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A entre a presunção de inocência e as prisões cautelares

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Academic year: 2018

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CURSO DE DIREITO

A COMPATIBILIDADE ENTRE A PRESUNÇÃO DE

INOCÊNCIA E AS PRISÕES CAUTELARES

Ricardo Morel Lopes Júnior

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A COMPATIBILIDADE ENTRE A PRESUNÇÃO DE

INOCÊNCIA E AS PRISÕES CAUTELARES

Monografia apresentada como exigência parcial para a obtenção do grau de Bacharel em Direito, sob a orientação de conteúdo e orientação metodológica do professor Raul Carneiro Nepomuceno.

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A COMPATIBILIDADE ENTRE A PRESUNÇÃO DE

INOCÊNCIA E AS PRISÕES CAUTELARES

Monografia apresentada à banca examinadora e à Coordenação do Curso de Direito do Centro de Ciências Jurídicas da Universidade Federal do Ceará, adequada e aprovada para suprir exigência parcial inerente à obtenção do grau de bacharel em Direito, em conformidade com os normativos do MEC.

Aprovada em: 29 de setembro de 2015

BANCA EXAMINADORA

_______________________________________________ Prof. Me. Raul Carneiro Nepomuceno (Orientador)

Universidade Federal do Ceará (UFC)

_______________________________________________ Mestrando Joshua Gomes Lopes

Universidade Federal do Ceará (UFC)

_______________________________________________ Mestrando Francisco Tarcísio Rocha Gomes Júnior

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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação Universidade Federal do Ceará

Biblioteca da Faculdade de Direito

L864c Lopes Júnior, Ricardo Morel.

A compatibilidade entre presunção de inocência e as prisões cautelares / Ricardo Morel Lopes Júnior. – 2015.

62 f.: 30 cm.

Monografia (graduação) – Universidade Federal do Ceará, Faculdade de Direito, Curso de Direito, Fortaleza, 2015.

Orientação: Prof. Me. Raul Carneiro Nepomuceno.

1. Prisão preventiva. 2. Presunção de inocência. 3. Medidas cautelares. I. Título.

(5)

Inicialmente, gostaria de agradecer a Deus, que através do seu imenso amor, concedeu-me o precioso dom da vida, também a Nossa Senhora, pela sua intercessão ao seu filho amado, Jesus Cristo, rogando-me proteção, força e fé. A Jesus, por sua permanência constante na minha vida, proporcionando-me a cada dia novas forças e esperança para trilhar esse longo caminho, e ao Espírito Santo que me capacita a todas as coisas pela sua graça inefável.

Gostaria de agradecer aos meus pais, Ricardo Morel Lopes e Francisca Maria Oliveira Morel Lopes, por todo o amor e segurança gerados no seio familiar, os quais foram fundamentais para a minha formação pessoal e social, além do apoio que tive durante toda a vida para buscar meus objetivos e sonhos, por mais difíceis que pudessem parecer.

Igualmente, quero agradecer aos meus irmãos, Rafael Oliveira Morel Lopes e Mariana Oliveira Morel Lopes de Sousa, pelo respeito e amor fraterno.

Agradeço a minha namorada Mariane Paiva Norões, por todo apoio que me deu neste caminho, estando sempre ao meu lado e acreditando nas minhas capacidades quando por algum motivo pensava que iriam superar minhas forças.

(6)

"A liberdade não é somente um direito que se reclama para si próprio: Ela é também um dever que se assume em relação aos outros."

(7)

O presente trabalho tem por objetivo examinar a prisão cautelar e o princípio da presunção de inocência. Aborda uma possível (in)compatibilidade entre esses institutos, buscando aprofundar o instituto da presunção de inocência no direito brasileiro e a forma de aplicação das prisões cautelares, previstas durante o curso da persecução penal. Busca-se analisar as posições doutrinárias acerca da temática, bem como o posicionamento jurisprudencial diante de uma aparente colisão entre os dois institutos. Verifica-se, ainda, que a predominância dos julgados e das abordagens doutrinárias é a de que pode haver a antecipação cautelar da prisão desde que haja a estrita análise de seus pressupostos e a efetiva necessidade da medida, para que não seja a medida cautelar, de forma alguma, uma antecipação da pena, mas uma medida de extrema necessidade, enquadrando-se dentro dos requisitos legais que são estipulados.

Palavras-chave: Prisão cautelar. Presunção de inocência. Colisão de princípios. Medidas

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INTRODUÇÃO

1 PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA

1.1 Sistemas processuais penais e os direitos e garantias fundamentais no Estado

Democrático de Direito ... 12

1.2 A definição jurídica de princípio segundo o modelo de Robert Alexy... 14

1.3 Colisão entre princípios e sua aplicação ... 15

1.4 Princípio da presunção de inocência ... 18

2 PRISÕES CAUTELARES 2.1 Definição e espécies de prisão ... 21

2.2 Teoria das prisões cautelares ... 22

2.3 Prisão em fragrante ... 25

2.3.1 Flagrante próprio, propriamente dito, perfeito real ou verdadeiro... 26

2.3.2 Flagrante impróprio, imperfeito, irreal ou quase flagrante ... 26

2.3.3 Flagrante presumido, ficto ou assimilado ... 27

2.3.4 Flagrante preparado, provocado, crime de ensaio, delito de experiência ou delito putativo por obra do agente provocador ... 28

2.3.5 Flagrante esperado ... 28

2.3.6 Outras situações importantes de flagrante ... 29

2.3.7 Procedimentos e formalidades da prisão em flagrante ... 30

2.4 Prisão preventiva ... 32

2.4.1 Requisitos fáticos ... 33

2.4.2 Requisitos normativos ... 36

2.4.3 Revogação da prisão preventiva ... 38

2.4.4 Relaxamento da prisão preventiva por excesso de prazo... 39

(9)

2.5.1 Requisitos para decretação ... 41

2.5.2 Prazo de duração ... 43

3 A RELAÇÃO ENTRE A PRISÃO CAUTELAR E A PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA 3.1 A (in) compatibilidade entre a prisão cautelar e a presunção de inocência ... 44

3.2 A ponderação de valores ... 46

3.3 O progresso da Lei n. 12.403, de 04 de maio de 2011 ... 49

3.3.1 Medidas cautelares diversas da prisão (art. 319, CPP) ... 51

3.3.2 Prisão domiciliar ... 52

3.4 Prisão cautelar de Marcelo Bahia Odebrecht na operação “Lava Jato”... 53

CONCLUSÃO

(10)

O Princípio da Presunção de Inocência, positivado na Constituição Federal de 1988, prevê que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”, conforme expresso no art. 5º, inc. LVII, do referido diploma. Isso quer dizer que ninguém poderá ser considerado ou tratado como culpado enquanto for cabível recurso no processo penal.

Ao positivar este princípio, a Constituição de 1988 ampliou as garantias fundamentais do acusado, tutelando sua liberdade frente aos institutos do Processo Penal. Como por meio deste princípio positivado o acusado passou a ter a prerrogativa de ser considerado e tratado como inocente até o término do processo, passou a ser um sujeito de direito dentro da relação processual, tendo sido valorizado a dignidade da pessoa humana dentro do Estado Democrático de Direito.

Por outro lado, a Constituição Federal de 1988, no art. 5º, inc. LXI, também prevê que “ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente” e no inc. LXVI, afirma que “ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança”.

Tais dispositivos, apesar de restringir a ação do Estado, demonstram em seu texto legal a possibilidade de serem decretadas medidas cautelares prisionais ainda durante o processo penal, ou mesmo antes do seu início, dentro dos parâmetros da lei e devidamente autorizadas por autoridades judiciais. Tais medidas caracterizam-se como encarceramentos sem penas, visando a atingir objetivos autorizados por lei, porém, sem que tenha havido uma sentença penal condenatória transitada em julgado ainda.

