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[Recensão a] Fernando Pessoa. Obra Completa de Álvaro de Campos

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Academic year: 2021

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[Recensão a] Fernando Pessoa. Obra Completa de Álvaro de Campos Autor(es): Medeiros, Ana Clara Magalhães de

Publicado por: Brown University; Warwick University; Universidad de Andes URL

persistente: URI:http://hdl.handle.net/10316.2/35308 Accessed : 18-Jul-2021 12:26:26

digitalis.uc.pt impactum.uc.pt

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essoa

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lural

revista de estudos Pessoanos / a Journal of fernando Pessoa sutdies issn: 2212-4179

Onésimo Almeida,

Paulo de Medeiros &

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Campos  Revisited  

Ana Clara Magalhães de Medeiros*  

 

Fernando   Pessoa.   Obra   Completa   de   Álvaro   de   Campos.   Edição   de   Jerónimo   Pizarro  e  Antonio  Cardiello;  colaboração  de  Jorge  Uribe  e  Filipa  Freitas.   Lisboa:  Tinta-­‐‑da-­‐‑china,  2014.  752  p.  

 

Eh-­‐‑eh-­‐‑eh-­‐‑eh   eh!   Eh-­‐‑lahô-­‐‑lahô-­‐‑laHO-­‐‑lahá-­‐‑á-­‐‑á-­‐‑à   à!   Nesse   tom   efusivo   e   insondável  deve  começar  qualquer  comentário  a  respeito  da  preciosa  Obra  completa   de  Álvaro  de  Campos,  organizada  pelos  entusiastas  do  legado  pessoano,  Jerónimo   Pizarro  e  Antonio  Cardiello,  e  publicada  pela  editora  Tinta-­‐‑da-­‐‑china  em  2014  –  ano   do   aniversário   número   124   de   Campos.     Jogo   matemático   que   um   místico   da   estirpe  de  Fernando  Pessoa  não  desprezaria.  

Quando   um   crítico   literário   e   um   filósofo   investigativo   unem-­‐‑se   a   uma   editora  insuflada  de  cuidado  e  criatividade,  o  resultado  não  pode  ser  outro  que  não   uma  publicação  compromissada  com  a  excepcionalidade  da  obra  que  apresenta.  A   combinação  Pizarro  mais  Tinta-­‐‑da-­‐‑china  tem  trazido  a  público,  via  coleção  Pessoa,   uma   série   de   textos   que   permaneciam   embaralhados   na   arca   mais   valiosa   da   Língua   Portuguesa,   sem   leitores   que   usufruíssem   dos   136   heterónimos   recém-­‐‑ descobertos   (Eu Sou Uma Antologia: 136 autores fictícios, 2013),   acompanhassem   criticamente  a  saga  sem  fatos  de  Bernardo  Soares  ou  visitassem  os  escritos  inéditos   do  engenheiro,  tão  debochados  quanto  o  próprio  autor.    

A   Obra   completa   inicia-­‐‑se   apresentando   toda   a   poesia   de   Campos,   já   publicada   e   inédita.   Aí   estão   –   para   mencionar   alguns   –   os   célebres   “Opiário”,   “Ode  Marítima”,  “Tabacaria”  e  “Lisbon  Revisited”  (os  dois  poemas).  A  seção  de   poesia  congrega  ainda,  em  “Poesia  –  Anexos”,  um  conjunto  de  textos  inacabados   ou   fragmentários   que   aparecem   divididos   em   dois   grupos:   Clearly   Campos   ou   Maybe   Campos.   A   segmentação   faz   referência   ao   poema   intitulado   “Clearly   Non-­‐‑ Campos!”,   do   heterônimo,   e   é   já   conhecida   dos   leitores   via   artigo   intitulado   “Clearly   Campos?”,   anteriormente   publicado   em   2013   por   um   dos   editores,   Jerónimo  Pizarro.    O  objetivo  deste  jogo  que  vai  do  clearly  ao  maybe  é  compartilhar,   com  o  leitor,  um  problema  de  pesquisador:  quais  indícios  permitem  definir  o  que  é   realmente   de   Campos?   O   estilo   Campos   é   definível?   O   exercício   é   inconcluso   e   movediço,  mas  instigante.  No  grupo  Maybe  Campos,  por  exemplo,  há  poema  que   outras   edições   (como   a   de   Maria   Aliete   Galhoz   em   1969)   enquadram   com   convicção  na  seção  das  Ficções  do  Interlúdio  assinada  pelo  engenheiro:    

