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Imigração qualificada : o setor do petróleo no Brasil

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Academic year: 2021

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MARIA BERNADETE FIN FERREIRA CAMPOS

IMIGRAÇÃO QUALIFICADA: O SETOR DO PETRÓLEO NO BRASIL

CAMPINAS 2017

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Ficha catalográfica

Universidade Estadual de Campinas

Biblioteca do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas Cecília Maria Jorge Nicolau - CRB 8/3387

Fin, Maria Bernadete,

F49i FinImigração qualificada : o setor do petróleo no Brasil / Maria Bernadete Fin Ferreira Campos. – Campinas, SP : [s.n.], 2017.

FinOrientador: Rosana Aparecida Baeninger.

FinDissertação (mestrado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas.

Fin1. Migração. 2. Indústria petrolífera. 3. Precarização. 4. Terceirização. 5. Nacionalidade. 6. Trabalhadores estrangeiros. I. Baeninger, Rosana

Aparecida,1963-. II. Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Filosofia e Ciências Humanas. III. Título.

Informações para Biblioteca Digital

Título em outro idioma: Highly skilled immigration : the Brazilian oil and gas industry Palavras-chave em inglês: Migration Oil industry Precariousness Outsourcing Nacionality Foreign workers

Área de concentração: Sociologia Titulação: Mestra em Sociologia Banca examinadora:

Rosana Aparecida Baeninger [Orientador] Bárbara Geraldo de Castro

Júlia Bertino Moreira

Data de defesa: 28-03-2017

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NIVERSIDADE

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STADUAL DE

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AMPINAS

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NSTITUTO DE

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ILOSOFIA E

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UMANAS

A Comissão Julgadora dos trabalhos de Defesa de Dissertação de Mestrado, composta pelos Professores Doutores a seguir descritos, em sessão pública realizada em 28 de março de 2017, considerou a candidata Maria Bernadete Fin Ferreira Campos aprovada.

Prof.ª Dr.ª Rosana Baeninger _______________________________________

Prof.ª Dr.ª Bárbara Geraldo de Castro _______________________________________

Prof.ª Dr.ª Júlia Bertino Moreira _______________________________________

A Ata de Defesa, assinada pelos membros da Comissão Examinadora, consta no processo da vida acadêmica da aluna.

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Dedico esta dissertação a todas as trabalhadoras e trabalhadores, migrantes, que se deparam todos os dias com situações vivenciadas, seja por nós ou pelo outro, tendo como causa a flexibilização e precarização no mundo do trabalho.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a todas as pessoas que contribuíram para que eu pudesse realizar a pesquisa de Mestrado que ora concluo. Nesse caminho que percorri da pós-graduação, encontrei barreiras

que precisaram ser suplantadas, mas também encontrei diversas pontes que me ajudaram na travessia.

Um agradecimento especial vai para a Dona Nega (Maria Idalina Tiritilli Fin), in memorian. A Vó Nega, como a chamávamos sempre nos incentivou a leitura, fundamental para a tomada

de consciência. E dizia que o senso crítico é importante ferramenta de conscientização e por isso não devemos ir aceitando tudo sem um bom debate. Apesar de ter sido obrigada a deixar

a escola ainda criança, para trabalhar, não abria mão de uma boa leitura e um bom debate. Obrigada sempre!!!

Tem mais um agradecimento especial, este vai para a Funnyhouse – Nivaldo, Natália, Francisco – local onde pude superar as barreiras e transpor as pontes em segurança.

Agradeço ainda à minha orientadora Profª Drª Rosana Baeninger, aos colegas de curso e às amizades que se construíram nesse período, além das trabalhadoras e trabalhadores do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Unicamp, em especial a Marli sempre tão

atenciosa.

A pesquisa de mestrado contou com o financiamento da CAPES e integra as pesquisas realizadas no âmbito do projeto temático “Observatório das Migrações em São Paulo” (NEPO/UNICAMP-FAPESP/CNPq), coordenado pela Prof.ª Dr.ª Rosana Baeninger para as

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“Primeiro, que o trabalho é externo (äusserlich) ao trabalhador, isto é, não pertence ao seu ser, que ele não se afirma, portanto, em seu trabalho, mas nega-se nele, que não se sente bem, mas infeliz, que não desenvolve nenhuma energia física e espiritual livre, mas mortifica sua physis e arruína o seu espírito. O trabalhador só se sente, por conseguinte e em primeiro lugar, junto a si [quando] fora do trabalho e fora de si [quando] no trabalho. Está em casa quando não trabalha e, quando trabalha, não está em casa. O seu trabalho não é portanto voluntário, mas forçado, trabalho obrigatório. O trabalho não é, por isso, a satisfação de uma carência, mas somente um meio para satisfazer necessidades fora dele. Sua estranheza (Fremdheit) evidencia-se aqui [de forma] tão pura que, tão logo inexista coerção física ou outra qualquer, foge-se do trabalho como de uma peste. O trabalho externo, o trabalho no qual o homem se exterioriza, é um trabalho de auto-sacrifício, de mortificação. Finalmente a externalidade (Äusserlichkeit) do trabalho aparece para o trabalhador como se [o trabalho] não fosse seu próprio, mas de um outro, como se [o trabalho] não lhe pertencesse, como se ele no trabalho não pertencesse a si mesmo, mas a um outro. Assim como na religião a auto-atividade da fantasia humana, do cérebro e do coração humanos, atua independentemente do

indivíduo e sobre ele, como uma atividade estranha, divina ou diabólica, assim também a atividade do trabalhador não é sua auto-atividade. Ela pertence a outro, é a perda de si mesmo.” - Karl Marx “Como o trabalho (definido para imigrantes) é a própria justificativa do imigrante, essa justificativa, ou seja, em última instância, o próprio imigrante, desaparece no momento em que desaparece o trabalho que os cria a ambos.” - Abdelmalek Sayad

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RESUMO

O objetivo principal da presente pesquisa consistiu em construir um panorama da força de trabalho qualificada imigrante do setor de petróleo e gás no Brasil. Para isso, foram utilizados os dados disponibilizados pelos órgãos do governo brasileiro que são responsáveis pelas autorizações de trabalho estrangeiro no país. Essa é uma imigração documentada e vem crescendo de maneira expressiva a partir do final do século XX, quando há uma mudança significativa no processo de produção capitalista e, consequentemente, no mundo do trabalho, marcado pela mundialização, transnacionalização e financeirização dos capitais. Ao contrário da imigração de baixa qualificação, composta em grande parte por indocumentados, a imigração qualificada foi pouco investigada como componente da imigração internacional no Brasil nessas últimas décadas. A questão principal consistiu em determinar se a força de trabalho qualificada imigrante que atua no setor petrolífero brasileiro também está sujeita à intensificação da atividade laboral e da perda de proteção social, as quais são consequências da flexibilização e precarização do trabalho estabelecida pelo novo processo de reestruturação produtiva em escala global que deu uma nova configuração ao mundo do trabalho. Nesse contexto, o trabalho terceirizado também aparece como sendo parte dessa flexibilização e precarização. O estudo está fundamentado na formação de um mercado de trabalho mundial, baseado no modo de produção capitalista que se constitui de maneira desigual, hierarquizando e estigmatizando países e regiões, suas economias e culturas possibilitando a mobilidade dos trabalhadores; de tal forma que a mobilidade espacial da população acompanha a mobilidade do capital. Tal mobilidade provê um fluxo regulamentado de imigrantes trabalhadores de alta qualificação em detrimento de um fluxo informal de imigrantes trabalhadores, que alimenta um mercado inferior de trabalho. Isso constitui um ponto de partida para uma análise dos impactos que tal fator representa nas condições de trabalho, nos meios de subsistência e nas carreiras dos trabalhadores. As visitas de campo, com as entrevistas realizadas, além dos workshops, seminários, encontros e debates sobre o assunto, ajudaram a responder algumas questões, tais como: quais as regiões ou países que atualmente são produtores de força de trabalho qualificada imigrante para o setor e que têm como destino o Brasil; as nacionalidades destes trabalhadores e a hierarquização a partir dessas nacionalidades que se apresentam em suas ocupações dentro do universo laboral do setor. As empresas às quais a pesquisa de campo teve acesso, excetuado uma delas, eram todas transnacionais, incluindo-se aí as empresas que dão suporte legal ou recrutam trabalhadores para o setor. A hierarquização das nacionalidades que se revelou nas ocupações dos trabalhadores qualificados imigrantes se desdobrou também em outra hierarquia, essa relativa ao gênero. A organização do trabalho nas plataformas de petróleo se dá de tal forma que “afasta” as mulheres de muitas oportunidades de desenvolvimento de suas carreiras no setor. A pesquisa revelou ainda que os trabalhadores qualificados imigrantes tendem a ser identificados como expatriados, mesmo que não estejam nessa condição segundo a definição do termo dada pelo mundo corporativo. Assim, o termo expatriado se apresentou como forma de distinção desses trabalhadores qualificados imigrantes.

