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Existem inúmeras mudanças a nível da função tiroideia que surgem com o

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Academic year: 2021

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RESUMO

Existem inúmeras mudanças a nível da função tiroideia que surgem com o envelhecimento. A velocidade com que estas ocorrem vai depender de fatores genéticos, comorbilidades, efeitos socio-económicos, estilo de vida, raça e ainda fatores ambientais. Dados epidemiológicos recentes indicam que a incidência da disfunção tiroideia pode estar a aumentar no idoso. Desta forma, torna-se importante conhecer as mudanças próprias do envelhecimento e saber distinguir verdadeiras doenças orgânicas de alterações fisiológicas, uma vez que as últimas não vão necessitar de intervenção terapêutica. Estas duas situações podem facilmente ser confundidas porque os sinais e sintomas próprios da doença tiroideia são menos marcados nos idosos. Numa sociedade cada vez mais envelhecida, torna-se imperativo o desenvolvimento de investigação que vise a obtenção de conhecimento mais extenso sobre a abordagem do idoso com variação dos valores da hormona estimuladora da tiroide (TSH) fora dos limites de normalidade para um diagnóstico mais precoce e tratamento atempado.

Este trabalho é uma revisão sistemática da literatura, cujo objetivo é clarificar essencialmente as mudanças da função da glândula tiroideia com o envelhecimento, com ênfase nas variações dos valores de referência da TSH, da tiroxina (T4), triiodotironina (T3) e do metabolito inativo T3 reverso (rT3), no diagnóstico clínico e laboratorial da disfunção tiroideia no idoso e no subsequente tratamento otimizado da mesma.

Para esta revisão realizou-se uma pesquisa bibliográfica baseada, maioritariamente, nas fontes médicas Pubmed (NCBI) e Medical Literature Analysis and Retrieval System

on-line (MEDLINE), Scientific Electronic Library Onon-line (SciELO), que incluiu artigos

científicos de investigação, artigos de revisão, livros de texto e websites de referência. Apesar do elevado número de estudos realizados recentemente, muitos não permitem uma

(2)

2 interpretação clara dos dados obtidos, uma vez que existem fatores difíceis de controlar na população em estudo, como por exemplo a variação da ingestão diária de iodo, a desnutrição, a polimedicação ou outras patologias próprias do envelhecimento. Os resultados alcançados pelos estudos revistos sugerem que a disfunção tiroideia, se não tratada, está associada a um aumento significativo de complicações ou, no caso do hipertiroidismo, morte.

Mais estudos serão necessários para fazer avançar a nossa compreensão sobre as mudanças da função tiroideia com o envelhecimento, uma vez que a melhoria do conhecimento e consequente tratamento atempado, quando indicado, permitirá melhorar a qualidade de vida e a longevidade do idoso.

PALAVRAS-CHAVE: Disfunção Tiroideia, Hipertiroidismo, Hipotiroidismo, Idoso, Valores de Referência da TSH, Euthyroid sick syndrome, Síndrome T3 baixa

ABSTRACT

There are a lot of changes at thyroid function level that occur with aging. The speed

which they occur will depend on genetic factors, co-morbidities, social-economic factors,

lifestyle, race and even environmental factors. Recent epidemiological data indicate that the

incidence of thyroid dysfunction may be increasing in the elderly. Thus, it is important to

know changes that affect aging, in order to distinguish organic diseases from physiological

changes, since the physiological changes will not require therapeutic intervention. These two

situations can easily be confounded because the signs and symptoms of thyroid disease are

less marked in the elderly. On an increasingly aging society, it is imperative to develop

research in order to obtain more extensive knowledge of how to approach the elderly with

thyroid stimulating hormone (TSH) values out of the normal range, to allow early diagnosis

(3)

3 This study is a systematic review of the literature, which aims to clarify essentially the

changes of the function of thyroid gland related to aging, with emphasis on variations of

reference values of the TSH, thyroxine (T4), triiodothyronine (T3) and the reverse inactive

metabolite T3 (rT3). This knowledge will enable a prompt clinical and laboratory diagnosis of

thyroid dysfunction in the elderly, as well as subsequent optimized treatment.For this review

it was done a literature search based mainly in the medical sources Pubmed (NCBI) and

Medical Literature Analysis and Retrieval System Online (MEDLINE), Scientific Electronic

Library Online (SciELO), which included scientific research papers, articles review,

textbooks and reference websites.

Despite the large number of recent studies, many of them do not allow a clear

interpretation of the data obtained, due to factors that are difficult to control in this

population, such as the variation of the daily intake of iodine, malnutrition, several drugs or

other own pathologies of aging. The results achieved by the reviewed studies suggest that

thyroid dysfunction, if untreated, is associated with a significant increase of complications or,

in the case of hyperthyroidism, death.

More studies will be needed to advance in our knowledge of changes in thyroid

function with aging, since the improvement of knowledge and subsequent early treatment,

when indicated, will improve the quality of life and longevity of the elderly.

