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Um caso de sindrôma cerebelo-labirintico de origem sifilitica

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N.° 72

Um caso

de síndroma cerebelo-labïrintico

de origem sifilitica

Monografia clinica elaborada no serviço da 2.a clinica medica

Tese de doutoramento apresentada í

A

Faculdade de Medicina do Porto

SETEMBRO DE 1920

PORTO

I M P R E N S A P O R T U G U E Z A 112, Rua Formosa, 112

(2)

Fernando Carlos

N.° 72

Um caso

de sindrôma cerebelo-labirintico

de origem sifilitica

Monografia clinica elaborada no serviço da 2.a clinica medica

Tese de doutoramento apresentada á

Facnidade de Medicina do Porto

SETEMBRO DE 1920

PORTO

I M P R E N S A P O R T U G U E Z A 112, Rua Formosa, 112

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DIRECTOR

Maximiano Augusío de Oliceira J3emos

SECRETARIO

Abaro Teixeira Basíos

CORPO DOCENTE , ~ Professores ordinários

Clinica medica Tiago Augusto d'Almeida, Patologia medica Alfredo da Rocha Pereira. Anatomia descritiva . 7 . 7 . 7 Joaquim Alberto Pires de Lima, Histologia e embriologia . . . . Abel de Lima Salazar. Fisiologia geral e especial . . . . Antonio de Almeida Qarrett. Farmacologia José de Oliveira Lima. Patologia geral ' Alberto Pereira Pinto de Aguiar. Anatomia patológica Augusto Henrique de Almeida Brandão. Bacteriologia e parasitologia . . . Carlos Faria Moreira Ramalhão. Higiene João Lopes da Silva Martins Junior.. Medicina legal Manuel Lourenço Gomes.

Medicina operatória e pequena cirurgia. Antonio Joaquim de Sousa Junior. Patologia cirúrgica . . . Carlos Alberto de Lima. Clinica cirúrgica Álvaro Teixeira Bastos.

Terapêutica geral José Alfredo Mendes de Magalhães. Clinica obstétrica. Vaga (1).

Historia da medicina e deontologia

m e (jic a Maximiano Augusto de Oliveira Lemos.

Dermatologia e sifiligrafia . . . . Luiz de Freitas Viegas.

Psiquiatria Antonio de Sousa Magalhães e Lemos. Pediatria Vaga (2).

Professores jubilados

José Andrade Oramaxo . . ) ^ c a ( e d r a t i c û s,

Pedro Augusto Dias . . . )

A Faculdade não responde pelas doutrinas expendidas na dissertação (art. 15.o § 2.0 do Regulamento privativo da Faculdade de Medicina do Porto, de 3 de Janeiro de 1920).

(4)

á msmoRsa

de

e de

Iy\eus f\vós

(5)

A miuip AYÓ

Com muita amizade e dedicação.

A M E U S I R M Ã O S

A IKEUS TIOS E TIAS

e e m especial

A meus fios ARTUR e JOSÉ MARIA

e

A ffilKHA HXADRIKHA

Como prova de grande amizade e profunda

gratidão. •

(6)

flos irieíis çondisçiplilos, çoníernporaneos

e arrçigos

e s p e c i a l m e n t e a

».

Com um abraço de despedida.

AOS MEUS COMPANHEIROS DE REPUBLICA

Dr. João Ferreira Guedes Dr. Anibal Scipião G. de Carvalho Ulisses da Silva Canijo

Gonçalo, Luiz, Roberto e Antonio Carlos Guedes Antonio Augusto Custodio Fernandes

Fausto José dos Santos Junior Antonio Cassiano Ferreira de Melo

Com utft adeus muito saudoso.

(7)

DA

Faculdade de Medicina do Porto

AO MEU ILUSTRÍSSIMO PRESIDENTE DE TESE

Dr. Tiago flíigiisfo de Almeida

Homenagem dû seu discípulo.

(8)

Observação do doente á entrada no hospital

B. S. R., natural de Lamego, solteiro, de 29 anos de idade, e residente nesta cidade do Porto, entrou para a sala de Nossa Senhora da Conceição, de clinica medica, em 17 de novembro de 1919. Nesta ocasião o doente apresentava uma sintomatologia muito inte-ressante que passo a descrever.