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Como será possível a coexistência destes dois institutos indicados sem que um anule o outro? Será possível ser preservada a presenção de inocência após a aplicação de uma prisão cautelar?

É dentro dessa aparente contradição que este trabalho se propõe a procurar, a luz da opinião doutrinária e da jurisprudência dominante dos tribunais, analisar como são aplicáveis as medidas cautelares prisionais antes da sentença condenatória transitada em julgado dentro de um Estado Democrático de Direito, como é o caso do Brasil, que prevê em sua Constituição como um direito fundamental o Princípio da Presunção de Inocência.

Este trabalho irá procurar dar uma visão a cerca de como poderá ser solucionado as questões mais polêmicas e relevantes deste assunto, dando suporte teórico sobre os dois institutos em colisão, dividindo-se estruturalmente em três capítulos.

O primeiro capítulo irá tratar mais especificamente do Princípio da Presunção de Inocência. Dará inicialmente uma breve introdução histórica quanto ao surgimento e a importância dos Princípios, e seguirá na sua definição, seguindo para isso, a doutrina de Robert Alexy, quanto à definição de normas, regras e princípios, assim como a solução indicada por sua corrente doutrinária para a solução de colisões entre princípios e conflitos entre regras.

O segundo capítulo, por sua vez, proporá uma abordagem mais voltada às medidas cautelares prisionais. A abordagem irá trazer a doutrina de diversos autores contemporâneos sobre os temas de prisão em flagrante, prisão provisória e prisão temporária, a forma de aplicação, quando serão consideradas ilegais, além dos requisitos legais que a tornarão possíveis. Serão também analisados julgados recentes, demostrando como o tema é tratado pela jurisprudência nacional, e a análise atenta de como são tratados os requisitos e pressupostos para a aplicação de tais medidas ainda na persecução penal.

Por fim, o terceiro capítulo irá abordar os temas prepostos da Presunção de Inocência e das Medidas Cautelares Prisionais, fazendo uma análise quanto a (in)compatibilidade e a possibilidade da convivência harmônica entre eles, além da aplicação da ponderação de valores segundo o método de Robert Alexy, que busca solucionar a colisão entre ambos os institutos a partir da otimização das possibilidades fáticos e jurídicas, analisando o caso concreto, por meio de um sopesamente dos valores colidentes.

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(13)

O princípio da presunção de inocência encontra-se positivado na Constituição Federal de 1988 no inciso LVII, tendo sido de grande importância na formação do Estado Brasileiro como um Estado Democrático de Direito, valorizando a dignidade da pessoa humana e impondo limites ao poder do Estado sobre a vida e liberdade do individuo. Ao longo dos anos, tal instituto foi se desenvolvendo e ganhando forças no Direito brasileiro, tendo o como ápice sua positivação na Constituição Federal de 1988 como um direito e garantia individual de todos.

1.1

Sistemas Processuais Penais e os direitos e garantias fundamentais no

Estado Democrático de direito

O Processo Penal, a depender dos princípios que venham a informá-lo, pode se caracterizar quanto a sua estrutura como inquisitivo, acusatório ou misto. Essa classificação apontará o grau de garantia que tem o cidadão contra o arbítrio do Estado, assim como dará indícios do seu sistema constitucional. (TÁVORA; ALENCAR, 2012)

No sistema inquisitivo, o acusado é considerado mero objeto do processo, não sendo considerado sujeito de direitos, havendo, por isso, constante mitigação dos direitos e garantias individuais. Em nome do interesse coletivo, admite-se que o individuo figure em uma posição de absoluta sujeição.

Este sistema foi adotado na Europa a partir do século XIII e sua característica principal era a concentração de poderes nas mãos do juiz, que geria como entendesse as provas do processo, e não estava submetido ao princípio da imparcialidade.

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julgador e utilizar o sistema de apreciação das provas como sendo o do livre convencimento motivado.

Há também o sistema misto, tendo raízes na Revolução Francesa, que divide o processo em duas fases. A primeira, uma fase inquisitorial, secreta, com um juiz aos moldes inquisitivo, e uma segunda fase em que se dá o julgamento, com direito a ampla defesa e todos os direitos dela decorrentes.

Na Idade Média, quando ainda vigorava o sistema Inquisitivo, a prisão cautelar era regra durante o processo penal, vigorando o princípio da culpabilidade, ou seja, o réu era culpado até que se provasse o contrário em seu julgamento. (MUCCIO, 2011)

Com a queda do Absolutismo e o advento da Revolução Francesa, deu-se início, aos poucos, ao sistema acusatório, iniciado com a utilização do sistema misto, que culminou na passagem de uma “presunção de culpabilidade” para uma “presunção de não culpabilidade”, assegurando a inocência do acusado para todos os efeitos até o trânsito em julgado de uma sentença condenatória (PACELLI, 2014).

É possível, no entanto, a aplicação das medidas cautelares no âmbito do Direito Processual Penal, como medida de exceção nas ocasiões devidamente aparadas e limitadas pelo legislador, sem negar a aplicação do sistema processual acusatório.

Tratando em especial as medidas cautelares prisionais, é preciso levar em conta para aplicá-las uma série de princípios e garantias individuais fundamentais dispostas na Constituição Federal, e que têm uma elevada importância na forma normativa da Carta Magna de 1988.

Com o surgimento do Estado Democrático de Direito, passou a ser um ponto central da vida em sociedade o respeito à dignidade da pessoa humana, à liberdade e o respeito aos direitos humanos. Portanto, tem-se que os direitos fundamentais encontrados na Constituição de 1988 caracterizam a positivação destes direitos e sua efetivação (BONVIDES, 2013).

(15)

Com efeito, os direitos fundamentais são entendidos como direitos universais, ou seja, não é possível excluir nenhuma pessoa, seja qual for a circunstância em que se encontre, religião que pratique, classe social que pertença, em fim, nenhuma característica a fará perder este direito (BONAVIDES, 2013).

Para assegurar os direitos fundamentais, existem, por sua vez, as garantias constitucionais, que não se confundem com os direitos, mas formam um sistema de proteção destes. Tais garantias, ao serem consideradas coletivamente, são como imposições, positivas ou negativas, que visam assegurar a observância dos direitos fundamentais, ou, no caso de violação, sua reintegração. Neste sentido, José Afonso da Silva (2010, p. 189) define garantia constitucional:

São normas constitucionais que conferem, aos titulares dos direitos fundamentais, meios, técnicas, instrumentos ou procedimentos para impor o respeito e a exigibilidade de seus direitos. Nesse sentido, as garantias não são um fim em si mesmas, mas instrumentos para a tutela de um direito principal. Estão a serviço dos direitos humanos fundamentais, que, ao contrário, são um fim em si, na medida em que constituem um conjunto de faculdades e prerrogativas que asseguram vantagens e benefícios diretos e imediatos a seu titular.

O autor Alexandre de Morais (2015, p. 31) também afirma que “as garantias traduzem -se quer no direito dos cidadãos a exigir dos poderes públicos a proteção dos -seus direitos, quer no reconhecimento dos meios processuais adequados a essa finalidade”, assegurando ao cidadão o exercício do seu direito.

Sob essa perspectiva, Alexandre de Moraes (2015) ainda expressa que o princípio da presunção de inocência, previsto no art. 5º, inciso LVII, da Constituição Federal de 1988, é um dos princípios basilares do Estado Democrático de Direito, e, como garantia processual penal, objetiva à tutela da liberdade pessoal. Sendo assim, a presunção de inocência é uma importante garantia constitucional, que protege o sujeito de direito dentro da relação processual.

