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A construção da ordem econômica internacional depois de 1945

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E.SATO (SISTEMA FINANCEIRO INTERNACIONAL) Página 1

A construção da ordem econômica internacional depois de 1945

CONDIÇÕES ESTRUTURAIS DA ECONOMIA POLÍTICA INTERNACIONAL EM 1945

Nos fins da segunda guerra mundial a liderança nas questões mundiais era exercida por três potências os Estados Unidos, o Reino Unido e a União Soviética, chamadas pela im- prensa de Big Three. Três conferências do BIG THREE marcaram o fim da segunda guerra mundial: Teerã (Novembro, 1943); Yalta (Fevereiro, 1945); e Potsdam (Julho/Agosto, 1945).

Na realidade, já se configurava uma clara divisão bipolar nas questões estratégicas e militares e uma hegemonia americana no que se refere à economia política mundial.

A Grã-Bretanha era, claramente, a potência declinante tanto em razão de sua capaci- dade de produção limitada quanto pelas condições de endividamento ao final da guerra. A União Soviética, em razão de seu regime baseado na doutrina comunista, tornava-se não ape- nas alvo de desconfianças na esfera política, mas também se colocava à margem do processo de construção de uma ordem econômica, já que a doutrina oficial do país era hostil ao merca- do e às instituições do mundo capitalista. Os Estados Unidos, por sua vez, era a nação que chegava ao fim da guerra ostentando várias condições que a qualificavam como a potência sem rival. Com efeito, havia sido a potência que verdadeiramente assegurou a vitória dos ali- ados na Europa; havia vencido a guerra contra o Japão; era a única potência atômica do plane- ta; seu PIB era maior do que a de todas as outras grandes potências somadas. Além disso, di- ferentemente do que havia ocorrido ao final da primeira guerra mundial, os Estados Unidos revelavam a disposição necessária para exercer uma liderança mundial: a United Nations Mo- netary and Financial Conference realizou-se em território americano (Bretton Woods, 1944);

a Conferência de criação da Organização das Nações Unidas realizou-se em San Francisco (Junho, 1945); os Estados Unidos iriam sediar as principais instituições do sistema ONU cria- dos ao final da guerra (ONU, FMI, Banco Mundial). Nesse quadro, para se compreender a reconstrução da ordem internacional depois da segunda guerra mundial, é interessante o re- curso do marco teórico oferecido pela teoria da estabilidade hegemônica.

A ideia central dessa teoria é a de que a ordem mundial é estável quando há um poder hegemônico que estabelece e garante essa ordem. Para ser hegemônica, a nação precisa ter capacidade de impor e de patrocinar suas regras ao sistema, ou seja, é preciso ter não apenas a disposição, mas precisa também ter os meios necessários para suportar os custos dos regimes.

R. Keohane argumenta que uma nação se torna hegemônica na economia mundial quando reúne as seguintes condições: 1) controle sobre as matérias-primas; 2) controle sobre as fontes de capital; 3) controle sobre os mercados; 4) vantagens competitivas sobre produtos de eleva- do valor agregado.

A teoria da estabilidade hegemônica não é incompatível com a ordem liberal, uma vez que a própria ordem liberal, para que funcione satisfatoriamente, precisará de um “garante”

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dessa ordem. Como já mencionado anteriormente, um dos formuladores dessa teoria foi C. P.

Kindleberger que em seu livro “The Great Depression: 1929-1939” argumenta que a ordem liberal do século XIX existiu enquanto a hegemonia britânica era efetiva e que ruiu juntamen- te com o declínio dessa hegemonia. Nesse sentido, a grande crise do entre-guerras, seria fruto do descompasso entre uma Grã-Bretanha queria exercer hegemonia, embora não tivesse os meios, enquanto os EUA embora tivessem os meios, não tinham a vontade de exercer seu papel participando da construção e da manutenção dos regimes internacionais que tentavam se formar na ordem política e econômica..

Vale considerar que: 1) a hegemonia não é um desejo, um propósito, é uma condição material e objetiva; 2) havendo um poder hegemônico, essa hegemonia precisa ser exercida, caso contrário o sistema torna-se instável. Ou seja, objetivamente, no caso de haver alguma potência que reúna as condições de hegemonia (supremacia nos meios e recursos de poder, dominância nos mercados de bens e de recursos financeiros) a estabilidade da ordem interna- cional vai depender diretamente da participação ativa desse poder hegemônico na construção e na manutenção da ordem internacional. Os dados mostram que na esteira da Segunda Guerra Mundial os EUA reuniam com sobras as condições de hegemonia e a Conferência de Bretton Woods ocorria nesse ambiente que marcava o meio internacional quando a guerra se aproxi- mava de seu final.

