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REGINALDO DE LIMA CORREIA

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CENTRO OESTE CAMPUS UNIVERSITÁRIO CEDETEG

SETOR DE CIÊNCIAS AGRARIAS E AMBIENTAIS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA

REGINALDO DE LIMA CORREIA

CONFLITOS TERRITORIAIS E R-EXISTÊNCIAS NO FAXINAL DOS RIBEIROS – PINHÃO/PARANÁ

GUARAPUAVA 2015

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Reginaldo de Lima Correia

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Estadual do Centro-Oeste (UNICENTRO), como requisito para obtenção do título de Mestre em Geografia.

Orientadora: Professora Doutora Marquiana de Freitas Vilas Boas Gomes;

Co-orientadora: Professora Doutora Cecilia Hauresko.

Linha de Pesquisa: Análise da Paisagem, Geomorfologia e Análise Ambiental

Guarapuava 2015

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Catalogação na Publicação

Biblioteca Central da Unicentro, Campus Cedeteg

Correia, Reginaldo de Lima

C824c Conflitos territoriais e r-existências no Faxinal dos Ribeiros – Pinhão / Paraná / Reginaldo de Lima Correia. – – Guarapuava, 2015

xi, 124 f. : il. ; 28 cm

Dissertação (mestrado) - Universidade Estadual do Centro-Oeste, Programa de Pós-Graduação em Geografia, área de concentração em Análise da Paisagem, Geomorfologia e Análise Ambiental, 2015

Orientadora: Marquiana de Freitas Vilas Boas Gomes Co-orientadora: Cecilia Hauresko

Banca examinadora: Marquiana de Freitas Vilas Boas Gomes, Jorge Luiz Favaro, Bernardo Mansano Fernandes

Bibliografia

1. Geografia. 2. Conflitos. 3. Faxinais. 4. Geografias. 5. R-existências. 6. Territorialidades. I. Título. II. Programa de Pós-Graduação em Geografia.

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Dedico este trabalho aos faxinalenses e posseiros do Município do Pinhão, povos que carregam consigo as marcas do dia-dia trabalhando exposto ao sol, com as mãos calejadas da agricultura e da extração da erva-mate, mas que trazem em seus rostos um sorriso sincero e contagiante, com o sonho de um futuro melhor. Minha dedicação é em especial a minha avó Julia, mulher forte e guerreira.

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AGRADECIMENTOS

Antes de tudo, sou grato a Deus (Rm 1, 8), pelo dom da vida e pela oportunidade de concluir mais um, dentre os vários, ciclos da vida.

Agradeço a Professora Marquiana, “esta pequena grande mulher” com quem tenho a honra de ter desenvolvido inúmeros projetos de ensino, pesquisa e extensão (Iniciação Cientifica, PET, Projetos com professores nas Escolas e Grupos de Estudo), uma apaixonada pelo que faz, que nos ensina a fazer as coisas com carinho e dedicação. Agradeço a sua paciência desde o tempo de graduação, as conversas de corredor, os momentos de descontração, as leituras dos textos, o incentivo em seguir sempre em frente e não desistir dos sonhos. Agradeço acima de tudo por nos ensinar a sonhar, a acreditar, a perseverar, e a fazer melhor um pouco do mundo a nossa volta.

Agradeço aos meus familiares, em especial a meus pais, estes trabalhadores de mãos calejadas que vivenciaram grande parte do que foi descrito nas linhas dessa dissertação, que sempre me incentivaram a seguir em frente, e acreditar, mesmo em meios as dificuldades. Palavras seriam poucas para demonstrar o meu sentimento de gratidão a vocês.

Agradeço a Professora Cecilia Hauresko, pelas horas de orientação no andamento dos trabalhos. Seu exemplo de superação é inspirador.

Agradeço ao povo brasileiro, que com seus impostos, permitem os recursos financeiros recebidos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Capes, e para mim proporcionaram uma maior dedicação a pesquisa.

Agradeço aos professores do Programa de Pós Graduação em Geografia da UNICENTRO, pelas contribuições nas disciplinas, discussões em sala de aula, pela troca de experiência e pela relação dialógica sempre estabelecida.

Aos Professores Jorge Favaro e Sergio Fajardo, pelas contribuições e sugestões na banca de qualificação.

Aos Professores Bernardo Mançano Fernandes e Jorge Favaro por terem aceito o convite para a banca de defesa.

Aos colegas de mestrado (Andressa, Mineira, Dani, Cris, Gilmar, Estevão, Fernanda, Adriano...), pelo companheirismo em todas as horas boas e ‘outras não tão”, pelas discussões metodológicas e “tudo mais”, e do ministério universidade renovadas (não citarei nomes para não esquecer de ninguém), e ao Professor Emerson Gomes no auxílio na elaboração dos Mapas.

Agradeço ao Hamilton Jose da Silva pelos esclarecimentos, e aos faxinalenses pelo acolhimento em suas casas, pelas caronas, pelos almoços e cafés.

E, por último e, não menos importante aos meus professores da Educação Básica, que acreditam na Educação Pública, na possiblidade dos sonhos, e que sempre incentivaram a busca pelo conhecimento.

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SUMARIO

INTRODUÇÃO ... 14

I: O SISTEMA FAXINAL NO PARANÁ E O FAXINAIS DOS RIBEIROS: ELEMENTOS PARA PROBLEMATIZAÇÃO DA PESQUISA ... 18

1.1-As transformações nos Faxinais no Paraná e a escolha conceitual ... 24

1.2 Os Faxinais na Mesorregião Centro-Sul do Paraná e no Município do Pinhão .... 31

II- TERRITÓRIO e BIODIVERSIDADE NOS FAXINAIS E O CAMINHO METODOLÓGICO PARA REFLETIR OS PROCESSOS DE TRANSFORMAÇÕES E R-EXISTÊNCIA NO FAXINAL DOS RIBEIROS ... 42

2.1 Território e Faxinais ... 42

2.1.1- A relação território-cultura ... 44

2.1.2- As territorialidades no Faxinal dos Ribeiros ... 46

2.1.3 Processos de Desterritorialização e Reterritorialização ... 49

2.3- Caminho metodológico ... 53

III- FLORESTA COM ARAUCÁRIA: INTERDEPENDÊNCIA E MODO DE VIDA ... 57

3.1- A floresta com Araucária ... 57

3.2- O modo de vida caboclo: interdependência com a floresta ... 64

IV: FAXINAL DOS RIBEIROS: TERRITÓRIO DE CONFLITOS, R-EXISTENCIA E NOVAS GEOGRAFIAS ... 67

4.1- A Chegada dos agentes, conflitos e as transformações no Faxinal dos Ribeiros 67 4.1.1- Migrante e Imigrante ... 67

4.1.2- Industria Zattar e a “gente de fora” ... 69

4.1.3- Assentados INCRA ... 70

4.1.4-Garimpeiros e “novos Moradores” ... 71

4.2- Conflitos em torno da criação da ARESUR em Faxinal dos Ribeiros ... 75

4.3- Panorama situacional no Faxinal dos Ribeiros: Território de R-existências e permanência de diferentes Geografias nos Faxinais ... 79

4.4- Atividades permanentes no Faxinal dos Ribeiros: Formas de R-existências perante os processos desestruturadores. ... 88

4.5- Aspectos Culturais de Faxinal dos Ribeiros: A religiosidade e o sistema faxinal ... 105

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 113

REFERÊNCIAS ... 115

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LISTA DE FIGURAS

FIGURA 01: Localização da área de estudo- Faxinal dos Ribeiros- Pinhão PR ... 19

FIGURA 02 e 03: Característica da Paisagem da Sub- Unidade Morfoescultural Foz do Areia/Ribeirão Claro ... 20

FIGURA 04: Carta Hipsométrica do Faxinal dos Ribeiros – Pinhão- PR ... 22

FIGURA 05: Carta Cinográfica do Faxinal dos Ribeiros ... 21

Figura 06: Áreas Estratégicas para conservação da Biodiversidade e povos tradicionais ... 25

FIGURA 07: Metodologia Qualitativa ... 55

FIGURA 08: Vegetação no Faxinal dos Ribeiros ... 59

FIGURA 09- Trajetória dos sujeitos no Faxinal dos Ribeiros ... 68

FIGURA 10: Vista de uma propriedade característica de “novos moradores” ... 72

FIGURA 11: Carta de uso da terra do Faxinal dos Ribeiros ... 80

FIGURA 12: “Bola de Erva-mate” após a coleta, pronta para ser entregue a Industria . 90 FIGURA 13: Extrativismo do Pinhão em Faxinal dos Ribeiros. ... 93

