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JONLANG-CRIANDOATEORIADAARQUITETURA-CAP.8

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CRIANDO TEORIA DA

ARQUITETURA:

(a) PARTE 2.1: TEORIA SUBSTANTIVA – O AMBIENTE E

O COMPORTAMENTO HUMANO; (b) PREÂMBULO:

CONCEITOS FUNDAMENTAIS DO AMBIENTE E DO

COMPORTAMENTO HUMANO; (c) CAPÍTULO 8: A

NATUREZA DO AMBIENTE

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JON LANG

TRADUÇÃO DE FREDERICO FLÓSCULO PINHEIRO BARRETO

TEORIA SUBSTANTIVA

O AMBIENTE E O COMPORTAMENTO HUMANO

Por Teoria Substantiva da arquitetura devemos compreender as descrições e explicações da natureza física do ambiente construído – seus materiais e sua estrutura – e o que esse ambiente abre de possibilidades à apropriação pelos organismos. Desenvolveremos uma apreciação desse importante segmento da teoria do projeto ambiental no plano desta obra, seguindo o diagrama abaixo:

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Introdução à Parte 2.1, “TEORIA SUBSTANTIVA”, O Ambiente e o

Comportamento Humano; CONCEITOS FUNDAMENTAIS SOBRE AMBIENTE E

COMPORTAMENTO HUMANO; Capítulo 8 (A Natureza do Ambiente) do livro CREATING ARCHITECTURAL THEORY: THE ROLE OF THE BEHAVIORAL SCIENCES IN THE ENVIRONMENTAL DESIGN, de JON LANG (Primeira edição: Van Nostrand Reinhold Company Inc., Nova York, 1987, pp. 73-83).

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ORIENTAÇÃO TEÓRICA TEMÁTICA TEÓRICA Positiva Normativa Procedimentos Parte 2 Capítulos 4-7 Substantiva Parte 2 Capítulos 8-19 Parte 3

O principal interesse desta obra é dirigido à contribuição que as ciências comportamentais nos oferecem, como projetistas: ou seja, tratamos do interesse de se ver os propósitos das pessoas sendo servidos pelo ambiente construído, mais do que com as questões de sua configuração através de materiais ou em termos de sua geometria.

O modelo tradicional dos interesses da arquitetura é aquele que foi explicitado por Vitruvius – modelo que ainda fundamenta boa parte da organização da práxis profissional, e no qual não deixaremos de nos apoiar aqui. Desse ponto de vista há pelo menos duas preocupações que são básicas a todo e qualquer projeto: sua componente funcional e sua componente estética – a primeira a buscar o abrigo para as nossas atividades, e a segunda, uma forma que nos dê prazer. É um comentário já bastante ouvido o que a funcionalidade e a beleza não podem ser considerados aspectos mutuamente exclusivos num projeto. Tanto há funcionalidade na beleza quanto beleza na funcionalidade. Para que entendamos de forma mais profunda o papel desempenhado pelo ambiente construído nas vidas das pessoas, no entanto, precisamos ter um conhecimento básico acerca da natureza do ambiente e da natureza do comportamento humano. Nós temos hoje uma compreensão muito mais rica e mais sistemática desses dois assuntos do que era disponível aos arquitetos modernistas, nas primeiras décadas – até meados - do século 20. Há, quanto a isso, uma posição normativa colocada neste livro: temos que usar esse conhecimento. A discussão acerca de uma teoria positiva da arquitetura é dividida em 3 componentes: (a) Conceitos Fundamentais do Ambiente e do Comportamento Humano; (2) Padrões de Atividades e o Ambiente Construído; (3) Valores Estéticos e o Ambiente Construído.

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CONCEITOS FUNDAMENTAIS DO AMBIENTE E DO

COMPORTAMENTO HUMANO

É fundamental para a compreensão do papel do ambiente construído na vida das pessoas que tenhamos clareza sobre o significado de “ambiente”. O atributo-chave de qualquer definição conhecida é que o ambiente “envolve” (Gibbson, 1966; Ittelson, 1973). Desse modo, qualquer definição, descrição ou explicação acerca da natureza e do funcionamento do ambiente deve fazer referência a algo que envolve e a algo que é envolvido. De particular interesse para nós é “aquilo que envolve” as pessoas em um nível ecológico – o nível do comportamento humano cotidiano. Tal descrição é feita adiante, no Capítulo 8, “A Natureza do Ambiente”. O ponto básico a ser locado é o de que os “arredores” das pessoas consistem, largamente, em componentes planetários, animados, sociais e culturais. Cada um desses amplos conjuntos afeta a vida das pessoas e a natureza de suas atitudes acerca do ambiente construído, assim como as suas expectativas do que possa vir pelas mãos de projetistas. O que os arquitetos concebem pode ser compreendido como ambiente potencial para o comportamento humano; o que as pessoas usam e apreciam é o ambiente efetivo. O papel que uma teoria positiva terá para as práticas profissionais do projeto é o de aprimorar a habilidade dos projetistas quanto a predizer como será o ambiente efetivo das pessoas, a partir do momento em que o ambiente construído é concebido – em potencial – em um determinado padrão.

Qualquer descrição ecologicamente válida acerca do ambiente humano fará alguma referência ao comportamento humano – o que examinamos melhor no Capítulo 8. Essas referências são aprofundadas um pouco mais no Capítulo 9, “Processos Fundamentais do Comportamento Humano”. O objetivo desses capítulos não é resumir tudo o que se sabe sobre o comportamento humano, mas busca-se uma compreensão da relação entre o comportamento espacial e os processos de motivação, percepção, cognição e afeição, de modo a que os projetistas se tornem mais aptos a estruturar ambientes que satisfaçam às atividades humanas e aos valores estéticos das pessoas. Um dos problemas presentes no esforço de apresentar um programa de investigações

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suficientemente claro acerca da natureza do comportamento humano é que há teorias bem diferentes – e algumas vezes mutuamente exclusivas – acerca do mesmo fenômeno.