Anamnesticos

B. S. R. dizia sentir uma zoeira cons-tante á volta do ouvido esquerdo, que ele comparava ao ruido que faz a chuva quando fustigada por um vento forte. Comtudo esse ruido que tanto o incomodava, e que vi-nha já de ha tempos para cá, não apresen-tava já aquela intensidade com que o aco-meteu quando da sua aparição. Esta zoeira apresentava dois máximos por dia: um pela manhã, ao despertar, que passado algum tempo, depois que o doente se levantava para ir para a sua sapataria, diminuia

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consi-deravelmente ; o outro sobrevinha-lhe de noite, depois que o doente adormecia, e que

o fazia despertar obrigando-o a algumas

horas de vigilia. ^

O doente queixava-se além disso de sur-dez completa do lado direito, datando já desde os três anos, e do ouvido esquerdo de ter a audição enfraquecida. Dizia mais, que ainda não diferenciava muito bem os sons. Quando ouvia tocar uma banda ou uma orquestra, não sabia extremar todos os instrumentos e todas as notas (sic). Conta que aprendeu a tocar benjolim douvido, mas que tendo tentado tocar algumas musicas que tinha aprendido, lhe era impossível fa-zê-lo por não poder distinguir os sons que tirava quando feria as cordas.

Sintomas objectivos

Aparelho da audição. O exame a este

apa-relho feito com os exíguos meios de que a enfermaria dispõe, deu os seguintes resulta-dos : surdez completa do lado direito (provas do relógio e diapasão negativas) e surdez parcial do lado esquerdo explorado pelas mesmas provas. O relógio colocado na parte media da fronte só era sentido pelo ouvido esquerdo.

(10)

9

Aparelho da olfacção. Anosmia na narina

direita que o doente diz ser já muito antiga.

^Aparelho da visão. Nada se notou de

anor-mal neste- aparelho. Não havia nistagmo expontâneo, quer procurado pelo método ordinário, (na excursão lateral extrema dos globos oculares), quer pelo processo de Weil.

Aparelho da gustação. Estava integro.

*

* *

Pelo exame físico notava-se que a face era assimétrica, a metade direita sendo mais cavada e com os sulcos menos aparentes do que a esquerda. A cabeça estava sempre na-turalmente inclinada sobre o ombro direito.

Pelo exame funcional notou-se: i.°) que o dinamometro primido sucessivamente na mão direita e na mão esquerda dava os seguintes resultados: para a mão direita 17,17 e para a

esquerda 22,22; 2.0) os movimentos activos

estavam conservados e os passivos faziam-se

normalmente; 3.0) executava um certo

nu-mero de movimentos coordenados, como por exemplo, levar a extremidade do indica-dor á ponta do nariz com os olhos fecha-dos, abrir a boca e fechar os olhos simulta-neamente, etc.

(11)

O estudo dos equilíbrios volicionais está-tico e dinâmico era muito interessante. Veja-mos primeiramente o equilíbrio volicional estático.

O doente estando na posição de «sen-tido» dos militares, o corpo entrava em osci-lações laterais que aumentavam gradualmente e que em pouco tempo o obrigavam a sair dessa posição. Com os pés juntos pelos seus bordos internos o desequilíbrio era ainda mais acentuado. A oclusão dos olhos nesta posição aumentava-o consideravelmente (sinal de Romberg). Era-lhe impossível sustentar-se num pé só.

Pelo exame do equilíbrio volicional ci-nético via-se o seguinte: O doente mar-chava normalmente e em linha recta, mas desde que se mandava fazer «alto» ou dar «meia volta» repentinamente, perdia ime-diatamente o equilíbrio, fazia grandes es-forços para não cair, entrando-lhe os pés em trepidação epileptoide. A marcha com os olhos fechados era-lhe completamente impos-sível, e a marcha de flanco era-lhe muito difí-cil, hesitante, e ao cabo de poucos passos os pés mostravam-se em trepidação epileptoide. Este fenómeno apresentava-se com mais niti-dez na marcha lateral esquerda. Era-lhe im-possível subir ou descer escadas.

