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ANÚNCIOS DE EMPREGOS: DISCRIMINAÇÃO E RESPONSABILIDADES

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A N Ú N C I O S D E E M P R E G O S : DISCRIMINAÇÃO E RESPONSABILIDADES

J O R G E L U I Z S O U T O M A I O R ' -»

Discriminar é distinguir coisas, pessoas, idéias, e m c o nf o rmidade c o m s u as características próprias e critérios b e m definidos. Discriminar é distin­

guir. O t e rm o discriminação, portanto, n ã o possui, etimológicamente falan­

do, por si só, u m sentido pejorativo.

Entretanto, a e x pr e s s ã o t e m sido usada, c o m u m e n t e , para designar a situação e m q u e s e faz u m a distinção entre p e s s o a s q u a n d o esta distinção n ã o s e justifica.

Para s e r m o s b e m honestos, antes d e c o m e ç a r qualquer a b o r d a g e m sobre este tema, d e v e m o s reconhecer: todos n ó s discriminamos. O s juizes discriminam, o s procuradores discriminam, o s m é d i c o s discriminam, o s a d ­ v o g a d o s discriminam, o s jornalistas discriminam... N e m m e s m o a o poeta e s c a p o u esta realidade!

N ã o importa a profissão, pois n ã o s o m o s o q u e fazemos. S o m o s , a n ­ tes d e tudo, pessoas, e as p e s s o a s discriminam.

T e m o s u m a tendência indisfarçável d e olhar d e m o d o estranho aqueles q u e s ã o diferentes d e nós. E até por isto m e s m o n o s a s s o c i a m o s a o s q u e s e a s s e m e l h a m a nós. Aliás, para s e socializar o h o m e m s e standartiza {se é q u e esta palavra existe, m a s d e todo m o d o , sei q u e vocês entenderam).

O maior e x e m p l o disso talvez seja a existência d a m o d a , q u e varia d e acordo c o m o tempo, o lugar e m e s m o a faixa etária. Durante a l g u m t e m p o m e u s o n h o era usar calça b o c a fina e c a m i s a H a n g Teen, para p o d e r fazer parte d a “tchurma"; depois, calça b o c a larga c o m c a m i s a havaiana. Hoje e m dia, q u e a m o d a é u m p o u c o m a is livre, insistem e m m e dizer q u e n ã o é compatível c o m a m i n h a função usar certos tipos d e roupas.

M e s m o para parecer u m intelectual, o q u e à s v e ze s é interessante para evitar u m a discriminação, h á posturas d e q u e n ã o s e p o d e fugir. N a ­ quele joguinho idiota, q u e alguns a d or a m , d o bate-bola, para n ã o causar

C ) Juiz d o Trabaifio, titular d a 3" Vara d e Jundial/SP. Protessor livre-docente d a Fa culdade d e

Direito d a USP.

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e s pa n t o e obter u m a certa aceitação, você d e ve responder: cantor: C a e t a ­ n o Veloso; filme: C i d a d ã o K a ne ; livro: O p e q u e n o príncipe; sonho: a p a z n o m u n d o (que vale tanto para entrevista n o J ô q u an t o para c o nc u r s o d e Miss).

A t é a l i ng u a g e m é utilizada para separar o s grupos sociais, c o m o objetivo d e institucionalizar a reserva d e mercado. O s juristas t ê m u m m o d o peculiar e enigmático d e falar. Q u e dirá a o leigo a expressão?: “data venia", n ã o m e r e c e acolhida a arguição d o réu. Dirimida, assim, a questão, rejeita- s e a preliminar d e litispendência, visto q u e a s c a u s a s d e pedir, n o s e u d a d o remoto, s ã o diversas."

E q u a n d o o s e c onomistas e m p l a c a m ? : "Por trás d a q u e d a gradativa d o s juros n ã o estão insegurança, timidez, e x ce s s o d e conse r v a do r i s mo ou cautela. Trata-se a p e n a s d o reflexo d e u m a assimetria natural entre a velo­

cidade d e u m c h o q u e e o ritmo d e reversão d a política monetária à posição d e equilíbrio” (Henrique Meirelles, Presidente d o B a n c o Central, n o jornal Folha d e S ã o Paulo, 29.7.03, p. B-10)

M e s m o o s jornalistas, pressionados pela falta d e e s p a ç o n o s jornais, a c a b a m a p re s e n t an d o o s s e u s enigmas: “M a n t e g a v ê acordo d e carros este ano" (Folha d e S ã o Paulo, 29.7.03, p. B-2).

Para o s policiais, o cidadão já s e transformou e m “e l e m e n t o ” h á muito tempo.

Queria m e n c i o n a r a l g u m a coisa t a m b é m sobre o s médicos, m a s c o m o n ã o e n te n d o a letra deles...

O fato é que, m e s m o r e c o n h e c e n d o q u e a conduta discriminatória existe e habita o cotidiano d o s arranjos sociais, n ã o s e p o d e concebê-la c o m o normal, pelo m e n o s s o b a ótica d o direito.

A h u m a n i d a d e , n a era d o s direitos h u m a n o s , r e c o n h e c e u a anormali­

d a d e d a s discriminações. Tanto isto é v e rd a d e q u e o s instrumentos jurídi­

c o s d e âmbito internacional, criados a p ó s a 2 a G u er r a Mundial, trazem, todos eles, preceitos jurídicos contra a discriminação.

H á n o r m a s neste sentido:

a) n a D e claração d a Filadélfia, d e 1944, q u e trata d o s fins e objetivos d a Q r g a n i z a ç ã o Internacional d o Trabalho:

'Todos o s seres h u m a n o s , qualquer q u e seja s u a raça, s u a crença, o u s e u sexo, t e m o direito d e perseguir s e u progresso material e s e u d e ­ senvolvimento espiritual e m liberdade e dignidade, e m s e g u r a n ç a e c o n ô ­ m i ca e c o m c h a n c e s iguais";

b) n a Declaração Universal d o s Direitos d o H o m e m , d e 1948:

"Todos o s h o m e n s n a s c e m livres e iguais e m dignidade e direitos.

