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Bol. Mus. Biol. Mello Leitão (N. Sér.) 28: Dezembro de

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Registros recentes de Harpia harpyja e espécies de Spizaetus

(Falconiformes: Accipitridae) na Reserva Biológica Augusto

Ruschi, Santa Teresa, Espírito Santo, Brasil

Tomaz D. de Novaes¹*, Fernando M. Flores², José Nilton da Silva²,

Eduardo C. M. Alves¹, Jacques A. Passamani³, Luciano A. Vieira² & Ilsa P. S. de Novaes4

RESUMO: Entre fevereiro de 2007 e março de 2010 foram registradas as es-pécies de gaviões da família Accipitridae, Harpia harpyja, Spizaetus tyrannus, S. melanoleucus e S. ornatus na Reserva Biológica Augusto Ruschi, situada em Santa Teresa, Espírito Santo. Estas aves de rapina são espécies de grande porte que vivem em florestas e apesar de terem uma ampla distribuição geográfica ocorrem de forma esparsa. A identificação das espécies se deu através dos con-tatos visuais e auditivos. Os exemplares foram detectados durante as expedições de campo do monitoramento da avifauna daquela unidade de conservação, no qual foram utilizados os métodos de pontos de escuta, levantamento exaustivo e o uso da reprodução da vocalização. Também foram considerados os registros casuais, obtidos fora dos períodos das amostragens do monitoramento. As vo-calizações das aves foram registradas através de gravações em áudio. Spizaetus tyrannus apresentou o maior número de registros, seguido de S. ornatus, H. harpyja e a menos frequente, S. melanoleucus.

Palavras chave: Aves, Mata Atlântica, monitoramento, ocorrência.

ABSTRACT: Recent records of Harpia harpyja and Spizaetus species

(Fal-coniformes: Accipitridae) at Augusto Ruschi Biological Reserve, Santa Teresa, Espírito Santo, Brazil. Between February 2007 and March 2010,

we recorded the harpy eagle Harpia harpyja and the hawk-eagles Spizaetus tyrannus, S. melanoleucus, and S. ornatus (Accipitridae) at Augusto Ruschi Biological Reserve, Santa Teresa, Espírito Santo, southeastern Brazil. These birds of prey are large-sized species that live in the forest and their occurrence is 1 Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, Caixa Postal 13, 29.650-000, Santa Teresa,

ES, Brasil.

2 Museu de Biologia Prof. Mello Leitão, Av. José Ruschi 4, Centro, 29.650-000, Santa Teresa, ES, Brasil. 3 Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, Av. Mal. Mascarenhas de

Moraes 2487, Bento Ferreira, 29.050-625, Vitória, ES, Brasil.

4 Escola Superior São Francisco de Assis, Rua Bernardino Monteiro 700, Dois Pinheiros, 29650-000, Santa Teresa, ES, Brasil.

* Correspondente: tomaznovaes@uol.com.br

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scattered, despite having broad geographic distributions. Species identification was done by direct visual contact or through audio. Specimens were documented during bird monitoring expeditions, using point counts, exhaustive surveys and playback methods. We also considered casual records obtained out of the monitoring period. Bird vocalizations were registered through audio recordings. Spizaetus tyrannus was the most frequently recorded species, followed by S. ornatus, H. harpyja, and the least frequent, S. melanoleucus.

Key words: Atlantic Forest, Aves, monitoring, occurrence. Introdução

A família Accipitridae é composta por espécies de aves de rapina com vasta distribuição no mundo, ocorrendo da floresta tropical à tundra ártica (Belton & Dunning, 1993; Hilty & Brown, 1986; Lerner & Mindel, 2005). Atualmente considera-se que ela possua 263 espécies, onde estão inseridas as maiores aves rapineiras, como também as mais ameaçadas de extinção (GRIN, 2010; Lerner & Mindel, 2005). No Brasil, a referida família é composta por 47 espécies (CBRO, 2009) e entre elas, estão as que ocorrem estritamente em florestas, necessitando muitas vezes de ambientes bem conservados até outras que podem viver em localidades urbanas (Sick, 1997; Thiollay, 2007). Há representantes de pequeno a grande porte, como por exemplo, Gampsonyx swainsonii considerado o menor gavião brasileiro e Harpia harpyja, a maior espécie da América e uma das maiores do mundo (Aguirre, 1992; Galetti et al., 1997; Hilty & Brown, 1986; Sick, 1993, 1997).