Palavras-chave: imigração qualificada, indústria petrolífera, petróleo e gás, trabalho, imigração, trabalho qualificado, divisão internacional e sexual do trabalho, tics, precarização, terceirização, nacionalidade, expatriado

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ABSTRACT

The main purpose of this research is to build an overview of the highly skilled immigrant workforce in the Brazilian oil and gas sector. To achieve this, datasets made available by offices of the Brazilian government that are responsible for issuing the alien work authorizations were used. This documented immigration has grown largely since the end of the 20th century, when

there was a significant change in capitalist production process and consequently in the workforce world, characterized by the globalization, transnationalization, and financerization of capital. Differently from the undocumented immigration, the documented immigration in the last decades has deserved little investigation as a part of the international immigration in Brazil. The main question consists in determining if the highly skilled immigrant workforce in the Brazilian oil and gas sector is also subjected to an increase in labor activity and loss of social protection. These are consequences of flexibilization and precarization of work established by the new process of global scale productive restructuration that has given a new configuration to the world of work. In this context, outsourced workforce also shows up as being a part of this flexibilization and precarization. The study is based on the formation of a worldwide work market, according to the capitalist production method that is constituted in an unequal manner, ranking and stigmatizing countries and regions, its economies and cultures, enabling the mobility of workers. In this way, the spatial mobility of the population accompanies the mobility of capital. Such mobility supplies a flux of regulated highly skilled immigrant workers over an informal flux of immigrant workers that feeds an inferior work market. This constitutes the starting point for the analysis of the impacts in the working conditions, means of subsistence and careers of the workers. Interviews made in the fieldwork, workshops, seminars, meetings and debates about the subject helped answer some questions like: which regions or countries that are sources of highly skilled immigrant workforce to the oil and gas sector and that have Brazil as a destination country; the nationalities of these workers; as well the hierarchy in the jobs occupied by each nationality. The companies interviewed in the research, except one, were all transnational, including those companies that give legal support or recruit workers for the sector. The hierarchy in the nationalities unfolds another kind of hierarchy, relative to gender. The arrangement of jobs in the oil rigs is made up in a way that “keeps out” women from many opportunities in the development of their careers in the sector. The research also revealed that highly skilled immigrants tend to be identified as expatriates, even though they are not in this condition according to the definition given by the corporate world. Therefore, the word expatriate also presents itself as a way of differentiation of these highly skilled immigrants.

Keywords: documented immigration, oil and gas industry, oil and gas, work, immigration, highly skilled work, international and sexual division of work, information and communication technologies, precarious, outsourced workforce, nationality, expatriate

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Segmentos primários do mercado de equipamentos e serviços para E&P ... 68

Figura 2 – Cadeia de Valor da Indústria de Petróleo e Gás ... 69

Figura 3 – Principais Elos da Cadeia Produtiva de P&G ... 70

Figura 4 – Investimentos do Plano de Negócios e Gestão 2014-2018 ... 72

Figura 5 – Investimentos do Plano de Negócios e Gestão 2015-2019 ... 73

Figura 6 – Investimentos do Plano de Negócios e Gestão 2017-2021 ... 74

Figura 7 – Investimentos em Pesquisa e Desenvolvimento por área entre 2012 e 2014 ... 78

Figura 8 – Total de autorizações de trabalho (temporárias e permanentes) concedidas a estrangeiros pelo MTE ... 91

Figura 9 – Total de autorizações de trabalho temporárias concedidas a estrangeiros pelo MTE .... 93

Figura 10 – Nacionalidades que mais receberam autorizações temporárias de trabalho (2014 e 2015) ... 97

Figura 11 – Autorizações de Trabalho Temporárias segundo Sexo 2015 ... 101

Figura 12 – RN 72 – Autorizações concedidas conforme Diário Oficial da União de 09/03/2015 ... 103

Figura 13 – Tipos de Plataforma – Foto construção e montagem da plataforma semissubmersível P-55 ... 124

Figura 14 – Foto do navio de perfuração West Tellus ... 125

Figura 15 – Tipos de Plataformas – Foto Refeitório e Camarote da plataforma semissubmersível P-51 ... 132

Figura 16 – Rig Gallery – Foto Camarote e Refeitório do navio de perfuração West Tellus ... 133

Figura 17 – Porcentagem de Trabalhadores Setor de Petróleo e Gás no Mundo por Benefício recebido 2015 ... 141

Figura 18 – Benefícios recebidos por tipo de emprego/trabalho no setor de petróleo em todo o mundo ... 142

Figura 19 – Benefícios ... 143

Figura 20 – País de Origem dos Expatriados de uma Empresa do Setor de Petróleo e Gás em 11/2015 ... 150

Figura 21 – Tipo de Trabalhador e Regime de Trabalho ... 152

Figura 22 – Idade e Sexo 2015 ... 159

Figura 23 – Idade e Sexo 2016 ... 159

Figura 24 – Variação Salários por Gênero em todos níveis profissionais setor de Petróleo e Gás no Mundo ... 161

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Principais Características: Rodadas de Licitação frente ao Conceito de

Conteúdo Local (1999 a 2013) ... 64

Tabela 2 – Cadeia Produtiva de Petróleo e Gás (P&G) ... 67

Tabela 3 – Perfis dos Centros de Pesquisas brasileiros ... 80

Tabela 4 – Perfis dos Institutos de Pesquisas brasileiros ... 81

Tabela 5 – Perfis das Redes brasileiras de Pesquisas ... 82

Tabela 6 – Projetos do PROMINP para Capacitação em E&P ... 84

Tabela 7 – Estrutura das carreiras profissionais conforme o nível de qualificação profissional ... 85

Tabela 8 – Análise de Autorizações Temporárias ... 92

Tabela 9 – Análise de Autorizações Temporárias (RN72) ... 95

Tabela 10 – RNs vigentes (Autorizações até 02 anos sem contrato de trabalho no Brasil) ... 95

Tabela 11 – Autorizações de Trabalho Temporárias – Principais Nacionalidades – RN 72 ... 96

Tabela 12 – RN 72 – Autorizações de Trabalho Temporárias – Principais Unidades Federativas... 98

Tabela 13 – RN 72 – Autorizações de Trabalho Temporárias – Principais Escolaridades ... 99

Tabela 14 – Autorizações de Trabalho Temporárias – Principais Escolaridades ... 99

Tabela 15 – Autorizações de Trabalho Temporárias, segundo Idade ... 100

Tabela 16 – Autorizações de Trabalho Temporárias, segundo o Sexo ... 101

Tabela 17 – Análise de Autorizações Temporárias – Total ... 102

Tabela 18 – Perfil dos Estrangeiros Legalmente Autorizados a Trabalhar no Brasil entre 2011 e 2015 ... 104

Tabela 19 – Perfil dos Estrangeiros Legalmente Autorizados a Trabalhar no Brasil no Período entre 2011 e 2015 (RN 72) ... 105

Tabela 20 – Principais diferenças entre o Estatuto do Estrangeiro e os Projetos e Anteprojeto de Lei... 107