ACONFERÊNCIA MONETÁRIA E FINANCEIRA DAS NAÇÕES UNIDAS (BRETTON WOODS, JULHO/1944)

Pode-se dizer que as discussões com vistas ao estabelecimento de uma ordem econômica para o pós-guerra tiveram seu início com a assinatura da Carta do Atlântico (14/Ago/1941) que incluía a disposição de se estabelecer uma ordem econômica que garantisse o livre acesso a fontes de matérias primas e mercados. A Carta do Atlântico tinha 8 (oito) artigos e estabele- cia princípios gerais que deveriam orientar a aliança contra as potências do Eixo:

ARTIGO QUARTO: (....) se dispõem a lutar, com o devido respeito por suas obrigações atu- ais, para o gozo futuro por parte de todos os Estados – grandes ou pequenos, vitoriosos ou vencidos – do acesso, sob condições iguais, ao comércio e às matérias-primas do mundo que são exigidos para a sua prosperidade econômica.

ARTIGO QUINTO: (....) desejam obter, de acordo com todas as nações, a maior colaboração possível no terreno econômico, com a finalidade de assegurar para todos, padrões de tra- balho melhores, progresso econômico e segurança social.

► A liderança dos EUA havia se tornado um fato evidente e incontestável. Os EUA possuíam quase ¾ das reservas de ouro do mundo. A Inglaterra saía da guerra endividada e a sua preo- cupação era a extensão do “lend leasing” (empréstimo concedidos pelos EUA como parte do esforço de guerra).

► Por iniciativa do Presidente Roosevelt, a Conferência Monetária e Financeira das Nações Unidas realizou-se entre 1 e 22 de julho de 1944 em Bretton Woods (New Hampshire) com a

representação de 44 países. O objetivo primário era estabelecer as bases da re- construção econômica quando a guerra terminasse.

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► Diferente do que havia ocorrido em 1919, não se pretendia “reconstruir” a ordem econô- mica do pré-guerra, o termo “reconstrução” referia-se essencialmente à reconstrução física e à retomada das transações internacionais (principalmente o comércio). Na realidade, as duas décadas que antecederam a Segunda Guerra Mundial haviam sido marcadas por instabilidade, desemprego e crise e, dessa forma, a disposição geral era a de buscar uma nova ordem eco- nômica internacional.

O Mount Washington Hotel, em Bretton Woods. Harry Dexter White conversa com j. M. Keynes em Bretton Woods.

► Embora houvessem muitas outras propostas, os debates ficaram concentrados nas propos- tas britânica e americana. A proposta apresentada por J. M. Keynes tinha seu foco cocentrado basicamente na reconstrução, o que incluía o manejo das dívidas de guerra, em especial a ex- tensão do Lend Lease (empréstimo dos EUA ao esforço de guerra do Reino Unido). Na reali- dade a destruição na Europa já era grande, a guerra ainda não havia terminado e não era ape- nas o Reino Unido que estava endividado. O Brasil era um dos poucos países não endivida- dos. A proposta americana, apresentada por Harry Dexter White, refletia a posição america- na, mais preocupada com a ordem e a disciplina. No entendimento dos norte-americanos, uma ordem econômica monetariamente bem organizada e financeiramente disciplinada natural-

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mente traria de volta o crescimento econômico. Keynes at Bretton Woods was the first-ever international celebrity economist. The American media could not get enough of the barbed, eloquent Englishman, who was both revered and reviled for his brash new ideas on govern- ment economic intervention (Benn Steil, The Battle of Bretton Woods, Princeton University Press, 2013, p. 3). Apesar de tudo, o que Keynes não podia mudar era o fato de que o Reino Unido era a potência endividada e declinante.

► A Conferência decidiu pela criação de duas instituições – o FMI e o Banco Mundial – que entraram em vigor em 27 de dezembro de 1945. Em novembro de 1947 as duas instituições foram integradas ao Sistema Nações Unidas na condição de agência especializada.