Os arquitetos têm certa reputação quanto a se aterem a uma dada teoria, a aceitarem essa teoria como se fosse factual, a aderirem a ela com fidelidade, e a desenvolverem uma posição normativa com base nela – ou, alternativamente, a usá-la para racionalizar um determinado preconceito que possuem. A aceitação da teoria da Gestalt e as teorias sociológicas de Mueller Lyer, na Bauhaus, são exemplo disso. Os arquitetos são forçados a tomar decisões, mas eles devem estar atentos ao fato de que atuam com uma grande margem de desconhecimento, e de que apesar de ser necessário decidir com base em uma ou outra teoria – ou se ver apoiando um ou outro ponto de vista teórico -, os arquitetos sempre operam com uma margem de incerteza. As conclusões a que se chega nessas circunstâncias devem ser mantidas com reserva e suficiente abertura para que possam ser refinadas e se exponham à refutação.

Com uma compreensão básica da natureza do ambiente e da natureza do comportamento humano, é possível desenvolver um quadro de referências teóricas e um conjunto de conceitos que esclareçam as relações entre comportamento e ambiente – especialmente quanto à atual ideologia do determinismo arquitetônico. Esse esforço é desenvolvido no Capítulo 10, “O Ambiente Construído e o Comportamento Humano”.

Esses três capítulos, nessa parte do livro, oferecem a base necessária para que desenvolvamos um modelo de teoria substantiva para o projeto ambiental. Está implícita nos capítulos uma demonstração de que as teorias existentes acerca do comportamento humano podem iluminar as preocupações dos projetos de interiores, de arquitetura, de paisagismo, e de desenho urbano.

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CAPÍTULO 8

A NATUREZA DO AMBIENTE

A palavra ambiente é amplamente utilizada na atualidade, e de um modo tão livre e desenvolto que acaba por gerar certa confusão acerca do que realmente está sendo discutido. Um geógrafo pode estar se referindo às grandes regiões continentais ou a aspectos do clima; um psicólogo pode estar se referindo às pessoas, suas personalidades e relacionamento; um sociólogo pode estar se referindo às organizações sociais e seus processos de controle; um arquiteto pode estar se referindo a conjuntos arquitetônicos, a edifícios, a paisagens. Qualquer que seja a categorização, ela depende crucialmente do propósito a que serve (Porteous, 1977).

Alguns estudiosos fazem distinções entre os ambientes físicos, os sociais, os

psicológicos, e os comportamentais. Os ambientes físicos consistem dos elementos

geográficos, terrestres, à nossa volta; os ambientes sociais consistem nas relações e organizações dos grupos, entre pessoas, entre instituições e organizações; os ambientes psicológicos consistem nas imagens que as pessoas mantêm em suas cabeças; os ambientes comportamentais daqueles elementos a que a pessoa atende, usa, ativa, e responde cotidianamente. O aspecto básico de tal classificação – e de outras assemelhadas – é a diferenciação que se quer fazer entre o mundo real, atual ou objetivo, que circunda um indivíduo, e o mundo fenomenológico que é percebido e que conscientemente ou inconscientemente afeta os padrões de comportamento e as respostas emocionais desse indivíduo.

Essa distinção tem uma história que pode ser traçada desde (pelo menos) a teoria da Gestalt. Kurt Koffka (1935) fez uma diferenciação entre o ambiente geográfico e o ambiente comportamental. O ambiente geográfico a que se referiu dizia a respeito Às

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circunstâncias objetivas – ao que realmente estava em torno de um indivíduo, como se podia verificar. O ambiente comportamental consistiria na imagem cognitiva do ambiente objetivo, e que seria a base para seu comportamento. Outros (como Lewin, 1951; Kirk, 1963; Gans, 1968) fizerem uma distinção similar, apesar de usarem terminologias diferentes. Kirk fez uma diferenciação entre o ambiente fenomênico (termo introduzido por Lewin) e o ambiente pessoal. Nesse caso, o ambiente pessoal consiste nas imagens pessoais do mundo (componentes comportamentais) e o conjunto de crenças e de atitudes perante essas imagens e seus referentes (o componente da experiência pessoal). C. Douglas Porteous (1977), influenciado por Lewin e por Kirk, adicionou o “ambiente contextual” aos conceitos de ambiente fenomênicos e pessoais. Escreve Porteous:

“As crenças, as atitudes, as preferências, e outros atributos da personalidade,

derivam tão-somente do indivíduo, mas são amplamente coloridas por suas experiências como um membro de uma família, de uma etnia, de uma classe social, de grupos culturais, nacionais ou de estilo de vida”.

O objetivo desses esquemas de categorização é oferecer um quadro de referência para aquelas coisas que impactam as nossas vidas. Todos esses esquemas reconhecem a existência de um ambiente potencial, aberto ao comportamento, à atividade, ao uso, a alguma forma de interação, e um ambiente efetivo, aquele que usamos e que tem a nossa atenção (Gibson, 1966; Gans, 1968).

Este capítulo discute a natureza do ambiente potencial. Ele focaliza o mundo à nossa volta. É importante lembrar que todos nós criamos uma “imagem mental” do mundo que nos circunda, e que essa imagem varia de pessoa para pessoa, pois ela não corresponde à “realidade”. O modelo do ambiente que aqui apresentamos também é uma abstração, uma imagem dada.

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O AMBIENTE

Os cientistas naturais fizeram um grande número de observações que devem ser do interesse daqueles que estudam e desenvolvem a teoria do projeto. Uma delas é a de que os organismos estão ligados em uma complexa de rede de relacionamentos. Uma segunda é a de que todos os organismos, sejam os animados ou os inanimados, são afetados por forças internas e externas; e uma terceira é a de que todos eles podem adaptar-se a uma ampla variedade dessas forças. Em resposta às demandas e agitações, aos choques e privações a que são eventualmente submetidos em seu ambiente, alguns organismos mostram-se capazes de adaptar-se a algumas dessas forças. Para que compreendamos as forças externas aos organismos é necessário estudo da natureza do mundo fenomênico – aquele que “é tal como nos aparece”.