S ã o d o ta d o s d e razão e consciência e d e v e agir e m relação u n s a o s outros c o m espírito d e fraternidade.” (art. 12)

‘T o d o h o m e m t e m c a pa c i d a de para g o za r o s direitos e a s liberdades estabelecidas nesta Declaração, s e m distinção d e qualquer espécie, seja d e raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política o u d e outra natureza, o r ig e m nacional o u social, riqueza, nascimento, o u qualquer outra condi­

ção." (art. 2 fi)

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"Todo h o m e m t e m direito a o trabalho, à livre escolha d e e m p r e g o , a condições justas e favoráveis d e trabalho e à proteção contra o d e s e m p r e ­ go.” {art. 23, 1)

c) n a D e claração A m e r i c a n a d o s Direitos e D e v e r e s d o H o m e m , d e 1948:

Art. 2 a

'Todas a s p e s s o a s s ã o iguais perante a lei e t ê m o s direitos e deveres c o n s a g r a d o s nesta Declaração, s e m distinção d e raça, língua, crença, ou qualquer outra.”

Art. 14.

"Toda p e s s o a t e m direito a o trabalho e m condições dignas e o direito d e seguir livremente s u a vocação, n a m e d i d a e m q u e for permitido pelas oportunidades d e e m p r e g o existentes.”

d) n a C o n v e n ç ã o Internacional sobre a Eliminação d e todas as F o r m a s d e Discriminação Racial, adotada pela Resolução n. 2.10 6 -A 0 0 0 d a A s s e m ­ bléia Geral d a s N a ç õ e s Unidas, e m 21 d e d e z e m b r o d e 1 9 6 5 e ratificada pelo Brasil, e m 2 7 d e m a r ç o d e 1968, q u e enuncia e m s e u preâmbulo:

“C o n v e n c i d o s d e q u e todas as doutrinas d e superioridade f u n d a m e n ­ tadas e m diferenças raciais s ã o cientificamente falsas, m o r a l m e n t e c o n d e ­ náveis, socialmente injustas e perigosas, e q u e n ã o existe justificativa, o n d e q u er q u e seja, para a discriminação racial, n e m n a teoria e t a m p o u c o na prática”;

e) n a C o n v e n ç ã o A m e r i c a n a sobre Direitos H u m a n o s (Pacto d e S ã o J o s é d a C o s t a Rica), d e 2 2 d e n o v e m b r o d e 1969:

"Art. 1 a O b ri g a ç ã o d e respeitar o s direitos:

1. O s Estados Partes nesta C o n v e n ç ã o c o m p r o m e t e m - s e a respeitar o s direitos e liberdades nela reconhecidos e a garantir s e u livre e pleno exercício a toda p e s s o a q u e esteja sujeita a s u a jurisdição, s e m discrimina­

ç ã o a l g u m a por motivo d e raça, cor, sexo, idioma, religião, opiniões políti­

c a s o u d e qualquer outra natureza, o r ig e m nacional o u social, posição e c o ­ nômica, n a sc i m e n to o u qualquer outra condição social.”

f) n o Protocolo Adiciona! à C o n v e n ç ã o Interamericana sobre Direitos H u m a n o s e m Matéria d e Direitos E c on ô m i c os , Sociais e Culturais (Proto­

colo d e S ã o Salvador), d e 1 7 d e n o v e m b r o d e 1998.

"Art. 3 a

O b ri g a ç ã o d e não-discriminação.

O s Estados Partes neste Protocolo c o m p r o m e t e m - s e a garantir o exer­

cício d o s direitos nele enunciados, s e m discriminação a l g u m a por motivo d e raça, cor, sexo, idioma, religião, opiniões políticas o u d e qualquer natu­

reza, o r ig e m nacional o u social, posição e c onômica, n a sc i m e n to o u qual­

q u er outra condição social."

REVISTA D O T R T D A 15a R E G I Ã O — N. 24 — J U N H O , 2004

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g) e, n a C o n v e n ç ã o sobre a Eliminação d e T o d a s a s F o r m a s d e Dis­

criminação Contra a s Mulheres, a d ot a d a pela R e s o l u ç ã o n. 34/180 d a A s ­ sembléia Geral d a s N a ç õ e s Unidas, e m 18 d e d e z e m b r o d e 1 9 7 9 e ratifica­

d a pelo Brasil e m 12 d e fevereiro d e 1984, l e m b r a n d o que:

“o s Estados-partes n a s C o n v e n ç õ e s Internacionais sobre Direi­

tos H u m a n o s t ê m a obrigação d e garantir a o h o m e m e à m u lh e r a igualdade d e g o z o d e todos o s direitos e c onômicos, sociais, culturais, civis e políticos".

A discriminação, atingido a dignidade d a p e s s o a agredida, trata-se, portanto, d e t e m a pertinente a o s direitos h u m a n o s . P a ra s e ter u m a idéia d o q u e isto representa, vale esclarecer q u e a proteção d o s direitos h u m a ­ n o s transcende até m e s m o o p o de r d o Estado. O E s ta d o brasileiro, c o m o signatário d a Declaração Interamericana d e Direitos H u m a n o s , d e v e res­

p o n d e r à C o m i s s ã o Interamericana d e Direitos H u m a n o s pelos s e u s atos e o m i s s õ e s q u e d i g a m respeito à eliminação d a s discriminações, p o d e n d o ser c o mp e l i d o pela Corte Interamericana d e Direitos H u m a n o s a Inibir a violação d o s direitos h u m a n o s e até a reparar a s c o n s e q ü ê n c l a s d a viola­

ç ã o d e s s e s direitos mediante o p a g a m e n t o d e Indenização justa à parte lesada (art. 63, Pacto S ã o J o s é d a C o st a Rica)'1'.

Isto significa q u e s e levada a juízo u m a questão q u e diga respeito à violação d e u m direito h u m a n o , e a discriminação é f u n d a m e n t a l m e n t e u m ato q u e viola a dignidade h u m a n a , s e qu e r o Judiciário brasileiro t e m a últi­

m a palavra, s e s u a decisão n ã o foi eficiente para reparar o d a n o sofrido pela vítima. O u e m outros termos, e m s e tratando d e direitos h u m a n o s , os juízes n ã o p o d e m m a n t e r u m a postura indiferente e c o m p l a c e n t e c o m o agressor.