 

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Cruz  na  porta  da  tabacaria!  

Quem  Morreu?  O  proprio  Alves?  Dou   Ao  diabo  o  bem-­‐‑star  que  trazia.   Desde  ontem  a  cidade  mudou    

[...]      

Elle  era  o  dono  da  tabacaria.  

Um  ponto  de  referencia  de  quem  sou.   Eu  passava  ali  de  noite  e  de  dia.   Desde  hontem  a  cidade  mudou  

(Pessoa,  2014:  371-­‐‑372).  

 

“Tabacaria”  (1928)  é,  possivelmente,  o  poema  mais  conhecido  e  recitado  de   Álvaro  de  Campos.  Dentro  da  poética  heteronímica,  erigida  a  palavra  “tabacaria”  –   como   em   “Cruz   na   porta   da   tabacaria!”   (1930)   –   o   pensamento   encaminha-­‐‑se   diretamente  para  o  mundo  narrado  pelo  engenheiro  das  janelas  de  seu  quarto.  No   texto   de   1928,   o   eu   poético   apresenta-­‐‑nos   o   Dono   da   Tabacaria,   que   sorri   enigmaticamente   no   último   verso   –   mas   não   o   conhecemos   pelo   nome.   Conhecemos  o  Esteves  –  esse,  no  entanto,  é  um  cliente  que  mete  troco  na  algibeira   das  calças.  Agora,  morreu  o  Alves  –  “elle  era  o  dono  da  tabacaria”.    

Como  informam  os  editores  em  nota  ao  poema,  Teresa  Rita  Lopes  não  vê  no   escrito  de  1930  ritmo,  estilo  ou  atitude  de  Campos.  Pizarro  e  Cardiello  avisam  que   o   manuscrito   encontrava-­‐‑se   em   envelope   junto   a   outros   poemas   do   autor   de   “Tabacaria”,   por   isso   o   alocam   no   grupo   Maybe   Campos,   à   revelia   da   opinião   de   Lopes.  O  ritmo  pode  não  ser  o  mesmo,  tampouco  o  estilo  mais  enxuto.  A  narrativa   contida   no   poema   –   índice   relevante   em   se   tratando   do   poeta   mais   prosaico   do   drama  em  gente  pessoano  –,  porém,  remete  a  algumas  personagens  literárias  que  só   podem  ser  de  Campos.  Se  o  homem  biográfico  Fernando  Pessoa  redimensionou  os   limites   da   autoria,   sua   obra   –   melhor,   sua   e   de   seus   companheiros   de   versos   –   extrapola   as   fronteiras   entre   prosa   e   poesia,   o   que   nos   permite   ratificar   a   opção   deste   volume:   o   poema   é   provavelmente   de   Campos   pelos   personagens   que   habitam  sua  poética.  