Há algumas generalizações que podemos fazer, com alguma segurança, acerca do mundo fenomênico. A vida, tal como a conhecemos, parece ter se desenvolvido apenas em nosso planeta, que possui qualidades tais que parecem poder sustentá-la. Os mais diferentes organismos encontraram nichos, espaços e recursos para manter-se no nosso planeta. Observe que o ambiente de qualquer desses organismos também consiste de outros organismos, alguns da sua mesma espécie, outros não. Por isso podemos dizer que o ambiente de qualquer indivíduo humano consiste igualmente de um componente

animal, ou, estendendo isso, social. Ainda mais: para nós humanos, a vida é parte de

uma cultura e existe em meio a uma ambiente cultural, cultivado.

É possível destacar diferenças entre os componentes do ambiente de outras maneiras, mas esse modelo descritivo – desenvolvido por James J. Gibson (1966) nos dá condições para fazermos afirmações muito claras acerca da natureza do nosso ambiente construído (ou artificial, se preferirmos). Esse modelo nos dá uma interessante fundamentação para que compreendamos o ambiente onde nos formamos e onde passamos todas as nossas vidas – e como o ambiente pode nos proporcionar o alcance de algumas coisas e de outras, não.

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O AMBIENTE DO PLANETA – OU GEOGRÁFICO

Os arquitetos, os paisagistas e os urbanistas usam o termo ambiente físico para se referirem aos aspectos que não são estritamente sociais ou culturais de nossos arredores. As edificações, assim como os elementos do clima, são ordinariamente incluídas nessa definição – o que a faz perder consideravelmente a sua precisão. O ambiente do planeta, terrestrial, em contraste, parece se referir apenas à natureza da Terra e aos seus abrangentes e poderosos processos. É importante compreender esses processos, pois com a exceção de nossas ainda preliminares explorações do espaço extra-terrestre – e na superfície da Lua – o ambiente humano está totalmente definido pelo planeta Terra. Assim, o ambiente construído por nós corresponde a adaptações que vimos fazendo ao ambiente do planeta Terra.

Todas as formas de vida existem em contextos geográficos definidos. Algumas coisas são constantes em toda a Terra, mas outras coisas variam. A gravidade existe por toda a parte, mas a distribuição dos montes e elevações, dos vales e depressões, das florestas e outras formas de vegetação, assim como das massas de água, dos lagos e mares, variam enormemente. Algumas áreas são mais férteis que outras. A disposição dessas características, em quaisquer locais que consideremos, oferece diferentes possibilidades para diferentes pessoas, e essa tensão exerceu enorme influência sobre o que as pessoas fazem com cada lugar. Alguns aspectos do ambiente exercem um severo controle sobre o comportamento humano. O planeta Terra gira em torno de seu eixo, e move-se em torno do Sol, o que resulta em ciclos diários e de estações. Toda a vida foi circunstanciada por esses ciclos. Algumas áreas são desconfortavelmente quentes para alguns de nós; outras são insuportavelmente frias para outros – a maioria, talvez. Algumas áreas do planeta podem sustentar a vida de alguns organismos, outras, não. Apesar de nós humanos termos desenvolvido formas de reduzir apreciavelmente os efeitos dessas condições ambientais, elas permanecem centrais ao desenvolvimento da vida e ao cotidiano de espécies como a nossa, especialmente ao desenvolvimento de nossos sistemas culturais (Vayda, 1969).

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O ambiente do nosso planeta consiste de componentes sólidos, líquidos e gasosos. A rigidez e a relativa permanência do ambiente sólido permitem que animais – inclusive os animais humanos – movam-se de um lugar para outro, que se orientem em seu deslocamento (o que nunca impediu que muitas vezes se perdessem completamente). Os materiais da Terra podem e têm sido recompostos e manipulados pelos humanos e por outros animais, deles produzindo materiais artificiais (von Frisch, 1974). Os humanos construíram obras que modificaram a superfície de planeta em larga escala, novas configurações de sua topografia foram criadas pelo trabalho humano, levando-nos a obter o melhor proveito que podemos, satisfazendo algumas de nossas mais poderosas e prementes necessidades – e mesmo ampliando o nosso impulso ambulatório e explorador, por estradas para toda a parte. Usamos, em tudo isso, materiais orgânicos e inorgânicos, presentes naturalmente e aproveitados ou produzidos especialmente para cada uso.

A radiação do Sol tem as mais importantes conseqüências para a vida. Ela regula o processo de fotossíntese e o ciclo do dióxido de carbono, que são poderosos requisitos para a sustentação da vida humana e para o ciclo nutricional dos animais. Há pelo menos um aspecto da radiação solar que é de central importância para a vida – e para o projeto ambiental: a luz. E ainda assim parece que não compreendemos bem do que se trata.

LUZ

Há muitas descrições acerca dos comprimentos de onda que se situam nessa faixa de energia radiante que chamamos luz. Essas descrições são interessantes para os físicos, mas irrelevantes para os projetistas. Por outro lado, o estudo da luz desde um ponto de vista ecológico é de direto interesse para as profissões do projeto, pois a luz é uma das variáveis do projeto.

Há dois tipos fundamentais de luz: a radiante e a ambiente. Os objetos incandescentes – como o Sol ou as lâmpadas – emitem luz radiante, que atravessam diferentes meios, que exercem diferentes graus de interferência sobre essa passagem. A

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luz radiante atravessa o vácuo sem interferência; atravessa gases com pouca interferência; com uma maior interferência atravessa materiais translúcidos – e com total interferência os materiais opacos. Esses materiais são opacos por definição, é assim que se comportam: absorvem parte da luz incidente e refletem o restante, a depender da natureza de sua superfície. A natureza da reflexão revela a distribuição da pigmentação (dada pela distribuição de partículas e outras estruturas internas) e a sensação de cor, dessa superfície. Já a luz ambiente consiste de luz refletida pelas superfícies e que chegam a um dado objeto, e aos nossos olhos ou câmeras. Sua qualidade de luz natural varia ao longo do dia e das estações, bem como do modo pelo qual as fontes de luz radiante e as superfícies que recebem essa luz estão dispostas. Apenas as superfícies que estejam diretamente expostas à luz radiante podem recebê-la; todas as demais superfícies recebem a luz difundida pelo céu ou refletida desde outras superfícies.