E x e m p l a r neste sentido é o c a s o n. 12.201, e n c a m i n h a d o à C o m i s s ã o Interamericana d e Direitos H u m a n o s , q u e reflete a situação d e u m a p e s s o a q u e teria sido discriminada por anúncio d e e m p r e g o , publicado n o Jornal Folha d e S ã o Paulo, d e 0 2 d e m a r ç o d e 1997, pelo qual s e previa q u e a candidata a o e m p r e g o ofertado fosse “preferencialmente branca”. A vítima apresentou queixa n a Delegacia d e Investigações sobre C r i m e s Raciais, m a s o Ministério Público pediu arquivamento d o processo, aduzindo q u e o ato n ã o se constituiu crime d e racismo, o q u e foi seguido pelo juiz, q u e determinou, enfim, o s e u arquivamento.

A questão, n o entanto, foi conduzida à C o m i s s ã o Interamericana de Direitos H u m a n o s , e m 0 7 d e outubro d e 1997, tendo sido o c a s o aceito, c o m notificação d o E s ta d o brasileiro para apresentar s u a defesa. Trata-se, portanto, d a primeira situação e m q u e o Estado brasileiro, nesta matéria, (1) Pa r a m a ior es esclarecimentos a respeito, vide Flávia Piovesan, '‘Introdução a o S i s t e m a Interamericano d e Pr oteção d o s Direitos H u m a n o s : a C o n v e n ç ã o A m e r i c a n a sobre Direitos H u m a n o s " ,

in

S i s t e m a Interamericano d e Proteção d o s Direitos H u m a n o s : legislação e juris­

prudência. S ã o Paulo: Centro d e E s t u d o s d a Procuradoria Geral d o E s tad o d e S ã o Paulo,

2001, pp. 70-104.

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260 REVISTA D O T R T D A 15* R E G I Ã O — N. 24 ~ J U N H O , 2004

p o d e receber relatório final d a C o m i s s ã o , responsabilizando-o pela viola­

ç ã o d e dispositivos d a C o n v e n ç ã o A m e r i c a n a q u e c u i d a m d e discriminação racial.

N o próprio o r d e n a m e n t o interno, vários s ã o o s instrumentos jurídicos criados para coibir a discriminação.

S o b r e s s a e m , neste sentido:

a) o artigo 3 8 inciso IV, d a CF:

"Constituem objetivos fundamentais d a República Federativa d o Brasil:

IV- p r o m o v e r o b e m d e todos, s e m preconceitos d e origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras f o rm a s d e discriminação."

b) o artigo 5 2, e s e u inciso I, d a CF:

"Todos s ã o iguais perante a lei, s e m distinção d e qualquer nature­

za...”

I — h o m e n s e mulheres s ã o Iguais e m direitos e obrigações, n o s ter­

m o s desta Constituição."

c) e a Lei n. 7.716, d e 5 d e janeiro d e 1989, c o m a s alterações d a d a s pela Lei n. 9.459/97, q u e define c o m o crime o preconceito o u a discrimina­

ç ã o e m função d e raça, cor, etnia, religião o u procedência nacional:

"Art. 4 S N e g a r o u obstar e m p r e g o e m e m p r e s a privada.

Pena: reclusão d e dois a cinco anos."

“Art. 16. Constitui efeito d a c o n d e n a ç ã o a p e rd a d o cargo o u função pública, para o servidor público, e a s u s p e n s ã o d o funcionamento d o esta­

belecimento particular por prazo n ã o superior a três meses."

"Art. 17. (Vetado)."

"Art. 18. O s efeitos d e q u e tratam o s arts. 16 e 17 desta Lei n ã o s ã o automáticos, d e v e n d o ser m o t i v a d a m e n t e declarados n a sentença.”

"Art. 20. Praticar, induzir o u incitar a discriminação o u preconceito d e raça, cor, etnia, religião o u procedência nacional.” ( R e d a ç ã o d a d a peia Lei n. 9.459, d e 15.05.97).

"Pena: reclusão d e u m a três a n o s e multa.”

O s atos discriminatórios poderão, ainda, conferir à vítima o direito a u m a reparação. F u n d a m e n t a m , juridicamente, esta pretensão, vários o u ­ tros dispositivos:

a) n a Constituição Federal:

Art. 5°, incisos V e X, d a CF:

" V — é a s s e g u r a d o o direito d e resposta, proporcional a o agravo, a l ém

d a indenização por d a n o material, moral o u à i m a g e m ; ”

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“X — s ã o invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a i m a g e m d a s pessoas, a s s e g u r a d o o direito a indenização pelo d a n o material o u moral decorrente d e s u a violação;”

b) n o N o v o C ó d i g o Civil:

“Art. 186. A q u e l e que, por a ç ã o o u o m i s s ã o voluntária, negligência o u imprudência, violar direito e causar d a n o a outrem, ainda q u e exclusiva­

m e n t e moral, c o m e t e ato ilícito.” (grifou-se)

O artigo 1 8 7 acrescenta q u e será considerado ilícito o ato, i n de p e n ­ d e n t e m e n t e d e culpa, q u a n d o o titular d e u m direito, “a o exercê-lo, e x c e d e m a ni f e stamente o s limites impostos pelo s e u fim e c o n ô m i c o o u social, pela boa-fé o u pelos b o n s costumes".

A eficácia destes dispositivos (arts. 1 8 6 e 187) é d e te rminada pelos artigos 9 2 7 e seguintes, q u e c u i d a m d a responsabilidade civil, o u até m e ­ lhor, d a obrigação d e indenizar q u e t o m b a sobre aqueles q u e c o m e t e m o ato ilícito.

A responsabilidade civil e m questão, n o s t e r m o s d o parágrafo único d o m e s m o artigo 927, é objetiva, isto é, n ã o d e p e n d e d e culpa n o s c a so s especificados e m lei o u " q u a n d o a atividade n o r m a l m e n t e desenvolvida pelo autor d o d a n o implicar, por s u a natureza, risco para o s direitos d e outrem".