Além do mais, Luiz Flávio Gomes (1993, p. 93) faz a seguinte observação:

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É certo que, na aplicação de uma medida prisional, há restrição de direitos fundamentais, como o de liberdade de locomoção, por exemplo. Por isso, Eugênio Pacelli (2014, p. 36) faz a seguinte consideração:

Nesse campo, então, como teremos a oportunidade de salientar por ocasião das medidas cautelares pessoais, incluindo a prisão e, sobretudo, das provas, o recurso aos princípios e/ou postulados da proporcionalidade, da razoabilidade, ou, enfim, da adequabilidade, para análise de seus limites e possibilidades hermenêuticas, poderá enriquecer a leitura dos princípios constitucionais fundamentais. Em determinadas situações, a equação a ser resolvida, não poderá limitar-se à tradicional oposição entre segurança jurídica x liberdade individual. (grifo original)

Desta feita, é de essencial importância o estudo da definição e aplicação dos princípios jurídicos no Direito brasileiro.

1.2 A definição jurídica de princípio segundo o modelo de Robert Alexy

Para Robert Alexy (2006, p. 90), os princípios jurídicos consistem em uma espécie de normas jurídicas por meio das quais são estabelecidos deveres de otimização, aplicáveis em vários graus, segundo as possibilidades normativas e fáticas.

O traço de normatividade dado ao conceito de princípio foi o principal avanço da doutrina contemporânea dado na definição deste conceito. Seus primórdios datam de 1952, quando Crisafulli conceituou princípio. (BONAVIDES, 2013)

Virgílio Afonso da Silva (2014) esclarece o quanto é essencial a delimitação da definição de princípio para se delimitar também o conteúdo dos direitos fundamentais. Para ele, a depender do conceito de princípio que se adote será delimitado também o âmbito de proteção de cada direito fundamental.

Para um bom entendimento e delimitação dos princípios, é essencial diferenciá-los de regras que, apesar de também serem normas não se confundem com princípios. Essa distinção é a chave para a solução de problemas centrais da dogmática dos direitos fundamentais. Para Robert Alexy (2006, p. 85) sem essa distinção “não pode haver nem uma teoria adequada sobre as restrições a direitos fundamentais, nem uma doutrina satisfatória sobre colisões”.

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aplicação das prisões cautelares constitucionalmente previstas, é essencial estabelecer-se essa diferença entre regras e princípios.

Existem autores que defendem a diferenciação dos princípios e das regras quanto ao grau, sendo os princípios as normas mais importantes do ordenamento jurídico enquanto as regras serviriam para concretizar esses princípios. Outros, distinguem-os a partir do grau de abstração e generalidade, sendo os princípios mais gerais e abstratos do que as regras.

Porém, a teoria defendida por Robert Alexy é diversa. Para ele, a diferença entre princípios e regras é mais qualitativa, presente na própria estrutura de ambas. Segundo essa teoria, as regras garantem ou impõem direitos ou deveres definitivos. Ou seja, se um direito é garantido por uma regra, deve ser realizado totalmente, ressalvadas as exceções previstas em lei.

Já os princípios garantem ou impõem direitos ou deveres prima facie que, nem sempre, corresponde com o que é garantido ou imposto definitivamente. Ou seja, não se pode realizar sempre totalmente aquilo que a norma exige. Por isso, Alexy define princípios como mandamentos de otimização que se aplicará na maior medida possível diante das possibilidades fáticas e jurídicas existentes. (ALEXY, 2006)

Com efeito, os princípios são aplicáveis em cada caso concreto, devendo ser medido o grau de seu enquadramento e a forma como deve ser aplicado. Isso é de essencial importância na aplicação dos princípios no caso concreto, porque dificilmente a realização total de um princípio não encontrará barreiras na proteção de outro princípio ou de outros princípios (SILVA, 2014).

1.3

Colisão entre princípios e sua aplicação

Como foi introduzido anteriormente, tomando como parâmetro a legislação brasileira, e considerando a enorme quantidade de normas já existentes, bem como as que constantemente estão entrando em vigor, ao se fazer a análise das possibilidades jurídicas aplicável a um caso concreto não é difícil que haja colisão entre os princípios e conflito entre as regras.

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a ser mitigada uma cláusula de exceção, permitindo que em certa circunstância específica certa norma não deva ser aplicada (ALEXY, 2006).

Quando esses critérios não puderem ser aplicados, existem outros que podem nortear a solução do conflito de regras por outros critérios, como, por exemplo, o cronológico, o hierárquico ou a especialidade (NOVELINO, 2013).

No conflito de regras, utiliza-se o raciocínio do “tudo ou nada”, Como afirma Virgílio Afonso da Silva (2014, p. 47), “se duas regras preveem consequências diferentes para um mesmo ato ou fato, uma delas é necessariamente invalidada, no todo ou em parte”.

Porém, quando há a colisão entre princípios, a solução será completamente diversa e não tão simples, pois é uma colisão entre dois valores que se apresentam efetivamente protegidos como fundamentais. Não se pode, portanto, simplesmente invalidar um deles para aplicar o outro.

Sendo assim, quando ocorrer a referida colisão, Robert Alexy (2006) defende que a solução será estabelecida através da ponderação entre os princípios colidentes, em que um deles, em determinadas circunstâncias concretas, receberá a prevalência. Neste caso, os princípios possuem apenas uma dimensão de peso e não determinam as consequências normativas de forma direta.

Na realização do sopesamento, para se descobrir qual o princípio mais adequado a ser aplicado, é de extrema importância a utilização da máxima da proporcionalidade, visando a concretização da otimização das possibilidades fáticas e jurídicas (ALEXY, 2006).

Diante das possibilidades fáticas para a aplicação dos princípios, devem ser usadas as máximas de necessidade e adequação. Assim, necessidade e adequação são requisitos intrínsecos ao princípio da proporcionalidade, no seu sentido amplo.

Sobre a adequação, diz Renato Brasileiro de Lima (2011, p. 88):

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adequação na determinação do âmbito subjetivo de aplicação diz respeito à individualização do sujeito passivo da medida e à proibição de extensão indevida de sua aplicação.

Para Paulo Bonavides (2013, p. 410), “pelo princípio ou subprincípio da necessidade, a medida não há de exceder os limites indispensáveis à conservação do fim legítimo que se almeja, ou seja, uma medida para ser admissível deve ser necessária”.

Com efeito, a adequação se refere a adequar o meio ao fim que se intenta alcançar, ou melhor, o meio escolhido deve ser o melhor para se atingir o objetivo desejado. Já através da necessidade, deve-se ponderar para que a alternativa escolhida seja a menos gravosa aos direito fundamentais.

Quando se fala, no entanto, da otimização das possibilidades jurídicas, o ideal a ser utilizado é a proporcionalidade em sentido estrito. Esta impõe um juízo de ponderação entre o ônus imposto e o benefício trazido entre os valores em conflito. Robert Alexy (2006, p. 117) a define da seguinte forma:

A máxima da proporcionalidade em sentido estrito, ou seja, a exigência do sopesamento decorre da relativização em face das possibilidades jurídicas. Quando uma norma de direito fundamental com caráter de princípio colide com um princípio antagônico, a possibilidade jurídica para a realização dessa norma depende do princípio antagônico. Para se chegar a uma decisão é necessário um sopesamento nos termos da lei de colisão.

Portanto, como os princípios são normas com a mesma hierarquia e força vinculativa, além de ser obrigatória a aplicação dos princípios em certos casos concretos, nas hipóteses de colisão é necessária uma análise principiológica das normas de direito fundamental, sendo feito um sopesamento entre os princípios antagônicos para aplicá-los da forma correta, ou seja, de forma a atender os fundamentos e objetivos do Estado Democrático de Direito.

Dentro desta perspectiva, a aplicação de qualquer medida cautelar imposta pelo juiz no curso de um processo penal, ou mesmo antes dele, seja ela prisional ou não, deverá observar em sua imposição a necessidade, a adequação e a proporcionalidade da medida. Estes elementos deverão estar clarificados, de plano, na motivação judicial que decretar tal medida.

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segurança pública, a paz social, a integridade física da vítima que pode estar ameaçada com a liberdade do acusado.