A percepção, seja da luz ou de outro estímulo, é o processo fisiológico e psicológico de obtenção de informação do ambiente. A pessoa que não seja cega obtém informação visual sobre o mundo quase inteiramente através da luz ambiente. Há outros tipos de informação cedida pelo ambiente, tal como os sons, os cheiros, as vibrações, as correntes de ar, as texturas de superfície, sua temperatura, tal como as pessoas cegas sabem e utilizam (Brodey, 1959). Os projetistas não são especialmente sensíveis a toda essa gama de formas de percepção, e uma das razões para que essa sua sensibilidade não se expresse sistematicamente se dá pelo meio de sua comunicação, necessariamente restritivo e simplificador: o desenho (ver, quanto a isso, a argumentação de Rasmussen, 1959). Essa afirmação, evidentemente, acaba por ter um conteúdo de normatividade !

INFORMAÇÃO AMBIENTAL NÃO-VISUAL

Além do fluxo de luz, a atmosfera da Terra permite a transmissão de vibrações e a transmissão de substâncias voláteis. A luz nos permite ver, as vibrações nos permitem ouvir, a difusão de substâncias voláteis nos permite sentir odores – claro, caso o nosso organismo possua os receptores qualificados, apropriados. O movimento do ar não afeta a transmissão da luz, mas afeta a transmissão do som e dos odores.

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A luz e o som propagam-se em ondas. As ondas de luz propagam-se linearmente, mas o som em formas concêntricas, e os cheiros dispersam-se aos ventos. Sons e cheiros podem dispersar-se envolvendo obstáculos, de um modo que a luz radiante não pode fazer. A luz é refletida pelas superfícies do planeta e é difundida pelas partículas de poeira em suspensão na atmosfera. Os sons podem ecoar, em certa medida, em espaços fechados ou parcialmente fechados, mas não reverbera como a luz, nem pode atravessar o vácuo. Os sons são causados por uma grande variedade de eventos mecânicos, tais como colisões, explosões, fricção, rupturas, rolagens, etc. A sucessão de ondas que resulta de tais eventos é específica do evento, produz e combina ondas de uma forma característica: somos capazes de diferenciar essas combinações; as pessoas reconhecem um conjunto muito maior de sons e de suas prováveis causas do que os físicos até hoje foram capazes de descrever.

Eventos químicos liberam substâncias voláteis, o que faz com que a composição do ar varie de lugar para lugar. Diferentes organismos possuem diferentes habilidades, e o que eles conseguem perceber tende a ser (após milhões de anos de seleção natural) os tipos de informação cruciais para a sua sobrevivência. Alguns odores são prazerosos para os seres humanos, de forma inata; outros são repulsivos. Alguns odores nos levam a fazer, mentalmente, prazerosas associações; outros nos levam a associações não-prazerosas. Nós aprendemos a diferenciar entre essas percepções, pois essa habilidade é crucial para a nossa sobrevivência. Nossas vidas estariam em risco sem essa capacidade de discriminar entre os estímulos. Assim como os sons, os odores são afetados pelo movimento do ar, mas a intensidade e a natureza de um odor também guardam a especificidade de sua fonte. Os seres humanos não são especialmente hábeis quanto a distinguir odores, ou a percebê-los, mas a nossa habilidade cotidiana com relação a determinados grupos de odores parece ser aceitável.

Outra fonte de estímulo ambiental para os animais consiste no contacto mecânico com o ambiente. Os seres humanos aprendem a realizar diferenciações entre um grande número de interações mecânicas (esticar, premer, cortar, rolar, torcer, dobrar, inflar, furar, romper, encaixar, soldar, etc.), assim como entre os atributos do ambiente que causam, na pele e nos músculos, algum tipo de deformação. De modo similar, as

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pessoas têm a habilidade de detectar diferenças de temperatura dentro entre determinados níveis e intensidade, entre frio e quente, embora a diferenciação entre as fontes de calor e de frio possam depender um pouco dos sentidos da visão, da audição e do olfato.

O ambiente da superfície do nosso planeta, o ambiente terrestre, é a fonte de quase todas as experiências perceptuais humanas, da luz ambiente e radiante, do calor, de sons, de odores, de contatos mecânicos. O modo pelo qual os projetistas estruturam o ambiente afeta todas essas percepções. Em especial, também afeta um outro tipo de estímulo: o estímulo social que advém dos outros animais.

O AMBIENTE ANIMADO

O ambiente ocupado pelos seres humanos também contém outros animais. Alguns desses animais que hospedamos, com que convivemos, possuem um considerável controle de suas próprias vidas e de sua parcela de ambiente, assim como controlam o grau de estímulo que recebem e oferecem aos demais animais, inclusive os humanos. O grau de controle varia, e embora o ambiente considerado aqui seja marcadamente controlado pelos seres humanos, devemos enfatizar que não podemos evitar – e em larga medida, dependemos de – esse convívio.

Os seres humanos são fonte de muitos estímulos simultâneos. Nós provocamos estímulos sonoros, visuais, químicos, térmicos, mecânicos, para as outras pessoas, para os outros animais, para todo o mundo à nossa volta. Afora toda essa atividade humana, bem poucos animais conseguem estimular os demais através do controle da luz ou de corrente de eletricidade. A natureza, a potência, a combinação de estímulos que cada animal é capaz de evidenciar é única para cada espécie, assim como seus objetivos, o que querem atingir através desses recursos - e que possibilidades de controle do ambiente esses recursos lhe permitem alcançar. As relações que os seres humanos mantêm entre si são de especial importância para que compreendamos os padrões de estímulos com que nos organizamos e que operamos nossas atividades, e parece ser uma direção promissora para a pesquisa aplicada ao projeto ambiental.