Adiante   no   livro,   deparamo-­‐‑nos   com   a   prosa   completa   que   abrange   a   produção  “Publicada  em  vida”  (vida  de  Pessoa?  Qual  é  o  Ano  da  Morte  de  Álvaro   de   Campos?),   as   delicadas   “Notas   para   recordação   do   meu   Mestre   Caeiro”   –   verdadeiro  tratado  estético-­‐‑artístico  –,  além  da  prosa  até  aqui  “Não  publicada”,  de   “Entrevista”,  “Correspondências”  (de  que  fazem  parte  os  divertidíssimos  escritos  a   José  Regio  e  a  Ophelia  Queiroz),  “Prefácios”,  “Outros  textos”  e  “Anexos”  (nestes   lança-­‐‑se  mão,  uma  vez  mais,  do  sistema  classificatório  –  Clearly  Campos  ou  Maybe   Campos   ora   explanado).   Certamente   que   a   experiência   de   Cardiello   e   Pizarro,   advinda   da   edição,   em   2012,   do   primeiro   volume   crítico   da   prosa   de   Campos,   incutiu-­‐‑lhes  domínio  para  perscrutarem  com  segurança  o  labirinto  que  é  a  prosa  de  

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um  polemista  –  “Desde  que  uma  cousa  cabe  em  palavras,  cabe  na  comprehensão   dos  outros”  (Pessoa,  2014:  495).  É  preciso  dizer  que  a  Obra  conta  ainda  com  notas   que   são   mesmo   pequenos   textos   de   crítica   literária   ou   editorial,   excertos   provocadores  de  pensamento  ou  cuidadosos  esclarecimentos  ortográficos.  De  fato,   uma  Obra  completa.  

Há  ainda  uma  decisão  editorial  que  destacamos:  desde  a  capa  do  exemplar   até  a  última  nota,  assume-­‐‑se  a  autoria  efetiva  de  Álvaro  de  Campos.  Finalmente  o   mercado   editorial   e   os   pesquisadores   pessoanos   concordaram   que   Campos   é   Campos,   diferente   de   Pessoa   porque   detentor   de   projeto   artístico,   produção   bibliográfica  e  enredo  biográfico  diversos  do  autor  da  Mensagem.  Não  nos  parece   ser  despretensiosamente  que  os  organizadores  escolhem  uma  única  epígrafe  para   todo  o  volume  e  lançam-­‐‑na  lá  em  meados  da  prosa,  antecedendo  as  “Notas  para  a   recordação  do  meu  Mestre  Caeiro”:  “Que  importa  existir,  se  se  é?”  (Pessoa,  2014:   451).    

Com   esta   sentença   enxuta,   simples   e   incisiva   (que   empresta   o   estilo   caeiriano),   os   responsáveis   pelo   volume   assumem   uma   postura   que   é   editorial,   como   também   crítica:   se   as   criações   heteronímicas   de   Pessoa   são   (com   toda   a   contundência  do  verbo  ser)  autores,  que  importa  se  existem  ou  não?  Importa  que   suas   obras   são   contributos   incontornáveis   à   literatura   em   Língua   Portuguesa   e   desconsiderar  o  valor  autoral  de  cada  figura  do  drama  em  gente  é  arrancar  agressiva   e   irresponsavelmente   o   peso   de   um   Álvaro   de   Campos   para   a   tradição   poética   modernista   luso-­‐‑brasileira,   de   um   Alberto   Caeiro   para   a   arquitetônica   textual   pessoana   e   de   um   Ricardo   Reis   para   a   poesia   perseverantemente   clássica   que   nossos  autores  ensaiam  até  hoje.  Se,  como  afirma  Campos,  “fazer  arte  é  confessar   que  a  vida  ou  não  presta  ou  não  chega”  (2014:  446),  completamos  resolutos:  clearly,   Álvaro  de  Campos  é  artista  como  poucos.  