KEY-WORDS: Thyroid Dysfunction, Hyperthyroidism, Hypothyroidism, Elderly, TSH Reference Ranges, Euthyroid sick syndrome, Low T3 Syndrome

(4)

4

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 7

MATERIAL E MÉTODOS ... 10

RESULTADOS E DISCUSSÃO ... 12

Mudanças na anatomia e fisiologia com o envelhecimento... 12

Importância do iodo ... 13

Problemas na determinação da TSH no idoso ... 16

1. Fatores que influenciam os valores da TSH ... 20

2.Valores de referência da TSH ... 23

Patologia tiroideia no idoso ... 29

1.Hipotiroidismo Clínico ... 29 2.Hipotiroidismo Subclínico ... 36 3.Hipertiroidismo Clínico... 41 4.Hipertiroidismo Subclínico ... 49 CONCLUSÃO ... 55 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 60

(5)

5 ABREVIATURAS E SIGLAS

D1 desiodinase 1

D2 desiodinase 2

DGS Direção Geral de Saúde

DIT diiodotirosina

HTs hormonas da tiroide

HTT eixo hipotálamo-hipófise-tiroide LDL lipoproteína de baixa densidade L-tiroxina levotiroxina

MIT monoiodotirosina

NIS proteína co-transportadora de sódio e iodo (“natrium-iodine symporter”) rT3 metabolito inativo de T3 (T3 reverso)

T3 triiodotironina

T3l T3 livre

T4 tiroxina

T4l T4 livre

TBG globulina ligadora de tiroxina

Tg tiroglobulina

Anti-Tg anticorpo anti-tiroglobulina

(6)

6 Anti-TPO anticorpo anti-tiroperoxidase

TRAb anticorpo anti-recetor da TSH TRH hormona libertadora da tireotropina TSH hormona estimuladora da tiroide

(7)

7 INTRODUÇÃO

A tiroide é uma das maiores glândulas endócrinas, cuja principal função é produzir as hormonas triiodotironina (T3) e tetraiodotironina (T4 ou tiroxina). Estas hormonas são essenciais para a regulação do consumo energético, crescimento, desenvolvimento e maturação de vários órgãos. Para a produção destas hormonas é necessário que haja um funcionamento, desenvolvimento e regulação ajustados às necessidades e ainda uma ingestão diária de iodo adequada.

O envelhecimento populacional tem sido associado a alterações da função tiroideia e também a variações nos valores de referência dos parâmetros avaliados. Além de alterações a nível da anatomia e fisiologia, vários estudos mostraram uma variação dos níveis da concentração da hormona estimuladora da tiroide (TSH) e de T3 livre (T3l) com a idade, enquanto que os níveis de T4 livre (T4l) permaneceram inalterados. Por sua vez, os níveis de T3 reverso (rT3) parecem aumentar com a idade. (1) O diagnóstico clínico das múltiplas patologias da tiroide torna-se cada vez mais difícil com o avançar da idade, devido à baixa especificidade de sinais e sintomas característicos da própria doença. (2) Desta forma, o estudo analítico assume um papel fulcral no correto diagnóstico e seguimento destas patologias, sendo essencial realizar uma correta interpretação dos resultados obtidos. A todas estas dificuldades acresce ainda o facto da apresentação e diagnóstico das formas subclínicas de disfunção tiroideia depender muitas vezes, e quase exclusivamente, de testes analíticos.

Algumas situações frequentes no idoso, como a presença de comorbilidades, a desnutrição ou até mesmo a polimedicação, podem levar a uma interpretação errada dos valores dos testes da função tiroideia, uma vez que também estes podem causar variações semelhantes, mesmo quando a doença tiroideia está ausente. Por este motivo, o seu diagnóstico e tratamento torna-se cada vez mais difícil e mais tardio. (3)

(8)

8 A grande maioria dos doentes com diagnóstico de hipertiroidismo apresenta hipertensão sistólica e diminuição da pressão diastólica e, consequentemente, aumento da pressão de pulso. (4) Também foi demonstrada uma associação direta e independente entre a função tiroideia e a espessura da íntima-média da carótida, o que poderá de certa forma refletir uma resposta adaptativa dos vasos ao stresse hemodinâmico induzido pelo aumento da frequência cardíaca e da pressão de pulso na presença de hipertiroidismo. (5) Por outro lado, doentes com hipotiroidismo surgem associados a fatores de risco cardiovascular, dos quais se salienta o aumento marcado das lipoproteínas de baixa densidade (LDL) e hipertensão arterial (principalmente diastólica). (6). No entanto, doentes com diagnóstico de hipotiroidismo subclínico apresentam tempos de tampão plaquetário prolongados, o que poderá constituir um fator protetor contra o desenvolvimento de aterosclerose (7), patologia esta tão frequente no idoso. Por esse motivo, os níveis elevados da TSH no idoso podem estar associados a um aumento da sua longevidade. (8) Outro estudo retrospetivo mostrou que doentes com acidente vascular cerebral (AVC) agudo, que surgiam à admissão com níveis da TSH ≥10µUI/L, apresentaram menor gravidade e melhor prognóstico, provavelmente explicado pela diminuição de resposta ao stresse induzida pelo hipotiroidismo. (9)

Perante todo este quadro de incerteza, torna-se importante esclarecer a associação dos valores da TSH com os diferentes quadros clínicos que o idoso pode apresentar. Mas mais importante que saber tratar, é saber identificar e distinguir as diferentes situações e agir em conformidade, para decidir se se deve prosseguir com uma terapêutica individualizada ou apenas com o controlo periódico.

Assim, os objetivos principais desta revisão de literatura consistem em conhecer a prevalência da disfunção tiroideia no idoso, conhecer as alterações fisiológicas e patológicas que decorrem da patologia tiroideia e procurar estabelecer para cada uma delas um diagnóstico clínico e laboratorial e consequente tratamento adequado e individualizado para

(9)

9 cada doente. Nesta faixa etária são muitas as comorbilidades associadas, e por isso as medidas terapêuticas devem ser instituídas com alguma precaução.