FIGURA 14: Transporte da produção das áreas de plantar, realizado pelos faxinalense, com o auxílio de animais ... 96

FIGURA 15: Área destinada a agricultura dentro do Faxinal dos Ribeiros ... 98

FIGURA 16: Áreas destinadas ao agronegócio ... 99

FIGURA 17: Porcos, típica criação baixa em faxinal dos Ribeiros ... 101

FIGURA 18: Carneiros, típica criação baixa em faxinal dos Ribeiros. ... 101

FIGURA 19: Cavalos, típica criação alta em faxinal dos Ribeiros ... 102

FIGURA 20: Igreja Católica de São Sebastião no Faxinal dos Ribeiros ... 107

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LISTA DE GRÁFICO

GRÁFICO 01: Posição quanto a criação de uma ARESUR no Faxinal dos Ribeiros ... 78

GRÁFICO 02: Número de filhos por família no Faxinal dos Ribeiros ... 81

GRÁFICO 03: Local onde residem os filhos dos faxinalenses ... 81

GRÁFICO 04: Principais destinos dos filhos dos faxinalenses ... 82

GRÁFICO 05: Tamanho da propriedade no Faxinal dos Ribeiros ... 83

GRÁFICO 06- Faixa etária das famílias no Faxinal dos Ribeiros ... 83

GRÁFICO 07- Renda mensal dos faxinalenses ... 84

GRÁFICO 08: Principal fonte de renda do faxinalense ... 85

GRÁFICO 09: Familias que possuem membros que estão trabalhando fora do Faxinal 87 GRÁFICO 10: Setor de atuação externa dos Faxinalenses ... 87

GRÁFICO 11: Principais atividades permanentes para geração de renda dos faxinalenses ... 88

GRÁFICO 12: Responsável pelo extrativismo no Faxinal ... 89

GRÁFICOS 13: Manejo da extração da erva-mate nas propriedades ... 91

GRÁFICO 14: Valor obtido por safra ... 92

GRÁFICO 15: Famílias que realizam Extrativismo do pinhão no Faxinal dos Ribeiros para comercialização. ... 94

GRÁFICO 16: Quantidade de pinhão colhido em média anualmente. ... 94

GRÁFICO 17: Produtos da Agricultura. ... 95

GRÁFICO 18: Local onde desenvolve a agricultura ... 96

GRÁFICO 19: Criação de animais à solta na propriedade ... 100

GRÁFICO 20: Quais animais são criados à solta na propriedade ... 101

GRÁFICO 21: Cria animais em mangueirões? ... 103

GRÁFICO 22: Tipo do Mangueirão no Faxinal dos Ribeiros ... 104

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LISTA DE QUADROS

Quadro 01: Espécies Vegetais utilizadas pelos faxinalenses ... 60

Quadro 02: Finalidade da Criação de animais no Faxinal dos Ribeiros ... 102

Quadro 03: Instrumentos elaborados pelos faxinalenses. ... 106

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LISTA DE SIGLAS AMFAR- Associação de moradores de Faxinal dos Ribeiros ARESUR- Áreas Especiais de Uso Regulamentado

COPEL- Companhia Paranaense de Energia IAP- Instituto Ambiental do Paraná

IBGE- Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

ICMS- Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços INCRA- Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária

IPARDES- Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social ITCG- Instituo de Terras, Cartografia e Geociências

PAA- Programa de Aquisição de Alimentos

PNAE- Programa Nacional de Alimentação Escolar MINEROPAR- Serviço Geológico do Paraná

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RESUMO

O processo de modernização da agricultura, juntamente com as políticas de povoamento do Paraná, provocou uma série de transformações e conflitos socioambientais no campo. Nas áreas de floresta, o processo de ocupação, justificou por vezes o desmatamento, e deixou o Paraná com poucos remanescentes, muitos destes, ocupados por comunidades tradicionais, que resistem aos processos de desmatamento e substituição da floresta. Os remanescentes de Floresta com Araucária no Paraná, via de regra, são ocupados por uma população tradicional que desenvolveu o seu modo de ser e estar no território, por meio do Sistema Faxinal, presente no primeiro, segundo e terceiro Planalto do Paraná, com destaque nas mesorregiões Centro-Sul e Sudeste do Estado. O Sistema Faxinal, é uma organização produtiva, social, cultural e ambiental que integra de forma muito particular os povos e as Florestas com Araucárias, através do uso das terras tradicionalmente ocupadas, onde são desenvolvidas atividades agrossilvipastoris como a criação de animais soltos (de pequeno e grande porte), o extrativismo vegetal (erva-mate e pinhão) e a agricultura de subsistência, com base na mão de obra familiar e envolvem uma cultura própria, caracterizada pelas atividades econômicas, religiosas e pelos laços de compadrio e solidariedade. Porém, nos últimos anos esse sistema passou por um intenso processo de transformação modificando algumas de suas características e sua singular relação entre sociedade e natureza. Nesse sentido, nossa pesquisa tem a atenção voltada para o Faxinal dos Ribeiros, situado no Município do Pinhão, onde evidenciamos as características contemporânea e realizamos outras reflexões, buscando identificar quais são os fatores que constituem o modo de ser e estar no território, e que tem dado especificidades a esta comunidade, vinculada ao Sistema Faxinal, pelas suas particularidade, processos de expropriação e r-existência os quais têm configurado suas territorialidades, seja pela manutenção da sua cultura e das relações com o ambiente no contexto do Sistema Faxinal. Para isso utilizaremos da metodologia qualitativa por meio de diferentes formas de coleta de dados, como a observação participante, entrevistas, e questionários.

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ABSTRACT

The process of agriculture modernization, along with the Paraná settlement policies led to a series of transformations and environmental conflicts in the countryside. In forest areas, the process of occupation, justified at times the deforestation, and left the Paraná with few remaining, many of these occupied by traditional communities that resist to the processes of deforestation and forest replacement. The remaining of Forest with Araucaria in Paraná, as a rule, are occupied by a traditional population that developed its modes of being and living in territory, through the Faxinal System, present in the first, second and third Plateau of Paraná, especially in mesoregions South Central and Southeast of the State. The Faxinal System, is an organization, productive, social, cultural and environmental that integrates of a very special way, the peoples and Forests with Araucarias, through the use of lands traditionally occupied, where are developed agroforestry and livestock activities like free animals creation (small size and large size), the vegetal extraction (yerba mate and pine nuts) and subsistence agriculture based on family labor and involve a very particular culture, characterized by economic activities, religious and the crony and solidarity ties. However, in recent years this system has undergone an intense process of transformation by modifying some of their characteristics and their singular relation between society and nature. In that sense, our research has focused attention to the Faxinal dos Ribeiros, located in the city of Pinhão, where we highlight the contemporary features and we realize other reflections, trying to identify what are the factors that constitute the mode of being in the territory, and that has given specificities to this community, this community, linked to Faxinal System, its particularity, expropriation proceedings and r-existência which have configured their territoriality, is by keeping its culture and relations with the ambiance in the context of

Faxinal System. For this we use the qualitative methodology by different forms of data

collection, such as participant observation, interviews, and questionnaires.

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INTRODUÇÃO

A ideia inicial desta pesquisa passa primeiramente pela condição de filho de faxinalense. Em certa medida, a passagem pela Geografia, trouxe-nos questões que até então eram internalizadas como naturais, mas o contato com a literatura fez-nos questioná-las, dentre elas estão as concepções sobre o próprio Sistema Faxinal e os processos desestruturadores.

O Sistema Faxinal, pode ser considerado como um conjunto de elementos de diferentes dimensões que inclui a cultura, o ambiente, a política, a economia e uma série de fatores históricos que contribuíram para o seu desenvolvimento. Procuraremos no decorrer do trabalho detalhar e exemplificar cada dimensão.

Já o termo faxinal é o usado para designar um tipo de vegetação (CHANG, 1988), caracterizada pela presença de Araucárias (Araucária angustifólia), Imbuais (Ocoteia

porosa), Erva-mate (Ilex paraguariensis) e uma vegetação rasteira típica denominada de

vassoura-lajeana (Baccharis uncinella), que se diferem das áreas de plantar, onde eram realizadas as “culturas” (agricultura), sendo chamada de capoeira com vegetação mais esparsa.