Fundo Monetário Internacional – FMI a) Prover e administrar a liquidez internacional

b) Assegurar o funcionamento de um sistema multilateral de pagamentos internacionais c) Monitorar os níveis de equilíbrio dos balanços de pagamentos e fazer funcionar os meca- nismos de ajuste (estabilidade das taxas de câmbio)

► Estabeleceu-se US$ 35 = 1 oz de ouro (31,1g) com o tempo as demais moedas deveriam se ajustar a essa relação.

► Cada país participava com uma quota em função de sua importância no comércio inter- nacional. Essa quota representava o peso do país nas decisões do Fundo e também o volu- me de recursos que poderia sacar em caso de desequilíbrio no balanço de pagamentos

► Desequilíbrios estruturais (?) deveriam ser objeto de negociação. Variações de até 1%

nas taxas de câmbio não precisavam ser aprovadas pelos governadores do FMI

Banco Mundial e a formação de um novo sistema financeiro

a) Instrumento de promoção e coordenação dos fluxos financeiros internacionais (emprésti- mos e investimentos): os fluxos financeiros internacionais deveriam ser administrados via Banco Mundial evitando-se, assim, o risco da volatilidade dos capitais que, na década de 1930 havia contribuído para agravar a crise;

b) No início o principal objetivo era o de ajudar a financiar a reconstrução econômica, especi- almente da Europa, depois passa a agente financiador do desenvolvimento;

► Estabelece-se um capital inicial de US$ 10 milhões distribuídos de acordo com a capa- cidade econômica dos países: 20% no ato da subscrição (2% em ouro e o restante em moe- da do próprio país) e 80% apenas quando o país efetivamente necessitasse de fundos (rece- bimento de divisas em troca de títulos)

► Recursos: a) capital subscrito e integralizado; b) títulos vendidos nos mercados de capi- tais; c) resultados líquidos das operações; d) captação de fundos pela CFI (1956)

Comércio

Foi deixado para ser tratado posteriormente. As primeiras propostas estruturadas vão ganhar forma apenas em 1946. Em 1947 foi produzido um primeiro “draft” da carta de uma “Organi- zação internacional para o Comércio” de onde se originou o GATT (Genebra, 1947).

As instituições e a conjuntura econômica internacional

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► EUA tornam-se os principais construtores da ordem econômica internacional e transferem para a ordem econômica suas características e visões a respeito da economia política.

► Os acordos de Bretton Woods, claramente, deram prioridade à disciplina como base da estabilidade econômica. O crescimento das economias seria uma resultante da estabilidade

► O grande problema da economia internacional era a falta de liquidez (dollar shortage). A Europa não dispunha de dólares para adquirir os produtos de que necessitava e, como conse- qüência, os EUA em breve não conseguiriam mais exportar:

“A mecânica do Plano (de White) é tal que impõe uma constante ameaça de escassez de dóla- res” (J.H.WILLIAMS, Post-war Monetary Plans and other Essays, 1949)

“. . . estamos vendendo demais nos mercados do mundo. Isto, na verdade, constitui um dos grandes problemas mundiais. Estamos sempre vendendo demais para o estrangeiro, mais do que eles podem pagar . . . Incapazes de obter pagamentos em dólares, nossos exportadores vêm continuamente acumulando saldos em países estrangeiros, que não podem converter em dólares” (A.H.HANSEN, America’s Role in the World Economy, 1945).

ESTRATÉGIA DE CRESCIMENTO

A discussão sobre o comércio prosseguiu após Bretton Woods e várias conferências foram realizadas com o propósito de recompor o sistema de comércio.

- Genebra, 1947, estabeleceu o GATT - Havana, 1948, aprovada a Carta da OIC - Torquay, 1950/51, abandono da OIC

O sistema financeiro move-se para o centro da “estratégia de crescimento”.

Os fluxos financeiros deveriam ser administrados pelos governos no plano doméstico e pelo sistema Banco Mundial no plano internacional:

. CFI – Corporação Financeira Internacional . Bancos regionais de desenvolvimento (BID)

. Agências de desenvolvimento de governos (USAID, ODA)

► O agente dinamizador seria o Estado e as agências governamentais e inter-governamentais de desenvolvimento

► Uma associação de planejamento econômico por parte dos governos com recursos financeiros vindos do exterior (ajuda ao desenvolvimento/development aid)

► A dinâmica do crescimento, portanto, estaria centrada no Estado e nos fluxos financeiros, diferentemente da ordem do século XIX que se assentava no mercado e no comércio.

Outubro/2020

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