O valor d a indenização m e d e - s e pela extensão d o d a n o (art. 944), m a s isto n ã o inibe o caráter punitivo d a indenização, c o m o f o r m a d e desestimular a continuação d a prática d o ato ilícito, especialmente q u a n d o o f u n d a m e n t o d a indenização for a extrapolação d o s limites e c o n ô m i c o s e sociais d o ato praticado, pois s o b o ponto d e vista social o q u e importa n ã o é reparar o d a n o individualmente sofrido, m a s impedir q u e outras pessoas, vítimas e m potencial d o agente, p o s s a m vir a sofrer d a n o análogo.

A reparação d o dano, nestes casos, t e m natureza social e n ã o m e r a ­ m e n t e individual. N ã o é, portanto, m e r a m e n t e , d o interesse d e ressarcir o d a n o individual q u e s e cuida. É neste sentido, aliás, q u e o artigo 944, esta­

belece q u e a indenização m e d e - s e pela extensão d o dano, pressupondo, assim, o e x a m e d e ser o d a n o m e r a m e n t e individual o u possuir importante repercussão social.

R e t o r n a n d o a o t e m a específico d e n o s s a discussão, o s anúncios d e e m p r e g o publicados e m jornais e revistas, n ã o s e p o d e deixar d e r e c o n h e ­ cer (basta ler o s jornais...) q u e o d e s e m p r e g o é o maior p r o b l e m a social de n o s s o país, d o qual a d v ê m vários outros p r ob l e m a s c o m o desajuste fami­

liar, violência, tráfico d e drogas etc. A conquista d e u m e m p r e g o , portanto, é fator essencial d a m a n u t e n ç ã o d a própria condição h u m a n a , sobretudo neste m u n d o capitalista e discriminatório.

N o contexto d a s n o r m a s internacionais n e ga r o a c e s s o a o e m pr e g o , à política d e pleno e m p r e g o , é, inegavelmente u m a agressão a o s direitos h u m a n o s e isto serve, igualmente para o Brasil que, vale acrescentar, rati­

ficou a c o n v e n ç ã o n. 168, d a OIT, a respeito d a p r o m o ç ã o d o e m pr e g o .

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Específicamente sobre a questão trabalhista, d e s t a q u e m - s e a s s e ­ guintes n o rm a s :

a) a C o n v e n ç ã o n. 111, d a OIT, ratificada pelo Brasil e p r o m u l g a d a peio Decreto n. 2.682, d e 22.7.98, q u e proíbe a o e m pr e g a d or , q u a n d o d o processo d e seleção d e trabalhadores, estabelecer u m a o r d e m d e prefe­

rência por critérios ligados a fatores diversos, tais c o m o : 1 . cor; 2. sexo, q u e alguns preferem c h a m a r d e g ê n e r o h u m a n o , para incluir a q u es t ã o re­

lativa à h omossexualidade; religião; opinião política (na qual s e p o d e in­

cluir o conceito d e ideologia); raça o u etnia; nacionalidade; estado civil;

idade (a n ã o ser q u e a discriminação s e justifique para a proteção d a p e s ­ soa: proibição d o trabalho para m e n o r e s d e 1 6 anos); e atividade sindical.

b) a Lei n. 9.029, d e 1 3 d e abril d e 1995, q u e proíbe a exigência d e atestados d e gravidez e esterilização, e outras práticas discriminatórias, para efeitos admissionais o u d e p e r m a n ê n c i a d a relação jurídica d e Trabalho.

Prevê o artigo 1a, desta lei:

“Fica proibida a a d o ç ã o d e qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito d e a c es s o a relação d e e m pr e g o , o u s u a m a n u ­ tenção, por motivo d e sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar o u idade, ressalvadas, neste caso, as hipóteses d e proteção ao m e n o r previstas n o inciso XXXIII d o art. 7® d a Constituição Federal.”

N o q u e s e refere à reparação d o ato discriminatório, a Lei n. 9.029/95 prevê q u e o infrator está sujeito a o p a g a m e n t o d e u m a multa administrativa d e d e z v e ze s o valor d o maior salário p a g o pelo empregador, elevado e m cinqüenta por cento e m c a s o d e reincidência. A l é m d e u m a proibição d e obter e m p r é s t i m o junto a instituições financeiras oficiais (art. 3°, d a Lei n.

9.029/95).

É evidente, n o entanto, q u e esta muita d e caráter administrativo n ã o i m p e d e q u e a p e s s o a vítima d a discriminação pleiteie, judicialmente, u m a indenização pelos d a n o s morais experimentados, n o s t e r m o s d o s já cita­

d o s artigos 5°, inciso X, d a C F e 186, d o C ó d i g o Civil.

c) e a própria CLT:

“Art. 373-A. R e ss a l v a da s a s disposições legais destinadas a corrigir a s distorções q u e afetam o a c e s s o d a mulher a o m e r c a d o d e trabalho e certas especificidades estabelecidas n o s acordos trabalhistas, é vedado:

(Acrescentado pela Lei n. 9.799, d e 26.05.1999)

I — publicar o u fazer nublicar anúncio d e e m p r e a o n o aual haia refe­

rência a o sexo, à idade, à cor o u situação familiar, salvo g u a n d o a natureza d a atividade a ser exercida, pública e notoriamente, a s s i m o exioir; (Inciso acrescentado pela Lei n. 9.799, d e 26.05.1999); — grifou-se -

¡I — recusar e m pr e g o , p r o m o ç ã o o u motivar a dispensa d o trabalho e m razão d e sexo, idade, à cor, situação familiar ou estado de gravidez, salvo q u a n d o a natureza d a atividade seja notória e publicamente i n c o m ­ patível; (Inciso acrescentado peia Lei n. 9.799, d e 26.05.1999)

REVISTA D O T R T D A 1 S S R E G I Ã O — N. 24 — J U N H O , 2004

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III — considerar o sexo, a idade, a cor o u situação familiar c o m o vari­

ável determinante para fins d e remuneração, f o r m a ç ã o profissional e opor­

tunidades d e a s c e n s ã o profissional; (inciso acrescentado pela Lei n. 9.799, d e 26.05.1999)