(12)

Mandando-11

lhe fazer um pequeno movimento rotatório á volta dum pé, perdia o equilibrio rapida-mente, sendo necessário ampará-lo para não cair. Depois do doente estar uns minutos com a cabeça pendente sobre o solo, man-dando-lhe deflecti-la sentia vertigens. O tonus muscular era normal.'Não apresentava verti-gens expontâneas, diadococinesia, tremulo em repouso e tremulo intencional, perturba-ções da escrita e da palavra, assinergia mus-cular e hipermetria. Oferecia bem nitida a catalepsia cerebelosa.

Do estudo dos reflexos neste doente viu-se que:

Plantares estavam diminuídos Cremasterianos diminuídos,

sendo essa diminuição mais sensível á direita

Abdominais inferiores aboli-dos

Nos membros superiores nor-mais

Rotulianos muito aumenta-~ a .. ] dos, principalmente do

Os reflexos tendinosos < r ,

lado esquerdo

Aquilianos aumentados, so-bretudo também do lado esquerdo

Os reflexos cutâneos

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Os reflexos pupilares á luz e acomodação normais.

A sensibilidade á dôr e sentido de logar normais. A sensibilidade ao frio ligeiramente retardada nos membros inferiores e a sensi-bilidade ao calor consideravelmente retardada nas mesmas regiões. A sensibilidade óssea, explorada com o diapasão, assim como a percepção estereognostica estavam integras. O mesmo acontecia aos esfincteres anal e vesical. Apresentava micropoliadenia inguinal e axilar.

O i.° ruido no foco mitral era duro e desdobrado. A auscultação no foco aórtico mostrava os mesmos caracteres para o i.°

ruido encontrados no foco mitral, e o 2.0

ruido era também rude.

A reacção de Wassermann no sangue, feita poucos dias depois do seu internato, foi foi fortemente positiva.

Antecedentes pessoais

Aos três anos, segundo informações que lhe forneceu a Mãe, teve um ataque (menin-gite?) do qual ficou paresiado do membro superior direito e surdo por completo do ouvido do mesmo lado. Ainda hoje os seus serviços profissionais que requesitam um

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'13

maior dispêndio de energia e um trabalho mais demorado, como seja por exemplo, o engraixar, são executados com a mão es­ querda. Aos oito anos foi atropelado por um carro de cavalos; ficou muito maltratado por esse acidente, conservando ainda hoje uma cicatriz junto do. sulco naso­geniano esquerdo e uma assimetria facial a que já me referi. Aos nove anos teve escrófulas que chegaram

á caseificação e que lhe. deixaram cicatrizes

junto do gonion esquerdo, e aos dez anos teve a erisipela na face. Mais tarde, na adolescên­ cia, foi presa duma blenorragia.

Antecedentes hereditários

O Pai sofria de reumatismo e foi victi­ mado em 1918 pela gripe pneumónica. A Mãe é viva e o doente diz que ela tem tido amiu­ dadas vêses ataques epileticos, e que os mes­ mos ataques se repetem numa irmã dela. Dos Avós nada se consegue apurar porque o doente os não conheceu. Tem oito irmãos vivos, que são fortes e saudáveis, e quatro morreram: um poucos dias depois do seu nascimento, outro aos quatro anos, uma irmã morreu dum parto e um outro irmão com trinta e cinco anos.

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Historia da doença

Em princípios de abril de 1917 apareceu-lhe uma solução de continuidade ao nivel da parte superior do prepúcio, após um coito suspeito. Chamado um clinico da localidade diagnosticou um cancro duro, e mandou-lhe fazer cauterisações com nitrato de prata se-guidas de pulvilhações de iodoformio. Em-quanto fazia este tratamento sobreveio-lhe uma adenite inguinal do lado direito que não chegou á supuração. Depois de resolvida esta adenite e passados dois meses sobre a data da aquisição daquele cancro venéreo, surgiu-lhe uma faringite que foi tratada com gargarejos de agua oxigenada e injecções endovenosas dum sal de mercúrio. Foi inter-nado depois no hospital de Lamego onde continuou com o uso das injecções e lhe substituíram o gargarejo de agua oxigenada por outro de clorato de potássio.

Pouco tempo depois teve novas manifes-tações anginosas.