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ESTÍMULOS E INTERAÇÕES SOCIAIS

Adaptações naturais favoráveis possibilitaram a algumas espécies a sobrevivência negada a outras. A sobrevivência também foi fortalecida, em alguns casos, pela cooperação e convívio não-agressivo entre algumas espécies. Há, nesses casos, um relacionamento social entre diferentes espécies. Isso é particularmente observável entre os mamíferos – e entre os humanos.

As relações sociais dependem de estímulos sociais, onde um determinado padrão de respostas pode tornar-se o estímulo para uma outra resposta. Pelo menos dois animais devem estar envolvidos – embora haja padrões que envolvem grupos consideravelmente grandes. O comportamento social é um ingrediente básico da vida para todas as espécies, mas é muito elaborado entre os humanos. O laço (loop) comportamental das interações sociais tanto serve a finalidades instrumentais quanto simbólicas.

Essas finalidades ou propósitos, por sua vez, permitem que uma variedade de necessidades seja satisfeita. Os enlaces comportamentais são muito complexos, e somente há bem pouco tempo, com o desenvolvimento das ciências comportamentais, têm sido submetidos a escrutínio cuidadosos, sistemático – apesar de os romancistas, poetas, artistas terem mostrado ardente interesses nesse tema há tempos. A extensão da influência que a configuração do ambiente – e os materiais que o compõem – tem sobre os canais de comunicação entre os membros dos enlaces comportamentais [intra- e

entre- espécies] é análoga à extensão em que o ambiente construído afeta os processos

sociais humanos.

As pessoas se comunicam entre si através de sua presença, de toques e de sons, de expressões faciais e da linguagem corporal - e mesmo através de odores. Suas declarações acerca do mundo, acerca de outras pessoas, acerca de suas emoções, são comunicadas dessas maneiras. De particular importância para os humanos é o uso da palavra, a fala, a oração. A fala permite que uma pessoa atraia e mantenha dirigida para

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si a atenção das outras pessoas – assim como para eventos do ambiente, para fatos atuais, do passado ou para suas especulações e suas idéias invisíveis, suas abstrações. A escrita permite um passo além. As pessoas também se comunicam umas com as outras através de artefatos, inclusive os edifícios que as abriga, cerca, circunstancia (Rapoport, 1982).

O SISTEMA SOCIAL

Muitos animais, mas os humanos em particular, agem no interior de um sistema social. Um sistema social consiste em um conjunto de indivíduos que, direta ou indiretamente, interagem regularmente para o alcance de objetivos específicos. O ambiente de qualquer pessoa consiste de um bom número de sistemas sociais. Dentro de cada um desses sistemas, há algumas expectativas compartilhadas por seus participantes, acerca dos papéis e comportamentos de seus membros. Os papéis dos indivíduos refletem as normas do sistema social.

Está implícito no conceito de “sistemas” a noção de que uma mudança numa parte afetará a outra parte. Portanto, as mudanças em um comportamento individual podem resultar em mudanças no sistema social – e vice-versa. As mudanças que ocorram num determinado nível de um sistema devem também levar a mudanças em outros níveis. Para que sobreviva, cada sistema deve desempenhar determinadas funções: ele deve recrutar novos membros, ensinar a eles as normas do sistema, deve lidar com ameaças internas e externas, com os conflitos que incidam sobre o sistema.

Sistemas sociais dependem de processos de comunicação para que sobrevivam. As normas de funcionamento e comportamento, os papéis desempenhados, os processos de comunicação são coisas aprendidas; eles variam de cultura para cultura. O comportamento humano não pode ser compreendido sem se fazer referência a um seu sistema social e à sua cultura, assim como sem referência ao seu ambiente físico – seja na escala geográfica, seja na escala física mais próxima de suas ações cotidianas. Isso é verdadeiro para as pessoas em geral, como também é verdadeiro para os arquitetos, para os paisagistas, para os urbanistas e para os demais projetistas que são membros dessa

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pequenina sub-cultura profissional do projeto físico ambiental (e membros da cultura social maior, que os acolhe). Os membros dessa sub-cultura partilham alguns valores, apesar de também portarem valores bem diferentes em outros assuntos.

O AMBIENTE CULTURAL

Não há distinções claras entre os ambientes terrestres (no sentido geográfico), animado, e cultural, na vida cotidiana, pois a cultura se desenvolve a partir das oportunidades naturais, dos interesses humanos, e de suas competências. Uma das características da história é que as pessoas migraram de uma parte para outra do mundo levando consigo muitos aspectos de sua própria cultura, de modo que as culturas apresentam mesclas, havendo tantas partes do mundo que são o resultado de um grande fluxo, acumulação e convívio de heranças culturais, vindas de situações anteriores, em todas as escalas imagináveis.

Nossas crenças e atitudes acerca de outras pessoas, acerca do ambiente terrestre, de nossos papéis na sociedade, das formas com que conduzimos nossas atividades cotidianas são partes de nossa cultura. Escrever, pintar, construir são formas de comunicar idéias acerca da sociedade, e são ligadas à cultura. São formas de estímulo artificial, e de informação sobre o mundo. A história das pessoas pode, assim, ser traçada a partir dos artefatos que elas criaram.

“O ser humano é reconhecido por seus artefatos, ele é um artesão, um artífice,

um operário das artes, um artista, um criador de arte... A origem das pinturas e esculturas pode ser datada com uma boa margem de confiança. Teve início há cerca de 20.000 a 30.000 anos atrás... A escrita pode ser datada de forma ainda mais exata, dado que a história se inicia com registros escritos. Ela começa em torno de 5.000 a 6.000 anos atrás.” (Gibson, 1966)

As normas culturais são transmitidas de uma geração para a seguinte através do processo de socialização. A lealdade a esses costumes depende das percepções dos custos e dos benefícios envolvidos. Há um considerável debate acerca da natureza

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desses processos – como veremos no próximo capítulo. Enquanto a linguagem, as ações, e os simbólicos, são meios para a educação cultural, muitos comportamentos são aprendidos através da experiência direta, sem a oferta de benefícios ou a imposição de custos, de forma aberta, segundo alguns psicólogos.