(10)

10 MATERIAL E MÉTODOS

Para a realização da presente revisão de literatura foi feita uma pesquisa baseada a partir de livros de texto, artigos científicos de investigação, artigos de revisão e websites de referência, acerca do presente tema.

No que concerne à pesquisa eletrónica, esta foi realizada nas bases de dados Pubmed (NCBI) e Medical Literature Analysis and Retrieval System on-line (MEDLINE), Scientific

Electronic Library Online (SciELO), considerando ainda outra literatura relevante. Foram

obtidas 133 entradas após pesquisa inicial (Figura 1), utilizando várias combinações das seguintes palavras-chave: “Thyroid Dysfunction”, “Hyperthyroidism”, “Hypothyroidism”,

“Subclinical Thyroid Dysfunction”, “Elderly”, “TSH Reference Ranges” e “Euthyroid Sick

Syndrome”. Os abstract foram selecionados de acordo com o ano (publicado entre o ano de

2000 e 2015), língua da publicação (inglês e português) e adequação do título para o trabalho em questão. Neste momento de pesquisa foram eliminados todos os artigos referentes a adultos jovens, o que permitiu, no total, a exclusão de 86 artigos (Figura 1). Os restantes foram lidos em versão integral e utilizados ao longo desta revisão, de acordo com o tipo de publicação (artigo de revisão vs meta-análise vs ensaio clínico) e a relevância da informação para o trabalho. Foram também selecionados artigos referenciados na bibliografia das publicações originalmente escolhidas as quais, apesar de não reunirem todos os critérios de inclusão, demonstraram relevância para o desenvolvimento do tema proposto, o que permitiu incluir mais 24 artigos (Figura 1). Adicionalmente, foram consultados dois livros com informação importante no âmbito de Endocrinologia e também Geriatria, como é o caso do “Harrison’s Principles of Internal Medicine 19th” e “Geriatria Fundamental”. Por fim, a informação disponibilizada por alguns websites, como a Organização Mundial de Saúde, Núcleo de Endocrinologia, Diabetes e Obesidade e American Thyroid Association, foi também utilizada, perfazendo um total de 67 referências a citar.

(11)

11

Figura 1 - Diagrama de fluxo acerca da inclusão dos artigos de investigação científica e artigos de revisão.

133 abstratcs da Pubmed, Medical

Literature Analysis and Retrieval System on-line e Scientific Electronic Library Onon-line

86 artigos foram excluídos após revisão dos abstracts

47 artigos selecionados

Total de 71 artigos

24 artigos foram,

adicionados por pesquisa manual de referências cruzadas

(12)

12 RESULTADOS E DISCUSSÃO

Mudanças na anatomia e fisiologia com o envelhecimento

O conceito e a idade a partir da qual o indivíduo é considerado idoso pode variar de autor para autor. Para esta revisão de literatura, define-se idoso como uma diminuição da integridade fisiológica, que leva a uma lenta e progressiva perda de função e aumento da vulnerabilidade, com início por volta dos 65 anos e que se prolonga até ao fim de vida. (10)

A tiroide é uma glândula endócrina situada na parte anterior da base do pescoço, abaixo da proeminência laríngea e anterior à traqueia, mede cerca de 5 centímetros e pesa aproximadamente 15 a 20 gramas. Com o avançar da idade, a tiroide tem tendência a tornar-se progressivamente mais fibrosada e atrófica (3) levando à diminuição do seu volume o que, por conseguinte, torna a palpação mais difícil ao exame físico. O aumento da prevalência dos anticorpos com a idade, que pode atingir até cerca de 20% das mulheres com mais de 65 anos, pode ser parcialmente responsável pelas mudanças anatómicas observadas com a idade. (3)

A principal função da tiroide é a produção de duas hormonas e a sua libertação para a circulação sanguínea: a T3 e a T4. Estas duas hormonas intervêm na diferenciação celular durante o desenvolvimento e na manutenção da homeostase termogénica e metabólica.

Para uma melhor compreensão do mecanismo fisiológico das hormonas da tiroide, é essencial perceber como funciona o eixo hipotálamo-hipófise-tiroide (HHT). A hipófise está dividida em duas partes: uma anterior (adeno-hipófise) que regula alguns órgãos endócrinos, e uma posterior (neuro-hipófise) que regula outras hormonas (ocitocina e hormona antidiurética). A regulação da síntese das hormonas tiroideias funciona através de um mecanismo de retrocontrolo negativo que envolve interações recíprocas entre a tiroide e os níveis das hormonas circulantes. (11) Este retrocontrolo negativo é feito pelo HHT, em que a produção das hormonas da tiroide (HTs) é induzida pela TSH, segregada pela hipófise

(13)

13 anterior. (3) Assim, um aumento das mesmas irá inibir a secreção da TSH, principalmente de forma indireta, ao inibir a libertação de hormona libertadora de tireotropina (TRH) pelo hipotálamo. (11) As principais alterações da glândula da tiroide relacionadas com a idade são: variação de volume, elevação fisiológica da TSH com a idade principalmente no género feminino, assim como um aumento da prevalência dos anticorpos antitiroideus. (10) A T4 (frações total e livre) não sofre alterações significativas com a idade e a T3 habitualmente mantem-se constante ou sofre uma diminuição devido à atividade reduzida da 5”-desiodinase ou pela presença de outras doenças associadas. (10)

Importância do iodo

A função da tiroide é produzir a quantidade de HTs necessária para suprimir a demanda dos tecidos periféricos. O iodo é um constituinte fundamental para todo este processo e como o corpo não tem capacidade de o produzir, a sua ingestão diária será essencial para uma produção adequada de HTs. A primeira etapa deste processo é a captação de iodo da circulação, mediado pela proteína co-transportadora de sódio e iodo