Em dezembro de 1918 fizeram-lhe a apli-cação de três injecções de 914. Em março do ano seguinte apareceram-lhe vómitos, verti-gens em pé e mesmo deitado, perturbações dequilibrio, a marcha sendo em zig-zag,

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cam-15 baleando como um ébrio. Depois de nova consulta medica fizeram-lhe umas injecções intra-musculares de benzoato de mercúrio. No dia em que tomava a segunda injecção ficou surdo completamente, sendo necessário escrevêr-lhe as palavras para ele poder enten-der-se com as pessoas que dele se acercavam. Concomitantemente com esta surdez apare-ceram-lhe halucinações auditivas (sensação de sinos a tocar, ruido dejDeneiros dos padeiros, etc.) e uma zoeira á volta do ouvido esquerdo de que ainda hoje se queixa.

Ao fim de nove meses, com o tratamento apropriado, começou a ouvir ligeiramente, mas sem perceber bem as palavras (surdez verbal) quasi só entendendo as pessoas que lhe falavam pelo mexer dos lábios. Quanto mais alto lhe falavam mènes ouvia. Só em Junho de 1919 é que ele começou a recor-dar-se do significado das palavras, mas ainda não as percebia a todas nem extremava bem os sons. As halucinações, vertigens e vómitos desapareceram-lhe com o tratamento, da marcha melhorou consideravelmente, mas como a zoeira do ouvido persistisse resolveu vir a esta cidade consultar um oto-rino-larin-gologista que o aconselhou a internar-se neste hospital.

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(2-2-20)

Este doente que apresentava a sintomato-logia descrita precedentemente quando entrou para esta enfermaria, com o tratamento a que esteve sugeito, e a que adeante me referirei, experimentou melhoras notáveis.

A zoeira que o atormentava, e de que ele tanto se queixava, diminuiu consideravel-mente. Todos os dias de noite acordava entre a meia noite e a uma hora com aquela zoeira intensificada que o obrigava á vigília durante duas a três horas, á qual se sucedia um sono leve até ao despertar da manhã com este ruido segunda vez exasperado. Levantava-se da cama, fazia a toilette, e depois de andar a pé algum tempo, a zoeira diminuía, conservan-do-se assim mais suportável até á meia noite ou uma hora da noite seguinte. Este sintoma, subjectivo sentiu-se agravado quando o doente

fazia a 2.a e 3,11 injecções de benzoato de

mer-cúrio a que ele esteve sugeito.

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17

Com a continuação do uso deste medica­ mento a zoeira voltou novamente a diminuir, sentindo depois o doente sempre progressivas melhoras. As perturbações dequilibrio persis­ ­ tiam ainda mas mais atenuadas. Em pé e pa­ rado, sustentando­se pelos membros inferio­ res com os calcanhares ou bordos internos •dos pés unidos, o doente mantinha­se em equilíbrio desde que tivesse os olhos abertos. O mesmo já não acontecia quando se susten­ tava num pé só ou se se lhe mandava fechar os

olhos. Neste ultimo caso o sinal de Romberg aparecia mas menos ruidosamente. Na mar­ cha com os olhos abertos, mandando­lhe dar «meia volta» ou fazer «alto», o doente ainda perdia o equilibrio, mas os esforços que fazia para não cair já não eram tão violentos como anteriormente e os pés não entravam em tre­ pidação epileptoide. O mesmo acontecia com

a marcha de flanco. ♦

O estado dos reflexos e da sensibilidade mantinha­se.

A audição do ouvido esquerdo estava um pouco melhorada. A olfacção do lado direito não apresentava variações.

O doente sentado.numa cadeira rotatoria em movimento, tendo previamente fechado os olhos,, não notava que esta se movia. O exame dos ouvidos feito pelo senhor

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dr. Teixeira Lopes mostrou haver dupla o;ite media catarral crónica e lesão que compro-metia totalmente o aparelho de recepção ou as suas vias do lado direito, e lesão compro-metendo parcialmente o aparelho de recepção ou as suas vias do lado esquerdo. O catete-rismo das trompas de Eustáquio melhorou ligeiramente a audição do lado esquerdo.