Tabela 21 – Principais características do Anteprojeto de Lei de Migrações ... 109

Tabela 22 – Entrevistas ... 119

Tabela 23 – Salário Anual por Área de Disciplina – Extração e Produção (em Dólar) ... 146

Tabela 24 – Salário Anual por Área de Disciplina – Administração e Gerenciamento (em Dólar) ... 147

Tabela 25 – Tabela informativa sobre quem adquire residência fiscal no Brasil ... 152

Tabela 26 – Funções exercidas pelos trabalhadores estrangeiros imigrantes no regime de trabalho ONSHORE em uma empresa do setor petrolífero ... 156

Tabela 27 – Funções exercidas pelos trabalhadores estrangeiros imigrantes no regime de trabalho OFFSHORE em uma empresa do setor petrolífero ... 157

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LISTA DE ANEXOS

ANEXO 1 – Portaria do Ministério do Trabalho e Emprego - MTE nº 1.964 de 11.12.2013 ... 190

ANEXO 2 – Portaria nº 708, de 28 de maio de 2015 ... 191

ANEXO 3 – Resolução Normativa nº 61, de 08 de dezembro de 2004 ... 192

ANEXO 4 – Resolução Normativa nº 71, de 05 de setembro de 2006 ... 194

ANEXO 5 – Portaria nº 4, de 26 de janeiro de 2015 ... 196

ANEXO 6 – Resolução Normativa nº 72, de 10 de outubro de 2006 ... 199

ANEXO 7 – Resolução Normativa nº 35, de 28 de setembro de 1999 ... 201

ANEXO 8 – Resolução Normativa nº 79, de 12 de agosto de 2008... 202

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SUMÁRIO

Introdução ... 14

Dinâmica do capital, mobilidade da força de trabalho e o setor petrolífero brasileiro ... 26

Dinâmica do capital e mobilidade da força de trabalho no contexto internacional ... 26

Dinâmica do capital e mobilidade da força de trabalho no contexto nacional ... 31

Dinâmica do capital, mobilidade da força de trabalho e o setor petrolífero brasileiro . 34 O termo “qualificado” no trabalho imigrante ... 40

Relações de gênero e trabalho qualificado imigrante ... 44

Identidade nas relações de trabalho qualificado imigrante ... 47

A Indústria petrolífera no Brasil e as Autorizações de Trabalho para Imigrantes Qualificados segundo o Estatuto do Estrangeiro ... 50

A Indústria petrolífera no Brasil ... 50

2.1.1. Contexto no qual ocorreu a criação da Petrobras ... 50

2.1.2. A Petrobras e a quebra do monopólio estatal do petróleo ... 54

2.1.3. O Pré-Sal, a Petrobras e o desenvolvimento do país ... 57

Navegação Marítima, o Setor Naval Brasileiro e a Indústria do Petróleo ... 62

Como funciona a cadeia produtiva de petróleo e gás (P&G) ... 66

Os Investimentos da Petrobras na indústria petrolífera ... 71

Investimentos em força de trabalho qualificada nacional e o trabalho qualificado imigrante ... 83

A Concessão de Autorizações de Trabalho para Imigrantes Qualificados: ocupações especializadas no setor do petróleo ... 89

As autorizações de trabalho permanentes e temporárias ... 90

A Lei de Migração... 105

A questão jurídica da imigração de trabalhadores qualificados no Brasil... 112

O Setor do Petróleo e a Imigração Qualificada no Brasil ... 117

Trabalhando numa plataforma de petróleo ... 121

Expatriados ... 138

Desigualdades nas relações de Gênero na Indústria do Petróleo e Gás ... 158

Comunicação e Interculturalidade ... 164

Empresas e crise ... 168

Considerações Finais ... 171

Referências Bibliográficas ... 175

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Introdução

O presente estudo teve como principal objetivo, traçar um panorama da força de trabalho qualificada imigrante no Brasil, de maneira mais específica, aquela ligada ao setor petrolífero. Essa é uma imigração documentada e vem crescendo de maneira expressiva a partir do final do século XX, quando há uma mudança significativa no processo de produção capitalista e, consequentemente, no mundo do trabalho, marcado pela mundialização, transnacionalização e financeirização dos capitais. Ao contrário da imigração de baixa qualificação, composta em grande parte por indocumentados (BAENINGER, 2011), a imigração qualificada foi pouco investigada como componente da imigração internacional no Brasil nessas últimas décadas. Por esse motivo, o contexto apresentado neste estudo é referente ao período de 2000 a 2015. A utilização de metodologias mistas para o estudo da imigração internacional (ARIZA Y VELASCO, 2012) permitiu acompanhar esta imigração através de fontes advindas de registros administrativos de órgãos governamentais, bem como realizar entrevistas com agentes institucionais e imigrantes ligados ao setor de petróleo e gás. Portanto, para compreender esse processo foram utilizados os dados disponibilizados pelos órgãos do governo brasileiro que são responsáveis pelas autorizações de trabalho estrangeiro no país e compreendeu um período entre 2011 e 2015; visitas de campo que possibilitaram a realização de entrevistas com diversos atores de diferentes segmentos do setor petrolífero brasileiro; além da participação em workshops, seminários, encontros e debates que abrangeram temas como: o funcionamento da indústria petrolífera, os desafios estratégicos na gestão de expatriados, a nova lei de migração.

O trabalho de campo se deu entre os meses de julho e novembro de 2015 nas cidades de Campinas, São Paulo e Rio de Janeiro. As entrevistas foram feitas com trabalhadores qualificados imigrantes de empresas que atuam na área do petróleo e gás, com agentes institucionais do governo ligados ao setor de imigração, com representantes do setor de recurso humanos (RH) de empresas da área, com representantes de empresas que prestam consultoria legal de imigração para o setor petrolífero e com agentes que trabalham em empresas especializadas em recrutamento de trabalhador qualificado para o setor. As empresas às quais a pesquisa de campo teve acesso, excetuado uma delas, eram todas transnacionais, incluindo-se aí as empresas que dão suporte legal ou recrutam trabalhadores para o incluindo-setor. Tais empresas têm como países de origem: Estados Unidos (03), Inglaterra (02), Noruega (02), Espanha (01), Brasil (01) e Reino Unido (01). Além disso, a participação em workshops, seminários,

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encontros e debates também ocorreu nesse período e foi imprescindível para melhor compreensão do tema. Estes eventos foram: VIII Workshop de Petróleo da Unicamp (Campinas/SP, 10/2015); 2ª Edição do Mobilidade Global e Expatriados Summit (São Paulo/SP, 11/2015); Seminário sobre a Nova Lei de Migração (São Paulo/SP, 09/2015); e diversos outros debates relativos ao tema. A participação na 1ª Conferência de Migrações e Refúgio – Comigrar (2014) e no VII Fórum Mundial Social das Migrações (2016) também foram importantes para o melhor entendimento do tema.

A questão principal da pesquisa consistiu em determinar se a força de trabalho qualificada imigrante que atua no setor petrolífero brasileiro também está sujeita à intensificação da atividade laboral e da perda de proteção social, as quais são consequências da flexibilização e precarização do trabalho estabelecida pelo novo processo de reestruturação produtiva em escala global que deu uma nova configuração ao mundo do trabalho. Nesse contexto, o trabalho terceirizado também aparece como sendo parte dessa flexibilização e precarização. A questão em relação ao gênero dos trabalhadores que atuam nesse setor é também um ponto de reflexão importante para a compreensão das formas de discriminação, exploração e dominação já presentes tanto no mundo do trabalho quanto no mundo da imigração.