Devemos também lembrar que os indivíduos pertencentes a uma dada cultura não se comportam, todos, do mesmo modo. Há sempre algum padrão de desvio da norma. Assim, nem todos os membros da mesma cultura respondem, atentam, interagem, se ocupam, das mesmas coisas em seu ambiente. Nem todas as oportunidades para a ação são percebidas pelos indivíduos - tampouco as oportunidades percebidas são aproveitadas. O ambiente é rico em possibilidades (affordances) para o comportamento; o conjunto dessas possibilidades que é usado por uma dada sociedade pode ser dito como característico de sua cultura, dos valores e necessidades individuais. O conceito de possibilidades ou potenciais de ação (affordances) proporcionados pelo ambiente terrestre, social e cultural, é de crucial importância, central ao debate mantido por este trabalho. A seguir perscrutaremos esse conceito.

OS POTENCIAIS (AFFORDANCES) DO AMBIENTE2

A frase “apresentar-se como possível” / “possibilitar-se” / “prover-se” / “habilitar-se” (to afford) já foi usada em outras partes deste trabalho. (Trata-se de palavra comum na língua inglesa: AFFORD; já a palavra AFFORDANCE não aparece em nenhum dicionário. Ela foi criada pelo psicólogo James J. Gibson, em 1979). As possibilidades (affordances) de algo, seja esse “algo” material ou imaterial, são propriedades que se oferecem e que são reconhecidas ou percebidas ao se realizarem, e que dizem respeito ao modo como esse “algo” é usado (ou ainda como se comporta, como se manifesta) por uma pessoa, por um animal, em um modo específico, previsível, passível de repetição ou verificação. As propriedades que interessaram a Gibson foram, em especial, as propriedades físicas, das configurações de um objeto ou de uma situação

2

NOTA DO AUTOR: Partes dessa discussão foram previamente publicadas. Ver Jon Lang, “The Built Environment and Social Behavior: Architecture Determinism Re-Examined”, VIA IV, Cambridge, Mass.: MIT Press, 1980, pp. 146-153.

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localizada (setting), que permitam o seu uso ou usufruto, através de atividade observável, à vista. Também de pode falar de affordances relativas a significados – significados que podem ser produzidos / atingidos / reconhecidos em determinadas condições demarcadas, verificáveis – ou a valores estéticos – como uma possibilidade de julgamento, digamos, do caráter de beleza, sublimidade, feiúra, etc., que, em determinadas condições, se pode alcançar.

Algumas coisas são alcançadas / disponibilizadas através de objetos ou pelo ambiente – seja ele considerado “terrestre”, “animado”, ou “cultural” – de uma forma mais direta e fácil que outras coisas; algumas atividades e/ou interpretações são alcançadas / disponibilizadas por (ou para) algumas pessoas e não para outras devido a aspectos físicos específicos, a aspectos da configuração do ambiente construído. O ponto básico que aqui se toca, é o de que affordances de uma situação física determinada são elementos / características / propriedades / formas que ela oferece como potencial de interação – “para o bem ou para o mal” de quem quer que as perceba como algo com que se pode interagir, usar; essa interação pode ser entendida como a busca, por uma pessoa imersa na situação, de experimentar uma determinada parte do mundo físico, algo que lhe parece possível de experimento, num determinado ambiente em que se encontra; é uma interação que se dá em face aos objetos do mundo. Essa oferta é condicionada por sua forma, por sua localização (relativa a outros objetos e situações), seus materiais, seu comportamento, ou dos materiais de que é feito. O arquiteto Louis Kahn usou o termo disponibilidades (availabilities) nesse sentido, e o paisagista Lancelot Brown usou o termo capacidade (capabilities) em sentido análogo.

O conceito de affordance é tão simples quanto poderoso. É fundamental para a teoria do projeto ambiental. Diferentes padrões do ambiente construído permitem / possibilitam (afford) diferentes comportamentos, e diferentes experiências estéticas. As

affordances do ambiente, desse modo, limitam ou estendem as escolhas

comportamentais das pessoas, e dependem crucialmente de como o ambiente é configurado. As pessoas mudam e não param de mudar os ambientes natural e artificial, em busca de alterar o conjunto de affordances que possuem. Evidentemente os edifícios

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são um subconjunto dessas mudanças [não são apenas influenciados de forma externa, incidental: são uma forma de promover e manipular affordances, essa é sua natureza].

O conceito de affordance relaciona-se a alguns conceitos anteriores (Gibson, 1979). Koffka (1935) sugere que os objetos possuem uma qualidade de demanda, de

convite ao uso. Uma caixa de correio “se oferta” para que as pessoas as usem,

depositando nelas as suas correspondências; um banco de praça “se presta” a que as pessoas descansem um pouco neles [e todos os seus arborizados arredores, a tranqüilidade dos espaços em volta conspirarão para esse silencioso convite] – ou, nos termos propostos por Louis Khan, “um tijolo quer ser um arco”. Gibson remonta o conceito até os escritos de Kurt Lewin, quando ele se referia à qualidade de

Aufforderungscharakter dos objetos. Esse termo foi traduzido ora por “qualidade do

convite ao uso”, ora como “valência” [valence, que na linguagem dos psicólogos de língua inglesa significa “a atração ou aversão que um indivíduo sente face a um objeto ou a um evento”]. No entanto, Lewin usou esse termo de um modo diferente daquele empregado por Gibson no conceito de affordance.

Lewin acreditava que a valência de um objeto era algo atribuído pelos valores e necessidades de cada pessoa que o considerava. Assim, a valência varia com cada percebedor, varia com as mudanças em seus valores e interesses. Ou seja: ao mesmo tempo em que um objeto não muda, e suas affordances não mudam, a sua utilidade, o seu valor, a sua representação tal como é operada por cada pessoa pode mudar significativamente com seus interesses e necessidades. O objeto, de acordo com Gibson, oferece “o que oferece” porque “é o que é”. Se um observador, um potencial usuário reconhece ou não suas affordances, isso depende crucialmente da natureza do observador, de sua experiência, de suas competências, de suas necessidades. As pessoas aprendem o que podem fazer com os objetos, como podem servir-lhes, como lhes podem ser úteis, prazerosos, estimulantes, ou incômodos, etc.; aprendem várias coisas acerca das affordances dos objetos que as cercam, do ambiente e dos momentos em que é culturalmente apropriado fazer uso desses objetos e elementos do ambiente. O que é importante – como Lewin reconheceu - é entender que o ambiente está repleto de oportunidades, e de limitações e perigos, devido às suas características.