(“natrium-iodine symporter” [NIS]), expressa na membrana basolateral das células foliculares da

tiroide. (12) Depois de entrar nas células foliculares, o iodo é transportado até à membrana apical e daí para o colóide onde é oxidado pela tireoperoxidase (TPO). O iodo encontra-se na glândula tiroideia unido à tiroglobulina (Tg), uma glicoproteína que serve de base para a síntese das HTs. O iodo liga-se aos anéis fenólicos dos resíduos da Tg, percursores das HTs, para dar origem às iodotirosinas: monoiodotirosina (MIT) e diiodotirosina (DIT). A TPO catalisa a ligação de duas moléculas de DIT e MIT com consequente formação de T3 e T4. Dentro de determinados limites, a tiroide tem a capacidade de manter a síntese e secreção das HTs quando a disponibilidade de iodo é pouca ou mesmo quando é excessiva (13) porque o transporte de iodo é altamente adaptado às variações da sua ingestão: baixos valores de iodo

(14)

14 fazem aumentar a quantidade de NIS e estimulam a captação, enquanto que valores mais altos de iodo suprimem a expressão e captação de NIS. (12) Uma vez que é um elemento fundamental para a síntese das HTs, a captação do iodo é um bom indicador da função tiroideia. (14)

Uma deficiência de iodo ou a sua baixa disponibilidade resultam num aumento da secreção da TSH, crescimento anormal da glândula tiroideia e consequente aparecimento de bócio e ativação de mecanismos que permitem o aprisionamento do iodo na tiroide. (13) A deficiência de iodo é uma das causas mais comuns de hipotiroidismo em todo o mundo. No entanto, não é tão prevalente na América do Norte devido à iodação do sal utilizado na alimentação diária. Na década de 90, 28.9% da população mundial tinha um risco acrescido de deficiência de iodo na sua alimentação. (15) A ingestão diária de iodo atinge valores mais baixos no idoso quando comparado com os adultos jovens devido à restrição de sal na dieta e diminuição da sua absorção. (3) A introdução do sal iodado na alimentação diária de populações onde existia carência de iodo praticamente eliminou o bócio causado por esta deficiência. (16) No entanto, muitas outras partes do mundo não têm um aporte suficiente de iodo através da sua dieta e, por isso, a deficiência de iodo continua a ser um importante problema de saúde pública a nível mundial. Segundo a American Thyroid Association, aproximadamente 40% da população do mundo continua em risco de deficiência de iodo. (16)

A Organização Mundial de Saúde recomendada a ingestão diária de 150 µg para a população em geral (adultos com idade superior a 12 anos). (17)

Por outro lado, um excesso de exposição ao iodo pode levar a um hipotiroidismo transitório, chamado de “efeito Wolff-Chaikoff”. Este efeito inibe a organificação do iodo na tiroide, sendo por isso um meio eficaz para o organismo se proteger de grandes quantidades de iodo ingeridas e impedir a síntese e libertação de elevadas quantidades de HTs para a corrente sanguínea. (12) Este efeito pode ser observado em doentes com doença de Graves, na

(15)

15 preparação de uma tireoidectomia ou no tratamento da tempestade tiroideia através da ingestão de grandes quantidades de iodo para suprimir a função tiroideia. (13) Este efeito ocorre aproximadamente 2 dias após a exposição excessiva ao iodo (15) e dura cerca de 10 dias, retomando depois a normal organificação do iodo e função normal da TPO. (18)

Doentes com defeito na organificação, como por exemplo na tiroidite de Hashimoto, podem sofrer de um hipotiroidismo prolongado quando exposto a um excesso de iodo. Doentes sujeitos a terapêutica com amiodarona também podem estar sujeitos a este efeito. (15)

A taxa de captação de iodo pela tiroide pode ser determinada usando iodo radioativo (131I ou 123I), o que nos permite diferenciar as diferentes causas de tireotoxicose associadas ao aumento da captação (hipertiroidismo) daquelas com captação baixa ou ausente como mostra a Tabela 1. (19)

(16)

16 Captação normal ou elevada Captação baixa ou ausente

Doença de Graves Tiroidite indolor (silenciosa)

Bócio multinodular tóxico Tireoidite induzida por amiodarona

Adenoma tóxico Tireoidite subaguda (granulomatosa, de

Quervain)

Doença trofoblástica Tireotoxicose iatrogénica

Adenoma da hipófise secretor da TSH Ingestão excessiva de hormonas da tiroide

Resistência às hormonas da tiroide

Struma ovarii

Tireoidite aguda

Metástases extensas de carcinoma folicular da tiroide

Tabela 1 - Captação de 131I nas diferentes causas de tireotoxicose (adaptado de (19)).

Problemas na determinação da TSH no idoso

A avaliação da função tiroideia é muitas vezes solicitada na investigação da etiopatogenia de diversas situações clínicas, como é o caso de alterações ponderais (ganho ou perda de peso), arritmias, dislipidémias ou até ansiedade. O diagnóstico de hipotiroidismo e hipertiroidismo primário é um diagnóstico essencialmente laboratorial, uma vez que depende dos valores da concentração sérica da TSH e de T4.