O referencial teórico que norteia o estudo está fundamentado na formação de um mercado de trabalho mundial, baseado no modo de produção capitalista (MARX, 2013b) que se constitui de maneira desigual, hierarquizando e estigmatizando países e regiões, suas economias e culturas (MARX, 2013b) possibilitando a mobilidade dos trabalhadores de forma que a mobilidade espacial da população acompanha a mobilidade do capital (SASSEN, 1988). Tal mobilidade provê um fluxo regulamentado de imigrantes trabalhadores de alta qualificação em detrimento de um fluxo informal de imigrantes trabalhadores, que alimenta um mercado inferior de trabalho. (SASSEN, 2011). Huws (2012) acrescenta que a mobilidade deve ser vista em duas dimensões: espacial e temporal, constituindo “tanto barreiras como pontes para os fluxos livres de investimento de capital, bens e serviços através das fronteiras”, como também “barreiras e pontes para a livre movimentação da força de trabalho”, de tal forma que se constitui um ponto de partida para uma análise da nova divisão global do trabalho e seus impactos nas condições da vida laboral, nos meios de subsistência e nas carreiras dos trabalhadores. (HUWS, 2012). Também Pietro Basso (2003) abordou esta questão, verificando que a análise feita por Marx ainda é válida para o mercado de trabalho mundial contemporâneo. Dessa forma, a imigração internacional é apresentada como um sistema massivo de fornecimento de força de trabalho e o aparato jurídico conformará as leis que determinarão

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como se dará essa imigração, tendo o Estado papel preponderante na consolidação dessa força de trabalho.

O fenômeno ocorrido na segunda metade do século XX no que diz respeito à crise estrutural do sistema capitalista e qual o impacto produzido por essa crise que resultou no processo de reestruturação produtiva em escala global, produzindo uma nova configuração ao mundo do trabalho, pode ser melhor entendido a partir de autores que se dedicaram a essa questão. Harvey (1998) apresenta as décadas de 1970 e 1980 como um período conturbado de reestruturação econômica e de reajustamento social e político. Nesse período, uma série de novas experiências nos domínios da organização industrial e da vida social e política começaram a tomar forma, ou seja, a passagem para um regime de acumulação inteiramente novo, associado com um sistema de regulamentação política e social bem distinta. (HARVEY, 1998). Dessa forma, Harvey (1998) define acumulação flexível como um sistema que se apoia na flexibilidade dos processos de trabalho, dos mercados de trabalho, dos produtos e padrões de consumo. Ela envolve rápidas mudanças dos padrões de desenvolvimento desigual, tanto entre os setores, como entre regiões geográficas, criando, por exemplo, um vasto movimento no emprego chamado “setor de serviços”, bem como conjuntos industriais completamente novos em regiões até então subdesenvolvidas. (HARVEY, 1998). Nesse novo contexto, o mercado de trabalho, segundo o autor, sofreu uma drástica reestruturação e devido à forte volatilidade do mercado, do aumento da competição e do estreitamento das margens de lucro, os patrões puderam tirar proveito do enfraquecimento do poder sindical e da grande quantidade de força de trabalho excedente, caracterizada por desempregados e ou subempregados, para impor regimes e contratos de trabalho mais flexíveis. (HARVEY, 1998).

Para entender a questão, Castells (1999), parte do pressuposto de que o paradigma informacional e o processo de globalização que afetam a sociedade em geral tem como seu principal instrumento a empresa emergente em rede na qual, dentro e em torno dela é que se dá as transformações tecnológica e administrativa do trabalho e das relações produtivas. Por isso, Castells (1999) afirma que as novas tecnologias possibilitaram um aumento significativo de flexibilidade e adaptabilidade, que contrapôs a rigidez do trabalho à mobilidade do capital. Houve assim “uma pressão contínua para tornar a contribuição do trabalho a mais flexível possível”. (CASTELLS, 1999). Consequentemente, “a produtividade e a lucratividade foram aumentadas, mas os trabalhadores perderam proteção institucional e ficaram cada vez mais dependentes das condições individuais de negociação e de um mercado de trabalho em mudança constante”. (CASTELLS, 1999). Assim, Castells (1999) afirma que “O trabalho nunca foi tão central para o processo de realização do valor”. (CASTELLS, 1999). Porém, “os trabalhadores,

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independentemente de suas qualificações, nunca foram tão vulneráveis à empresa, uma vez que haviam se tornado indivíduos pouco dispendiosos, contratados em uma rede flexível cujos paradeiros eram desconhecidos da própria rede”. (CASTELLS, 1999).

O contexto nacional, no período após 1990, Krein (2007) afirma que “Do ponto de vista das relações de trabalho, a lógica foi de constituição de um sistema em que os direitos trabalhistas e a proteção social ficam cada vez mais subordinados à acumulação de capital”. (KREIN, 2007). Ele afirma que o sistema tem por base uma ideologia liberal, a qual, “a balança tende a pesar para o lado do atendimento das necessidades de acumulação de riqueza abstrata do capital em detrimento de um processo de desenvolvimento econômico voltado para o benefício da coletividade tanto no que diz respeito à produção quanto à distribuição” (KREIN, 2007). E a partir da crise dos anos 1970, “as iniciativas, sob a hegemonia dos “porta vozes das forças impessoais do capitalismo”, vão na perspectiva de viabilizar uma regulação com menor proteção social, por meio da desregulamentação de direitos ou políticas de proteção social e da flexibilização das relações de trabalho”. (KREIN, 2007). Para Antunes (2009) é nesse período que as formas de extração de trabalho se intensificam de tal forma que “a noção de tempo e espaço são metamorfoseadas e tudo isso muda muito o modo do capital produzir as mercadorias”. Assim uma empresa pode ser substituída por várias pequenas unidades interligadas pela rede que produzirá muito mais com muito menos trabalhadores. (ANTUNES, 2009). Para ele, a “forma de ser” da classe trabalhadora (ANTUNES, 2009) na sociedade contemporânea deve levar em conta o trabalhador imigrante, o qual é parte integrante e fundamental do mundo do trabalho globalizado.

Por sua vez, Druck (2013) afirma que o processo resultante dessa nova precarização social do trabalho pode ser verificado “pela disseminação da terceirização a todos os tipos de atividades e setores.” (DRUCK apud ANTUNES, 2013) e é nesse contexto que a indústria petrolífera brasileira e consequentemente a força de trabalho por ela utilizada está inserida. A característica dessa “nova precarização social do trabalho” está amparada “na ideia de que se trata de um processo que instala – econômica, social e politicamente – uma institucionalização da flexibilização e da precarização modernas do trabalho, renovando e reconfigurando a precarização histórica e estrutural do trabalho no Brasil” (DRUCK apud ANTUNES, 2013), sobretudo a partir de uma concepção hegemonizada pelo capital, esse processo mundial de precarização, também é vivenciado pelos países desenvolvidos. (DRUCK apud ANTUNES, 2013). Sua presença pode ser encontrada tanto no setor público, como no setor privado, sendo que em relação ao setor industrial, a autora afirma que a terceirização “ocorreu de início em atividades consideradas periféricas, [...] e propagou-se gradativamente para todas as áreas, num

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movimento indiscriminado, sem qualquer distinção entre “atividade fim” e “atividade meio”. (DRUCK apud ANTUNES, 2013). Dessa forma, ela atinge de maneiras e com intensidades diversas, tanto trabalhadores mais qualificados quanto os menos qualificados; o mesmo acontece com as diversas regiões do país e, da mesma forma, atinge tanto os setores mais modernos e dinâmicos como o trabalho informal. (DRUCK apud ANTUNES, 2013). O seu alcance atinge de forma gradativamente mais intensa quanto menos qualificado for considerado o trabalho e o trabalhador.