Tanto H. harpyja como as espécies do gênero Spizaetus estão entre os maiores representantes neotropicais de Accipitridae. São espécies florestais de grande porte, predadoras do topo da cadeia alimentar, com baixa densidade populacional, que necessitam de extensas áreas de vida, com cobertura florestal relativamente bem conservada (Carvalho-Filho et al., 2009). Das quatro es-pécies de Spizaetus, três ocorrem no Brasil: S. tyrannus, S. melanoleucus e S. ornatus, as quais juntamente com H. harpyja tem ocorrências esparsas, apesar da ampla distribuição geográfica, que vai do México à Argentina e em quase todo o Brasil. (Meyer de Schauensee, 1982; Rosário, 1996; Sick, 1993, 1997; Vargas-González, 2006). Entre as ações antrópicas que mais ameaçam esses grandes gaviões, estão a destruição dos ecossistemas, a caça das espécies e das suas presas, pois além de grandes áreas, eles também necessitam que os habitats tenham uma suficiente densidade de animais que lhes sirvam como alimento (Galetti et al., 1997; Sick, 1997). Com a redução dos ambientes florestais houve um declínio regional das populações destas aves e fora dos domínios amazônicos

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elas se tornaram extremamente raras, sendo evidência disso o fato de estarem presentes nas listas estaduais de espécies ameaçadas de extinção dos estados do sudeste e do sul do Brasil (Carvalho-Filho et al., 2009; Zorzin et al., 2006).

A região de Santa Teresa/ES onde está situada a Reserva Biológica Augusto Ruschi, tem a sua avifauna relativamente bem conhecida em função de vários levantamentos efetuados por ornitólogos ao longo das últimas déca-das (Ruschi, 1965, 1969, 1977, 1979; Simon, 2000, 2006; Vieira et al. 2007; Willis & Oniki, 2002) e inclusive, já se conhecia a ocorrência das espécies H. harpyja, S. tyrannus, S. melanoleucus e S. ornatus para aquela área. O objetivo deste trabalho é atualizar as informações pertinentes sobre a ocorrência destas espécies na região de Santa Teresa/ES, comunicando sobre os registros recentes e dessa forma podendo contribuir com futuros programas de conservação e pesquisas das espécies naquela unidade de conservação.

Métodos

Os dados foram coletados na Reserva Biológica Augusto Ruschi (19º45’–20º00’S e 40º27’–40º38’W) situada no município de Santa Teresa, região centro-serrana do estado do Espírito Santo. Ela possui uma área de 3.598,41 ha, com altitudes entre 800 e 1.100 metros e o clima da região é caracterizado como do tipo Cwa pela classificação de Köppen (MMA, 1997). A sua formação florestal pertence ao Domínio da Mata Atlântica, sendo carac-terizada como Floresta Ombrófila Densa (IBGE & IBDF, 1988) ou Floresta Pluvial Montana (Rizzini, 1997).

Os mencionados acipitrídeos foram registrados nas amostragens feitas no monitoramento da avifauna da referida Reserva Biológica, que se deu no período entre outubro de 2008 e agosto de 2009 (Autorização Sisbio nº 16577) e no qual foram empregados alguns dos métodos tradicionais de levantamento da avifauna, como pontos de escuta, levantamento exaustivo e uso de playback (reprodução da vocalização) conforme Anjos (1996), Develey (2004), Gibbons et al. (1996), Gregory et al. (2004), Ralph et al. (1993) e Vielliard & Silva (1990). Também foram registrados os exemplares detectados casualmente, fora dos períodos das amostragens do monitoramento, entre fevereiro de 2007 e março de 2010.