Mas nem sempre a variação dos valores da TSH foi entendida como uma alteração fisiológica relacionada com a idade. Os primeiros estudos mostravam que os níveis séricos da TSH não sofriam variação ao longo da vida, mantendo-se dentro dos valores de referência ou, por outro lado, outros faziam referência a uma diminuição com a idade. (1) Contudo, estes

(17)

17

A B

estudos eram relativamente pequenos e realizados maioritariamente em áreas com ingestão deficiente de iodo. (20)

Um estudo holandês, que incluiu cerca de 5 000 habitantes e excluiu aqueles que apresentavam risco para disfunção da tiroide, verificou uma diminuição gradual dos valores da TSH e um aumento dos valores de T4l relacionados com a idade, em pessoas com idade superior a 60 anos, facto explicado muito provavelmente devido ao desenvolvimento da autonomia da glândula da tiroide (tecido tiroideu que funciona sem estimulação pela TSH) após longos anos de ingestão de iodo. (21)

Outro grande estudo transversal realizado a uma amostra populacional com idade superior a 12 anos, representativa da distribuição geográfica e étnica dos Estados Unidos, -

National Health and Nutrition Examination Survey III (NHANES III) - mostrou um aumento

dos valores da TSH e da prevalência de anticorpos antitiroideus na mulher, aumento esse relacionado com a idade e maior na raça caucasiana comparativamente à raça negra (Figura 2). (22,23)

Figura 2 - A: percentagem de doentes com TSH > 4.5 µUI/l ; B: percentagem de doentes com TSH < 0.4 µUI/l (adaptado de (23)).

(18)

18 A principal diferença entre o estudo realizado na Europa e o NHANES III realizado na população Norte Americana é a variação dos valores da TSH relacionado com a idade: no primeiro verifica-se uma diminuição enquanto que no segundo um aumento. Uma possível explicação para esta discrepância é a ingestão diária de iodo, relativamente superior nos Estados Unidos. (21)

Uma vez que os valores de TRH permanecem dentro da normalidade no idoso, estes níveis reduzidos da TSH podem ser atribuídos ao aumento de sensibilidade dos tireotrofos ao feedback negativo da T4. Embora os valores diminuídos da TSH resultem numa secreção diminuída de T4 e T3 nos mais idosos, os valores da concentração de T4 permanecem inalterados. Isto acontece porque a desiodação do anel externo, que causa a degradação da T4, diminui com a idade. (3,24) A desiodação do anel externo, catalisada pela “desiodinase” do tipo 1 e do tipo 2 (D1 e D2 respetivamente) é responsável pela conversão de T4 a T3 e pela clearance do metabolito inativo rT3. Posto isto, concluímos que existe uma diminuição dos níveis de T3 livre e total e um aumento dos níveis de rT3 relacionada com a idade (Figura 3). (1,24)

(19)

19 Esta variação dos valores das HTs também pode ser explicada pela diminuição do seu metabolismo periférico (hepático) que surge com o envelhecimento. Em primeiro lugar, o envelhecimento pode ser acompanhado pela diminuição da atividade da D1 que leva a uma diminuição dos níveis séricos de T3 devido à redução da conversão de T4 a T3. Por outro lado, uma redução da ingestão de selénio pode contribuir para uma diminuição da atividade de D1 no idoso, porque a sua deficiência é conhecida por reduzir a expressão da selenoproteína D1. Em segundo lugar, um aumento dos níveis de rT3 pode ser observado com a idade e pode ser explicado por uma redução da captação hepática de rT3. Para além disso, tanto a diminuição da atividade de D1 como uma diminuição da captação hepática das hormonas da tiroide podem ocorrer devido a doença existente ou a um estado nutricional baixo, ambos frequentes em idosos. (25)

Por seu lado, o aumento das concentrações da TSH com a idade poderá supor um processo fisiológico ou patológico. Muitas pessoas exibem alterações do sistema endócrino mesmo na ausência de manifestações da doença: diminuição da secreção da somatotropina relacionado com a idade, fator de crescimento semelhante à insulina tipo 1, sulfato de dihidroepiandrosterona e, em homens, da testosterona. (26) Se semelhantes mudanças ocorrerem na função tiroideia, uma queda nas concentrações de T4 circulante relacionada com a idade (na ausência de doença tiroideia) pode resultar num aumento de secreção da TSH. Por outro lado, o aumento da TSH também pode ocorrer sem que tenha que haver diminuição nos valores circulantes de T4 se, por exemplo, existir uma redução da bioatividade da TSH ou da capacidade de resposta da tiroide à TSH relacionada com a idade. Outra hipótese deste aumento em idosos resulta da doença tiroideia oculta. Os testes séricos para detetar anticorpos antitiroideus não são sensíveis a todos os casos de tiroidite linfocítica. Desta forma, o grupo de referência usado no estudo NHANES III pode ter incluído pessoas com doença tiroideia

(20)

20 autoimune e, neste caso, o aumento da TSH que foi observado com o aumento da idade pode refletir uma sobrevalorização da prevalência da doença tiroideia oculta no idoso em vez de ser uma característica fisiológica do envelhecimento. (27)

1. Fatores que influenciam os valores da TSH

Uma vez que a quantificação do valor da TSH é considerado o teste mais sensível para o diagnóstico de doença tiroideia primária, é de extrema importância perceber que uma alteração do seu valor não reflete necessariamente patologia da tiroide. (20) Por isso, é importante conhecer que fatores podem influenciar os valores da TSH e exclui-los antes de qualquer diagnóstico definitivo.

