificador, um tradutor capaz de tornar compreensível para o profano o que lhe foi contado numa linguagem hermética e, quase sempre, eivada de termos estrangeiros. Ele é o

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manizador do jargão peculiar a cada um dos ramos da ciência e da tecnologia, vulgarizando e popularizando o saber cien-tífico.

A interpretação é realmente muito importante no caso, diante da pouca ou nenhuma intimidade do leitor médio com a ciência, embora não seja uma exigência específica do fato científico. Depois de longos anos de obediência aos princípios da pureza da notícia, ditados pela imprensa norte-americana, segundo os quais a notícia tinha que ser "pura e im pes-soal", e na qual a personalidade do redator não devia se manifestar, o jornalismo está realizando uma volta às suas raízes e se tornando novamente informativo e interpretativo ao mesmo tempo.

"O leitor de hoje - a opinião é do jornalista Alberto Dines não quer apenas saber o que acontece à sua volta, mas assegurar-se de sua situação dentro dos acontecimentos. Isso só se consegue com o engrandecimento da informação a tal ponto que ela contenha os seguintes elementos: a dimensão comparada, a remissão ao passado, a interligação com outros fatos, a incorporação do fato a uma tendência e a sua pro-jeção para o futuro."

Um comentário que cai como uma luva no jornalismo ci-entífico. Mas, qual é o perfil do jornalista científico, afinal de contas o sujeito de todo o processo que tentamos analisar? Para decifrar, interpretar e contar o que está acontecendo no mundo científico, o jornalista precisa evidentemente ter uma razoável base científica. "Não que se tenha de conhecer as razões últimas de cada problema - repetimos aqui o que dissemos no livro Técnica de Jornal e Periódico - mas que tenha uma noção exata dos princípios gerais que regem os fenômenos científicos e que esteja sempre bem informado a respeito de quanto se relacione com o progresso científico e tecnológico.

Mesmo que tenha passado muitos anos a se preparar, o jornalista precisa compreender o fato de que a comunicação,

e não a ciência é o seu ofício.

Como qualquer outro jornalista, o redator de ciência deve ter um grande respeito pela exatidão, possuir talento para apreciar os fatos, ter uma extraordinária curiosidade e não confiar nunca "de olhos fechados" procurando confirmar tudo

aquilo que ouve antes de transmitir a seus leitores.

The Christian Science Monitor, exige duas condições para

que uma matéria seja publicada:

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"- Que ela mostre

como

a

pesquisa

está ajudando a

su-perar falhas ou limitações humanas; e

- Que seja algo que possa interessar a qualquer leitor bem informado.

Aos repórteres em suas entrevistas com cientistas, Campo bell e Wolseley dão os seguintes conselhos:

- Respeitem a exatidão como nunca respeitaram;

- Informem-se, antes, sobre o assunto a abordar, mas não se dêem ares de experts durante a entrevista;

- Façam muitas perguntas, mas que sejam pertinentes e inteligentes. Se não for possível, perguntem de qualquer maneira. Vocês correrão menos riscos de errar se pergunta-rem muito do que se perguntarem pouco.

- Confiram sempre suas informações; e

- Procurem notícias científicas com cientistas, e notí-cias políticas com políticos.

Após essas modestas considerações, eu Ihes diria que o jornalismo científico

é

uma das especializações mais difíceis, e talvez, a que exija do profissional maior dose de precisão, seriedade e responsabilidade. Em contrapartida,

é

uma aven-tura maravilhosa pelas promessas de revelações que oferece ao longo do caminho e pelas possibilidades de prestação de serviço

à

comunidade a que pertencemos.

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