As amostragens por pontos de escuta foram realizadas em seis tri-lhas de pesquisa, distribuídas na área da Reserva Biológica de forma que todas as suas seções foram representadas. Cada trilha possuía 10 pontos de escuta, os quais eram eqüidistantes em 100 metros, sendo as amostragens feitas em cinco pontos alternados numa manhã. Os trabalhos de campo eram

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iniciados logo ao amanhecer e o tempo de amostragem em cada ponto era de 15 minutos, durante o qual se faziam os registros dos contatos visuais e auditivos. Com este método foram feitos 14 dias de amostragens distribuídos ao longo de todas as estações do ano, alcançando-se o total de 70 amostras e com os dados obtidos calculou-se o Índice Pontual de Abundância (IPA) das espécies, de distância ilimitada, que é um índice relativo e consiste na divisão do número de contatos com uma determinada espécie pelo número total de amostras. Podem ser feitas comparações com o referido índice, em relação a outros levantamentos no qual tenha se utilizado a mesma metodologia, mas desde que seja sempre com a mesma espécie, devido as diferenças na detectabilidade (Gibbons et al., 1996).

O levantamento exaustivo, de finalidade qualitativa, que visava complementar a lista de espécies, consistia em registrar os contatos feitos durante os deslocamentos para se alcançar as trilhas, nos trajetos entre os pontos de escuta, em caminhadas intermitentes e em observações realizadas em dois locais mais elevados, de grande ângulo de visão, os quais eram denominados de mirantes números 1 e 2, situados na região central e sul da unidade de conservação, respectivamente e afastados três quilômetros um do outro, onde se permanecia no horário que normalmente os grandes rapinei-ros do gênero Spizaetus realizam o vôo planado nas térmicas (por volta das 10:00 às 13:00 horas) procedimento este que, embora em menor proporção, não difere ao adotado em trabalhos específicos de levantamentos de aves de rapinas diurnas em florestas tropicais úmidas (Mañosa et al., 2003; Thiollay, 1989a, 1989b, 2007). Ao longo desses percursos, em algumas ocasiões utilizou-se a técnica de playback, principalmente para o caso de espécies de difícil detecção. No levantamento exaustivo foram feitas 170 horas de amostragem ao longo de 17 dias, também distribuídos ao longo de todas as estações do ano. Uma vez que se fazia 10 horas de amostragem por dia, pois além do período diurno, foram amostrados os períodos de crepúsculo e partes das noites. Desse total, nos mirantes se permaneceu sempre em dias de céu limpo, por pelo menos 36 horas, distribuídas ao longo de nove dias. Com os dados obtidos através deste método, calculou-se a freqüência de ocorrência, que permite uma avaliação da riqueza específica por época e que é expressa como o número de dias em porcentagem nos quais cada espécie ocorreu na área amostrada, independente da quantidade de manifestações. As espécies foram identificadas através da visualização direta com auxílio de binóculos, lunetas e câmeras fotográficas, como também, por meios au-ditivos, com auxílio de gravadores digitais e microfones unidirecionais. As gravações em áudio realizadas nos trabalhos de campo foram depositadas, em formato digital, no acervo da Reserva Biológica Augusto Ruschi.