A função tiroideia pode estar alterada noutras patologias orgânicas sem que haja evidência de patologia tiroideia. (1) Esta situação denomina-se síndrome do doente eutiroideu (“Low T3 Syndrome”, “Euthyroid Sick Syndrome” ou “Non-Thyroidal Illness

Syndrome”) e define-se como uma diminuição dos níveis séricos de T3 e aumento de rT3, e

pode manifestar-se em situações como: desnutrição, processos infeciosos agudos/crónicos, doença hepática, neoplasias ou doença renal. (1) Por norma, os níveis de T4l são normais. A prevalência desta síndrome nos idosos é alta, atingindo cerca de 32% dos doentes hospitalizados. (24) A elevada prevalência da doença não tiroideia devido a subnutrição e a doença crónica são dois aspetos a ter em conta quando os testes de função tiroideia são realizados, uma vez que alteram os seus valores significativamente. Prova disso são os resultados de um estudo conduzido por Beld et al. (26), que incluiu 403 homens saudáveis com idade entre os 73 e 94 anos (pessoas com doença infeciosa, inflamatória e maligna foram excluídas). Deste estudo, 63 pessoas preencheram os critérios para doença não tiroideia. Além de terem idade mais avançada, frequentemente apresentavam hipertensão, aterosclerose, insuficiência cardíaca congestiva ligeira, doença pulmonar obstrutiva crónica, diabetes e/ou

(21)

21 artrite. Independentemente da doença subjacente, valores elevados de rT3 surgiram associados a uma performance física mais baixa. O aumento dos valores de rT3 poderá representar um estado catabólico, que eventualmente ocorre antes da “low T3 syndrome”. Também o estado nutricional pode ser um determinante de rT3, uma vez que a privação calórica surge associada a aumento dos valores de rT3. Como já mencionado, a redução da ingestão de selénio, para além de outros fatores como a ingestão de iodo, parece ter um papel fundamental uma vez que este é essencial para a desiodação das hormonas da tiroide. (25)

Para além do défice nutricional e algumas patologias já referidas, também o uso de determinados medicamentos pode influenciar os valores dos testes da função tiroideia no idoso. Dependendo da classe, há fármacos que podem causar hipotiroidismo (lítio ou amiodarona), hipertiroidismo (amiodarona) ou que estejam associados a anormalidades dos testes da função tiroideia sem que exista um efeito direto sobre a função da tiroide, afetando a concentração da TBG (glucocorticoides, estrogénios), a ligação da T4 à TBG (heparina), a secreção da TSH (glucocorticoides, dopamina), ou a conversão de T4 a T3 (glucocorticoides, amiodarona, propanolol). Posto isto, toda a medicação deve ser considerada e questionada durante a história clínica do doente, antes da interpretação dos valores obtidos nos testes de função tiroideia. (1)

Importa referir que são poucos os medicamentos que causam verdadeira tireotoxicose. A tabela 2 mostra os vários mecanismos que podem estar envolvidos, o tempo aproximado de início dos sintomas após iniciar a toma do medicamento e o respetivo tratamento. (28)

(22)

22

Fármaco Mecanismo

Tempo de início dos sintomas após iniciar a

toma do medicamento

Tratamento

Amiodarona

Induzida pelo iodo (tipo 1) meses a anos

- Cuidados de suportea

- ATS; percloratob

- Cirurgia

Tiroidite (tipo 2) frequentemente > 1 ano

- Cuidados de suportea

- Corticosteroides - Cirurgia

Lítio Tiroidite dolorosa frequentemente > 1 ano - Cuidados de suporte

a

- ATS

Interferão α Tiroidite subaguda; Doença de Graves meses

- Cuidados de suportea

- ATS e/ou 131I (apenas

na Doença de Graves)

Interleucina 2 Tiroidite dolorosa; Doença

de Graves meses

- Cuidados de suportea

- ATS e/ou 131I (apenas

na Doença de Graves) Contraste com

iodo

Autonomia prévia da

tiroide semanas a meses - ATS

a Cuidados de suporte que podem incluir bloqueadores β adrenérgicos durante a fase tireotóxica, caso se

desenvolva hipotiroidismo.

b Não é válido nos Estados Unidos da América.

Tabela 2 - Causas de Tireotoxicose induzida por fármacos (adaptado de (28)).

Não obstante, também o ritmo circadiano interfere com os valores da TSH. A sua concentração apresenta um pico mais baixo ao início da tarde e concentrações mais elevadas surgem durante a noite. (29) Por este motivo, as recolhas de sangue para análise laboratorial devem ser feitas sempre à mesma hora. Este mecanismo poderá ser explicado pelo aumento da sensibilidade das tirotrofinas ao retrocontrolo negativo mediado pela T4. (1)

Também a hereditariedade e a variação genética têm sido apontadas como fatores que podem influenciar a concentração de T4l e TSH. (30) Andersen et al. (31) analisou as amostras de 16 homens saudáveis e fez a quantificação dos níveis séricos da T4l e da TSH durante 12 meses. Com este estudo concluiu que a variação intraindividual da concentração destes dois valores foi mais pequena que a variação interindividual, o que demonstra um

(23)

23 elevado grau de reprodutibilidade das medições de cada pessoa ao longo do tempo. Estes achados mostraram uma possível influência da hereditariedade na concentração da TSH e T4l. Nos últimos anos surgiram fortes evidências que fatores e polimorfismos genéticos nos genes ligados às hormonas da tiroide poderão ser responsáveis pela variação nos testes de função tiroideia entre diferentes indivíduos. (1) Estudos recentes mostraram que polimorfismos comuns localizados perto ou nos genes PDE8B, TSHR e CAPZB foram associados a diferenças nas concentrações séricas da TSH, ainda que a maioria da heritabilidade da TSH permaneça inexplicada. (32)