IV — exigir atestado o u e x a m e , d e qualquer natureza, para c o m p r o ­ v a ç ã o d e esterilidade o u gravidez, n a a d m i s s ã o o u p e r m a n ê n c i a n o e m p r e ­ go; (Inciso acrescentado pela Lei n. 9.799, d e 26.05.1999)

V — impedir o a c e s s o o u adotar critérios subjetivos para deferimento d e inscrição o u a p ro v a ç ã o e m concursos, e m e m p r e s a s privadas, e m razão d e sexo, idade, cor, situação familiar o u estado d e gravidez; (Inciso acres­

c e nt a d o pela Lei n. 9.799, d e 26.05.1999)

VI — proceder e m p r e g a d o r o u preposto a revistas íntimas n a s e m p r e ­ g a d a s o u funcionárias. (Inciso a c r e s c e n t a d o pela Lei n. 9.799, d e 26.05.1999)

Parágrafo único. O disposto neste artigo n ã o obsta a a d o ç ã o d e m e d i ­ d a s temporárias q u e v i s e m a o estabelecimento d a s políticas d e igualdade entre h o m e n s e mulheres, e m particular a s q u e s e destinam a corrigir as distorções q u e afetam a f o r m a ç ã o profissional, o a c e s s o a o e m p r e g o e as condições gerais d e trabalho d a mulher. (Parágrafo único acrescentado pela Lei n. 9.799, d e 26.05.1999).”

E o s anúncios p o d e m discriminar?

V e j a m o s alguns exemplos, extraídos d o C a d e r n o ‘' E m p r e g o s ”, d o Jor­

nal Folha d e S ã o Pauto, d e 2 7 d e julho d e 2003;

Auxiliar de Sistemas: Masculino de 25 a 35 anos. 2a grau técnico completo (informática ou PD). Experiência em manutenção de mícroinfor- mática, hardware e software, instalação e configuração de rede de microcomputador.” (grifou-se)

“Operadores de Telemarketing ativo: estamos selecionando profissio­

nais de telemarketing ativo para prestar serviços em Cali Center. Temos vagas para os bairros Casa Verde, Broocklin, Pinheiros e Itaim Bibi. Requi­

sitos: Experiência mínima de 6 meses2"grau completoHabilidade em InformáticaBoa Dicção, entusiasmo e desenvoltura para atuar com ven­

das — O í s p o n i M í d a d e de horário — O f e r e c e m o s fixo, c o missões e assist.

médica gratuita.” (grifou-se)

“Gerente ComercialÁfrica. Sólida Empresa em Capital Africana Contrata:— imprescindível experiência na comercialização de bebidas quen­

tes ; — apto a montar e liderar equipes de vendas no campo;capacidade de trabalhar sob oressão e c o m m e t a s d e vendas: C u r s o superior, francês e inglês desejados; Disponibilidade de mudar para País Africano, Oferece­

mos: Atraente remuneração mais benefícios. C. V. detalhado com foto e pre­

tensão salarial. Asseguramos sigilo." (grifou-se)

“Balconista: Mase.. 1 ano de experiência no ramo alimentício. 2a G.

Compl., que reside próx. Mooca. Liaar somente c/ perfil. (grifou-se)

(9)

264 REVISTA D O T R T D A 15» R E G I Ã O — N. 24 — JUNH O , 2004

"Divulgadora: interna, a c 1 8 fl, b o a a p r e s .. c/exp v e n d a s , 1/2 per, f i x o + c o m + p r ê m i o s + V T E n v CV.”

“Cabelereiro: Masculino, b o a anarência. n ã o fumante, c o m exp. e m cortes m o d e r n o s f e m / m a s c e químicas e m geral.” {grifou-se)

“Garçonete: M o ç a s até 2 8 anos, b o a a p re s e n t aç ã o , exp. e conhec.

e m inform. p/ reg. Morumbi.” (grifou-se)

N e s t e t e ma , aliás, t a m b é m n ã o s e p o d e negar: q u a n t o m a i s baixa a c a m a d a social, s o b o p r i s m a e c o n ô m i c o , m a i s a s p e s s o a s s ã o discri­

m i na d a s .

N o m e s m o jornal h á 3 0 anúncios d e e m p r e g o s para m é d i c o s e n e ­ n h u m deles exige b o a apresentação, cor específica, s e xo definido o u c a p a ­ cidade para trabalhar s o b pressão.

Ora, estas limitações d e a c e s s o a o m e r c a d o d e trabalho para deter­

m i n a d o s tipos d e pessoas: mulheres, negros, feios, gordos, maiores d e 3 5 anos, portadores d e m á dicção, s ã o totalmente injustificáveis, sendo, por­

tanto, ato d e discriminação.

P o d e - s e p e ns a r q u e a l g u m a s delas s e j a m pertinentes, m a s, sincera­

mente, a l g u é m deixaria de, por exemplo, c o m p r a r u m a pizza s e ligasse para a pizzaria e u m a p e s s o a f a nh o s a o a t en d e s s e? Isto a conteceu c o m i g o o u ­ tro dia. N o principio, confesso-fhes, fiquei surpreso, m a s conversei n o r m a l ­ m e n t e c o m o atendente e pedi a m i n h a pizza.

T a m p o u c o m e importa s e a v e n d e d o r a é bonita o u feia, para fins d a c o m p r a d o produto. Aliás, o feio o u o bonito é algo e x t r e m a m e n t e subjetivo e é, e m muita medida, fruto d a inconsciência popular f o r m a d a pelos m e i o s d e c o m u n i c a ç ã o e m m a s s a .

A discriminação estética121, aliás, e m princípio p o d e parecer m e n o s perversa, m a s ela, efetlvamente, agride a auto-estima e, e m certos a s p e c ­ tos, a própria intimidade d a s pessoas. Q u a n d o estava fazendo concurso para juiz d i z i a m - m e s e mp r e : v o c ê n ã o haja q u e d e v e cortar o cabelo, pois d o contrário v o c ê n ã o p a s s a n o concurso? Passei n o concurso, m a s o c a ­ belo estava cortadinho...

M a s, voltando m a is u m a v e z a o assunto: e as e m p r e s a s p o d e m ser responsabilizadas por estes anúncios?