Seja   em   poesia   ou   em   prosa,   toda   a   obra   desbravada   é   revelada   com   a   graphya  não  necessariamente  usual  até  fins  da  década  de  1930,  senão  escolhida  por   Campos,   Pessoa   ou   qualquer   dos   heterônimos.   Daí   erige   mais   um   aspecto   compositivo  da  arte  desses  poetas  que  não  seria  plenamente  captada  não  fosse  o   empenho  de  uma  edição  crítica.  Os  pesquisadores  não  deixam  de  apontar  ali  notas   e  mais  notas  referentes  às  diversas  grafias  possíveis  de  acordo  com  testemunhos   vários   encontrados.   Escreveu   o   saudosista   Teixeira   de   Pascoaes,   um   dia,   sobre   o   quanto   serve   um   y   em   detrimento   de   um   i   (latino)   para   fazer   surtir   o   efeito   abysmático   e   mysterioso   que   certas   palavras   requerem.   Em   alguma   medida,   a   opinião  de  Pascoaes  parece  cingida  pela  de  Campos  –  que  pode  bem  não  crer  nos   abysmos  (desconfiamos  disso),  mas  não  prescinde  da  profundidade  máxima  para  o   vocábulo  garantida  pela  letra  grega:  “Não  há  abysmos!  |  Nada  é  sinistro!  |  Não  há   mysterio  ou  verdade!”  (Pessoa,  2014:  170).  

Ah,  todo  o  cais  é  uma  saudade  de  pedra!  E  essa  edição  deixa  qualquer  leitor   aficionado   pela   heteronímia   com   saudades   do   futuro   de   uma   Obra   completa   de  

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Alberto   Caeiro.   Seja   pelos   textos   situados   na   transição   de   mestre   para   discípulo   (“De   Caeiro   a   Campos”),   pelos   “Apontamentos   para   uma   esthetica   não-­‐‑ aristotelica”,   pela   “Nota   ao   acaso”   ou   pelas   já   mencionadas   “Notas   para   a   recordação  do  meu  Mestre  Caeiro”  –  que  ganharam,  merecidamente,  pelo  grau  de   teoria   heteronímica   e   pela   densa   crítica   literária   que   apresentam,   uma   seção   inteiramente  dedicada  a  elas  –,  seja,  ainda,  pelos  prosaicos  e  nostálgicos  versos  da   “Ode  mortal”  e  de  “Mestre,  meu  mestre  querido!”,  por  qualquer  dessas  razões,  a   obra   de   Campos,   conjunturalmente   organizada,   incute-­‐‑nos   a   ansiedade   por   uma   edição   tão   completa   e   tão   cuidadosamente   planejada   que   propague   escritos   do   Caeiro  que  ainda  nem  descobrimos  ou  que  já  conhecemos  (mas  apenas  de  ouvir   num   poço   tapado),   que   incremente,   enfim,   a   nossa   biblioteca   (borgeana,   por   infinita;  pessoana  por  indecifrável)  carente  de  um  Mestre.  Uma  edição  é  eficiente   quando  garante  que  o  público  a  leia.  É  surpreendente  quando,  em  si,  gesta  Obras   futuras  e  desassossega  leitores.  

Campos:  outra  vez  te  revejo.  Como  coisa  real  por  fóra  na  Obra  completa  que   te   redimensiona   à   medida   exata   de   sagaz   escritor   em   poesia,   prosa   e   polêmica.   Como  coisa  real  por  dentro,  neste  conjunto  heteronímico  em  que  –  tudo  é  sonho  –,   porém   é   também   texto,   palavra,   ação.   Campos:   outra   vez   te   revejo.   Velho   conhecido   futurista,   redescoberto   prefacista   brilhante   ou   esteta   de   vanguarda   aparecido:  obriga-­‐‑nos  a  sentir  tudo  de  todas  as  maneiras,  viver  tudo  de  todos  os   lados   e   realizar   em   nós   toda   a   humanidade   de   todos   os   momentos.   Campos:   o   leitor   casual,   o   pesquisador,   o   curioso,   o   esteta,   o   acadêmico,   o   desdenhoso,   o   especialista   e   o   banal   –   todos   –   outra   vez   te   revemos:   ATENÇÃO!   De   braços   erguidos,  fitando  o  Atlântico,  saudamos  abstratamente  o  Infinito  da  tua  obra!  

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