2. Valores de referência da TSH

Segundo as orientações da Direção Geral da Saúde (DGS), a avaliação da função tiroideia deve ser realizada pela determinação conjunta dos níveis da TSH e T4l e, em casos de maior dificuldade diagnóstica, auxiliada pelo doseamento de T3. (33)

No entanto, a definição dos seus limites de referência para o diagnóstico no idoso tem sido controverso. A quantificação do valor sérico da TSH é o parâmetro de referência para avaliar a função tiroideia na ausência de doença que afete o HHT, especialmente no hipotiroidismo primário e no hipotiroidismo subclínico. Isto por 3 razões:

1. Existe uma relação linear logarítmica inversa entre as concentrações da TSH e T4l: uma ligeira redução de T4l está associada a um aumento exponencial das concentrações da TSH;

2. A maioria dos casos de hipotiroidismo têm uma causa primária (95% dos casos); 3. Os imunoensaios de micropartículas por quimioluminuscência para a TSH apresentam

elevada sensibilidade e especificidade. (34)

Os ensaios de primeira geração para a determinação dos valores da TSH permitiam apenas o diagnóstico de hipotiroidismo (não detetavam valores baixos da TSH) e

(24)

24 apresentavam sensibilidade de 75% e especificidade de 90%. Surgiram depois os ensaios de segunda e terceira geração com sensibilidade e especificidade semelhantes: 97% e 93% respetivamente. (34,35)

Não existe dúvida que se deve dar preferência aos ensaios de terceira geração que, para além de uma elevada sensibilidade e especificidade, são capazes de detetar valores da TSH inferiores 0.002 µIU/L. (33) Para além de ser um teste exato, está amplamente disponível, é seguro e relativamente barato.

Os limites de referência considerados para os valores da TSH, tal como acontece para os valores de glicose nos diabéticos e tensão arterial nos hipertensos, poderiam possibilitar ao médico uma classificação do doente em: (1) normal, sem necessidade de qualquer intervenção; (2) doente que requer observação periódica sem intervenção farmacológica; (3) doente com diagnóstico que exige medidas terapêuticas. No entanto, definir valores de referência para a TSH implicaria que qualquer doente fora desses limites fosse considerado candidato para tratamento farmacológico, mas nem sempre isso se verifica. (36) Da reunião de várias entidades (American Thyroid Association, The American Association of Clinical

Endocrinologists e The Endocrine Society) resultou um consenso que estabeleceu os limites

de referência entre 0.45 e 4.50 µUI/L, conforme se verifica na tabela 3. (37)

Valor de T4l < 0.45 µUI/L Limite de referência da TSH 0.45 a 4.50 µUI/L

> 4.5 µUI/L

Normal Hipertiroidismo

subclínico

Normal, “Euthyroid Sick

Syndrome” Hipotiroidismo subclínico

Diminuído Hipotiroidismo (causa

central) Tiroidite tardia

Hipotiroidismo (causa primária)

Aumentado

Hipertiroidismo (iatrogénico, doença de Graves, nódulo tóxico)

Tiroidite aguda

Hipertiroidismo (adenoma da hipófise produtor da

TSH)

(25)

25 Algumas entidades têm recomendado a adoção de um limite de referência para a TSH dependente da idade (39), embora este aspeto ainda permaneça matéria de debate nos dias de hoje. (40) A controvérsia prende-se com o fato de apenas existirem estudos transversais, faltando estudos longitudinais/observacionais robustos que analisem as alterações da concentração da TSH e da T4l em indivíduos sem patologia tiroideia. Como já foi mencionado, não só a faixa etária deve ser tida em conta, também a raça pode interferir com os valores da TSH. O estudo realizado por Boucai and Surks (41) mostra isso mesmo, quando após a análise de cerca de 22 000 pessoas de raça negra, caucasiana e latina se pôde concluir que as pessoas de raça negra apresentavam valores da TSH mais baixos em relação a pessoas de raça caucasiana.

Figura 4 - Distribuição da TSH segundo a raça (adaptado de (41)).

(26)

26 Esse mesmo estudo conduzido por Boncai and Surks analisou a distribuição da amostra populacional em função dos valores da TSH da seguinte forma: < 0.3 µIU/L, 0.31-2.49µIU/L, 2.5-4.5µIU/L e > 4,5µIU/L, conforme se observa na tabela 4. (41)

Idade por grupos (em anos) Tamanho da amostra % TSH ≤0.3µUI/L TSH 0.31-2.29 µUI/L TSH 2.5-4.5 µUI/L TSH>4.5 µUI/L (A) Todos os doentes ≥ 10 22 116 100.0 3.9 77.8 12.8 5.5 20-29 2321 11.3 4 83.7 10 2.3 30-39 2769 13.5 4.7 81.2* 10.9 3.2 40-49 3710 18.1 2.9* 80.6 12.9* 3.6 50-59 3561 17.4 2.8 76.9* 16* 4.3 60-69 2739 13.3 3.2 76 16 4.8 70-79 1984 9.7 3.4 73.2* 18 5.4 >80 1159 5.6 3.3 67.9* 23.2* 5.6 RAÇA Caucasiana 20-29 167 2.4 85.6 9 3 >80 387 3.6 68 23.2 5.2 Negra 20-29 809 5.2 85.7 7.9 1.2 >80 326 3.4 76# 16.3 4.3

*P < 0.05 pela diferença em relação ao decil prévio de idade #P < 0.05 pela diferença entre a raça caucasiana e negra