A resposta a esta pergunta n ã o é fácil, pois i m p r e s s i o n a m dois a r gu ­ mentos: 1 B) a matéria é p a g a e o jornal a p e n a s v e n d e u o espaço; 2 a) qual­

q u er tipo d e n e g a ç ã o d e publicação por parte d o jornal poderla ser visto c o m o violação d o direito livre d e manifestação, caracterizando-se c o m o u m a censura.

(2) Para maiores esclarecimentos sobre a matéria vide: Paulo E d u a r d o d e Oliveira, O D a n o P e s ­

soal n o Direito d o Trabalho, S ã o Paulo, ITr, 2002; Christiani Ma rques, O Contrato d e Trabalho e a

Discriminação Estética, S ã o Paulo, LTr, 2002: e Márcia N o v a e s Q u e d e s , Terror Psicológico n o

Trabalho, S ã o Paulo, LTr, 2003.

(10)

C o m o apoio para a liberdade d e e x pr e s s ã o s e teriam o s seguintes dispositivos:

Art. 5 a, d a Constituição Federal:

"IV — é livre a manifestação d o p e n s a m e n t o , s e n d o v e d a d o o anoni­

mato;

(-.}

IX — é livre a expressão d a atividade intelectual, artística, científica e d e c o mu nicação, i n d e p e n d e n t e m e n t e d e censura o u licença;’1

E o art. 220, d a Constituição:

“Art. 220. A manifestação d o p e n s a m e n t o , a criação, a expressão e a informação, s o b qualquer forma, processo o u veículo n ã o sofrerão quaí- q u er restrição, o b s e r v a d o o disposto nesta Constituição.

§ 1® N e n h u m a lei conterá dispositivo q u e p o s s a constituir e m b a r a ç o à plena liberdade d e informação jornalística e m qualquer veículo d e c o m u n i ­ c a ç ã o social, o b s e r v a d o o disposto n o art. 5 a, IV, V, X, XIII e XIV.

§ 2 S É v e d a d a toda e qualquer censura d e natureza política, ideológi­

c a e artística.”

C o m o p r eg a o Instituto Gutenberg:

“Leis d e i m pr e n s a n ã o d e v e m tratar d a imprensa. D e v e m transcrever o s postulados constitucionais q u e a s s e g u r a m a liberdade e regulamentar, isso sim, a s relações d a s ociedade c o m a mídia, por e x e m p l o a s s e g u r a n d o o v a g o e desrespeitado direito d e resposta. N u m a era e m q u e informação viaja à velocidade d a luz, o direito d e resposta exigido e m a ç ã o penal p e d e tribunais rápidos e rito sumário. Muitos pontos b e m intencionados d o proje­

to d e Landim, c o m o o art. 3 9, q u e prescreve u m figurino democrático para a imprensa, s ã o próprios d e códigos de ética. Leis não são os Dez M a n d a ­ mentos. O C ó d i g o Penal n ã o diz q u e o s cidadãos d e v e m ser bons, e respei­

tar a vida, o s b e n s e a h o nr a alheia. Define o s crimes e estipula a s penas.

D a m e s m a forma, a legislação n ã o d e ve dar receitas d e a p ur a ç ã o jornalística o u estatuir q u e a i m p r e n s a precisa ser 'responsável', ‘pluralista’, o u ouvir as d u a s versões, c o m o s u ge r e o projeto d e lei.” (Boletim n. 8, mar-abr/96).

Entretanto, entre o s dispositivos constitucionais há, obviamente, u m a o r d e m d e preferência. N o c a s o d e colisão entre n o r m a s constitucionais pre­

valecem, e m primeiro plano, aquelas que se apoiam nos princípios funda­

mentais fixados n o Título I, d a Constituição, e dentre estes destacam-se: a dignidade d a p e s s o a h u m a n a (inciso III, d o art. 1a); a p r o m o ç ã o d o b e m d e todos, s e m preconceitos d e origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer o u ­ tras f o rm a s d e discriminação (inciso IV, d o art. 3 a); e a prevalência d o s direitos h u m a n o s (inciso II, d o art. 4 9).,3)

(3) Par a u m m a i o r a p r o f u n d a m e n t o sobre o t e m a vide: Edilson Pereira d e Farias, Colisão d e

Direitos: a honra, a intimidade, a vida privada e a i m a g e m

versus

a liberdade d e e x p r e s s ã o e

informação, Sérgio Fabris, Porto Alegre, 2000.

(11)

266 REVISTA D O T R T D A 15* R E G I Ã O — N. 24 — J U N H O , 2004

A l é m disso, o próprio artigo 220, faz m e n ç ã o expressa a o dever d e se preservar a intimidade, a honra e a i m a g e m d a s p e s s o a s n o exercício d o direito d e expressão.

M e s m o a Lei n, 5.250/67 (Lei d e Imprensa), q u e a s s e g u r a a liberdade d e manifestação d o p e n s a m e n t o , a c a b o u por limitar e s s a liberdade a o coi­

bir o s "abusos n o exercício d a liberdade d e manifestação e p e n s a m e n t o e informação”, estabelecendo q u e os responsáveis r e sp onderão pelos preju­

ízos q u e c a u s a r e m (art. 12).

O s a b u s o s s ã o coibidos s o b dois prismas: a fixação d o crime d e "ex­

ploração o u utilização d o s m e i o s d e informação e divulgação” (art. 13); e a responsabilidade civil por d a n o s morais (inciso I, d o art. 49) e d a n o s m a t e ­ riais (inciso II, d o art. 49).

Dentre outras práticas, o artigo 1 4 define c o m o crime "fazer p r o p a ­ g a n d a d e guerra, d e p rocessos para subversão d a o r d e m política e social o u preconceitos d e raça o u d e classe”, c o m p e n a prevista d e u m a quatro a n o s d e detenção.

N a m e s m a linha, prevê o artigo 17, q u e será, igualmente, crime: “ofen­

der a moral pública e o s b o n s costumes", c o m p e n a fixada d e três m e s e s a u m a n o d e d e t e n ç ã o e multa d e u m a vinte salários mínimos.

O artigo 2 7 enuncia, expressamente, hipóteses q u e n ã o s e constitui­

riam crime, destacando-se o inciso IX: “a exposição d e doutrinas e idéias”.