Durante a nossa passagem pela graduação, quando o tema Sistema Faxinal entrava na pauta das discussões, vários exemplos foram debatidos sobre a situação dos faxinais localizados no segundo Planalto do Paraná (Prudentópolis, Rebouças, Rio Azul), mas pouco se abordou da realidade dos faxinais do terceiro Planalto, a exemplo daqueles do Município do Pinhão-PR. Ora foram pouco lembrados, ora, quando citados, eram indicados como exemplos de faxinais já desintegrados, ou como o palco dos conflitos de terra entre os posseiros e a Industria Madeireira Zattar.

Nosso interesse, ao ser ampliado, nos levou a revisão bibliográfica sobre o tema, a qual permitiu-nos a identificação de muitas pesquisas sobre os faxinais já mencionados, com importantes contribuições de Sahr e Cunha (2005), Barreto e Sahr (2007), Sahr (2008), Schuster (2010) e Hauresko (2012), porém constatamos poucas pesquisas sobre os faxinais do Município do Pinhão (FRANCESCONI, 1998; AYOUB, 2010 e PORTO et al, 2013) e, mesmo aquelas existentes, não esgotavam toda a complexidade envolvida nos faxinais desta localidade.

A reestruturação e/ou a desintegração do sistema, resultado da modernização da agricultura, é abordado na literatura como processo comum nas várias localidades

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faxinalenses no Paraná, e cuja reprodução, a exemplo do que acompanhamos no município do Pinhão, produziu diferentes paisagens.

Testemunha desses processos, tendemos a concordar com vários autores sobre o papel desestruturante da modernização do campo para o Sistema Faxinal, porém, nossa experiência nos colocou em dúvida sobre o destino apontado na literatura sobre o sistema, principalmente, quando esta indica o seu esgotamento num curto espaço de tempo.

Diante deste cenário, buscando contribuir com a discussão sobre o Sistema Faxinal, principalmente, para com as pesquisas sobre aqueles situados no município do Pinhão, sem a pretensão de preencher todas as lacunas existentes sobre estes faxinais. Nos desafiamos a realizar esta pesquisa, na qual buscamos compreendê-los, a luz das diferentes dimensões do Sistema Faxinal (sejam elas histórico-geográfica, política, econômica, social, ambiental, entre outras) e, com vistas a analisarmos o sistema faxinal na atualidade, suas permanências e rupturas, bem como, a natureza destes processos no munícipio do Pinhão, tendo como recorte espacial de pesquisa o Faxinal dos Ribeiros.

Entende-se por Sistema Faxinal as terras tradicionalmente ocupadas para o uso comum de pastagens e florestas no Paraná, que designam situações em que a reprodução social, familiar e territorial, de acordo com suas possibilidades, combina apropriação privada e coletiva dos recursos naturais (SAHR, 2008; GOMES, 2012; HAURESKO, 2012). O modo de vida faxinalense é caracterizado pelo uso comum das terras tradicionalmente ocupadas, conciliando as atividades agrossilvipastoris com conservação ambiental, visando a manutenção de sua reprodução física, social e cultural.

O controle e o uso dos recursos- especialmente pastagens nativas, água, produtos florestais madeireiros e não madeireiros- considerados essenciais à existência física e social, é exercido de maneira livre e aberta, conforme normas específicas, definidas pelo grupo.

O Faxinal dos Ribeiros, assim como os outros Faxinais da Mesorregião Centro Sul do Paraná, passou por processos que transformaram e modificaram características do sistema, porém mantiveram aquelas essenciais. Essas transformações se deram, principalmente, no aspecto socioambiental. A Mesorregião do Centro-Sul, possuía uma grande reserva de Araucárias Angustifólia ou, como popularmente conhecido, Pinheiro do Paraná.

A atuação das madeireiras e serrarias e a modernização da agricultura, reduziram drasticamente as áreas florestais e, consequentemente, acarretaram transformações

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importantes no Sistema Faxinal, pois a reprodução do sistema cultural do faxinalense está condicionada a manutenção da floresta.

As transformações não ocorrem sem conflitos, e têm levado os faxinalenses a criar diferentes formas de resistência e novas territorialidades. Ou seja, os povos de faxinais se recriam a partir de um conjunto de processos transformadores do sistema e, isto, não necessariamente, pode ser tomado como extinção do faxinal, mas sim, como novas formas de organização.

Nesta pesquisa, buscaremos abordar estas diferentes transformações e conflitos, bem como analisar os processos de mudanças no Faxinal dos Ribeiros, situado no município do Pinhão/PR, sobretudo, com o objetivo de verificar qual (ais) a (s) particularidade (s) deste faxinal, no contexto do sistema de faxinais do Paraná e do Município do Pinhão.

E, em razão da natureza do nosso objeto, adotamos a metodologia qualitativa, como procedimento metodológico, integrando entrevistas, questionários e observações de campo.

Organizamos o trabalho, em quatro capítulos. No primeiro apresentamos os elementos que nos ajudaram na constituição da problemática de pesquisa, por meio da opção conceitual de Sistema Faxinal e das transformações e conflitos ocorridos nos territórios faxinalenses, voltando a atenção para a Mesorregião Centro Sul e em particular para o Município do Pinhão.

No segundo capitulo trazemos uma revisão bibliográfica que nos proporcionam refletir sobre os territórios faxinalenses com suas novas territorialidades que permitem a r-existência desse povo, através dos seus saberes ambientais e modos de vida caracterizados pela interdependência com a floresta, que legitima suas crenças, hábitos e rituais através de territórios e territorialidades específicos. Para isso buscamos compreender de que território estamos falando e quais as novas territorialidades de r-existência e resistência.

A r-existência pode ser definida com base em Porto-Gonçalves (2012), que ao estudar as comunidades tradicionais da Amazônia/Amazônias apresenta este conceito como uma forma das populações tradicionais existir através de racionalidades especificas e o termo resistência como uma reação a uma ação anterior.

No terceiro capitulo denominado de Floresta com Araucária: Interdependência e modo de vida, abordamos a importância e a riqueza, biológica e cultural dessa fitofisionomia do bioma da Mata Atlântica, além dos processos de devastação de

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contingente significativo de floresta que afetaram os povos tradicionais que nela habitam, desenvolvendo um modo de vida intimamente relacionado a floresta. Esse modo de vida caboclo contribuiu para a preservação da floresta através do Sistema Faxinal.

No último capítulo, procuramos abordar o território do Faxinal dos Ribeiros através dos conflitos, das resistências, r-existências e das novas territorialidades, para isso realizamos um resgate das principais transformações ocorridas, proporcionadas por diferentes sujeitos a fim de evidenciar que essas transformações têm propiciado novas formas de reordenamento, principalmente das atividades econômicas, e isso implica muitas vezes em novas territorialidades. Essas novas territorialidades constituem as novas geografias dos faxinais, que não excluem todas as práticas antigas, mas as adaptando na medida do possível sem perder aquilo que é característico e essencial no Sistema Faxinal.

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I: O SISTEMA FAXINAL NO PARANÁ E O FAXINAIS DOS RIBEIROS: ELEMENTOS PARA PROBLEMATIZAÇÃO DA PESQUISA

Nossas inquietações desenvolvidas ao longo do período da graduação em geografia sempre nos fizeram refletir sobre o Faxinal dos Ribeiros e suas configurações perante os outros faxinas do Estado do Paraná.

A localidade de Faxinal dos Ribeiros engloba um grande território do Município do Pinhão, que pode ser dividida em dois (figura 01), os quais possuem características totalmente distintas, seja na paisagem ou na organização socioespacial.

O primeiro, situado próxima as margens da PR 170, que liga o Município de Pinhão a Bituruna, está a cerca de 20 km da sede do Município e apresenta características que em nada lembram uma comunidade faxinalense, com destaque para duas delas: as áreas destinadas a monocultura, já bastante mecanizadas e a quase extinção da Floresta com Araucária. Neste caso, o termo faxinal está restrito apenas ao nome da localidade.

O outro território, situado a aproximadamente 32 km da sede do município, com estradas de chão, relevo mais ondulado, que engloba uma área de aproximadamente 1300 alqueires. Este apresenta características típicas (vegetais, agrícola, organização socioespacial, e relação com o ambiente entre outras) das comunidades faxinalenses, conforme aquelas descritas por Sahr e Cunha (2005), Barreto e Sahr (2007), Sahr (2008) Almeida e Souza (2009) e Hauresko (2012).