Observação actual

Como o doente reside nesta cidade, pro-porcionou-se-me o ensejo de o poder estudar novamente. Convidado a um novo exame, ao que ele muito amavelmente acedeu, B.S.R. diz que a zoeira persiste ainda mas muito ligeira,, muito menos incomodativa do que na ocasião em que abandonou o hospital, permitindo-lhe já trabalhar, o que dantes não conseguia. Apresenta ainda as mesmas variantes de intensidade. Diz ouvir muito melhor e que extrema já muito bem os sons que ouve. In-vestigando-lhe a sua sintomatologia objectiva, eu vi que ele já se mantém perfeitamente na posição de «sentido» dos militares e mesmo mandando-lhe unir os bordos internos dos pés. Com os olhos fechados nesta posição tem umas leves oscilações laterais de pequena amplitude. Com os olhos abertos, para adquirir

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19

o equili-brio estático num pé só ainda faz alguns esforços para o conseguir.

Mandando-lhe fazer o mesmo exercício com os olhos fechados, se se sustenta no pé esquerdo cai para a esquerda, e se se sustenta no pé direito tem tendência a cair para a direita. Com os pés juntos pôde deflectir o tronco sobre a bacia sem perda do equilíbrio, e o mesmo acontece mandando o doente colocar-se na posição de «cócoras».

Fazendo-o marchar em linha recta e man-dando-lhe fazer um «alto» repentino, o doente já não perde o equilíbrio nem os pés entram em trepidação epileptoide. A marcha com os olhos fechados é incerta e aos zig-zags. A mar-cha de flanco é levemente hesitante. Ao subir escadas o doente ainda vacila levemente.

A prova de Holmes-Stwart feita nesta ocasião foi positiva.

A prova do balouço dos braços e o «Worbeizeigen» de Barany foram negativas. A prova de Babinski-Weil deu um resultado nitidamente positivo. As provas de Weil, sobre os desvios inscritos, foram, negativas. Um novo exame dos ouvidos feito pelo senhor dr. Teixeira Lopes mostrou haver ligeiras melhoras acústicas do lado esquerdo.

A catalepsia cerebelosa já se não encontra presentemente.

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Os reflexos aquilianos e patelares estão apenas ligeiramente exagerados e o clonus do pé já não existe.

Foi-lha feita uma punção lombar, para o exame do liquido cefalo-raquidiano, pelo Prof, senhor dr. Rocha Pereira. O boletim da analise do laboratório do Prof. Alberto de . Aguiar diz assim :

«Certifico que o liquido cefalo-raquidiano perten-cente ao antigo doente de clinica medica, snr. B. S. R., colhido pelo colega Rocha Pereira revelou a analise :

Exame fisico:

Aspecto e côr—liquido límpido e incolor. Sedimento — quasi nulo.

Volume — 4,5 cc.

Tensão—16 cm deitado (Claude).

Exame químico:

Albumina —por litro —0,850 gramas.

Exame citologico :

Numero de células por m m3 — 8,2.

Formula —linfocitos e algumas células em des-truição.

Exame biológico: _

Reacção Wassermann absolutamente negativa. Idem no sangue colhido na mesma ocasião.

Conclusões:

Albuminose e linfocitose pequenas, mas manifes-tas e R. Wa absolutamente negativa, tanto no liquido raquidiano como no sangue.

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21

afecção orgânica do sistema nervoso central,

harmo-nisando-se com a hipótese de etiologia sifilitica e de evolução regressiva do processo sob a influencia terapêutica anteriormente instituída segundo infor-mações».

Diagnostico

Pela leitura das observações precedentes facilmente se verifica que os sintomas que dominam a patologia deste doente estão dependentes do cerebelo e do labirinto es-querdo. Refiro-me, está bem visto, ás per-turbações sobrevindas apoz a aquesição do cancro venéreo, e quando falo de labirinto não me refiro apenas ao que anatomicamente se denomina labirinto, mas também ás fibras nervosas que daí emanam para os centros do mesocefalo, medula e cérebro, visto que as lesões desses conductores originam também

o "síndroma labiríntico. ,

Ha estreitas relações anatómicas que ligam o cerebelo ao labirinto não coclear. É no ves-tíbulo e canais semicirculares que terminam os dehdritos das células do ganglio de Scarpa. Por seu turno estas células enviam os seus cilinder-eixos que justapondo-se for-mam o feixe vestibular do auditivo. Em breve este feixe junta-se a outro vindo do

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caracol para formar o tronco nervoso do nervo auditivo.