M a s, e m n e n h u m d o s incisos s e extrai o fato d e s e tratar d e u m a matéria paga.

C o m o sujeitos passivos d a a ç ã o penal, a lei e m q u es t ã o permite q u e s e atinja o diretor o u o redator-chefe d o jornal o u periódico, q u a n d o o autor estiver ausente d o país o u "não tiver idoneidade para responder pelo cri­

me", p o d e n d o até m e s m o atingir o gerente o u o proprietário d a s oficinas impressoras o u d a estação emissora d e serviços d e radiodifusão q u a n d o o diretor o u redator-chefe estiver ausente d o país o u "não tiver idoneidade para r esponder pelo crime".

N o q u e s e refere à responsabilidade civil, por d a n o morai o u material, a legislação é clara n o sentido d e q u e "responde pela reparação a p e s s o a natural o u jurídica q u e explora o m e i o d e informação o u divulgação" (§ 2 a, d o art. 49), c o m direito à a ç ã o regressiva c o m relação a o "autor d o escrito, transmissão o u notícia, o u o responsável pela s u a divulgação" (art. 50).

A definição d o q u e s e e n t e n d e m e i o d e informação o u divulgação encontra-se n o parágrafo único d o art. 12: " S ã o m e i o s d e informação e divulgação, para o s efeitos deste artigo, o s jornais e outras publicações periódicas, o s serviços d e radiodifusão e o s serviços oficiosos".

O artigo 51 fixa o s parâmetros d a indenização devida pelo jornalista, q u a n d o concorra para o dano, por ato culposo, indo d e dois a 2 0 salários mínimos. Q u a n t o à e m p r e s a q u e explora o m e i o d e informação, esta inde­

nização é limitada a 1 0 vezes a o s valores fixados para o jornalista (art. 52).

(12)

N o q u e tange à indenização por d a n o s materiais n ã o h á pré-fixação, d e v e n d o esta ser suficiente p a ra “restituir o prejudicado a o estado anterior”

(art. 54).

O projeto d e lei sobre a matéria, e m trâmite n o C o n g r e s s o Nacional, m a n t é m esta lógica d a responsabilidade d a e m p r e s a , c o m a u m e n t o d a in­

denização para 1 0 % sobre o faturamento d a e m p r e s a , c o m elevação d e até 5 0 % s e a e m p r e s a faturar m a i s d e 2 0 milhões por ano; e, e m c a s o d e rein­

cidência, u m acréscimo d e 5 0 % .

E, por falar n o projeto d e lei, este é expresso, e m s e u artigo 3 S, a respeito d a responsabilidade d o s m e i o s d e c o m u n i c a ç ã o quanto à discrimi­

nação.

O artigo 5 6 d a Lei d e I m pr e n s a esclarece q u e p o d e m ser a c u m u l a d a s a s p r et e n s õ es p a ra ressarcir o s d a n o s morais e materiais, c o m prazo decadencíal fixado e m 0 3 (três) m e s e s , contado d a data d a publicação o u transmissão q u e lhe der causa, s e n d o q u e a a ç ã o civli I n d e p e n d e d a a ç ã o

penai {parágrafo único d o art, 56).

Vale destacar, n o entanto, q u e e m s e tratando d e discriminação raciaf o crime é imprescritível, n o s t e rm o s d o inciso XLII, d o art. 5 fi, d a Constitui­

ç ã o Federal: “A prática d o racismo constitui crime inafiançável e Imprescri­

tível, sujeito à p e n a d e reclusão, n o s t e r m o s d a lei.” Destaque-se, t a m b é m , q u e n ã o h á diferença fundamental entre "racismo" e “discriminação racial", c o n f o r m e decidido pelo Superior Tribunal d e Justiça, n o s autos d o H a b e a s C o r p u s n. 15.155/RS, q u e s e encontra atualmente, em grau de recurso n o STF, o n d e r e ce b e u o n ú m e r o 82.424, cujo julgamento ainda n ã o terminou, m a s já s e atingiu a maioria d e votos para m a n t e r a decisão d o STJ.

Claro q u e contra todos e s se s a r g u m e n t o s s e p o d e r á dizer: m a s, a escolha d o e m p r e g a d o n ã o c o m p e t e a q u e m contrata?

Sim, entretanto, esta escolha t e m limites e o dever d e não-discrimina­

ç ã o é a p e n a s u m dentre outros.

C o m efeito, n o setor privado, a Lei n. 8.213/91, q u e cuida d o s benefícios previdenciários, fixou q u e d e v e m ser reservados a o s deficientes, a p ó s reabili­

tação, d e 2 a 5 % d a s vagas, a) 2 % , para as e m p r e s a s c o m 1 0 0 a 2 0 0 e m p r e ­ gado; b) 3 % , d e 201 a 500; c) 4 % , d e 501 a 1.000; d) 5 % , a c im a d e 1.000.

N o s t e r m o s d o art. 429, d a CLT, “O s estabelecimentos d e qualquer natureza s ã o obrigados a e m p r e g a r e matricular n o s cursos d o s Serviços Nacionais d e A p r e n d i z a g e m n ú m e r o d e aprendizes equivalente a cinco por cento, n o mínimo, e quinze por cento, n o m á x i m o , d o s trabalhadores exis­

tentes e m c a d a estabelecimento, cujas funções d e m a n d e m f o r m a ç ã o pro­

fissional”, c o n f o r m e redação d a d a pela Lei n. 10.097, d e 1 9 d e d e z e m b r o d e 2000.

N o setor público, a Constituição exige q u e u m percentual d o s cargos

públicos seja destinado a o s portadores d e deficiência. O Estatuto d o s S e r ­

vidores Públicos Civis d a U n iã o a s se g u r o u o percentual d e 2 0 % d o s cargos

públicos para os portadores d e deficiência. N o E s ta d o d e S ã o Paulo, este

percentual é d e 5 % .