O Sistema Faxinal, vai muito além da paisagem a ele característica (apenas visível) trata-se de uma organização produtiva, social, cultural e ambiental que integra de forma muito particular os povos e as Florestas com Araucárias.

O Faxinal dos Ribeiros localiza-se nas coordenadas geográficas de Latitude Sul 25º47’ e 25º41' e Longitude Ocidental 51º30’ e 51º34’ (Figura 01), sob o domínio da Floresta Ombrófila Mista (ITCG, 2013), apresenta Clima moderado, subtropical úmido, invernos com geadas e temperatura média anual de 18º C.

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Está situado no Sub-planalto denominado de Planalto do Foz do Areia/Ribeirão Claro, em uma altitude que varia entre 1020 a 1296 metros (Figura 04), relevo configurado como suavemente ondulado e ondulado (Figura 05), com declividade entre 0-20% (MINEROPAR, 2006), a exemplo das paisagens apresentadas nas figuras (02 e 03). Já os solos da região, segundo Ribas (2010), normalmente são ácidos e desbasificados.

FIGURA 02 E 03: Característica da Paisagem da Sub- Unidade Morfoescultural Foz do

Areia/Ribeirão Claro.

FONTE: MINEROPAR (2006).

A floresta Ombrófila Mista, ou Floresta com Araucária, característica da região, faz parte do Domínio da Mata Atlântica, com predomínio de espécies arbóreas como o Pinheiro do Paraná ou Araucária (Araucária angustifólia), e diversas espécies que se associam a Araucária como a Erva-Mate (Ilex paraguariensis) e a Imbuia (Ocoteia porosa). As características físicas (solo, geomorfologia e vegetação), juntamente com elementos econômicos, políticos e socais, contribuíram para o desenvolvimento do Sistema Faxinal nessa Região, integrando de forma particular esse povo com a floresta com Araucária.

Essa integração com a floresta se dá através do uso das terras tradicionalmente ocupadas, onde são desenvolvidas atividades agrossilvipastoris como a criação de animais a solta (de pequeno e grande porte), o extrativismo de materiais vegetais (erva-mate e pinhão) e agricultura de subsistência, com base na mão de obra familiar.

As terras tradicionalmente ocupadas, são terras ocupadas por grupos culturalmente diferenciados e que possuem formas próprias de organização social, que ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição.

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O uso das terras tradicionalmente ocupadas dos faxinais é marcado pela existência de criadouros comuns, onde são criados animais a solta, que circulam livremente, mantidos através dos vínculos de solidariedade e compadrio, e da existência das terras de plantar, onde se desenvolvem as atividades agrícolas.

Os vínculos de solidariedade estão relacionados a forma do homem manter-se inserido no ambiente que o rodeia, onde ele estabelece laços de convivência, principalmente com os mais próximos, implicando em respeito e considerações com o outro, pois a solidariedade é um sentimento recíproco que estabelece um vínculo moral entre as pessoas e à vida, criando laços de fraternidade.

Já os vínculos de compadrio estão ligados a religiosidade, através do ato de levar uma pessoa por quem se tem grande estima para compadre, ou seja, para ajudar a ministrar os sacramentos católicos (Batismo, Eucaristia, Crisma e Casamento). Assim, por meio destes ritos a pessoa passa a ter vínculos mais próximos com as famílias inclusive adquirindo algumas co-responsabilidades, como na educação dos filhos (nesse caso os compadres de Batismo, Eucaristia e Crisma), desenvolvendo desta forma laços de solidariedade mais profundos e de grande respeito, apoiados na religiosidade.

Esse sistema desenvolveu uma cultura própria, caracterizada pelas atividades econômicas e religiosas. A atividade econômica se caracteriza pela criação dos animais à solta, o extrativismo da erva-mate e a agricultura de subsistência. As atividades religiosas incluem rituais e festas a santos católicos, mesadas de anjos, peregrinações a fontes de água e benzimento. Os laços de compadrio e solidariedade são reforçados por meio das práticas religiosas, esses laços são indispensáveis para a manutenção do sistema.

Porém, o Faxinal dos Ribeiros, assim como tantos outros da Mesorregião Centro Sul do Paraná, passou por processos, que modificaram algumas características do sistema, porém foram mantidas práticas que são essenciais.

Buscando contribuir para o entendimento destas transformações do sistema faxinal no Paraná, organizamos este texto, em três partes. Na primeira, apresentamos o contexto do sistema faxinal no Paraná, a concentração geográfica, e as principais características e organização. Na segunda parte, aprofundamos o olhar sobre os processos transformadores dos faxinais na Mesorregião Centro-Sul do Paraná, com ênfase para aqueles diretamente relacionados ao município do Pinhão.

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1.1-As transformações nos Faxinais no Paraná e a escolha conceitual

Entender as diferentes transformações e conflitos nos territórios faxinalenses no Paraná implica em considerar diferentes fatores históricos, políticos, econômicos e sociais no estado, sobretudo a partir da segunda metade do século XX. Na Mesorregião Centro-Sul do Paraná, estes processos conduziram sobretudo a mudança na apropriação social do território e na paisagem. Nesta última, chama-nos atenção os poucos remanescentes da Floresta com Araucárias que sobreviveram às motosserras. Estes remanescentes têm sido fundamentais ecológica e socialmente, para aqueles que deles dependem, principalmente, quando associamos a Floresta ao modo de vida de muitos sujeitos sociais, cuja organização social está diretamente relacionada à este ambiente.

O sistema faxinal é um deles, pois nele a organização produtiva, social e cultural integra de forma muito particular os povos e as Florestas com Araucárias, uma simbiose que é responsável de um lado, pela manutenção do sistema faxinal e, do outro, pela própria sobrevivência dos Pinheirais.

Por sistema faxinal, entende-se as terras tradicionalmente ocupadas para o uso comum de pastagens e florestas no Paraná, que designam situações em que a produção familiar, de acordo com suas possibilidades, combina apropriação privada e coletiva dos recursos naturais (SAHR, 2008; GOMES, 2012; HAURESKO, 2012).

O controle e o uso dos recursos são exercidos de maneira livre e aberta, conforme normas especificas e definidas pelo grupo, especialmente, pastagens nativas, água, produtos florestais madeireiros e não madeireiros, considerados essenciais à existência física e social.

Atualmente, o sistema faxinal expressa um conjunto de mudanças, fruto dos processos de modernização na região, especificamente da modernização da agricultura. No Paraná, este sistema encontra-se no primeiro, segundo e terceiro planaltos, mas é nas Mesorregiões Centro-Sul e Sudeste (Figura 06) que há a maior concentração de seus remanescentes.

Nesta pesquisa, nossa atenção se concentra na Mesorregião Centro-Sul, particularmente, no Faxinal dos Ribeiros, Município do Pinhão, no Paraná.

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Figura 06: Áreas Estratégicas para conservação da Biodiversidade e povos tradicionais. Fonte: ITCG, 2014.

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O município do Pinhão tem como principais características a presença de grandes áreas cobertas por Florestas com Araucária e por um contingente significativo de população tradicional, bem como por práticas na sua organização produtiva que se estruturam de acordo com a lógica do que a literatura denomina “sistema faxinal” (PORTO, 2013).

Entendemos por povo tradicional, grupos culturalmente diferenciados que ocupam e usam territórios e recursos para manter sua cultura, não vivendo apenas do culto ao passado, ou de um tempo que não mais existe, mas estando ligado à preservação de valores, de tradições e cultura. E neste contexto, no caso dos povos tradicionais dos faxinais, Hauresko (2012) afirma que estes são marcados por uma história e cultura própria, caracterizada pelas tradições e costumes, bem como pela vivencia comunitária e solidária.

Além disso, estes povos mantem um modo de vida e organização socioespacial particular, ocupando e usando, de forma permanente ou temporária, terras tradicionalmente ocupadas e o ambiente como condição para sua reprodução cultural, econômica, religiosa, expressando uma diversidade de formas de existência coletiva e uma série de relações com os recursos da natureza (ALMEIDA, 2004).

Neste sentido, Almeida (2004) explica que a noção de “tradicional” não se reduz a história mais incorpora as identidades coletivas redefinidas situacionalmente, perante a dinamicidade em que estes povos estão envoltos.