Á sua chegada ao bolbo os feixes consti-tuitivos deste nervo voltam a separar-se e, impropriamente chamados raizes do auditivo, seguem destinos diferentes. A raiz vestibular, penetrando na fossêta lateral do bolbo, divi-de-se em dois feixes: um que vai terminar no bolbo; e outro que, por arborisações livres, termina á volta dos dendritos das células dos núcleos de Deiters, dorsal interno e Bechte-rew. Destes núcleos partem por seu turno cilinder-eixos que, atravessando o pedúnculo cerebeloso inferior, terminam nos núcleos do tecto, globuloso e embolus. Destes nú-cleos outras fibras saem pondo o labirinto em relação com outras regiões do nevraxe, mas que para o nosso caso pouco importam. Vê-se portanto que o vestibulo e canais semi-circulares estão anatomicamente ligados ao cerebelo.

*

Para que um individuo possa manter-se em equilibrio estático e cinético, necessário é que as impressões tácteis, quineticas, visuais, e labirínticas chegando ao mesocefalo aí deem origem a movimentos reflexos

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deter-23

minados, e adequados a esse fim. Destas impressões, aquelas para as quais agora a nossa atenção mais se dirige, são as impres-sões vindas dos canais semi-circulares e ves-tíbulo, que não tendo função nenhuma na audição, são apenas considerados como ór-gãos estato-receptores dessas impressões.

São estas impressões recebidas pelos canais, semi-circulares que, depois de Cyon, servem á formação da noção que temos de espaço, e Doniseli disse que, «se os canais semi-circu-lares nos orientam no espaço, o caracol da-nos a noção do tempo, da medida, do nu-mero. De forma que o labirinto é o órgão •dos sentidos matemáticos, encontrando-se

nele justapostos, o órgão do sentido geomé-trico e o órgão do sentido aritmético».

O papel fisiológico do cerebelò tem sido muito discutido. Fazendo a ablação parcial do •cerebelò a alguns animais, Flourens, depois de •os observar, concluiu que este órgão era o que presidia á coordenação dos movimentos. Mas as suas experiências eram passíveis de critica, visto que os animais morriam pouco tempo depois da operação a que eram sujeitos, não

(25)

se sabendo bem se os fenómenos observados eram devidos a excitação da parte restante ou á extirpação.

Luciani, dentro das suas experiências, vendo que um cão, a que tinha feito a ablação total do cerebelo, colocado sobre o solo não podia sustentar-se em pé nem marchar, mas que lançado á agua conseguia nadar, conven-ceu-se de que o cerebelo não era propria-mente, o órgão coordenador dos movimentos.

Os animais descerebelados por Luciani, a principio apresentavam dismetria, oscilações do corpo, marcha em zig-zag, ataxia (que a oclusão dos olhos não aumentava), mas passado algum tempo todos estes fenómenos desapareciam gradualmente, persistindo ape-nas a ataxia, porque o cerebelo era funcional-mente substituído pelo cortex

sensitivo-mo-tor, como Luciani pôde demonstrar, (porque

fazendo a ablação simultânea deste e do cere-belo todas aquelas perturbações persistiam). Daqui concluiu este autor que o cerebelo não é indispensável ao equilíbrio e segundo a sua opinião seria um órgão de reforço do eixo cerebro-espinal cuja ablação produz astenia^ atonia e abasia. Para A. Thomas o cerebelo seria um centro reflexo do equilíbrio. Ba-binski diz ser o cerebelo um órgão de contrôle sobre os movimentos voluntários. Com estas,.

(26)

p

muitas outras teorias, como a de Sherington, Mills, etc., tentam explicar a fisiologia deste órgão, mas ela ainda não está seguramente assente, os autores não estando completa­ mente de acordo (Wilson e Pike).

O cerebelo contém, segundo os estudos modernos, centros para o tonus muscular, que a experimentação fisiológica, auxiliada pelos dados da clinica teem conseguido loca­ lizar. E esse tonus é em parte dependente das excitações vindas do labirinto.