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O AMBIENTE CONSTRUÍDO

O ambientes construído é parte dos ambientes terrestre e cultural. O que nos preocupa aqui é o entendimento do ambiente como uma parte do habitat dos seres humanos, apesar de muitos dos conceitos que vimos discutindo ao longo deste trabalho podem ser estendidos de forma a incluírem os ambientes artificiais criados por outros animais, por pássaros, por répteis, por insetos, por peixes (von Frisch, 1974). O ambiente arquitetural consiste no arranjo artificial de diferentes superfícies de diferentes materiais com diferentes características quanto aos seus pigmentos / texturas / iluminação / graus de transparência ou transluscência, dos espaços entre eles, de suas posições. As variáveis essenciais do projeto assumem essa natureza.

O ambiente construído deve ser compreendido aqui como o conjunto de adaptações que as pessoas fizeram em seus ambientes terrestre e cultural. O modo como as pessoas estruturam as superfícies do mundo em torno delas afeta todas as interações entre elas e o ambiente terrestre. Há mudança nos padrões de calor e luz, nos sons e nos odores, no contato mecânico que cada pessoa experiência no mundo físico. Num certo sentido, essa estruturação altera – ou resulta de alterações de – os ambientes social e cultural das pessoas. Qualquer mudança no ambiente construído irá alterar os potenciais de uso e exploração (affordances) do mundo.

As propriedades do ambiente são alteradas para que novas atividades tenham espaço, ganhem probabilidade (afford), assim como novas experiências estéticas – e ainda que as “velhas” experiências estéticas sejam reapresentadas, experienciadas de uma forma nova, ainda que sutilmente inovadas. Gibson (1966) nota que:

“As pessoas pavimentaram e alinharam as sólidas superfícies de seus ambientes, alteraram a vegetação, fizeram seus caminhos, subdividiram os espaços antes naturais, eliminaram os perigos, criaram ilhas de luz durante a noite, criaram ilhas de conforto para os dias e estações desfavoráveis... de forma ainda mais impactante, as pessoas inundaram o ambiente com formas, com sons e padrões visíveis a todos, mas que somente têm sentido para os iniciados, para si mesmas.”

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Figura 8-1 – O Conceito de Affordance.

Qualquer ambiente construído possui um conjunto de possibilidades e potenciais para atividades humanas ocorram de forma mais ou menos apropriada, para que determinadas experiências estéticas sejam vividas. Escadas e rampas dão ingresso a ambientes edificados, uma facilitando acesso por pessoas sem dificuldades de locomoção, outras permitindo o acesso a pessoas em cadeiras de rodas – e também facilitando o acesso de ciclistas. Outros edifícios oferecem deliberadamente as suas formas para criar uma vívida experiência estética, que é interpretada de muitas maneiras, a depender do conhecimento do observador acerca das intenções do arquiteto autor desse projeto, e de outras associações que se veja compelido a fazer. Áreas residenciais “tradicionais” possuem uma variedade de potenciais de uso, abrindo possibilidades para o convívio e controle do espaço público de um modo crucial para as vidas de seus moradores; seu abrigo, sua identidade, sua privacidade, seu controle territorial, entre muitos aspectos de uma longa lista de demandas e ofertas intensamente trocadas pelas pessoas ao longo de sua experiência de uso dos espaços

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que construíram. Ao mesmo tempo, esses ambientes residenciais não proporcionam tantas possibilidades de identidade individual ou de controle territorial quanto ocorre mais facilmente em casas unifamiliares construídas em lotes isolados.

Essas mudanças foram feitas de modo que os ambientes terrestre, animado e cultural sirvam melhor aos propósitos dos indivíduos ou grupos. As mudanças refletem as crenças ou atitudes, bem como os recursos que se tem num certo momento, e são cruciais para que padrões a serem considerados no futuro sejam gerados. Não é raro que todos lucrem com as mudanças – às custas de outros que nela investiram, que as conceberam; não é raro que benefícios imediatos, soluções para o momento, resultem em prejuízos ou perdas, no longo prazo. Nesse caso, todos podem perder. A ideologia do Movimento Modernista trouxe muitos benefícios, mas – se aceitarmos por um momento as análises de seus críticos -, também acarretou em muitos prejuízos (ver Jacobs, 1961, Blake, 1974, Brolin, 1976).

MUDANÇA CONSCIENTE / MUDANÇA SEM AUTO-CONSCIÊNCIA

Algumas mudanças no ambiente construído resultam de processos naturais – resultam da ação do vento, da chuva, da insolação, até mesmo de violentas ocorrências como as erupções vulcânicas. As mudanças que ocorrem no ambiente construído e que as pessoas iniciam resultam de dois processos – ou de uma mistura de ambos. Podem resultar de adaptação – a denominada mudança adaptativa -, que é incremental e sem auto-consciência, ou de mudanças auto-conscientes, planejadas (ver, acerca disso, Alexander, 1964, e Broadbent, 1973). A mudança planejada envolve a tomada de decisão de fazer mudanças, e um projeto ou delineamento da natureza das mudanças a serem feitas, antes de se tentar fazê-las. Qualquer que seja o caminho das mudanças, o propósito geral é alterar o potencial de uso, as possibilidades de ação – the affordance – do ambiente. Os arquitetos de interiores, os arquitetos de edificações, os urbanistas, os paisagistas, entre outros, assumiram diferentes papéis sociais ao serem incumbidos e ao lançarem padrões de mudança auto-consciente.