No que diz respeito ao sistema Faxinal, numa abordagem histórica-econômica proposta por Chang (1988), o mesmo foi definido nessa concepção como uma organização camponesa característica da Região Centro-Sul do Paraná, cuja formação está condicionada ao quadro físico-natural da região (Floresta Ombrófila mista) e um conjunto de fatores econômicos, políticos e sociais [também consideramos oportuno incluir - culturais], que remontam de forma indireta aos tempos da atividade pecuária dos Campos Gerais no século XVIII, e mais diretamente à atividade ervateira na região da floresta com Araucária, no século XIX e XX. Esse sistema se caracteriza pelos seguintes componentes (CHANG, 1988, p. 13, grifos da autora):

(...) produção animal- criação de animais domésticos para tração e consumo com destaque às espécies equina, suína, caprina, bovina e aves; produção agrícola- policultura alimentar de subsistência para abastecimento familiar e comercialização da parcela excedente, destacando as culturas de milho, feijão, arroz, batata e cebola; coleta de

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coletados durante a entressafra das culturas; desempenhando papel fundamental de renda complementar.

Já os povos dos Faxinais, reunidos em encontro1 no ano de 2005 no Município de Irati- Paraná, autodefinem o Sistema Faxinal enquanto:

Uma forma de organização camponesa com ocorrência na região Centro-Sul do Paraná, onde a ocupação do território social foi determinada pelo uso da terra em comum, apesar da propriedade da terra ser privada. Internamente, o que caracteriza o faxinal é seu sistema de manejo de criações (soltas) e a presença de cercas separando áreas de lavouras e áreas de criação. Sua formação data do final do século XIX, e atualmente essas comunidades são responsáveis por contribuírem com a manutenção da paisagem florestal nativa do Bioma Floresta com Araucária e, especialmente, com um modo de vida tradicional de suas populações representado por sociabilidade particular, derivadas do uso comum da terra e das relações de parentesco. (ANAIS do 1º Encontro dos Povos dos Faxinais, 2005, p.2, sic)

As concepções sobre faxinais, não reservam diferenças apenas entre os pesquisadores e os próprios faxinalenses, mas também em relação à identificação dos mesmos, refletindo substancialmente na quantidade de remanescentes considerados Sistemas Faxinais e nesse caso ambas apresentam apenas uma dimensão do Sistema.

Segundo o levantamento realizado a pedido do Instituto Ambiental do Paraná (IAP) em 2004, existiam 44 faxinais no Estado (Marques, 2004), todos em avançado processo de desintegração. Esse mapeamento foi realizado levando em consideração a proposta de Chang (1988), concepção com base em processos históricos-econômicos e que embasa grande parte das pesquisas sobre faxinais.

O trabalho de Chang (1988), por estar relacionado a dimensão econômica do sistema, indica como projeção, em sua própria análise, a “extinção” dos faxinais do Paraná em apenas dez/doze anos, afirmando que estes entrariam para a história. Hoje, após duas décadas e meia da publicação de sua pesquisa, esta tese não se confirma. Esse modo tradicional de se viver ainda resiste e reexiste.

1 Esse evento foi organizado pela Rede Puxirão, e teve por objetivo obter o reconhecimento social das comunidades faxinalenses, através da construção de elementos de afirmação da identidade, e para elaboração de pautas para políticas públicas.

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Em contraposição aos dados de Marques (2004) que identificou 44 Faxinais no Estado do Paraná, a Articulação Puxirão2, por meio de outro levantamento (Meira et al, 2009) considera que existam 227 faxinais no Estado, número de unidades que supera mais de cinco vezes o levantamento de MARQUES (2004).

A diferença substancial entre uma metodologia e outra está no fato do uso do conceito de Faxinal. Enquanto alguns pesquisadores, a exemplo de Marques (2004), analisam o sistema a luz do conceito proposto por Chang (1988), ignorando a dinâmica do próprio sistema em virtude da intensa modernização do campo. Os movimentos sociais, neste caso, a Articulação Puxirão (Meira et al, 2009), resignificaram o conceito a partir destas mudanças e das condições situacionais dos povos faxinalenses e, identificam como sistema faxinal todos aqueles que se reorganizam para resistir no campo e reproduzir seu modo de vida mesmo que para isso, tenham sacrificado partes das suas formas de reprodução.

Neste sentido, de fato, não são todos os povos que conseguiram manter as mesmas atividades aos moldes do que retratou Chang em 1988, como qualquer organização social que é dinâmica, se reinventaram para garantir a permanência no território e sua reprodução sociocultural.

Embora muitas de suas práticas tenham sido impossibilitadas em virtude dos processos de modernização [principalmente, da agricultura ou da criação coletiva], algumas permanecem e outras foram redimensionadas (SOUZA, 2009)

Neste trabalho não entendemos o Faxinal apenas no sentido restrito da presença do criadouro comunitário, mas como um sistema que se recriou ao longo das últimas décadas e, ao invés de se desintegrar totalmente, criou novas territorialidades ou se (re) territorializou.

Fundamentados em Souza (2009) e, em observações empíricas realizadas nas comunidades de faxinais do Município de Pinhão - Paraná, encontramos expressa na paisagem, as características típicas de faxinais com destaque para: a criação de animais a soltos; as lavouras (embora estas sejam quase ausentes) quando existem, estão cercadas; a floresta preservada mas com mata rala; a atividade extrativista da erva-mate e do pinhão; assim como, as ações religiosas populares e os laços de compadrio e solidariedade; como descritas por HAURESKO (2012) e SAHR(2008).

2 A Articulação Puxirão dos Povos Faxinalenses, é um movimento organizacional dos faxinalenses criado no ano de 2006, que traz em sua pauta de reivindicação o acesso a seus direitos territoriais resultantes de sua identidade étnica (HAURESKO, 2012).

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Compreendemos que hoje existem diferentes modelos de classificação de faxinais, que se diferenciam muitas vezes daquele aceito pelo estado e defendido por parte dos pesquisadores, sobretudo quando se concentram basicamente no aspecto histórico-econômico e na tendência de reduzir a classificação dos faxinais, à presença do “criadouro comum”.

Segundo Souza (2009), esta condição do criadouro comum é situacional, mas durante as últimas duas décadas surgiram vários processos de reorganização social, ou uma nova territorialização que implicou em uma nova unidade sociocultural. Estes levaram os faxinalenses a se mobilizarem em prol de suas práticas tradicionais, as “redesenhando de acordo com as possibilidades que dispõe sua reprodução social e física” (SOUZA, 2009, p.47).

Souza (2009) atenta para o fato de que as características produtivas se modificaram, especialmente, no que se refere à drástica redução das áreas de uso comum, bem como das áreas de floresta, reduzido ou impedido pelo uso privado. Assim, os faxinalenses que dispunham de terras, reorganizaram suas práticas tradicionais nas condições em que é possível reproduzi-las, selecionando e reduzindo as criações, ou até mesmo extinguindo-as (principalmente, as de pequeno porte, como cabritos e porcos), edificando “mangueirões” ou “potreiros”, aos quais grupos familiares e/ou vizinhos que estabelecem consenso utilizam em conjunto, em oposição a outras atividades ou granjas (de suínos e aves) que banem as raças crioulas.

Para Souza (2009), esses mangueirões podem ser entendidos como um local que os animais são criados em confinamento, ou seja, cercados, mas que nos faxinais variam de tamanho e que muitas vezes são coletivos. Já no caso de Faxinal dos Ribeiros os mangueirões são entendidos como grandes áreas cercadas [pequenos faxinais], onde a população também reside no interior deste.

Isso evidencia aquilo descrito por Sahr (2008), em que as comunidades faxinalenses veem-se em situações conflituosas, mas que buscam manter as características tradicionais, num processo de integração sistêmica, e também integrando-se socialmente, integrando-sem perder aquilo que é característico ao faxinal.