No caso concreto, ao serem sopesados, analisados segundo a proporcionalidade, adequação e necessidade da medida, a partir das situações fáticas que envolvam o caso, irá prevalecer um princípio sobre o outro, não sendo possível aplicar uma relação em abstrato de precedência entre eles, pois em outras circunstâncias ou situação concreta, a mesma colisão poderia ter um sopesamento diferente que resultaria e solução de forma diversa.

1.4

Princípio da presunção de inocência

Apesar de ser mais conhecido como princípio da presunção de inocência, a melhor denominação que reflete esta garantia constitucional seria princípio da não culpabilidade. Isto, porque a Constituição Federal de 1988, em seu art. 5º, LVII, expressamente definiu este principio da seguinte forma: “Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.

Note-se que o texto legal utilizou a expressão “não considerado culpado”, ao invés de “considerado inocente”. Tal dispositivo concedeu expressamente ao cidadão direito de não ser declarado culpado, senão mediante sentença transitada em julgado, ao término do processo, em que o acusado tenha se utilizado de todos os meios de prova pertinentes para sua defesa, visando à destruição da credibilidade das provas apresentadas pela acusação, ou seja, a ampla defesa e o contraditório.

Porém, antes mesmo de ser positivado na Constituição de 1988, este princípio já era presente implicitamente na legislação brasileira principalmente em face do princípio do devido processo legal e, diante da legislação internacional aplicada pelo Brasil que trata do assunto, pode-se aplicar o termo presunção de inocência, como é feito, como sinônimo para não culpabilidade.

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pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência enquanto não se comprove legalmente sua culpa.”

A presunção de inocência acarreta na atividade jurisdicional uma série de consequências. Exemplo disso é que toda e qualquer prisão só poderá ser decretada se pautada na necessidade ou na indispensabilidade da providência em decisão fundamentada pelo juiz, ou seja, será medida de exceção presente antes de sentença condenatória transitada em julgado.

Tal fundamento está na proibição do excesso que, em outras palavras, significa a impossibilidade de antecipação dos efeitos da condenação antes do trânsito em julgado da sentença. Assim, o cumprimento da pena, a perda da primariedade, a execução civil da condenação, entre outros efeitos, pressupõem a condenação transitada em julgado.

Ademais, essa presunção, além de alcançar o mérito da culpabilidade, influi também no modo como o acusado é tratado no decorrer do processo, como deve ser tutelada a sua liberdade, sua integridade física e psíquica, sua honra, moral, sendo terminantemente vedado humilhações e constrangimentos desnecessários, exploração midiática em torno do suposto fato criminoso, ou qualquer ato incompatível com seu status, mesmo que presumido, de inocente.

Alguns autores, como Renato Brasileiro de Lima, Fernando Capez e Aury Lopes Jr., destacam em suas obras essa regra de tratamento a ser obedecida na persecução penal:

Portanto, por força da regra de tratamento oriunda do principio constitucional da não culpabilidade, o Poder Público está impedido de agir e de se comportar, em relação ao suspeito, ao indiciado, ao denunciado ou ao acusado, como se este já houvesse sido condenado definitivamente, enquanto não houver sentença condenatória com trânsito em julgado. (LIMA, 2011, p. 15)

Outra regra importante derivada da presunção de inocência a ser respeitada é a regra probatória, em que a parte acusadora tem o ônus de provar a culpabilidade do acusado, e não este de provar a sua inocência. Em outras palavras, o acusado não precisa provar que é inocente, mas para que seja possível a condenação, deve se provar que ele é culpado, não sendo obrigado, o acusado, a ajudar na apuração dos fatos, haja vista ninguém ser obrigado a criar provas contra si mesmo.

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apreciação de provas, mas uma valoração geral quanto à culpa do réu no crime analisado.Não se provando, ou não se utilizando de uma base probatória idônea e suficientemente relevante para a condenação, o réu não poderá ser responsabilizado por crime algum e considerado, portanto, inocente na sentença judicial.

Por fim, o princípio da presunção de inocência fortalece a garantia de que os efeitos da sentença não serão antecipados em nenhuma situação, mas somente após o devido processo legal, com todas as garantias constitucionais preservadas. Não pode o réu ser condenado sem provas que embase suficientemente sua condenação, nem ser tratado como culpado antes da condenação transitada em julgado.

(23)

Após feita a análise da Presunção de inocência, faz-se oportuno introduzir a ideia contraposta a ela, objeto do presente estudo. A medida cautelar prisional possui uma série de requisitos fáticos e normativos essenciais para a sua aplicabilidade. Em respeito ao status de inocente, devido a todo individuo que não tem sentença condenatória transitada em julgado, estas medidas cautelares devem ser aplicadas somente quando estritamente necessárias e possíveis segundo o ordenamento jurídico brasileiro que as regulamenta.

Quanto a isso, serão analisados quais esses requisitos em cada uma das medidas cautelares prisionais previstas no ordenamento jurídico brasileiro para tornarem tal aplicação legítima.

2.1

Definição e espécies de prisão

A origem etimológica da palavra prisão provém do latim prehensio, de prehendere, que tem o significado de ato de prender, privar da liberdade de locomoção, recolher ao cárcere. (LIMA, 2011)

Em outras palavras, a palavra prisão significa tirar a liberdade do individuo, privando-o do direito de ir e vir, garantido a todos, dentro dos parâmetros de exercício pleno de direito no ordenamento jurídico brasileiro.

Por sua vez, o processualista penal, Tourinho Filho (2012, p. 429), define prisão como a supressão da liberdade individual mediante clausura. “É a privação da liberdade individual de ir e vir; e, tendo em vista a denominada prisão albergue, podemos definir a prisão como a privação, mais ou menos intensa, da liberdade ambulatória”.

(24)

Além do mais, Renato Brasileiro de Lima (2011, p. 1175) afirma que a legislação brasileira não utiliza a palavra prisão de modo preciso, e sim contendo vários significados, a depender do contexto em que é colocada:

De fato, o termo prisão é encontrado indicando a pena privativa de liberdade (detenção, reclusão, prisão simples), a captura em decorrência de mandado judicial ou flagrante delito, ou, ainda, a custódia, consistente no recolhimento de alguém ao cárcere, e, por fim, o próprio estabelecimento em que o preso fica segregado.

Há, no entanto, uma enorme diferença entre a prisão que resulta do cumprimento de uma pena já imposta pelo juiz em sentença irrecorrível e uma prisão cautelar, presente no decorrer da instrução processual ou mesmo antes dela.

Dentro desse contexto, Tourinho Filho (2012) defende a existência de duas espécies de prisão, quais sejam, a prisão-pena e a prisão sem pena.

A prisão-pena (prisão ad poenam) seria a execução de uma sentença ao culpado de uma infração penal. Neste caso, o agente já foi reconhecidamente culpado de ter cometido uma infração penal, devendo, portanto, cumprir a pena imposta (TOURINHO FILHO, 2012).

Por mais que se queira negar, a pena é castigo: se o cidadão comete uma infração penal sujeita a pena privativa de liberdade, proferida em sentença condenatória, uma vez transitada em julgado, deverá ele ser segregado, afastado do convívio social, como retribuição do mal cometido, e, ao mesmo tempo, serve de intimidação a todos os possíveis e futuros infratores da lei penal. (TOURINHO FILHO, 2012, p. 435)

No que tange a prisão sem pena, Tourinho Filho (2012) afirma que é aquela que não tem caráter de pena, mas apenas um caráter cautelar. Sobre essa espécie, será tratada detalhadamente mais adiante. Antes, cumpre salientar que há certa divergência na doutrina a cerca de quais seriam as espécies de prisão.

Renato Brasileiro de Lima (2011), por exemplo, trata de três espécies de prisão: prisão Penal, conhecida como prisão pena; prisão cautelar, provisória, processual ou sem pena, cujas subespécies seriam a prisão em flagrante, prisão preventiva e a prisão temporária; e a prisão extrapenal, tendo como subespécies a prisão civil e a prisão militar.