Tudo isto vinha para dizer que, se o cere­ belo está anatomicamente ligado ao labirinto, também o não deixa de estar fisiologicamente. Assim melhor se poderá compreender a comunidade de sintomas nas lesões destes dois órgãos.

*

* *

São três os sintomas comuns ás lesões do cerebelo e do labirinto: o nistagmo, a vertigem e a ataxia. Por isso os autores teem­se esforçado em procurar outros sinais que possam fazer o diagnostico diferencial.

Babinski no xvn Congresso de Londres, referindo­se ao sindrôma cerebeloso disse que, para bem o patentear e diferenciar do sindrôma labiríntico, em face dos sintomas

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comuns, era preciso que os doentes exterio-risassem outros sinais como a hipermetria, assinergia muscular, diadococinesia, pertur-bações 3a escrita e da palavra, ataxia, atonia e catalepsia cerebelosa.

E dentro desses sintomas comuns haverá algumas particularidades que façam inclinar - o nosso espirito para uma lesão do labirinto

ou do cerebelo? Ha.

Assim a ataxia labiríntica, contrariamente á cerebelosa, é acompanhada do sinal de Romberg; na vertigem dos labirínticos a aparente rotação do corpo é sempre na dire-cção da fase rápida do nistagmo. Pelo" que respeita á rotação dos objectos os auctores não estão ainda de acordo, mas a opinião mais verosímil é a de Holt que diz que o movimento é contrario á rotação do corpo (Wilson e Pike).

Além disso o nistagmo cerebeloso é ata-xico, uniforme na direcção, oscilatório e aumenta com a fixação.

Este doente não apresentava nistagmo expontâneo nem provocado pelas excitações calóricas e giratórias.

Das vertigens não se lembra dos "seus caracteres subjectivos.

Mas apresentava o sinal de Romberg que faz depender a sua ataxia do labirinto. A prova

(28)

27

de Babinski-Weil e a prova da cadeira girató-ria, a surdez, as halucinações e a zoeira vêem por seu turno confirmar o ataque labiríntico. Mas o doente apresentava outros sinto-mas de que se não pode culpar este órgão.

A catalepsia cerebelosa e a positividade da reacção de Holmes-Stwart são sinais que são próprios unicamente das doenças do cerebelo.

Desde já poderei portanto afirmar, pela analise dos seus principais sintomas, que o doente apresentava o síndroma eerebelo

labirín-tico. •

Mas onde localisar a lesão ou lesões? Este diagnostico topográfico é um pro-blema muito delicado e que oferece algumas duvidas.

Quatro hipóteses se poderão discutir:

i.a — lesão única do cerebelo.

2."'—lesão única interessando só o labi-rinto, o labirinto e as suas vias ou somente o nervo auditivo.

3.a — concomitância duma lesão em foco

do cerebelo e doutra no labirinto, ou no labi-rinto e nas suas vias, ou só nas suas vias.

4.a—lesão a distancia em qualquer outro

ponto do encefalo.

Examinemos em primeiro logar a ultima hipótese.

(29)

Sabido é que as lesões tendo a sua sede em qualquer região do encefalo podem ma-nifestar-se por perturbações cerebelosas e labi-rínticas pelo mecanismo da compressão (Ba-rany).

Será este o nosso caso ? Não me parece ser visto que, aparte umas ligeiras perturbações de reflectividade e da sensibilidade, e que de resto se poderão explicar por uma forma mais verosímil, o doente não exteriorisou outros sintomas que não coubessem dentro do sín-droma cerebelo-labirintico,

Além disso a intensidade e a persistência destes sintomas não se coaduna com uma lesão a distancia.

Será toda a sua doença causada por uma lesão única no cerebelo?

Também me não parece provável porque, para que uma lesão isolada do cerebelo com-prometesse tão ruidosa e predominantemente durante tanto tempo, as vias labirínticas, ne-cessário seria que essa lesão fosse volumosa, o que se não conforma muito com a pobrêsa do síndroma cerebeloso (apesar de haver tumores do cerebelo, por vezes enormes, que se não exteriorisam por nenhum sintoma). "

Resta portanto referir-me ás 2.a e 3.*

hipóteses. (Se nelas junto a possibilidade de a lesão estar no labirinto, no labirinto e suas

(30)

29

vias, ou só nas suas vias é porque os sinto-mas apresentados pelo labirinto são os mes-mos que se encontram nas suas vias quando um ou outro adoece).