A pesquisa de campo revelou que os trabalhadores qualificados imigrantes atuam principalmente na área de desenvolvimento de tecnologias; trabalham em diferentes postos nas plataformas de petróleo tanto em regime offshore quanto onshore. Parte dessa força de trabalho é contratada pelas empresas operadoras das plataformas, sendo que muitos deles na condição de expatriados. Enquanto que outra parte desses trabalhadores são contratados por empresas terceirizadas que, por sua vez, são contratadas pelas empresas operadoras da exploração e produção de petróleo e gás. Através de dados fornecidos pelo MTE, entre 2011 e 2015, constatou-se que o setor petrolífero brasileiro tem sido o responsável por empregar praticamente a metade de toda força de trabalho qualificada imigrante que está legalmente autorizada a trabalhar no Brasil com visto de trabalho temporário, ou seja, esta é uma imigração documentada. Assim, em 2014, em torno de 1/3 (14.931) de todas as autorizações de trabalhos temporários (43.897) concedidas foram para trabalho a bordo de embarcação ou plataforma estrangeira com embasamento legal na resolução normativa de nº 72. Se acrescentarmos as autorizações concedidas com base na resolução normativa nº 61 que trata da assistência técnica, cooperação técnica e transferência de tecnologia, sem vínculo empregatício (6.383), essa proporção sobe para quase metade (21.314), ou seja, 48,55% de todas as autorizações concedidas para trabalho temporário no ano de 2014. Em 2015, as proporções continuam equivalentes, apesar da queda no total das autorizações. Assim, o resultado das pesquisas realizadas em órgãos do governo brasileiro, como o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), o Conselho Nacional de Imigração (CNIg), o Ministério da Justiça, o Departamento de Polícia Federal, a Defensoria Pública da União entre outros, apresenta um trabalhador imigrante do sexo masculino, com idade entre 20 e 49 anos e educação formal de nível superior completo ou pelo menos ensino médio completo. A maioria deles recebe visto temporário de trabalho, desembarcaram nos estados do Rio de Janeiro e São Paulo, sendo que os vistos mais requisitados foram os relativos à RN 72 – que se refere ao trabalho a bordo de embarcação ou plataforma estrangeira – e à RN 61 referente ao trabalho de assistência técnica, cooperação técnica e transferência de tecnologia, sem vínculo empregatício.

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A dissertação está dividida em quatro capítulos e compreende ainda esta Introdução bem como as Considerações Finais. O presente estudo apresenta no Capítulo 1 – nos itens 1.1 a 1.3 – os principais apontamentos teóricos à respeito da nova reestruturação do capital ocorrida no final século XX, tais como as Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs) que transformaram o mercado de trabalho mundial. Nesse contexto, surge o debate acerca da mobilidade internacional de trabalhadores, de forma que o processo de reestruturação produtiva em escala global deu uma nova configuração ao mundo do trabalho. Castells (1999) afirma que as TICs possibilitaram um aumento significativo de flexibilidade e adaptabilidade, que contrapôs a rigidez do trabalho à mobilidade do capital. A “classe-que-vive-do-trabalho”, expressão cunhada por Antunes (2008) inclui não somente o trabalho produtivo, ou seja, aquele que gera mais-valia, mas também o trabalho improdutivo, que não gera mais-valia, pois esse também é imprescindível para a produção capitalista e ajuda a pensar na nova divisão internacional do trabalho. Por sua vez, Huws a apresenta como divisão global do trabalho e, devido à universalização crescente desses padrões de qualificação dos trabalhadores, se torna essencial para a formação de um exército global de reserva de trabalhadores da informação. Assim, a mobilidade espacial da população que acompanha a mobilidade do capital nessa nova divisão internacional do trabalho fundamentada no capital é indicativa da flexibilização e precarização do mundo do trabalho levando à sua intensificação. Apesar de enfoques teóricos de diferentes matizes os autores Harvey (1998); Castells (1999, 2005); Sassen (1988, 2011); Huws (2003, 2008, 2012); Antunes (2009); Vasapollo (2006); Vasapollo e Arriola (2005); Krein (2007); Druck (2013) apresentam suas visões sobre o tema. Dessa forma, o trabalho continua sendo imprescindível para o processo de realização do valor [Antunes (2009); Castells (1999)], mas os trabalhadores, independentemente de suas qualificações, nunca foram tão vulneráveis. O contexto nacional, no período após 1990, Krein (2007) afirma que um sistema que tem por base uma ideologia liberal, “do ponto de vista das relações de trabalho, a lógica foi de constituição de um sistema em que os direitos trabalhistas e a proteção social ficam cada vez mais subordinados à acumulação de capital”. (KREIN, 2007). E Antunes (2006) apresenta como se deu o desenvolvimento da industrialização brasileira e a reestruturação produtiva do capital no Brasil na década de 1990. (Antunes, 2006). E é nesse contexto que Druck (2013) apresenta como a “nova precarização social do trabalho” apenas renova e reconfigura a precarização histórica e estrutural do trabalho no Brasil, e expõe uma das diversas faces dessa precarização chamada terceirização. (Druck, 2013).

O item 1.4 apresenta uma breve discussão à respeito do termo “qualificado” no trabalho imigrante. O termo “qualificado” carrega consigo muitos significados e a sua

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consideração enquanto categoria que define um tipo de trabalho abrange um grande debate para a sociologia. A demanda por uma força de trabalho qualificada cresceu sobremaneira, e a sua importância e funcionalidade está justamente no baixo custo unitário desses trabalhadores, pois permite aos países receptores aumentar sua competitividade internacional também com geração de novos conhecimentos. Dessa maneira, é vantajoso recorrer à força de trabalho qualificada proveniente do estrangeiro, ou seja, trabalhadores qualificados imigrantes, mantendo assim a mesma funcionalidade para o sistema. [(Aragonés & Salgado (2011); Castells (1999); Huws (2012); Lozano & Gandini (2011)]. Um breve debate acerca das noções de qualificação e competência é apresentado. [Dubar (1999) e Hirata (1994)]. Porém, a despeito do uso do termo “qualificado” adjetivando a força de trabalho imigrante como forma de distinção, este pode abarcar diferentes níveis de formação, tanto aquela formação acadêmica comprovada como a formação técnica para um setor específico. Estes níveis por sua vez se desdobram em um sem números de profissões ou ocupações exercidas pela força de trabalho imigrante que pode ser admitida legalmente pela lei vigente do país sob a mesma denominação de “qualificada”.

No item 1.5, o estudo aborda questões relativas às relações de gênero e trabalho qualificado imigrante. As autoras, Hirata (2002); Hirata e Kergoat (2007); Araújo et al (2004); Haraway (2004, 2009) expõem alguns apontamentos acerca da questão. Hirata aponta para como a introdução da dimensão do gênero questiona fortemente as ciências sociais e as ciências econômicas”, pois partem em suas elaborações teóricas da figura do trabalhador homem como encarnando o universal. (HIRATA, 1994). Além disso, “a exploração por meio do trabalho assalariado e a opressão do masculino sobre o feminino são indissociáveis, sendo a esfera de exploração econômica – ou de relações de classe – aquela em que simultaneamente é exercido o poder dos homens sobre as mulheres” (ARAÚJO et al, 2004). A respeito da inserção das mulheres no mercado de trabalho a partir da nova reestruturação produtiva e em referência a ações de requalificação – a noção de “flexibilidade ou de especialização flexível foi construída ignorando todo enfoque em termos de gênero” (HIRATA, 1994). Porém, as relações de gênero e a divisão entre os sexos atravessa o conjunto da sociedade, e não apenas do espaço da empresa”. (HIRATA, 1994). E assim, “as ações de requalificação não têm a mesma extensão, nem o mesmo alcance, nem a mesma significação, para as mulheres e para os homens”. (HIRATA, 1994). Portanto, “o panorama é extremamente complexo e heterogêneo quando se leva em consideração as diferenças relacionadas com o gênero, a qualificação e a divisão internacional do trabalho” (HIRATA, 1994), pois “as teses de alcance universal tais como as dos novos paradigmas ou dos novos conceitos de produção são forçosamente questionados à luz de pesquisas empíricas introduzindo tais diferenciações”. (HIRATA, 1994).