(25)

depositário infiel foi decretada inconstitucional pela súmula vinculante 25 publicada pelo Supremo Tribunal Federal.

2.2

Teoria das prisões cautelares

Conforme foi citado anteriormente, prisão cautelar é aquela decretada antes do trânsito em julgado de uma sentença penal, ou seja, antes da decisão penal se tornar irrecorrível. Não tem, portanto, o caráter de pena para o aprisionado, mas seu objetivo é assegurar a eficácia das investigações ou do processo penal.

Certamente, diante do princípio da presunção de inocência, consagrado fortemente pelo Estado brasileiro na Constituição de 1988, o ideal seria que a privação da liberdade de uma pessoa se desse apenas com a prisão-pena, ou seja, depois de uma sentença condenatória irrecorrível.

Porém, do momento em que se inicia a investigação de um crime ao final do processo penal, com uma sentença definitiva, existe o risco de que a atuação jurisdicional seja prejudicada, fazendo-se necessário garantir a ordem pública ou a ordem econômica, ou até mesmo venha ser comprometida a eficácia e a utilidade do julgado, casos em que a legislação prevê medidas para evitar que isso ocorra.

Por esses motivos, em determinadas situações, faz-se necessário a adoção de medidas cautelares, visando atenuar esses riscos. Tais medidas, no entanto, precisam ser tomadas com a devida cautela, para que não se mitigue a presunção de inocência de forma ilegal e abusiva, inaceitável ao Direito brasileiro.

Antônio Scarance Fernandes (2002, p. 297) estabelece que as medidas cautelares “[...] são providências urgentes, através das quais se tenta evitar que a decisão da causa, ao ser proferida, não mais satisfaça o direito da parte, atingindo-se assim, a finalidade instrumental do processo consistente em uma prestação jurisdicional justa.”

Renato Brasileiro de Lima (2011, p. 1196) segue o mesmo pensamento, dizendo:

(26)

Ressalta-se ainda que, em análise do fundamento das medidas cautelares, existe uma divergência doutrinária de alguns autores e a doutrina tradicional. Estes adéquam ao Direito Processual Penal os termos utilizados no Processo Civil do Fumus Bonis iures e Periculum in Mora, segundo Calamadrei em sua obra Introduzione allo studio sistemático dei provedimenti

cautelari (CALAMADREI, apud LOPES JÚNIOR, 2013).

Aury Lopes Júnior, André Luiz Nicolitt, entre outros autores, consideram uma impropriedade jurídica a adequação desses termos para o processo penal, defendendo a existência de cruciais diferenças entre as medidas cautelares aplicadas no Processo Civil para as aplicadas no Processo Penal. Segundo a doutrina de Aury Lopes Júnior (2013), assim como a de outros autores, as expressões mais adequadas para o Processo Penal seriam Fumus

Commissi Delicti e o Periculum Libertatis.

No Processo Civil, a medida cautelar é utilizada quando houver a “fumaça do bom direito”. Porém, no Processo Penal, isso seria uma completa impropriedade jurídica e semântica, pois não se fala em direito, mas na possibilidade da ocorrência de um delito. São duas situações opostas. Não se pode impor a aplicação de uma medida cautela penal um

Fumus Boni Iuris, pois o que se tem na verdade é possibilidade do cometimento de um delito.

Em complemento a esse posicionamento, o risco no processo penal não tem como fator predominante o tempo, como ocorre no processo civil, mas, diante da situação de perigo criada pelo imputado, o risco decorre de sua liberdade. Assim, para se decretar uma medida cautelar prisional no Processo Penal, tem-se como fundamento não o Periculum in Mora, e sim o Periculum Libertatis que, concretamente, poderiam ser a fuga do imputado, o risco de prejudicar a coleta de provas, risco de graves prejuízos por cometimento de novos crimes pelo acusado, entre outros.

É necessário abandonar a doutrina de CALAMANDREI para buscar conceitos próprios que satisfaça plenamente as necessidades do processo penal, recordando sempre que as medidas cautelares são instrumentos a serviço do processo, para tutela da prova ou para garantir a presença da parte passiva. (LOPES JÚNIOR, 2013, p. 788)

(27)

No Processo Penal, para a aplicação das medidas cautelares, não se faz necessário um processo cautelar específico, mas são medidas tomadas pelo juiz dentro do próprio processo corrente. Assim também, diferente do que ocorre no Processo Civil, não existe no Processo Penal a possibilidade de aplicação de medidas cautelares inominadas e tampouco possui o juiz criminal o poder geral de cautela, como assegura o art. 798 do Código de Processo Civil.

Sobre o assunto, Eugênio Pacelli de Oliveira (2014, p. 523) se posiciona da seguinte forma:

Já a admissão de cautelares não previstas em lei pode abrir um perigoso leque de alternativas ao magistrado, dificultando, sobremaneira, o controle de sua pertinência e oportunidade, ficando em mãos de magistrado de primeiro grau a escolha de providências cujo controle de pertinência e adequação (além da proporcionalidade) seria muito mais difícil. No juízo cível, no boje do qual, em geral, se debate direitos subjetivos x direitos subjetivos, nem sempre a técnica legislativa aponta a melhor situação para a proteção do direito, de tal maneira que o próprio legislador autoriza uma margem mais flexível de manobra do julgador.

Tratando especificamente de medidas cautelares prisionais, vigoram hoje no Brasil três tipos de prisões cautelares: Prisão em Flagrante, Prisão Preventiva e Prisão temporária. Cada uma possui aspectos próprios de aplicação e características inerentes ao momento do seu cabimento.

É de extrema importância abordar cada uma de forma mais detalhada.

2.3

Prisão em flagrante

A expressão flagrante deriva do latim flagara – queimar, e flagrans – ardente brilhante. Em outras palavras, seria uma infração que está queimando, acontecendo, ou acabando de acontecer.

Seu fundamento acha-se inserido no artigo 5º, inciso LXI, da Constituição Federal de 1988, que assim versa: “ninguém será preso senão em flagrante delito [...]”, constituindo-se na única e excepcional espécie de prisão provisória efetuada sem ordem judicial, “tratando-se de privação da liberdade imposta por ato administrativo, motivado por uma verificada situação de urgência”, conforme afirma Maria Lucia Karam (2009. p. 26).

(28)

Em um primeiro momento, torna-se oportuno constatar que a prisão em flagrante é como uma medida de autodefesa da sociedade, pois como está expresso no art. 301 do Código de Processo Penal, qualquer pessoa do povo, inclusive a própria vítima, poderá prender quem se ache em flagrante delito. Trata-se aqui do chamado pela doutrina de flagrante facultativo, pois apesar de poder, ninguém será obrigado a realizar uma prisão em flagrante, ainda que presencie um crime. Para o particular, na verdade, a prisão em flagrante, na situação em que seja possível fazê-la, seria um exercício regular de direito.

Por outro lado, as autoridades policiais e seus agentes, deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito. Aqui, trata-se de flagrante obrigatório, compulsório ou coercitivo, pois estes sujeitos têm o dever de agir.

Superada esta análise, resta a importante definição prática na lei brasileira de o que seria preciso para se caracterizar uma situação de flagrante e quais os limites legais para tanto.

Existem diversas espécies de flagrante. Algumas enumeradas no art. 302 do Código de Processo Penal, outras trabalhadas pela doutrina e jurisprudência. Serão analisadas agora as mais recorrentes.

2.3.1 Flagrante próprio, propriamente dito, perfeito real ou verdadeiro

Estando previsto nos inciso I e II do artigo 302 do Código de Processo Penal, esta é a modalidade que mais se aproxima com a origem da palavra flagrante. Refere-se a quem está cometendo ou acaba de cometer a infração penal, mas ainda não se desligou da cena do crime.

Portanto, quem é surpreendido no momento em que está cometendo o fato típico do crime ou acabando de cometê-lo poderá ter sua prisão em flagrante efetuada, ainda que posteriormente seja reconhecida a atipicidade da conduta. Porém, não se aplica a esta hipótese ao agente que consegue se desvencilhar da vítima e do lugar do crime sem que tenha sido detido.