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Resultados

A espécie Spizaetus tyrannus (Figura 1) não foi detectada nos pontos de escuta e no levantamento exaustivo ela foi registrada em três dias, resultando numa freqüência de ocorrência de 17% (n = 17). Estes registros se deram na região central da Reserva Biológica, mais propriamente no mirante nº 1. Ela foi a espécie que teve o maior número de registros casuais, sendo constatada em 77 dias nas proximidades da sede da Reserva Biológica, que se situa na região sudoeste da unidade de conservação (Figura 2). A espécie foi registrada ao longo de todas as estações do ano. Somente em quatro contatos as aves desta espécie foram vistas pousadas no dossel, sendo os outros registros oriundos de exemplares em vôo sobre a floresta, em vôos altos planados, aproveitando as correntes de ar ascendentes. Cabe salientar que em 53 registros desta espécie, 80% se deram entre as 9:00 e 12:00 horas. Em uma ocasião foi encontrado restos da carcaça de um exemplar juvenil na floresta. Normalmente os registros se deram com a presença de somente um exemplar, mas em nove ocasiões foi observado um par e em apenas dois registros detectou-se três indivíduos juntos.

Figura 1. Spizaetus tyrannus no dossel da floresta da Reserva Biológica Augusto

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Não foi constatado qualquer comportamento agonístico nem de cortejo entre esses exemplares. Todos os registros desta espécie foram obtidos por meio da visualização e/ou vocalizações espontâneas e em uma ocasião foi observada a ocorrência de um exemplar, em área próxima, com um indivíduo de Spizaetus ornatus (Figura 3).

A espécie Spizaetus ornatus também não foi registrada na amostra-gem por pontos de escuta, mas no levantamento exaustivo, a exemplo da espécie anterior, ela foi observada por três dias, resultando numa freqüência de ocorrência de 17% (n = 17). Estes registros se deram nas regiões sul (trilha) sudoeste (estrada) e central (mirante nº 1) da Reserva Biológica. Também foram obtidos registros casuais com esta espécie, os quais se deram durante 36 dias, nas proximidades da sede da unidade de conservação. Em apenas um contato foi avistado um exemplar pousado no dossel da floresta, sendo o restante dos registros obtidos com os indivíduos em vôo sobre a floresta, aproveitando-se do movimento ascendente do ar. De 28 registros desta espécie, 85% também se deram entre 9:00 e 12:00 horas. Como a es-pécie anterior, esta também foi observada ao longo de todas as estações do ano. Normalmente os registros da espécie eram feitos quando havia somente um indivíduo, mas em dois registros constatou-se a presença de um par. Da mesma forma que a espécie anterior, não se constatou o comportamento

Figura 2. Vocalização espontânea de dois indivíduos de Spizaetus tyrannus gravados na

Reserva Biológica Augusto Ruschi em 26 set 2008 às 11:30 horas. A seta da esquerda corresponde a vocalização de um indivíduo, a seta do meio ao outro indivíduo e a seta da direita aos dois indivíduos juntos, que vocalizaram ao mesmo tempo.

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agonístico nem de cortejo entre os exemplares avistados juntos. Os registros foram obtidos por meio da visualização e/ou de vocalizações espontâneas (Figura 4) exceto um que se deu com a resposta vocal motivada através da técnica de playback .

Figura 3. Vocalização espontânea das espécies Spizaetus tyrannus (seta escura) e

Spizaetus ornatus (seta clara) em uma mesma ocasião, gravado na Reserva Biológica Augusto Ruschi em 07 jul 2008 às 10:00 horas.

Figura 4. Vocalização espontânea de um exemplar de Spizaetus ornatus gravado na

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No monitoramento não se detectou a espécie S. melanoleucus, a qual somente foi constatada através de registros casuais em duas ocasiões, em 19/dez/2009 (12:30 horas) e 29/mar/2010 (15:20 horas) nas áreas norte (em área limítrofe) e sudoeste (sede) da unidade de conservação, respec-tivamente. Como na maioria dos registros das espécies anteriores, ela foi avistada em vôo alto planado e vocalizando de forma espontânea (Figura 5) e em ambos os registros os exemplares encontravam-se solitários.