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A respeito dos apontamentos teóricos acerca da imigração, do imigrante [Sayad (1998); Vainer (1996)] e de suas variadas distinções de acordo com a posição que ocupa na estrutura social e da força de trabalho qualificada imigrante [Davatz (1972); Hall (2003); Prado Júnior (1989); Seyferth (2008); Stolcke (1984); Truzzi (1986); Tschudi (1976)] estão relacionados no item 1.6 do presente estudo. Assim, dependendo de onde esse “imigrante/estrangeiro/expatriado” se posiciona na estrutura social, ele será identificado por um adjetivo que o distingue de tal maneira que pode determinar sua aceitação ou se constituir em objeto de discriminação. A princípio, segundo o direito, um estrangeiro que aporte em terras brasileiras, é considerado migrante, podendo ser classificado como transitório, temporário ou permanente. Contudo, as categorias imigrante, estrangeiro, expatriado podem assumir conotações diversas. Assim, quando um trabalhador estrangeiro é identificado com o adjetivo “qualificado” é porque ele foi admitido legalmente no país, ou seja, é chamado de documentado. Enquanto que um trabalhador estrangeiro, mesmo que tenha as mesmas qualificações do anteriormente citado, porém indocumentado, não será aceito como trabalhador qualificado e só irá conseguir os trabalhos que ninguém mais quer. Muito embora esses trabalhadores possam ter diplomas universitários ou habilidades específicas, não será reconhecido pelo mercado de trabalho como “qualificado”.

No Capítulo 2 é apresentado uma visão geral da indústria petrolífera brasileira, onde o principal objeto do estudo, a força de trabalho qualificada imigrante está inserida; como também as Autorizações de Trabalho para Imigrantes Qualificados segundo o Estatuto do Estrangeiro. O item 2.1 está subdividido em três partes e apresenta no subitem 2.1.1 o contexto no qual ocorreu a criação da Petrobras e como a “Campanha do Petróleo” com o lema “O Petróleo é Nosso” contribuiu para o embate que não aconteceu apenas na esfera política institucional, mas com a participação da sociedade civil representadas por diversos grupos que em última instância conseguiram a mobilização popular. Assim, foi sancionada a Lei de nº 2.004/1953 que “instituiu o monopólio da União na pesquisa e lavra das jazidas de petróleo, na refinação de petróleo nacional e estrangeiro, no transporte marítimo do petróleo bruto de origem nacional e dos derivados de petróleo produzidos no País e no transporte por oleodutos e gasodutos” e que também autorizava a União a constituir a sociedade por ações “Petróleo Brasileiro S.A.”, com a sigla PETROBRAS. O subitem 2.1.2 aborda como a quebra do monopólio estatal do petróleo que teve como pano de fundo a reestruturação produtiva do capital que se desenvolvia intensamente no país, num contexto neoliberal, a partir dos anos 1990 e que transformou a Petrobras em uma empresa de capital misto, possibilitando assim a abertura do setor à iniciativa privada. E como esse fato possibilitou a fragmentação da empresa

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e a substituição do efetivo próprio de trabalhadores por terceiros, de tal modo que o programa de terceirização reduziu de 62 mil trabalhadores diretos em 1990, para 30 mil em 2002; enquanto os trabalhadores terceirizados e quarteirizados somavam mais de 80 mil. (FUP, 2002). E para finalizar, o subitem 2.1.3, apresenta a fase do pré-sal e sua importância para Petrobras e para o desenvolvimento do país, como a destinação dos royalties para as áreas de educação e saúde com a publicação da lei de nº 12.858/2013 que previa a aplicação desses recursos advindos dos royalties do petróleo num montante de 75% para a educação e 25% para a saúde, além de que 50% do fundo social do pré-sal também deviam ser destinados para as mesmas áreas da educação e saúde. Embora a União seja proprietária do petróleo, a extração pode ser feita por empresas ou consórcios mediante diversas formas de pagamento, como os royalties, que dependem do sistema vigente.

O item 2.2, apresenta dados acerca da navegação marítima e do setor naval brasileiro que se mostram imprescindíveis para o funcionamento da cadeia produtiva do petróleo e gás, em consequência do país possuir grandes reservas de petróleo e gás em águas profundas e ultra profundas. O item 2.2 aborda a questão do conceito de conteúdo local e se apresenta como parte integrante de uma política industrial para o setor do petróleo. Porém, há uma grande debate quanto à eficácia dessa política que será apresentada na discussão do referido assunto. Além disso, trata da questão da política de afretamento da Petrobras, que segundo o Sindicato Nacional dos Oficiais da Marinha Mercante (SINDMAR), ao longo das duas últimas décadas, levou a estatal a contratar cerca de 300 navios estrangeiros, contra apenas 33 navios brasileiros, o que representa um baque para a política industrial praticada pelo governo como forma de alavancar a indústria do país. O sindicato também tem denunciado que a operação realizada pela Petrobras e pela Transpetro, de navios-tanques de bandeira de conveniência empregando tripulação estrangeira, estabelecendo contratos firmados fora do Brasil, representa uma forma de terceirização para o trabalhador marítimo brasileiro, pois favorece o dumping social.

O item 2.3, apresenta de forma concisa as características do setor petrolífero brasileiro, como os principais elos da cadeia produtiva de petróleo e gás (P&G) e também dos segmentos primários do mercado de equipamentos e serviços para exploração e produção (E&P) estruturado a partir do ciclo de vida de um campo petrolífero necessários à realização das atividades de E&P. O estudo apresenta ainda, no item 2.4, os investimentos e desinvestimentos da Petrobras de uma forma geral (Planos de Negócios e Gestão) e aqueles relativos à pesquisa, desenvolvimento e inovação (PD&I) mostrando a participação dos Centros e Institutos de Pesquisa no desenvolvimento de novas tecnologias para o setor.

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Finalizando, o Capítulo 2, o item 2.5, assinala os investimentos em força de trabalho qualificada nacional realizados pelo governo brasileiro através de diversos programas de formação em recursos humanos direcionados à indústria petrolífera brasileira. [Bain & Company; Tozzini Freire Advogados (2009); Alonso (2013); Página Web Prominp]. E sobre o trabalho qualificado imigrante para atender a um mercado internacional e multinacional de trabalho marítimo com o fornecimento em massa de trabalhadores, de maneira especial, asiáticos. O autor Valter Zanin (2007) cunhou o termo “I forzati del mare” (forçados do mar) para explicar o fenômeno. De um modo geral, a categoria “marítimos globais” que trabalham em embarcações de propriedade transnacional, corresponde hoje a 2/3 dessa força de trabalho. [Zanin (2007); Villen (2015)].

O Capítulo 3, apresenta os dados relativos à concessão de autorizações de trabalho para imigrantes qualificados em ocupações especializadas no setor do petróleo e está dividido em: item 3.1 – apresentar e discutir os dados das autorizações de trabalho permanentes e temporárias a partir de pesquisas realizadas em órgãos do governo brasileiro, como o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), o Conselho Nacional de Imigração (CNIg), o Ministério da Justiça, o Departamento de Polícia Federal, a Defensoria Pública da União entre outros; item 3.2 – apresentar o debate em torno da Lei de Migração; e item 3.3 – como as pessoas entrevistadas encaram a questão jurídica da imigração de trabalhadores qualificados no Brasil. Por ter o Estado papel preponderante nas políticas que definem o caráter imigratório do país, um dos aspectos de grande relevância para o setor petrolífero se dá no campo político/jurídico para a efetiva contratação dessa força de trabalho imigrante. Assim, o item 3.1 traz uma breve apresentação de órgãos como o Conselho Nacional de Imigração (CNIg); a Coordenação Geral de Imigração (CGIg); o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) que agora responde pelo nome de Ministério do Trabalho e Previdência e do Ministério da Justiça. Dessa forma, foram apresentados dados referente aos anos de 2011 a 2015 do número total de autorizações de trabalho permanentes e temporárias concedidas a estrangeiros pelo Ministério do Trabalho e Emprego; e de maneira específica das autorizações temporárias para trabalho a bordo de embarcação ou plataforma estrangeira que se refere à Resolução Normativa de nº 72, a qual contempla o objeto do presente estudo. A partir desses dados foram realizadas análises que abrangeram questões como as principais nacionalidades, unidades federativas, escolaridade, idade e sexo. Também foram analisados os dados obtidos através do Diário Oficial da União das autorizações concedidas relativas à RN 72, (temporário, sem contrato) e que apresenta dados como o nome da empresa contratante, do estrangeiro contratado e o número do processo pelo qual o Ministério do Trabalho e Emprego por meio do Coordenador Geral de

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Imigração autoriza sua entrada no país. O resultado das análises culminou com um perfil dos estrangeiros legalmente autorizados a trabalhar no Brasil no período entre 2011 e 2015.