2.3.2 Flagrante impróprio, imperfeito, irreal ou quase flagrante

(29)

Neste ponto cabem duas colocações indispensáveis. Primeiramente, cabe salientar importância da expressão logo após, que significa imediata. Para se caracterizar esse tipo de flagrante é necessário que o agente, mesmo não tendo sido capturado no momento que realizava o fato típico, foi perseguido logo depois.

Também é indispensável para quase flagrante a continuidade na perseguição, não importando quanto tempo dure. O que configurará o flagrante não será o tempo que demorou para que o agente tenha sido encontrado, mas o fato de a perseguição ter sido contínua.

Tem-se a crença popular que o flagrante só poderá perdurar por 24 horas. No entanto, isso não encontra nenhum respaldo legal. Como Guilherme de Souza Nucci (2013, p.606) afirma “a perseguição por sua vez, pode demorar horas ou dias, desde que tenha tido inicio logo após a prática do crime”.

2.3.3 Flagrante Presumido, ficto ou assimilado

Previsto no inciso IV do art. 302 do Código de Processo Penal, neste caso, o autor é encontrado logo depois com instrumentos que façam presumir ser ele o autor do crime. Segundo entendimento do Superior Tribunal de Justiça não há necessidade de se demonstrar que a perseguição se iniciou imediatamente após o fato crime, bastando que a pessoa seja encontrada logo depois. Esse também é o posicionamento da maior parte da doutrina, mas não de forma absoluta.

A maior parte da doutrina tem entendido que a expressão “logo depois”, difere da “logo após” que caracteriza o flagrante impróprio. Esse posicionamento da doutrinaria defende que a primeira expressão, relacionada ao flagrante presumido, comporta um lapso temporal maior para a captura do autor, como expressa Fernando Capez ao citar Magalhães Noronha (2012, p. 316):

Embora as expressões dos incisos III e IV sejam sinônimas, cremos que a situação de fato admite um elastério maior ao juiz na apreciação do último, pois não se trata de fuga e perseguição, mas de crime e encontro, sendo a conexão temporal daquelas muito mais estreita ou íntima.

Porém, essa posição não é unânime. Outros doutrinadores não concebem essa diferença quanto à expressão dos incisos II e IV do art. 302. Exemplo dessa corrente de opinião é Renato Brasileiro de Lima (2011, p. 1281) que diz:

(30)

III). Deve ser interpretada com temperamento, a fim de não desvirtuar a própria prisão em flagrante. Com a devida Venia, pensamos que a expressão logo depois não é diferente de logo após, significando ambas uma relação de imediatidade entre o inicio da perseguição, no flagrante impróprio, e o encontro do acusado, no flagrante presumido. Na verdade a única diferença é que, no art. 302, inc. III, há perseguição, enquanto no art. 302, inc. IV, o que ocorre é o encontro do agente com objetos que façam presumir ser ele o autor da infração.

O mais importante na caracterização do flagrante presumido, portanto, se encontra na necessidade de o autor ser encontrado depois do crime, com objetos que façam presumir ser ele o autor do crime, um indício forte o suficiente para assegurar o embasamento necessário a essa suspeita e ser decretada a prisão em flagrante.

2.3.4 Flagrante preparado, provocado, crime de ensaio, delito de experiência ou delito

putativo por obra do agente provocador

Neste caso de flagrante, alguém instiga o autor à prática de um delito a fim de

prendê-lo em flagrante, mas, ao mesmo tempo, adota todas as providências para que o delito não se consuma.

Sobre esse tipo de flagrante o Supremo Tribunal Federal sumulou o entendimento que se trata de um crime impossível, pois desde o início já era comprovadamente impossível a consumação do delito e, consequentemente, é ilegal a prisão em flagrante. É isso que afirma a Súmula 145 do STF: “não há crime quando a preparação do flagrante pela polícia torna impossível a sua consumação”.

Neste contexto, Renato Brasileiro de Lima (2011, p. 1281) faz um interessante comentário, deixando claro o posicionamento da doutrina a cerca deste tema:

Como adverte a doutrina, nessa hipótese de flagrante o suposto autor do delito não passa de um protagonista inconsciente de uma comédia, cooperando para a ardilosa averiguação da autoria de crimes anteriores, ou da simulação da exterioridade de um crime.

Estes são, portanto, o posicionamento da doutrina e da jurisprudência, deixando claro ser inaceitável considerar a legalidade deste tipo de flagrante para acusar o autor e prendê-lo.

2.3.5 Flagrante Esperado

(31)

Há na doutrina posicionamentos no sentido de igualar o flagrante esperado com o flagrante preparado, alegando tratar-se da mesma forma de um crime impossível. Para essa corrente, a exemplo de Eugênio Pacceli de Oliveira (2014), ou se tornaria válido o flagrante provocado, ou tonaria ilegal também o flagrante esperado, visando à coerência da fundamentação de ambos.

Porém, não é essa a posição da doutrina majoritária e tampouco dos tribunais superiores. A jurisprudência do STJ já é consolidada no sentido de não aceitar de forma alguma a aplicação de crime impossível às situações de flagrante esperado, pois aqui a autoridade policial está apenas em alerta, não tendo de nenhuma forma instigado o autor à prática de crime.

Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça, em 02 de março de 2015, no Habeas

Corpus n. 242740, sendo relator o Ministro Ericson Maranhão, decidiu: “A hipótese de

flagrante esperado não afasta a ocorrência do delito e nem configura crime impossível”.

Ademais, o Superior Tribunal de Justiça, em 08 de junho de 2015, no Agravo em Recurso Especial n. 589337, sendo relator o Ministro Leopoldo de Arruda Raposo, firmou entendimento no sentido de nãohaver flagrante preparado, ante a demonstração inequívoca de oferecimento de droga por um dos acusados, espontaneamente, a um agente policial que se encontrava à paisana, porque tal conduta não foi provocada pelo agente público.

Mesmo diante destas posições jurisprudenciais, alguns autores, como Rogério Grecco e Guilherme de Souza Nucci, por exemplo, defendem que, apesar de, via de regra, não tratar-se de crime impossível, em algumas circunstâncias poderia se caracterizar o crime impossível mesmo no flagrante esperado. Nucci (2013, p. 609) afirma:

Eventualmente, é possível que alguma hipótese de flagrante esperado transforme-se em crime impossível. Ilustrando: caso a polícia obtenha a notícia de que um delito vai ser cometido em algum lugar e consiga armar um esquema tático infalível de proteção ao bem jurídico, de modo a não permitir a consumação da infração de modo nenhum, trata-se de tentativa inútil e não punível, tal como prevista no art. 17 do Código Penal.

(32)

2.3.6 Outras situações importantes de flagrante

Cabe ressaltar também a possibilidade do Flagrante Prorrogado, também chamado de Retardado ou de Ação Controlada. Neste caso, mesmo presenciando o crime, sabendo concretamente de sua prática, é permitido relativizar a obrigatoriedade da prisão em flagrante por parte da autoridade policial e seus agentes, como já analisado em item anterior, visando um momento mais oportuno do ponto de vista investigativo, para a efetivação da prisão. Esse retardo na prisão visa possibilitar a recuperação de mais bens jurídicos envolvidos no crime, assim como a identificação de outros agentes não presentes na ação controlada, por exemplo.

Esse tipo de flagrante é previsto na Lei de Organizações Criminosas, na Lei de Drogas, assim como na Lei de Lavagem de Dinheiro, tendo, nas duas últimas leis, a necessária permissão judicial para ser feita.