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OS POTENCIAIS (AFFORDANCES) DO AMBIENTE CONSTRUÍDO

A composição do ambiente construído torna possível uma variedade de coisas ao usuário (em potencial). Torna possível sua estimulação visual; também permite sua estimulação auditiva / sônica, e olfativa. Se uma pessoa... come o que lhe é colocado ao alcance, temos aí, sem dúvida, ainda outra forma de estímulo. Além de estímulos como esse, o ambiente construído permite que ocorra um diversidade de coisas que dão suporte a determinados comportamentos – e que restringem outros. A lista de possibilidades é infindável.

Uma lista preliminar, no entanto, de categorias de potenciais de estímulo / uso / fruição (affordance) que nos são proporcionados pelas edificações e por objetos artificiais, criados e dispostos por nós, pode oferecer um amostra da ampla variabilidade que existe, que pode ser constatada – ou descoberta. No nível mais simples, a superfície pavimentada, tão plana e horizontal quanto possível, permite que andemos com facilidade. Algumas superfícies são diferentes de outras, mais escorregadias, e permitem deslizar, outras mais ásperas e impedem que derrapemos. As superfícies são combinadas: verticais, inclinadas, horizontais, em construções que abrigam contra as intempéries, que permitem a privacidade, o ocultamento, a segurança que as pessoas podem requerer, assim como lugares para que permaneçam juntas, para que se encontrem com outras pessoas – ou as evitem, em determinados momentos. Essas seriam possibilidades básicas para a apropriação do espaço construído por usuários

expertos e usuários em aprendizado. Se adequadamente configurados para que formem

objetos específicos, as composições dessas superfícies sólidas / visuais podem lograr o alcance de utilidades como brinquedos, instrumentos, máquinas. Elas podem lograr a leitura de significados e associações entre significados, a partir de elementos visuais tais como os signos e símbolos gráficos / icônicos. Algumas dessas possibilidades (affordances) podem ser percebidas apenas por membros de uma cultura, a expertos ou a pessoas em aprendizado; podem ser invisíveis ou passarem desapercebidas por não-iniciados. Outras são percebidas universalmente.

Os potenciais de apropriação do ambiente construído são uma propriedade de sua configuração, dos materiais de que é formado, do modo como é iluminado, ou como seu acesso é restrito, privilégio de um grupo determinado de pessoas. Em termos dos

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significados mais concretos – como, por exemplo, a percepção que se tem da profundidade das coisas – o reconhecimento dos potenciais de apropriação (affordances) do ambiente parece ser uma função da própria natureza biológica das pessoas; já no nível simbólico, os potenciais de apropriação (affordances) são função das convenções sociais e da experiência das pessoas. Nesse nível, o que seja esse potencial de apropriação, é dependente do processo de socialização que a pessoa atravessa para que se torne parte de uma dada cultura. Na medida em que os potenciais de apropriação são, sobretudo, uma função das características individuais e de grupo, e das motivações humanas, os processos fundamentais do comportamento humano devem ser descritos em maior detalhe que o apresentado aqui. Uma descrição mais rica deve nos proporcionar uma compreensão mais rica do ambiente construído e dos propósitos a que serve, às pessoas.

LEITURAS ADICIONAIS

Fitch, James Marston. American Building 2: The Environmental Forces that

Shape It. Nova York: Schocken, 1972.

Gibson, James J. “The Environment as a Source of Stimulation”. Em: The

Senses Considered as Perceptual Systems. Boston: Houghton Mifflin, 1966. pp. 7– 30.

Porteous, J. Douglas. “Environments”. Em: Environment and Behavior. Reading, Mass.: Addison-Wesley, 1977. pp. 133-147.

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PLANO DA TRADUÇÃO (NEGADO) PARA A REVISTA ELETRÔNICA “PARANOÁ” da FAUUnB - São 22 (vinte e duas) “apostilas”, capítulo a capítulo do livro, com o agrupamento das introduções a cada uma das Partes e seções do livro, e seus respectivos capítulos iniciais. A presente “apostila” é mostrada em vermelho, contra o conjunto das demais “apostilas”. Com isso se pretende que o livro Creating Architectural Theory, de Jon Lang, possa servir como livro texto em disciplina sobre teoria da arquitetura e do projeto. A tradução foi autorizada pelo próprio Jon Lang, em 2000, mas a Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UnB, negou espaço para divulgar esse trabalho. Uma parte da Academia é destrutiva do que a outra faz, e vice-versa.

Prefácio

PARTE 1. O MOVIMENTO MODERNO, TEORIA DA ARQUITETURA E AS CIÊNCIAS SOCIAIS 1.O Legado do Movimento Moderno

2.A Natureza e Utilidade da Teoria

3.As Ciências Comportamentais e a Teoria Arquitetônica

PARTE 2. TEORIA ARQUITETÔNICA EXPLÍCITA: Conceitos de Práxis e Conceitos de Ambiente TEORIA DE PROCEDIMENTOS

Metodologia de Projeto

4.Modelos de Práxis do Projeto Ambiental

5.Atividades de Inteligência e a Fase de Inteligência

6. Projetação e a Fase do Projeto

7. Decisão e a Fase da Decisão

TEORIA SUBSTANTIVA

O Ambiente e o Comportamento Humano

CONCEITOS FUNDAMENTAIS SOBRE AMBIENTE E COMPORTAMENTO HUMANO 8.A Natureza do Ambiente

9.Processos Fundamentais do Comportamento Humano

10.O Ambiente Construído e o Comportamento Humano

PADRÕES DE ATIVIDADES E O AMBIENTE CONSTRUÍDO

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12.Antropometria e Ergonomia

13.Mapas Espaciais e Comportamento Espacial

14.Privacidade, Territorialidade e Espaço Pessoal – Teoria Proxêmica

15.Interação Social e o Ambiente Construído

16.Organização Social e o Ambiente Construído

VALORES ESTÉTICOS E O AMBIENTE CONSTRUÍDO 17.Teoria Estética

18.Estética Formal

19.Estética Simbólica

PARTE 3. TEORIA NORMATIVA DO PROJETO AMBIENTAL Polêmica e Prática

20.Compreendendo as Teorias Normativas do Projeto Ambiental

21.Questões Sócio-Físicas Contemporâneas no Projeto Ambiental – Uma Instância Normativa

Referências

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