Em relação a Lei de Migração, o item 3.2 apresenta um panorama das principais discussões à respeito da Lei nº 6.815/80, como também do Projeto de Lei 5.655/2009 de autoria do executivo; do Projeto de Lei do Senado 288/2013 e do Anteprojeto de Lei de Migrações/2014 proposto pelo Ministério da Justiça. Também apresenta os principais debates sobre os projetos acima mencionados, tanto no âmbito jurídico-administrativo das instituições governamentais quanto por órgãos de defesa de imigrantes no âmbito da sociedade civil. A realidade migratória do país difere muito do que o Estatuto do Estrangeiro prevê, ou seja, sua subordinação à lógica da segurança nacional e o controle documental voltado ao acesso ao mercado de trabalho. Contudo, fica claro que mesmo os projetos de lei que foram apresentados para substituir o Estatuto do Estrangeiro também contêm propostas similares quanto à questão relativa ao mercado de trabalho. Dessa forma, acaba por gerar uma imigração seletiva que atende justamente a uma força de trabalho qualificada utilizada pelo mercado de trabalho brasileiro e de maneira incisiva pelo setor petrolífero. Isso porque a regularização migratória é vinculada ao trabalho previamente contratado, ou seja, é exigido uma autorização prévia ao trabalhador para que este seja admitido no país. Finalizando o capítulo, o item 3.3, aborda a partir do ponto de vista das entrevistadas e entrevistados da pesquisa o que representa uma nova Lei de Migração para os trabalhadores migrantes e as dificuldades acerca dos procedimentos jurídicos do atual Estatuto do Estrangeiro.

O Capítulo 4, oferece uma análise, a partir da pesquisa de campo, abrangendo diversos aspectos – políticos, jurídicos, sociais e econômicos – da questão da força de trabalho qualificada imigrante no setor petrolífero. A pesquisa foi realizada com trabalhadores qualificados imigrantes de empresas que atuam na área do petróleo e gás; com agentes institucionais do governo ligados ao setor de imigração; com representantes de empresas que prestam consultoria legal nesta mesma área, podendo ser on/offshore; com agentes que trabalham em empresas especializadas responsáveis no recrutamento de trabalhador qualificado para o setor e com representantes da área de Recursos Humanos de empresas do setor petrolífero responsáveis pela contratação dessa força de trabalho. No presente capítulo são abordadas as seguintes temáticas:

O item 4.1 – Trabalhando numa plataforma de petróleo, apresenta como se configura o trabalho numa plataforma de petróleo, discutindo questões como: terceirização, tipos de plataformas, meios de transporte, regras estabelecidas pela Marinha Brasileira para o trabalho offshore,

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escala de embarque, turnos, regime de sobreaviso, e sobretudo como as pessoas entrevistadas que trabalham na plataforma encaram essa atividade laboral.

O item 4.2 – Expatriados, apresenta além da definição do termo que no meio corporativo assim os identifica, o tema também abrange entender o processo de expatriação e repatriação, o regime e escala de trabalho, os salários e benefícios recebidos, nacionalidades, tipos de ocupações que exercem entre outros.

O item 4.3 – Desigualdades nas relações de Gênero na Indústria do Petróleo e Gás, apresentará alguns apontamentos sobre gênero, divisão sexual do trabalho, e sobre o lugar que as trabalhadoras que se identificam como mulheres ocupam nesse mercado em relação aos trabalhadores que se identificam como homens. As entrevistas ajudaram a entender como essas desigualdades se configuram dentro do espaço de trabalho no setor petrolífero.

O item 4.4 – se refere à Comunicação e Interculturalidade nas relações de trabalho, questão importante de ser analisada, pois o processo de expatriação também depende da adaptação do expatriado e de sua família perante os diversos fatores a que estão expostos durante esse processo, como o tamanho e natureza das diferenças culturais entre os países de origem e destino, as barreiras linguísticas, a estrutura familiar do expatriado e a função que será desempenhada pelo profissional.

No item 4.5 – Empresas e Crise, as entrevistadas e entrevistados contam a respeito de suas percepções sobre a crise e como as empresas do setor reagiram a ela. Porém, apesar de acreditarem que a crise no setor não será permanente, os expatriados são os primeiros a senti-la, pois as empresas tendem na medida do possível substituí-los, por causa dos custos elevados em mantê-los.

Nas Considerações Finais, o estudo realizado nesta dissertação possibilitou conhecer a imigração qualificada para o setor do petróleo no Brasil, incorporando aspectos teóricos e evidências empíricas a respeito das condições de trabalho e imigração internacional neste setor.

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Dinâmica do capital, mobilidade da força de trabalho e o

setor petrolífero brasileiro

Dinâmica do capital e mobilidade da força de trabalho no contexto internacional A formação de um mercado de trabalho mundial, baseado no modo de produção capitalista, já foi descrito por Marx, como aquele que envolve “todos os povos na rede do mercado mundial” (MARX, 2013b) e por conseguinte, dá “o caráter internacional do regime capitalista”. (MARX, 2013b). Marx analisou como esse mercado se constitui de maneira desigual, hierarquizando e estigmatizando países e regiões, suas economias e culturas (MARX, 2013b) de tal modo que se tornam produtoras e/ou receptoras de força de trabalho imigrante a partir de uma divisão internacional do trabalho fundamentada no capital. Também Pietro Basso (2003) abordou esta questão, verificando que a análise feita por Marx ainda é válida para o mercado de trabalho mundial contemporâneo.

O desenvolvimento do sistema capitalista implica na formação de um “exército” ativo de trabalhadores livres e ao mesmo tempo de um “exército” industrial de reserva – decorrente da acumulação primitiva – composto por “miseráveis” e que será utilizado para o controle da lei de oferta e procura. (MARX, 2013a). É exatamente esse “exército” de reserva, esse subproletariado, que irá protagonizar a força de trabalho do migrante, interno e internacional. Nesse contexto, é possível apresentar a imigração internacional como um sistema massivo de fornecimento de força de trabalho. O aparato jurídico conformará as leis que determinarão como se dará essa imigração, tendo o Estado papel preponderante na consolidação dessa força de trabalho.

As transformações ocorridas no final do século XX levaram as Nações Unidas a declarar que “a mobilidade humana tornou-se parte integrante da economia mundial” (ARAGONÉS & SALGADO, 2011) e, dessa forma, dá um novo impulso à sua função estrutural, no sentido de favorecer o processo de acumulação de capital a partir da desvalorização da força de trabalho mundial. (ARAGONÉS & SALGADO, 2011). Segundo Aragonés & Salgado1:

1 Tradução livre de: “De acuerdo con Naciones Unidas entre 1990-2000, la proporción de migrantes que se dirigió

a los países desarrollados pasó de 53% a 60%. De tal suerte que el stock de migrantes altamente cualificados presentó un incremento de 155% para América Latina, 152% para Asia y 145% para África, y 65% de los migrantes del mundo se encontraban residiendo en la región de América del Norte (Estados Unidos, Canadá y México)”. (ARAGONÉS & SALGADO, 2011).

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De acordo com as Nações Unidas, de 1990 a 2000, a proporção de migrantes que se dirigiram aos países desenvolvidos aumentou de 53% para 60%. De tal maneira que o estoque de migrantes altamente qualificados apresentou um aumento de 155% para a América Latina, 152% para a Ásia e de 145% para a África, sendo que 65% dos migrantes do mundo residiam na região da América do Norte (Estados Unidos, Canadá e México). (ARAGONÉS & SALGADO, 2011).