(13)

268 REVISTA D O T R T D A 15» R E G I Ã O — N. 24 — J U N H O , 2004

C o m o s e vê, o o r d e n a m e n t o jurídico, analisado c o m o u m iodo, repu­

dia a s discriminações e proíbe q u e s e evitem responsabilidades quanto a o s atos q u e s e traduzam, concretamente, c o m o discriminatórios. Esta res­

ponsabilidade, aliás, é d e todos nós, m a s a c i m a d e tudo daqueles que, d e a l g u m m o d o , s e j a m o s f o rm a d o r es d a opinião pública. O m e r o p a g a m e n t o para s e o c up a r u m e s p a ç o n o jornal n ã o p o d e isentar o jornal d a r e s p o n s a ­ bilidade peio e s p a ç o q u e conferiu, pois o p a g a m e n t o n ã o p o d e tornar legal u m a ilegalidade e q u e m s e presta à ilegalidade participa d o ilícito.

Imagine-se, grotescamente, a hipótese d e u m motorista d e táxi a q u e m é oferecido o p a g a m e n t o d a corrida para q u e s e torne possível a prática d e u m crime ( u m seqüestro, por exemplo), tendo ele consciência d o q u e se passa. O contrato o n e r o s o feito, por óbvio, n ã o elimina a responsabilidade d o taxista c o m o co-autor d o crime. "Mutatis mutantis", é o m e s m o q u a n d o o jornal v e n d e s e u e s p a ç o para a prática d e atos discriminatórios q u an t o a o a c e s s o a o m e r c a d o d e trabalho.

Aliás, neste sentido, destaca-se a S ú m u l a n. 221, d o STJ, d o seguinte teor:

“S ã o civilmente responsáveis pelo ressarcimento d e dano, decorren­

te d e publicação pela imprensa, tanto o autor d o escrito quanto o proprietá­

rio d o veículo d e divulgação.”

N ã o s e n d o d e m e n o r Importância neste sentido o art. 373-A, d a CLT, c o m r e da ç ã o q u e lhe fora d a d a pela Lei n. 9.799, d e 26.05.1999, q u a n d o proíbe, expressamente, o ato d e “publicar o u fazer publicar anúncio d e e m ­ p r eg o n o qual haja referência a o sexo, à idade, à cor o u situação familiar, salvo q u a n d o a natureza d a atividade a ser exercida, pública e n o toriamen­

te, a s s i m o exigir", atribuindo nítida distinção d e d u a s condutas: a d o a n u n ­ ciante e a d o q u e v e n d e o u e m p r e s t a o e s p a ç o para o anúncio.

Claro q u e o jornal p o d e crer q u e d e te rminado anúncio n ã o s e confi­

gura c o m o discriminação e fazer publicar o anúncio s e m a intenção d e agredir a morai d e n i ng u é m , m a s este tipo d e ilícito, c o m o visto, i n d e p e n d e d a v o n ­ tade d o agente. S e será, efetivamente, o u não, ato discriminatório esta é u m a outra história, q u e s e decidirá, judiciaimente, t e nd o e m vista a s razões d o ofendido e d o suposto ofensor, m a s s e m p r e s e m excluir d e plano a e v e n ­ tual responsabilidade d o veículo d e informação.

D e todo m o d o , juridicamente falando, importante esclarecer q u e q u a n ­ d o u m anúncio d e e m p r e g o estabelece u m a distinção b a s e a d a e m critérios proibidos pelo direito, quais sejam: raça, cor, sexo, Idade, etnia, religião, convicção ideológica etc, cria-se a p r e s u n ç ã o d e q u e o anúncio é discrimi­

natório, c a b e n d o àquele q u e o produziu (e por via oblíqua, a o q u e o repro­

duziu) a prova, q u e d e v e ser real e convincente, d e q u e a distinção s e jus­

tificou por a l g u m aspecto relevante, s o b p e n a d e s e r esponder pelo ato.

A e n un c i a ç ão d e todos e s se s preceitos jurídicos, n o entanto, n ã o p o d e ser vista c o m o m e r a e q u a ç ã o matemática, a fim d e s e quantificar a indeni­

z a ç ã o devida pela discriminação. C o m o s e trata d e t e m a ligado à dignidade

d a p e s s o a h u m a n a , o q u e s e d e v e priorizar é evitar q u e a discriminação

aconteça.

(14)

P a ra tanto, a s s u m e m relevante papel a sociedade e, e m especial, s e us p o de r e s constituídos, no qual s e p o d e incluir, evidentemente, a imprensa.

À i m p r e n s a c a b e a responsabilidade d e evitar a divulgação d e a n ú n ­ cios discriminatórios; o que, por si só, n ã o elimina a discriminação n o m u n ­ d o d o trabalho, m a s já é u m c o m e ç o . E x a t a m e n t e por isto é que, para c o m ­ p lementar u m a a ç ã o concreta contra a discriminação, c a b e a o Ministério Público d o Trabalho apurar e levar adiante as denúncias d e atos discrimina­

tórios q u an t o à inserção n o m e r c a d o d e trabalho e, por fim, c a b e a o Judici­

ário deixar d e iado posturas c o mp l a c e nt e s para c o m o s agressores, punin­

do-os e x em p l armente.

A discriminação é algo e x t r e m a m e n t e perverso, q u e está e m n o ss o m e i o e d e v e ser coibido, pois c o m o dito pelo A s s e s s o r Especial d a Secreta­

ria Especial d o s Direitos H u m a n o s (,1), Ivair A u g u s t o Alves d o s Santos: “c o n ­ viver c o m a discriminação e m u m ambiente q u e a nega, s a b e n d o q u e ela existe, é terrível".

É dever d o s aplicadores d o direito deixarem d e lado o s s e u s pré-con­

ceitos discriminatórios para tornar as n o r m a s jurídicas q u e p r e s e r v a m os direitos h u m a n o s u m a realidade.

O direito, aliás, t e m m e s m o este papel d e corrigir a s n o s s a s deficiên­

cias, coagindo-nos a atuar d e m o d o diverso, n o sentido d o ideal, e o ideal neste t e m a é respeitar a condição h u m a n a ou, e m outras palavras, nao- discriminar.

(d) E m s u a manifestaçSona s e d e d a Procuradoria Regional d o Trabalho d a 2 a Região, na audiên­

cia pública d o dia 1°, d e agosto d e 2003.

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