Já a espécie H. harpyja foi registrada na amostragem por pontos de escuta, em cinco amostras, resultando no IPA de 0,07 (n = 70). Ela também foi constatada no levantamento exaustivo com um registro, re-sultando na freqüência de ocorrência de 5% (n = 17) e além disso, ela foi detectada em sete registros casuais. Os contatos se deram ao longo de todas as estações do ano, não sendo registrada apenas nos meses de maio, novembro e dezembro. Ela foi constatada nas áreas norte (pontos de escuta) noroeste (pontos de escuta) sudoeste (sede) e sul (pontos de escuta e trilha) da Reserva Biológica e diferentemente das outras espé-cies, não foi observada em vôo alto planado, sendo registrada durante as manhãs, com 77% (n = 13) dos registros entre 6:00 e 9:00 horas. Apenas um registro se deu com o uso da técnica de playback ao longo de uma trilha, quando então, dois indivíduos da espécie responderam tempestivamente, dentre os quais, aparentemente havia um imaturo ou juvenil, devido a diferenciação nas vocalizações (Figuras 6 e 7).

Figura 5. Vocalização espontânea da espécie Spizaetus melanoleucus, gravado na

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Discussão

Todas as referidas espécies foram registradas anteriormente na região de Santa Teresa, sendo S. tyrannus a mais constante nos levantamentos, como em Ruschi (1965, 1969, 1977, 1979), Silva et al. (2007), Simon (2000, 2006),

Figura 7. Vocalização espontânea de um exemplar de Harpia harpyja gravado na

Reserva Biológica Augusto Ruschi em 07 abr 2009 às 8:22 horas.

Figura 6. Vocalização de dois indivíduos de Harpia harpyja em resposta a playback,

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Vieira et al. (2007) e Willis & Oniki (2002). As outras espécies, ao contrário, foram pouco registradas, como S. ornatus, constatada por Ruschi (1965, 1969, 1977, 1979) e documentada com um indivíduo na coleção ornitológica do Museu de Biologia Mello Leitão, taxidermizado no ano de 1949 (MBML 6764). Os registros de S. melanoleucus em Santa Teresa limitavam-se apenas ao informado em Willis & Oniki (2002). No caso dos registros de Harpia harpyja na região, além daqueles descritos por Ruschi (1965, 1969, 1977, 1979) e indivíduos taxidermizados nos anos de 1944 (MBML 2097) 1945 (MBML 2098) e 1949 (MBML 6762), a espécie também foi detectada em 1990 na Reserva Biológica Augusto Ruschi (Pacheco et al., 2003; Willis & Oniki, 2002). A raridade destas três espécies pode ser destacada pelas pesquisas de Simon (2000, 2006) que realizou trabalhos de campo durante sete anos na região (1998 a 2004) e não as detectou, mas as incluiu em um grupo que totalizou 48 espécies de aves florestais de presença conhecida para a área e que não foram registradas.

O presente estudo proporcionou a constatação daqueles acipitrídeos, com a aplicação do método convencional de amostragem por pontos de escu-ta, que permitiu os registros de H. harpyja e do levantamento exaustivo, que também contemplou amostragens específicas ao estudo de rapineiros diurnos e permitiu registros de S. tyrannus e S. ornatus. Os registros casuais também possibilitaram expressivas e importantes informações sobre as espécies na área, como por exemplo, a espécie S. melanoleucus que somente foi detectada por este meio.

A espécie Harpia harpyja, diferentemente das espécies de Spizaetus, não executa os vôos planados com ajuda de correntes de ar ascendente (térmicas) ela se mantém empoleirada, silenciosa, difícil de detectar, sendo mais notada de manhã cedo, normalmente em árvores mortas emergentes, onde incidem os raios solares (Thiollay, 1989a, 1989b, 2007). Com este comportamento inato, foi possível registrá-la na amostragem por ponto de escuta convencional, que normalmente é executada no princípio das manhãs.