Souza (2009) identifica diferentes classificações de faxinais que nos auxiliam nas reflexões acerca deste sistema. Considerando que estas classificações valorizam a dinamicidade do sistema, bem como, os processos de resistência [ou r-existência (Porto Gonçalves, 2012)], entendemos nesta pesquisa, que sua abordagem é mais complexa pois

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leva em consideração a dinamicidade do Sistema e, portanto, oferece elementos mais apropriados para o estudo de caso no Faxinal dos Ribeiros. São elas:

1) Faxinais com uso comum – “criadouro comum aberto”, caracterizado pelas suas

territorialidades específicas, pois contempla grandes extensões territoriais (acima de 1000 ha), onde os animais (criações de grande e pequeno porte), tem livre acesso as pastagens naturais e água, com predomínio de florestas nativas por onde circulam as criações. Estas áreas geralmente vêm sofrendo conflitos com empresas madeireiras desde a década de 1950 e encontram nos monocultivos florestais (eucalipto e pinus) os principais conflitos socioambientais.

2) Faxinais com uso comum – “criador comum cercado”: Podem ser

caracterizados pela presença do uso comum dos recursos essenciais em “criadouros comuns”, com extensões variadas para circulação livre de “criações de grande e pequeno porte”, delimitadas por cercas de uso comum, “mata-burros”, portões, valos e rios. Souza (2009) ainda ressalta que esta categoria é mais identificada como “sistema faxinal” ou “criadouro comunitário” como a descrita por Chang (1988), pela literatura e ações do Estado (como o levantamento de Marques, [2004] e a política das Áreas Especiais de Uso Regulamentado -ARESUR). Podemos destacar, com base na obra de Souza (2009), como os principais conflitos a disputa pela manutenção das dimensões da área de uso comum, intensificadas pela pressão provocada pelas monoculturas, empreendimentos imobiliários, entre outros.

3) Faxinais com uso comum – “criadouro com criação de grande porte”: tem como

principal característica o “fechamento”, com cercas de arame de 4 fios nas divisas das propriedades, onde ficam disponíveis algumas áreas privadas e públicas para a criação de grande porte à solta, que circulam nessas áreas por diferentes períodos de tempo, dependendo das pastagens nativas. Já as criações baixas, são mantidas em mangueirões familiares isoladas das áreas de uso comum. Surgem diversos sujeitos que são colocados por Souza (2009) como responsáveis pelo “fechamento” ou “livre acesso” das criações, tais como “chacareiros” e a integração agroindustrial. Embora haja certa restrição a “criações baixas”, os bens considerados de uso comum não são retirados ou destruídos, permanecendo “mata-burros” e/ou portões e cercas para delimitar fisicamente áreas com distintas finalidades.

4) Faxinais sem uso comum – “mangueirões” e “potreiros”: Representam

situações em que o uso comum das terras destinadas para a criação animal (“baixa” ou “alta”) ocorre somente pelo grupo familiar e/ou vizinho. Portanto, quando ocorre o uso

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comum dos recursos naturais este se dá nos limites da propriedade privada. Neste caso, a restrição foi causada, principalmente, por aqueles sujeitos denominados “gente de fora”, que via de regra, possuem uma relação com a terra diferenciada dos faxinalenses, sobretudo quanto aos meios de produção. Assim surgem, os denominados “piquetes”, quando as criações mantem-se soltas, em uma terra de propriedade do grupo familiar e/ou de vizinhos. Os denominados “mangueirões”, correspondem à terras cercadas para uso das “criações baixas”, em comum acordo entre familiares e vizinhos.

Podemos observar então, que muitos faxinalenses têm buscado novas territorialidades, através da reinvenção do “criadouro comunitário”, mesmo que muitas vezes este esteja restrito a um mangueirão, piquete ou potreiro.

Denominamos faxinalenses, os moradores dos faxinais, porém, esta é uma questão identitária de grupo (autodenominação). Desta forma, entendemos a identidade faxinalense em seus aspectos socioambientais, como condição de existência, caracterizada pelo seu modo de viver. Este modo de viver, se dá pelo uso comum das terras tradicionalmente ocupadas, conciliando as atividades agrosilvopastoris com conservação ambiental, visando a manutenção de sua reprodução física, social e cultural (PROJETO NOVA CARTOGRAFIA SOCIAL DO POVOS E COMUNIDADES TRADICIONAIS DO BRASIL, 2008).

1.2 Os Faxinais na Mesorregião Centro-Sul do Paraná e no Município do Pinhão A Mesorregião Centro-Sul, sofreu importantes transformações nas últimas décadas, principalmente, no aspecto socioambiental. Essas mudanças não puderam ocorrer sem tensões, pois os territórios, aparentemente “ociosos”, carentes de “desenvolvimento”, eram ocupados por diferentes sujeitos sociais, que viviam à margem do sistema econômico, mas, que dispunham, tanto dos espaços cedidos quanto dos florestados para produzirem o necessário a sua subsistência e reproduzirem suas práticas culturais (GOMES, 2012).

Essa Mesorregião tem se configurado pela pluralidade de usos da terra, de acordo com os grupos sociais que foram se apropriando da natureza, via de regra, o caboclo e/ou primeiros imigrantes contribuíram com a criação coletiva de animais nas florestas e com a agricultura de subsistência, e os descendentes de imigrantes italianos, poloneses, alemães, pela manutenção da tradição da agricultura familiar (GOMES, 2012).

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A pressão da ação do homem sobre as áreas florestais, foi mais intensa a partir de 1940, estando diretamente relacionadas às iniciativas públicas e privadas, ligadas a interesses de povoamento do Paraná e a exploração dos recursos naturais. Gomes (2012) nos explica, que estes fatos, levaram a um cenário socioambiental, onde se consolidou a desigualdade, a concentração de renda e a degradação ambiental, combinando perda da biodiversidade com a injustiça social.

A Mesorregião do Centro-Sul, possuía uma grande reserva de Araucária

Angustifólia. A atuação das madeireiras e serrarias, reduziram drasticamente estas áreas

florestais.

O uso extensivo da floresta com Araucária proporciona aos faxinais, certo equilíbrio dinâmico, que embora impacte a floresta, permite certa regeneração deste sistema ecológico (Gomes, 2012), entretanto, Sahr (2008) recorda, que a integração de parte ou da totalidade dessas economias ao mercado, numa racionalidade moderna, tem levando alguns faxinais a uma situação de estresse ecológico, conduzindo a desequilíbrios ambientais e sociais.

Com a redução das áreas para reprodução do sistema, os animais ficam circunscritos à pequenos pedaços ou áreas de terra, diminuindo as possibilidades de regeneração. Tal situação tem sido utilizada por pesquisadores para justificar o impacto ambiental da criação nos faxinais, na erosão de solos, por exemplo. Embora não se possa negar este fato, defendemos que essa degradação dos faxinais é proporcionalmente menor se comparada a outras práticas agrícolas, como a soja ou o fumo, na qual a perda de solo é muito significativa.

Para limitar o estresse ecológico, são necessárias políticas públicas3 voltadas ao apoio dos faxinalenses para implementar tecnologias de baixa degradação ambiental, pois a desintegração e destruição do faxinal tem consequências socioambientais irreparáveis. A mesma autora afirmar que na atualidade, estes fatos, somados a discussão em torno do desenvolvimento sustentável e do sistema de uso integrado, transformou o faxinal que até então era marginalizado pela política da modernização do campo no Estado, em um sistema agroecológico desejado por abordagens políticas ecológicas mais recentes como o caso das ARESUR (SAHR, 2008).

3 Um exemplo relevante é a reposição de ervais nativos nas áreas onde foram criadas as Áreas Especiais de Uso Regulamentado- ARESUR, com este incentivo econômico os faxinalenses estão investindo em replantio dos ervais para futuramente poderem proporcionar a rotatividade entre as atividades no faxinal.

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As Áreas Especiais de Uso Regulamentado–ARESUR- foram criadas, através do Decreto Estadual 3.446/1997, com a intenção de melhorar as condições da qualidade de vida das comunidades residentes e a manutenção do seu patrimônio cultural, conciliando as atividades agrosilvopastoris com a conservação ambiental. Inclui-se também nesta a proteção da Araucária angustifólia, através do recebimento por parte do município de ICMS Ecológico -Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviço (PARANÁ, 1997). Hauresko (2012), ao estudar as comunidades faxinalenses de Anta Gorda e Taquari dos Ribeiros afirma que nos faxinais, seu modelo original, era praticada a agricultura extensiva, praticada fora das áreas de mata, muitas vezes, na área de capoeira, que não tinha valor comercial. Por isso, os faxinalenses, à maneira indígena, derrubavam esta mata, queimavam e produziam o seu alimento. Enquanto as matas ricas em pinheiros e erva-mate, com alto valor comercial, eram preservadas4, justamente para manter o alimento dos animais e a extração da erva para consumo. Os faxinalenses buscaram otimizar ainda mais o aproveitamento das áreas de faxinais, transformando-as em criadouro.