Mais do que nunca, hoje, essa força de trabalho com características próprias da imigração internacional ocupa um lugar fundamental no funcionamento das economias centrais. Para entender o fenômeno ocorrido na segunda metade do século XX, no que diz respeito à crise estrutural do sistema capitalista e de como se desenrolaram os acontecimentos após esse período, diversos autores se dedicaram a explicar essas mudanças. A seguir são apresentadas algumas dessas abordagens.

Para Harvey (1998), fica claro que nesse período entre os anos de 1965 e 1973, a incapacidade do fordismo e do keynesianismo de conter as contradições inerentes ao capitalismo se tornou cada vez mais evidente. (HARVEY, 1998). Segundo o autor,

A profunda recessão de 1973, exacerbada pelo choque do petróleo, evidentemente retirou o mundo capitalista do sufocante torpor da

"estagflação" (estagnação da produção de bens e alta inflação de preços) e pôs

em movimento um conjunto de processos que solaparam o compromisso fordista. (HARVEY, 1998).

Como consequência disso, as décadas de 1970 e 1980 constituíram um “conturbado período de reestruturação econômica e de reajustamento social e político”. (HARVEY, 1998). Assim, Harvey (1998) afirma que, “No espaço social criado por todas essas oscilações e incertezas, uma série de novas experiências nos domínios da organização industrial e da vida social e política começou a tomar forma”. (HARVEY, 1998). Consequentemente, “Essas experiências podem representar os primeiros ímpetos da passagem para um regime de acumulação inteiramente novo, associado com um sistema de regulamentação política e social bem distinta”. (HARVEY, 1998).

Desse modo, a assim chamada “acumulação flexível” expressão denominada por Harvey (1998) “é marcada por um confronto direto com a rigidez do fordismo”. (HARVEY, 1998). Segundo ele, a acumulação flexível

se apoia na flexibilidade dos processos de trabalho, dos mercados de trabalho, dos produtos e padrões de consumo. Caracteriza-se pelo surgimento de setores de produção inteiramente novos, novas maneiras de fornecimento de serviços financeiros, novos mercados e, sobretudo, taxas altamente intensificadas de inovação comercial, tecnológica e organizacional. A acumulação flexível envolve rápidas mudanças dos padrões de desenvolvimento desigual, tantos entre os setores, como entre regiões geográficas, criando, por exemplo, um vasto movimento no emprego chamado “setor de serviços”, bem como

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conjuntos industriais completamente novos em regiões até então subdesenvolvidas. (HARVEY, 1998).

Harvey aponta que o mercado de trabalho, nesse novo desenho, sofreu uma drástica reestruturação. E dessa maneira, devido à

forte volatilidade do mercado, do aumento da competição e do estreitamento das margens de lucro, os patrões tiraram proveito do enfraquecimento do poder sindical e da grande quantidade de mão-de-obra excedente (desempregados ou subempregados) para impor regimes e contratos de trabalho mais flexíveis”. (HARVEY, 1998).

Apesar disso, Harvey (1998) afirma que é difícil esboçar um panorama geral da questão, pois existem muitas especificidades relacionadas a cada empresa. Independentemente disso, para o autor o mais importante “é a aparente redução do emprego regular em favor do crescente uso do trabalho em tempo parcial, temporário ou subcontratado”. (HARVEY, 1998). Para ele, muito embora

seja verdade que a queda da importância do poder sindical reduziu o singular poder dos trabalhadores brancos do sexo masculino nos mercados do setor monopolista, não é verdade que os excluídos desses mercados de trabalho – negros, mulheres, minorias étnicas de todo tipo – tenham adquirido uma súbita paridade (exceto no sentido de que muitos operários homens e brancos tradicionalmente privilegiados foram marginalizados, unindo-se aos excluídos). (HARVEY, 1998).

Assim, Harvey (1998) argumenta que “Esses arranjos de emprego flexíveis não criam por si mesmos uma insatisfação trabalhista forte, visto que a flexibilidade pode às vezes ser mutuamente benéfica”. (HARVEY, 1998). Porém, “os efeitos agregados, quando se consideram a cobertura de seguro, os direitos de pensão, os níveis salariais e a segurança no emprego, de modo algum parecem positivos do ponto de vista da população trabalhadora como um todo”. (HARVEY, 1998).

Muito embora, não compactuem da mesma abordagem teórica, Castells também apresenta a flexibilização e a precarização do trabalho como o resultado de um processo de reestruturação do capital frente à crise estrutural do sistema capitalista ocorrida na segunda metade do século XX. Castells (1999) afirma que “O trabalho nunca foi tão central para o processo de realização do valor”. (CASTELLS, 1999). Porém, “os trabalhadores, independentemente de suas qualificações, nunca foram tão vulneráveis à empresa, uma vez que haviam se tornado indivíduos pouco dispendiosos, contratados em uma rede flexível cujos paradeiros eram desconhecidos da própria rede”. (CASTELLS, 1999). Para o autor, “a transformação tecnológica e administrativa do trabalho e das relações produtivas dentro e em torno da empresa emergente em rede é o principal instrumento por meio do qual o paradigma informacional e o processo de globalização afetam a sociedade em geral”. (CASTELLS, 1999).

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Dessa forma, para Castells (1999), as novas tecnologias possibilitaram um aumento significativo de flexibilidade e adaptabilidade, que contrapôs a rigidez do trabalho à mobilidade do capital. Assim, houve “uma pressão contínua para tornar a contribuição do trabalho a mais flexível possível”. (CASTELLS, 1999). Consequentemente, “a produtividade e a lucratividade foram aumentadas, mas os trabalhadores perderam proteção institucional e ficaram cada vez mais dependentes das condições individuais de negociação e de um mercado de trabalho em mudança constante”. (CASTELLS, 1999).

Como um dos fatores que possibilitaram as mudanças ocorridas no final do século XX, tanto no que se refere à estrutura organizacional e política das empresas quanto ao impacto causado na estrutura laboral e social dos trabalhadores, as novas tecnologias de informação e comunicação (TICs) se apresentam como um dos setores estratégicos desse novo paradigma. Essas novas tecnologias têm a capacidade de armazenar, recuperar, processar e transmitir informações e provocaram uma mudança nos sistemas produtivos e geraram uma força de trabalho específica. Para Castells (1999), o conhecimento não é apenas uma ferramenta a ser aplicada, mas um processo a ser desenvolvido. Para ele, “a mente humana é uma força direta de produção, não apenas um elemento decisivo no sistema produtivo”. (CASTELLS, 1999).

Segundo os autores, Becker (1975) e Aragonés & Salgado (2011) as TICs aumentam os requisitos de “capital humano” para que os novos processos de produção sejam executados e quando insuficientes os contingentes internos de “capital humano”, as TICs acabam por se transformar num elemento adicional de atração de migrantes. (BECKER, 1975; ARAGONÉS & SALGADO, 2011). A autora Ursula Huws (2003, 2008)2 argumenta que o

desenvolvimento das chamadas tecnologias da informação “traz consigo, em teoria, a possibilidade de uma radical reestruturação nos postos de trabalho relacionados ao processamento de informações”. (HUWS, 2003, 2008). Dessa forma, segundo a autora, “pode haver uma transformação na desigual divisão do trabalho, existente entre países desenvolvidos e em desenvolvimento”. (HUWS, 2003, 2008). Assim, continua Huws (2003, 2008), “É mais provável que nós estejamos assistindo a uma crescente centralização do controle dessa nova tecnologia e sua utilização como um instrumento de dominação, ao invés de tornar-se uma forma de libertação”. (HUWS, 2003, 2008).

2 O capítulo quarto do livro de Ursula Huws – The Making of a Cybertariat: Virtual work in a real world. New

York, Monthly Review Press, 2003, p.56-60 – intitulado de “The Global Office: Information Technology and the Relocation of White Collar Work” traduzido pela Revista Tempos Históricos se baseia no texto que foi originalmente escrito para uma conferência organizada pelo “Greater London Council”. As fontes que sustentam as questões e os argumentos nele apresentados foram levantadas por volta de 1982. Portanto, o advento da internet ainda não era um recurso popularizado. (HUWS, 2008).

Referências

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