As espécies do gênero Spizaetus (S. tyrannus, S. ornatus e S. melanoleu-cus) não foram registradas nas amostragens por pontos de escuta convencional, corroborando que o horário de amostragem desse método não é apropriado para a detectabilidade delas, pois como elas tem o comportamento de fazer o vôo planado em térmicas, são melhor detectadas nos horários que concentram essa atividade, normalmente do meio ao fim da manhã, entre 9:00 e 12:00 horas (Mañosa et al., 2003; Thiollay, 1989a, 1989b, 2007). Para uma maior obtenção de dados, as amostragens por pontos de escuta, específicas para detectar estas espécies de aves de rapina e outras que fazem o vôo planado, além de terem os pontos escolhidos em locais mais elevados da área, com grande ângulo de visão, devem ser concentradas no mencionado horário e ter a duração de três a

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quatro horas em cada ponto (Mañosa et al., 2003) ao invés de 10 a 20 minutos como o adotado nas amostragens por pontos de escuta convencional, feitas nas primeiras horas da manhã. Isto coincide com os dados obtidos em nosso estudo, pois somente se detectou S. tyrannus e S. ornatus no levantamento exaustivo e nos registros casuais, dentro do referido horário de maior atividade de planeio destas espécies. Apesar da freqüência de ocorrência de S. tyrannus e S. ornatus serem iguais no levantamento exaustivo, o número de registros casuais da pri-meira espécie foi expressivamente superior (77 contra 36). Estas informações se correlacionam com outros trabalhos realizados com as referidas espécies na Floresta Atlântica, a exemplo de Mañosa et al. (2003) que trabalhou na serra da Paranapiacaba no estado de São Paulo, com amostragem por ponto de escuta específica para rapineiros que fazem o vôo planado. Eles constataram que S. tyrannus foi comum e teve um número de registros superior ao de S. ornatus. No estado de Minas Gerais, no período entre os anos de 1997 e 2003, Zorzin et al. (2006) constataram que S. tyrannus foi o táxon mais visualizado, dentre outras espécies de Falconiformes com problemas de conservação naquele estado. Já no Parque Estadual do Rio Doce, no mesmo estado, Canuto (2009) registrou maior abundância de S.melanoleucus, seguido de S. ornatus, mas S.tyrannus teve baixa abundância.

Conforme os dados obtidos e considerando as dimensões da Reserva Biológica, é possível que o tamanho das populações das referidas aves de ra-pina, seja acentuadamente restrito e que os exemplares ou pares constatados sejam os mesmos. Diante disso, concluímos que há necessidade da realização de estudos sobre as populações das espécies desses grandes acipitrídeos na referida área, utilizando-se metodologia compatível, com um esforço amostral de longo prazo e enfocando a obtenção de dados da densidade populacional, pois enquanto não há estudos aprofundados o suficiente das populações, pode-se ter a noção de que aparentemente existem populações estáveis na região, ao passo que, de fato, na realidade esteja existindo apenas um casal por espécie ou poucos exemplares e que devido ao longo tempo de vida, são encontrados por um extenso período, mas que na realidade podem estar sem descendentes, pois estas espécies têm uma lenta e baixa taxa de reprodução (Sick, 1997).

Agradecimentos

Aos vigilantes Ademir Kelhert e Dárcio Zanotti Ratunde, por auxilia-rem nas coletas de dados na área da sede administrativa da Reserva Biológica Augusto Ruschi. Ao professor Luiz Buzatto pelas correções ortográficas, a Angelo Ziviani Zurlo pela revisão geral do texto, aos revisores anônimos

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pe-las importantes recomendações, ao pesquisador Giancarlo Zorzin, diretor de pesquisa do S.O.S. Falconiformes – Centro de Pesquisa para a Conservação das Aves de Rapina Neotropicais, pela preciosa revisão técnica e científica do texto, indicação e envio de referências bibliográficas. Ao professor e pesquisador José Eduardo Simon, também pela relevante revisão científica do texto, pelas recomendações gerais e pelo envio de referências bibliográficas. Ao professor e pesquisador Mauro Galetti, pelo envio de importante fonte bibliográfica.

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Referências

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