O diagnostico diferencial entre estas duas hipóteses restantes parece-me impossível com os dados colhidos nas observações. Só a abla-ção das partes supostas doentes (de que feliz-mente o doente se livrou graças ao trata-mento) e consecutivo exame histológico é que duma maneira certa nos poderia decidir no diagnostico.

O inicio das suas perturbações por vómi-tos, marcha em zig-zag, (já haveria o sinal de Romberg?), e vertigens (seriam labirínticas?, cerebelosas?), só mais tarde aparecendo a surdez, as haluçinações auditivas e a zoeira, faz lembrar que o labirinto ou as suas vias foram atacados depois de o ter sido já o cerebelo. Neste caso a hipótese de duas lesões em foco distinctas seria perfeitamente acei-tável. Um exame cuidadoso naquela ocasião talvez resolvesse as duvidas que agora existem.

Por outro lado a 2.a hipótese formulada

também se poderia justificar:

i.° —pela ausência de nistagmo calórico, que é um sinal constante nas lesões únicas e isoladas do nervo auditivo e que só falta

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2.° — pela persistência e predominância do sindrôma labirintico. ,

3.0 — pela pobrêsa do sindrôma

cere-beloso.

Inclino-me portanto a aceitar esta ultima hipótese como sendo a mais provável, não deixando comtudo de confessar que ela não assenta numa base solida e indestructivel.

Diagnostico etiológico

Para completar este capitulo do diagnos-tico, resta apenas investigar qual a causa de todos estes padecimentos. Fácil é encontrá-la — a sífilis.

E para justificar esta afirmação eu apre-sento os seguintes argumentos: i.°) o doente em 1917 contraiu um cancro

ve-néreo; 2.0) a seguir a este cancro teve uma

adenite inguinal que não supurou; 3.0)

pas-sado pouco tempo uma faringite, que

de-pois se repetiu; 4.0) a micropoliadenia

in-guinal e axilar; 5.0) o facto de ser a sua

reacção de Wassermann fortemente positiva quando o doente foi internado; 6.°) os ruidos

cardíacos eram duros, vibrantes; 7.0) as

me-lhoras sentidas pelo doente com o uso do tratamento anti-sifilitico ; 8.°) o aparecimento da reacção de Herxheimer (quando o doente

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31

sentiu a zoeira intensificada ao tomar a 2.a e

3-a injecção de benzoato de mercúrio.

Atenta a sua hereditariedade nevropatica não é para estranhar que a sífilis atacasse tão forte e precocemente este doente.

Prognostico

Pelo exame das observações clinicas do doente e da analise do sangue e do liquido cefalo-raquidiano, facilmente se verifica que as suas melhoras teem sido muito sensíveis, e é para esperar que elas se continuem a acentuar desde que ele não descure a sua doença.

Tratamento

Durante o seu estádio no hospital o doente fez o seguinte tratamento :

Do dia 18-11 a 22-1 i—Iodeto de potássio. Do dia 23-11 a 8-12 — Benzoato de mer-cúrio (em injecções intra-musculares).

Do dia 9-12 a 1 o-12 — Iodeto de potássio. Do dia 11-12 a 16-12—Iodeto de potás-sio T- tintura de beladona.

Do dia 18-1 a 1-2 — Benzoato de mercú-rio (em injecções intra-musculares).

(33)

TESTUT — Anatomic humaine. G LEY — Physiologie.

PIERRE MARIE — l a pratique neurologique.

F. J. COLLET—Pathologie interne.

Revue neurologique—Anos de 1895, 1897,

1903, 1904, 1905, 1906, 1911, 1912, 1913, 1914, 1916, 1917, 1919).

Nouvelle iconographie de la Salpctrière (1912,

1915).

// policlínico (1916).

Journal des praticiens (1918). The lancet (1913-1914).

La presse médicale — Anos de 1913 a 1920.

Visto. Pôde imprimir-se.

Referências

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