No município do Pinhão, a forma de apropriação do território também se assemelha com o apresentado por Hauresko (2012), mas com suas especificidades.

O termo faxinal é bastante comum no vocabulário dos munícipes de Pinhão, fato evidente pelo grande número de localidades que carregam o nome de “Faxinal”. Geralmente, ao Faxinal é adicionado o sobrenome de alguma família bastante numerosa e que, via de regra, são indicados como os primeiros moradores. Como exemplo, podemos citar as localidades de Faxinal dos Albinos, Faxinal dos Carvalhos, Faxinal dos Coutos, Faxinal dos Franças, Faxinal dos Ferreiras, Faxinal dos Ribeiros, Faxinal dos Silvérios. Quando não associados aos nomes familiares, o Faxinal recebe adjetivos de elementos da natureza, ou a valores sentimentais e religiosos, tais como: Faxinal dos Taquaras, Faxinal Bom Retiro, Faxinal São Roquinho, Faxinal do Céu, Faxinal Poço Grande (MEIRA, et al, 2009).

Porto e Ayoub (2013), nos proporcionam uma reflexão histórica do Município de Pinhão no contexto dos processos de ocupação territorial no Paraná.

4 Havia também o corte da madeira, mas este era principalmente para construção das casas e em pequena escala.

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Segundo estes autores, as primeiras ações oficiais de ocupações5 dos limites territoriais do Município6, remontam a ocupação portuguesa no período colonial em fins do século XIX7. Por situar-se nas divisas dos Campos de Guarapuava com as áreas de floresta com Araucária, com a presença de grande quantidade de ervais nativos e de madeiras de lei, como Imbuia e Pinheiros, proporcionou a inserção econômica destas áreas nos ciclos da erva-mate e, em seguida, no da madeira (PORTO E AYOUB, 2013).

Porém ressaltamos que essa relação com vários ciclos econômicos, significativos no processo de ocupação e consolidação do povoamento oficial do Paraná, não foi significativa quanto a inserção produtiva capitalista nas áreas de Floresta do Município, onde parcelas significativas do território, ainda hoje são ocupadas por uma população tradicional, constituída ao longo dos séculos XIX e XX (PORTO e AYOUBY, 2013).

Pelo fato deste município possuir fortes vínculos com o vizinho Município de Guarapuava8, nas áreas de campos se desenvolviam as atividades ligadas ao sistema campeiro, reconhecido como espaço das elites [sociedade campeira (GOMES, 2012) ].

Já as regiões de floresta passaram por um processo de ocupação menos sistemático, levados adiante pela população nativa (caboclos) e, por outras, vindas de outros estados e do exterior, onde a posse da terra se consolidava, principalmente, através do trabalho, sendo este o grande legitimador que dava direito a terra9 (PORTO E AYOUB, 2013).

Neste período, que se circunscreve, sobretudo, entre o final do século XIX e início do século XX, até 1930 aproximadamente, as áreas de floresta eram, pouco exploradas

5 Porto (2013) nos lembra que na história do Município há um silencio com relação as populações indígenas e uma dissolução destas a categoria de caboclo.

7 O terceiro planalto foi destino das expedições militares de ocupação oeste do Paraná, por iniciativa da coroa de Portugal, por ocasião da chegada de Dom João VI ao Brasil no início do século XIX. A expedição de ocupação dos campos de Guarapuava se concretizam no século XIX e foram responsáveis pela ocupação definitiva da região pela tradicional sociedade campeira.

8 A área que compreende ao Pinhão foi integrada ao município de Guarapuava até 1964, quando

emancipou-se deste pela Lei 4823, com uma área de 3.017,27 Km2(GOMES, 2012).

9 A partir de 1850 no Brasil, com a lei de terras, o direito à propriedade era garantido por meio dos títulos em cartório, mas no Município do Pinhão esta regra não foi observada, devido a quantidade de terras que dispunha, sem necessariamente haver conflito de interesses.

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pela sociedade campeira10. A floresta só ganhou outra conotação na região com a exploração da madeira e a chegada das serrarias a partir de 1940 (GOMES, 2012).

Assim, Porto e Ayoub (2013), afirmam que o povoamento disperso nas áreas de mata, juntamente com a baixa densidade demográfica, fez com que essas áreas permanecessem como fronteiras abertas a novos habitantes até metade do século XX.

Esta realidade foi confirmada pelos autores, por meio de relatos que narram histórias de imigrantes europeus isolados que lá chegaram e se casaram com “gente da terra”, ou mesmo, de “novos moradores” que vieram dos estados do Sul, de outras partes do Paraná (como o oeste e sudoeste), bem como de refugiados de guerras11 que procuravam um “lugar para viver em paz”.

Desta forma Porto e Ayoub (2013, p. 142) concluem que:

A cultura e sociabilidade das matas, portanto, se desenvolveu de maneira muito diversa daquela das áreas de campos. Estas últimas construíram-se com sua face voltada para Guarapuava, para uma sociedade mais desigual, marcada pela presença de uma elite proprietária e produtora e um contingente populacional dependente dessa elite. [...]Já a população das matas organizava sua produção de acordo com o sistema faxinal – reunião de compáscuo e atividade extrativista nas florestas mistas de araucária com produção agrícola de subsistência em áreas cercadas ou distantes de lavoura.

Porém, a partir dos anos de 1950, a realidade do Estado do Paraná, e especificamente do município do Pinhão se modificou, sendo marcante a instalação da Indústria madeireira na região.

A região onde encontra-se o Município do Pinhão, foi polo de atração de serrarias com atitudes nômades, que deixavam as áreas já esgotadas do Estado, no primeiro e segundo planaltos, e migravam para o oeste, em busca da matéria-prima. Houve nesse período a valorização no mercado da Araucária, principalmente, ao fim da Segunda Guerra Mundial. A demanda da Europa, para sua reconstrução, expandiu o mercado da madeira paranaense, aliada a isso, estava a política de nacionalização do governo Getúlio Vargas, que buscava a transformação produtiva do Brasil, a integração regional, a industrialização e a urbanização, ampliando a demanda por madeira (GOMES, 2012).

10 O ciclo da madeira coincidiu com o declínio definitivo da sociedade campeira (GOMES, 2012).

11 Há na memória dos moradores cujos antepassados são remanescentes de inúmeras guerras, tanto específicas quanto genéricas. Dentre as específicas podemos citar a Guerra do Contestado (1912-1916) ou a Revolução Federalista (1893-1895); (PORTO E AYOUB, 2013).

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A Industria João José Zattar S/A (Industria Zattar como chamaremos ao longo do trabalho) é uma dessas empresas que explorou amplamente as Florestas com Araucárias do Município. Fundada em 1943, iniciando sua atuação com uma serraria no atual município de Teixeira Soares (então pertencente a Irati), de onde se deslocou para Pinhão na década seguinte, seguindo a marcha das serrarias (Salles, 2013).

Com a chegada da Indústria Zattar (década de 1940) e suas serrarias, houve grandes transformações no território, no ambiente e na vida da população. Podemos citar como exemplo o direito à terra que até então era, estabelecido através da posse no sistema faxinal e, que a indústria passa a questionar, exigindo a titulação, como forma de comprovar a propriedade. Amplia-se também os interesses econômicos nas áreas de faxinais, principalmente, pela exploração da erva mate e das madeiras de lei, além de uma série de conflitos que perduram até os dias de hoje.

Com a chegada desta indústria também se construiu um discurso desenvolvimentista, ideia que permanece na atualidade, como podemos observar em DIAS (2013, p. 295, sic):

[...] é construído o discurso de que a madeireira João José Zattar S/A, no município de Pinhão, é pensada como a chegada do progresso e as comunidades tradicionais, os faxinalenses, os posseiros e os sem-terra, como o símbolo da “carência” e da “pobreza”. Talvez esteja nisso a preocupação de modernizar e implantar, a todo custo, processos civilizatórios de maneira encoberta e sutil.

Os territórios de mata, tidos como “ociosas” pelo estado, já eram habitadas tradicionalmente pelos faxinalenses quando a indústria ali se instalou, fato que deu início há inúmeros conflitos com a madeireira. Os faxinalenses foram proibidos de deixar seus animais soltos como tradicionalmente o faziam, foram obrigados a construir cercas, que, desde então, passaram a compor a paisagem faxinalense.