Existe ainda o chamado Flagrante Forjado ou Fabricado. Neste caso, trata-se de criar falsamente provas contra uma pessoa para possibilitar sua incriminação e consequente prisão em flagrante. Além de, logicamente, ser uma prisão ilegal, para quem forjou a situação tipifica-se em crime de abuso de autoridade (Lei 4898/65, art. 3º, “a”), caso trate tenha sido um policial, ou por denunciação caluniosa (Código Penal, art. 339), caso tenha sido um particular.

Por fim, em relação ao Crime Permanente, conforme direciona o art. 303 do Código de Processo Penal, a prisão em flagrante poderá ser realizada enquanto não cessar a permanência. Na mesma ótica, vê-se o Crime Continuado que, como se trata de mais de um crime e várias ações, irá incidir isoladamente a possibilidade de se efetuar a prisão em flagrante por cada uma delas, chamando-se de flagrante fracionado.

2.3.7 Procedimentos e formalidades da prisão em flagrante

Diante da gravidade da medida da prisão em flagrante, como visto anteriormente, a lei

exige uma série de procedimentos a serem tomados pela autoridade policial, visando máxima proteção ao princípio da presunção de inocência mitigado na aplicação da prisão.

O Código de Processo Penal tipifica o procedimento, de forma principal, nos artigos 304 a 306. O artigo 304 e seus parágrafos dizem o seguinte:

(33)

entrega do preso. Em seguida, procederá à oitiva das testemunhas que o acompanharem e ao interrogatório do acusado sobre a imputação que lhe é feita, colhendo, após cada oitiva suas respectivas assinaturas, lavrando, a autoridade, ao final, o auto.

§ 1o Resultando das respostas fundada a suspeita contra o conduzido, a autoridade mandará recolhê-lo à prisão, exceto no caso de livrar-se solto ou de prestar fiança, e prosseguirá nos atos do inquérito ou processo, se para isso for competente; se não o for, enviará os autos à autoridade que o seja.

§ 2o A falta de testemunhas da infração não impedirá o auto de prisão em flagrante; mas, nesse caso, com o condutor, deverão assiná-lo pelo menos duas pessoas que hajam testemunhado a apresentação do preso à autoridade.

§ 3o Quando o acusado se recusar a assinar, não souber ou não puder fazê-lo, o auto de prisão em flagrante será assinado por duas testemunhas, que tenham ouvido sua leitura na presença deste.

Destaca-se que tal procedimento, segundo consta no artigo 305, poderá ser feito por qualquer pessoa, no caso de impedimento de escrivão, depois de prestado compromisso legal, devido à urgência do procedimento é a importância da lavratura imediata do auto de prisão em flagrante.

O artigo 306 também trás regras de extrema importância.

Art. 306. A prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente, ao Ministério Público e à família do preso ou à pessoa por ele indicada.

§ 1o Em até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão, será encaminhado ao juiz competente o auto de prisão em flagrante e, caso o autuado não informe o nome de seu advogado, cópia integral para a Defensoria Pública.

§ 2o No mesmo prazo, será entregue ao preso, mediante recibo, a nota de culpa, assinada pela autoridade, com o motivo da prisão, o nome do condutor e os das testemunhas.

Vê-se que o Código apresenta um conteúdo detalhado das ações das autoridades policiais na lavratura do auto de prisão em flagrante, sem os quais tornará a prisão ilegal, ensejando a possibilidade do Relaxamento da prisão em flagrante, conforme indica o art. 310, I do mesmo código.

Apenas para destacar os pontos mais importantes neste procedimento apresentado, cabe ressaltar dois pontos que visam dar máxima segurança jurídica ao capturado, amenizando a mitigação da presunção de inocência, assegurando ao máximo a informação ao preso e garantindo-lhe a legítima defesa e o contraditório.

(34)

Em um segundo momento, até 24 horas da realização da prisão, será entregue ao preso nota de culpa, com base no § 2º do art. 306 do Código de Processo Penal, como procedimento de vital importância para a validade da prisão, pois garante a informação, cientificando-o sobre os reais motivos de sua prisão, os responsáveis por ela, assim como o nome das testemunhas. Esse procedimento é assegurando também constitucionalmente, segundo o art. 5º, LXIV da Constituição Federal.

2.4

Prisão Preventiva

A Prisão Preventiva é uma espécie de medida cautelar prisional, decretada pela autoridade judiciária competente de ofício, se no curso do processo penal, mediante representação da autoridade policial, ou a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente em qualquer fase da investigação ou do processo, conforme consta no art. 311 do CPP.

Nestor Távora e Rosmar Rodrigues Alencar (2012, p. 579) caracterizam a prisão preventiva como “medida de exceção, devendo ser interpretada restritivamente, para compatibilizá-la com o princípio da presunção de inocência (art. 5º, inciso LVII da CF), afinal, o estigma do encarceramento cautelar é por demais deletério à figura do infrator”.

Esta medida de exceção é confirmada no Código de Processo Penal, art. 282, § 6º que diz: “A prisão preventiva será determinada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar (art. 319)”. O Rol especificado no art. 319 do CPP é essencial para efetivar essa medida de exceção. Nele o legislador prevê diversas medidas que poderão satisfazer a proteção ao bem jurídico ameaçado, sem ter a necessidade de privar o acusado de sua liberdade.

Essas medidas cautelares vão desde a proibição do acusado de frequentar determinados lugares, ausentar-se da comarca em que estiver sendo julgado, monitoramento eletrônico e recolhimento domiciliar, até medidas como a proibição de manter contato com pessoa determinada, por exemplo. Sobre estas medidas cautelares alternativas à prisão, será abordado mais detalhadamente em ponto posterior do trabalho.

(35)

dominante o fato de não ser aceitável, por exemplo, a fundamentação de medida prisional somente pela análise da gravidade em abstrato do crime. É preciso que a decretação seja baseada em análise concreta do fato crime, em suas peculiaridades, na sua individualidade. Não se pode decretar uma prisão preventiva fundamentando-a de forma genérica com relação ao crime praticado, conforme se observa na decisão do Ministro do Supremo Tribunal Federal, Luiz Fux, em 11/05/2015, no Habeas Corpus n. 128108:

Prossegue dizendo que o édito constritivo da liberdade deve ser concretamente fundamentado, sendo inviável a menção apenas à gravidade em abstrato do delito. Requer, liminarmente e no mérito, a revogação da prisão preventiva do

paciente, com a expedição do respectivo alvará de soltura. [...] analisando os autos, verifica-se flagrante ilegalidade na decisão do Juízo singular que decretou a prisão preventiva sem lançar fundamentação idônea para tanto. (grifo nosso)

Além disso, é necessário para a aplicação desta prisão, que a decretação esteja de acordo com os requisitos fáticos (artigo 312) e os requisitos normativos (art. 313, do CPP), contendo decisão fundamentada do juiz assegurando a existência do fumus comissi delicti e do

periculum libertatis.

Estando presentes todos os requisitos apresentados a seguir que tornam legal a prisão preventiva, esta se justifica plenamente como medida cautelar, sendo necessária e possível sua aplicação. Em algumas circunstâncias, torna-se tão claro a necessidade da aplicação de uma prisão preventiva para o bem andamento do processo ou segurança da suposta vítima que não se considera uma mitigação da presunção de inocência, mas uma medida claramente necessária, que não ofende tal presunção.

2.4.1 Requisitos fáticos

O art. 312 do CPP prevê situações que deixam claro a existência do periculum

libertatis, necessário para a aplicação da cautelar.

O referido artigo traz quatro requisitos fáticos que devem servir de fundamentação para ensejar uma preventiva, bastando para tanto, que se enquadre em pelo menos um deles: garantia da ordem pública, garantia da ordem econômica, conveniência da instrução criminal e garantia da aplicação da lei penal.