Outros conflitos dizem respeito as queimas de casas e dos paióis, matanças de animais, ameaças de morte, tiroteios contra casas e os assassinatos, sempre quando os faxinalenses se recusavam a cumprir com os termos da empresa (AYOUB, 2013).

Segundo Ayoub (2013) a indústria chegou a possuir sete mil escrituras de terra no Município de Pinhão, a qual relata que a grande obtenção de alqueires foi possível porque os contratos de venda de pinheiros eram na verdade contratos de venda das terras, pois a população, que naquela época era de maioria analfabeta, assinava contratos confiando que estava vendendo o “pinheiro em pé”, mas na verdade estava abrindo mão de suas

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propriedades. Esse processo de grilagem, através da assinatura de contratos, persistiu desde a década de 1950 até finais da década de 1980.

A venda de “pinheiro em pé”, consistia na aquisição dos Pinheirais pelas serrarias, mantendo a terra para o dono original. Esta forma foi muito utilizada no Paraná, porém, muitas famílias foram enganadas com os documentos de venda dos materiais madeireiros e outras foram até ameaçadas (GOMES, 2012).

A Indústria Zattar não restringiu suas atividades somente a exploração da madeira, diversificou-as. Nas áreas de faxinais ela passou a trabalhar com o extrativismo de erva-mate e nas “terras de cultura”12 soltou cabeças de gado. A erva mate é uma importante fonte de renda das famílias, quando a indústria passa a fazer o extrativismo, inicia-se além de uma série de conflitos, graves problemas de ordem econômica e de sobrevivência dessas populações.

O faxinalense porém continuou residindo nas áreas que a Industria havia documentado em seu nome, porém, fora obrigada a estabelecer contratos de arrendamento, segundo os quais, não poderia retirar nenhum tipo de material vegetal das terras, e deveriam pagar um terço da produção em troca do “direito” de continuar morando nessas áreas (AYOUB, 2013).

Os conflitos aumentaram devido a necessidade da retirada de recursos vegetais por parte dos faxinalenses [principalmente a erva-mate], e a pressão exercida pela indústria, através de seus seguranças [guardas, ou jagunços, como popularmente, são conhecidos em Pinhão, constituía uma certa “segurança patrimonial” armada e que andava com uniformes típicos (AYOUB, 2013)].

Porto e Ayoub (2013) lembram que a década de 1970, é o momento em que ocorre a exacerbação dos conflitos e que os moradores associam, principalmente, à intimidação da madeireira no sentido do controle do território – através da obrigatoriedade de assinatura por aqueles que não possuíam a documentação de suas terras.

Ainda na década de 1970, a empresa passa a realizar a medição13 e levantamento de áreas e, nos fins dos anos de 1970 e início de 1980, passa a vender essas terras para

12 Trata-se de terras utilizadas para produção de alimento. Estas áreas são denominadas de terras de plantar, terras de cultura ou paiol pela população local.

13 Segundo entrevista realizada em 12/05/2014, com Senhor A.C. em sua casa, foi a partir da década de 1970, que a Industria Zattar passa a realizar o levantamento de suas áreas bem como a medição, e que aqueles que possuíam os documentos da terra, que era uma minoria, tinham suas áreas delimitadas, porém a grande maioria eram posseiros e não possuíam os documentos, sendo assim a Industria passou a ser a proprietária de mais de 70% de Faxinal dos Ribeiros.

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sitiantes de fora do município do Pinhão. Todavia, esses sitiantes que adquiriam as terras da Industria foram impedidos de obter a documentação dos seus terrenos, pois estes haviam sido penhorados pela própria madeireira.

Esses “novos vizinhos” tornaram-se agentes com os quais os antigos moradores tiveram de negociar divisas e usos do território. Já os fazendeiros e alguns outros pequenos proprietários, vindo de fora, marcaram ainda mais o quadro de conflito com a população local e segundo AYOUB (2013, p. 178, sic.):

A chegada dos “vindouros” estabeleceu, por um lado, nova tensão com os moradores locais, devido às diferentes concepções de produção dos dois grupos – o primeiro tendo como base de seu sistema a agricultura e a criação fechada, e o segundo a lavoura protegida e a criação aberta de animais. Gerou, também, uma nova categoria de “posseiros”: não mais aqueles que não possuíam documentos de propriedade por terem ocupado o território no sistema de terras livres, mas também aqueles que, embora comprando suas terras, não tiveram acesso aos documentos devido às irregularidades no processo de venda.

Desta forma: Sonda e Bergold (2013, p. 19), alertam para as implicações desse processo:

Os interesses conflitantes sobre o uso e ocupação de um mesmo território gera disputas territoriais: grilagens, titulações ilegais ou que dão a terra como um privilégio, genocídio das populações tradicionais, ocupações de terra praticadas pelos movimentos sociais de luta pela terra, reintegrações de posse, ações de usucapião, processos de regularização fundiária, ações judicias envolvendo demarcação de territórios indígenas e quilombolas, entre outras.

Outro conflito, lembrado por Porto (2013) e, que é esquecido na história, é a construção da Usina Hidrelétrica de Foz do Areia pela COPEL (Companhia Paranaense de Energia Elétrica) no Município do Pinhão, inaugurada em 1980 e a maior do Paraná ainda hoje (2015). Esta também provocou expulsão de população tradicional de suas áreas de origem e a inundação de vários alqueires de terra, principalmente, das chamadas terras de plantar, onde os faxinalenses desenvolviam a agricultura.

Por outro lado, se realizarmos um paralelo, entre o processo de expropriação e a submissão dos contratos da Indústria Zattar com os faxinalenses, observamos que estas se dão justamente no período de construção da hidrelétrica, e devido as limitações imposta pela indústria, muitos faxinalenses passam a ser trabalhadores na construção da usina e,

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consequentemente, segundo Porto (2013), se deslocando14 pelo país, após o término desta em trabalhos do gênero, sobretudo, na construção civil.

O que atualmente se percebe, é um reflexo de um processo histórico de luta pela terra e pela permanência na terra e por preservação de suas identidades. Independente da sua condição social e de posse da terra, com ou sem título, natural do município do Pinhão, ou descendentes de famílias que vieram de outros lugares para o município, os faxinalenses possuem um modo de ser e estar neste território.

Muitos deles, não utilizam da auto-definição de faxinalense, utilizada principalmente por aqueles integrados aos movimentos sociais, mas se intitulam como posseiro, agricultor familiar, assentados, etc. A diferença entre a posse da terra, não retira deles a semelhança nas formas de organização e práticas socioculturais, no que se refere as atividades comunais, respeitando as circunstâncias e as condições dos faxinais.

O posseiro pode ser caracterizado como aquele que se estabelece em terras ainda não regularizadas, seja privada ou devolutas, estando sujeitos ao “despejo” (expulsão dos sujeitos da área ocupada), quando surge um proprietário com o título da área, quer seja verdadeiro ou falso (AYOUB, 2013).

No caso específico do município Pinhão, muitos destes posseiros são herdeiros de famílias que ocuparam o território desde o século XIX. É importante lembrar que o território foi apropriado por meio de sesmarias naquele século, com a expulsão compulsória de muitos indígenas. Ao falecer o patriarca da família, nem todos tinham acesso ou condições financeiras para regularização fundiária. Houve também miscigenação entre os indígenas e os brancos colonizadores de descendência luso-brasileira. O que lhes garante o direito à terra é a ancestralidade, pois as famílias ocupam este território a mais de 100 anos (GOMES, 2012).

O Agricultor familiar pode ser entendido como aquele que é proprietário dos meios de produção e desenvolve as atividades na propriedade por meio da mão de obra familiar, ou seja, a estrutura produtiva associa família-produção-trabalho (Brasil, 2006). E o assentado é o sujeito que através do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária –INCRA-, recebe a transferência da terra de forma legal.

14 Além da Usina Hidrelétrica de Foz do Areia foi construída ainda da década de 1980 a Usina Hidrelétrica se Salto Segredo no atual Município de Reserva do Iguaçu, desmembrado de Pinhão em 1997, sendo marcada como a primeira obra que levou muitos faxinalenses a se deslocarem em busca de emprego. E nos anos 2000 foram construídas na divisa dos Municípios de Condói e Pinhão as Usinas Hidrelétricas de Santa Clara e Fundão.

Referências

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