(36)

Quanto à garantia da ordem pública, apesar da existência de diversas correntes sobre qual seria a abrangência desta expressão, de forma unânime a decretação da preventiva com base nesse fundamento visa evitar que o agente continue delinquindo no transcorrer da persecução penal, resguardar a sociedade da reiteração de condutas criminosas em decorrência da periculosidade do agente. Com base nesse fundamento, é realizado um juízo de periculosidade do agente, e não de culpabilidade, que, sendo positivo, se torna necessário a sua retirada cautelar do convívio social. Ressalta-se que essa periculosidade deve ser demonstrada com base em dados concretos, demonstrando que se o sujeito permanecer solto voltará a delinquir, sendo, portanto, um risco para a ordem pública.

É importante ainda, estabelecer a diferença entre a periculosidade do agente e a gravidade do crime cometido por ele ou a repercussão que o crime tomou. Estes dois aspectos não se confundem. Portanto, mesmo que um agente tenha cometido um crime hediondo, não se está subtendido somente pela gravidade do crime que é um risco a ordem pública, mas esse critério terá que ser analisado objetivamente quanto ao risco concreto de voltar a delinquir.

Apesar de alguns doutrinadores não concordarem com a repercussão social como elemento possível para a decretação da preventiva, Guilherme de Souza Nucci (2013) vai de encontro a muitas opiniões, fazendo parte da corrente que defende a posição que isso pode influenciar.

Para ele, para a aplicação da preventiva, deve-se analisar e sopesar três fatores, quais sejam, a gravidade concreta da infração, a repercussão social e a periculosidade do agente. E segue afirmando o seguinte:

Por vezes, pessoa primária, sem qualquer antecedente, pode ter sua preventiva decretada porque cometeu delito muito grave, chocando a opinião pública (ex.: planejar meticulosamente e executar o assassinato dos pais). Logo, a despeito de não apresentar periculosidade (nunca cometeu crime e, com grande probabilidade, não tornará a praticar outras infrações penais), gerou enorme sentimento de repulsa por ferir as regras éticas mínimas de convivência, atentando contra os próprios genitores. A não decretação da prisão pode representar a malfadada sensação de impunidade, incentivadora da violência e da prática de crimes em geral, razão pela qual a medida cautelar pode tornar-se indispensável. (NUCCI, 2013, p. 622)

(37)

Renato Brasileiro de Lima (2014, p. 1326) defende a possibilidade de aplicação da preventiva com base neste aspecto de seguinte forma:

[...] possibilita a prisão do agente caso haja risco de reinteração delituosa em relação a infrações penais que perturbem o livre-exercício de qualquer atividade econômica, com abuso do poder econômico, objetivando a dominação dos mercados, a eliminação da concorrência e o aumento arbitrário dos lucros.

Os crimes que atentam contra a ordem econômica estão previstos nas leis especiais, esparsas, extravagantes, como é o caso, por exemplo, da Lei 1.521/51 (crimes contra a economia popular), Lei 7.134/83 (crimes de aplicação ilegal de créditos, financiamentos e incentivos fiscais), Lei 7.492/86 (crimes contra o sistema financeiro nacional), Lei 8.078/90 (crimes previstos no Código de defesa do Consumidor), Lei 8.137/90 (Crimes contra a ordem tributária, econômica e contra a relação de consumo), Lei 8.176/91 (crimes contra a ordem econômica), Lei 9.613/98 (crimes de lavagem de capitais), entre outros presentes na legislação pátria.

Dentre essas hipóteses de aplicação da preventiva para assegurar a ordem econômica citadas acima, a que mais tem merecido destaque pela doutrina é o art. 30 da Lei nº 7.492/86 (crimes contra o sistema financeiro nacional), que sustenta a possibilidade de aplicação da medida prisional em razão da magnitude da lesão, sem a análise conjunta dos art. 312 e 313 do CPP.

Porém, essa possibilidade é combatida pela doutrina, como explica Nestor Távora (2012, p. 583): “Ao que parece, coadunando o entendimento majoritário que o fundamento não se sustenta, afinal, a necessidade do cárcere não pode estar pautada na magnitude da lesão causada pela infração”.

Já a prisão por conveniência da instrução criminal, visa impedir que o acusado perturbe ou impeça a livre produção de provas, destruindo-as, ameaçando testemunhas ou comprometendo de qualquer maneira a busca da verdade. Neste caso, mostra-se completamente plausível a aplicação da prisão preventiva.

(38)

Por outro lado, é de suma importância destacar que, pela circunstância imposta a esse tipo de motivação da preventiva, em findando a instrução criminal, ou não havendo mais o risco desta ser prejudicada, caberá ao juiz revogar tal medida.

O último critério motivador trazido pelo art. 312 do CPP é o de garantia de aplicação da lei penal. Esta é a situação que se aplica no caso de o agente demonstrar que pretende fugir e inviabilizar a possível futura execução penal.

Pela subjetividade desta análise, é preciso se ter muito cuidado para não violar o princípio da presunção de inocência por meras suposições. Tem entendido a doutrina e a jurisprudência que não se pode presumir a fuga. Para decretar a preventiva com base nesta motivação, é preciso ter elementos de prova concretos de que é real a intenção do agente de fugir e frustrar a possível execução penal.

Por fim, em nível de esclarecimento, faz-se necessário estabelecer o sentido do art. 366 do CPP que afirma:

Se o acusado, citado por edital, não comparecer, nem constituir advogado, ficarão suspensos o processo e o curso do prazo prescricional, podendo o juiz determinar a produção antecipada das provas consideradas urgentes e, se for o caso, decretar prisão preventiva, nos termos do disposto no art. 312.

É importante deixar claro que, neste caso, o Código não criou uma nova possibilidade de aplicação da prisão preventiva e não se pode deduzir pela sua citação por edital que o agente frustrar a aplicação da pena. Como o próprio artigo menciona, só será aplicada a preventiva se for o caso, analisando, independente do tipo de citação, se é possível enquadrar o caso concreto no art. 312 do CPP.

2.4.2 Requisitos normativos

Os requisitos normativos para a aplicação da preventiva, sempre levando em conta os aspectos do art. 312 em análise conjunta, são expressos no art. 313 do Código de Processo Penal, que apresenta hipóteses de admissibilidade da medida, contendo a seguinte redação:

Art. 313. Nos termos do art. 312 deste Código, será admitida a decretação da prisão preventiva:

I – nos crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 (quatro) anos;

(39)

III – se o crime envolver violência domestica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência;

IV – (revogado).

Parágrafo único. Também será admitida a prisão preventiva quando houver dúvida sobre a identidade civil da pessoa ou quando esta não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la, devendo o preso ser colocado imediatamente em liberdade após a identificação, salvo se outra hipótese recomendar a manutenção da medida.

No caso do inciso I, esta condição está diretamente relacionada com o princípio da proporcionalidade. Sabe-se que, pelas regras do Código Penal, o inc. I do art. 44, via de regra, possibilita a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito quando for aplicada pena não superior a quatro anos e o crime não for cometido mediante grave ameaça à pessoa. Assim, se o crime praticado tem pena máxima de 4 anos, em condições normais, sua pena não passará da máxima.

Além disso, o art. 33, §2º, alínea “c”, do CP possibilita ao condenado não reincidente, cuja pena seja igual ou inferior a quatro anos, cumpri-la em regime aberto. Com isso, é notório perceber que realmente seria desproporcional aplicar uma cautelar prisional a um agente que, nem mesmo após a aplicação da pena, ficaria preso.

O inciso II mostra clara relação com o aspecto de garantir a ordem pública do art. 312 do CPP, pois se preocupou com a prática reiterada de delitos. Neste caso, não se observa a distinção se a pena para o crime for de reclusão ou de detenção. Caso trate-se de reincidência em crime doloso, é permitida a aplicação da preventiva.

Ressalta-se, no entanto, a observância aos critérios de reincidência do art. 64, inc. I do CP, que não prevalece se passados cinco anos da extinção da pena por crime anterior.

Quanto ao inciso III, a intenção da norma visa dar maior proteção a pessoas mais vulneráveis. Por isso o inciso se refere à mulher, criança e adolescente, idoso, enfermo e pessoa com deficiência.

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