Tabela 4 - Distribuição da TSH de acordo com a faixa etária (adaptado de (42))

A percentagem de doentes com a concentração da TSH compreendida entre 0.31 e 2.49 µUI/L diminui gradualmente com a idade, com valores que variam desde os 83.7% nos mais jovens (20-29 anos) a 67.9% nos mais idosos (>80 anos), contrariamente ao que se observa quando os valores se situam nos intervalos entre 2.5 e 4.5 µUI/L ou até quando são superiores a 4.5 µUI/L onde existe um aumento progressivo da percentagem de doentes relacionado com a idade. Cerca de 90% dos doentes com TSH superior a 4.5 µUI/L tem TSH

(27)

27 inferior a 10 µUI/L. Estes resultados sugerem um aumento dos valores da TSH com a idade. (41)

Uma reanálise recente ao estudo NHANES III (figura 6), onde foram utilizadas as variantes idade, sexo e raça, sugeriu limites de referência para os valores da TSH na raça caucasiana com grau de confiança de 95%: 5.6 µUI/L para pessoas com idade compreendida entre os 70 e 79 anos e 6.6 µUI/L para pessoas com idade superior a 80 anos. Para além disso, este estudo mostrou que a baixa prevalência de anticorpos antiroideus na raça negra pode explicar a diferença de valor da TSH entre raças. (23)

Esta análise ao estudo NHANES III (36) também concluiu que pessoas que tinham um valor da TSH compreendido entre 5.0 e 10µUI/L apresentaram risco acrescido de progressão para hipotiroidismo primário. Este risco é estimado em 2.6% ao ano na ausência de anti-TPO e 4.3% na sua presença. Outro estudo semelhante, realizado durante cerca de 10 anos por

Gerold Huber et al. a uma amostra populacional de 82 mulheres com diagnóstico de

hipotiroidismo subclínico, obteve resultados comparáveis quando mostrou que o hipotiroidismo primário surgiu em 42.8% da amostra cujos valores iniciais da TSH variavam

(28)

28 entre 6 e 12 µUI/L mas o mesmo não se constatou quando os valores iniciais da TSH estavam compreendidos entre 4 e 6 µUI/L. (43)

Nem todos os doentes com hipotiroidismo subclínico têm evolução para hipotiroidismo primário ou permanecem com esta patologia. Prova disso é o estudo realizado por Diez JJ et al. a uma amostra de 107 pessoas, com idades compreendidas entre os 55 e 83 anos, com diagnóstico de hipotiroidismo subclínico. Durante 32 meses de estudo, os valores da TSH voltaram aos limites de normalidade em 37% da amostra. (44)

Por outro lado, foram descritos efeitos benéficos em doentes que apresentavam valores

da TSH ligeiramente acima dos valores recomendados. Num estudo realizado durante 4 anos

a uma amostra populacional com idade superior a 85 anos, Gussekloo et al. concluíram que

doentes com valores elevados da TSH tinham uma maior esperança média de vida. (45) De

modo semelhante, Van den Belde et al. salientaram que baixos níveis de T4l surgiam

associados a uma maior esperança média de vida, o que poderá refletir um possível

mecanismo adaptativo para prevenir o excesso de catabolismo no idoso. (25)

A grande dúvida dos estudos realizados nos últimos anos prende-se com o facto de saber se os limites de referência para os níveis séricos da TSH, em particular o limite superior, devem ser adaptados ou não à população mais idosa porque, de acordo com o que foi mencionado anteriormente e contrariamente ao esperado, estudos recentes mostraram que subpopulações distintas têm uma distribuição dos valores da TSH única e limites de referência que são significativamente diferentes dos limites estabelecidos pela abordagem tradicional. (30) A aplicação de diferentes valores de referência da TSH para diferentes faixas etárias poderia prevenir uma classificação errada de patologia tiroideia subclínica em pessoas saudáveis. (20)

Se considerarmos a hipótese de tratamento preventivo global nos doentes com hipotiroidismo subclínico, muitos dos que retomam espontaneamente os seus valores à

(29)

29 normalidade serão tratados desnecessariamente. Torna-se assim óbvio que apenas o seguimento das pessoas com este tipo de alterações analíticas permite esclarecer se estamos perante uma real situação patológica que necessita de tratamento.

PATOLOGIA TIROIDEIA NO IDOSO

As alterações fisiológicas e patológicas da tiroide são frequentes em pessoas com idade superior a 60 anos, com uma evolução e apresentação particulares. Na presente revisão serão abordados o hipotiroidismo clínico e subclínico, assim como o hipertiroidismo clínico e subclínico, com a respetiva epidemiologia, etiologia, clínica, diagnóstico e tratamento.

1. HIPOTIROIDISMO CLÍNICO

O hipotiroidismo primário, sob o ponto de vista analítico, é definido pela elevação dos valores da TSH, acompanhado por valores diminuídos da T4l. (3) Para esta interpretação ser válida consideramos que, num período de pelo menos 4 semanas, o HHT não foi afetado e não existe patologia evidente.

1.1. Epidemiologia

A frequência do hipotiroidismo varia entre 0.1% e 2%, mas a prevalência pode aumentar até 6% em indivíduos com mais de 65 anos (24), sendo 5 a 8 vezes mais comum na mulher que no homem (20), assim como em algumas raças. (23) Cerca de 7 a 14% dos idosos têm os níveis séricos da TSH acima do limite superior dos valores de referência. (3) No entanto, e como já foi mencionado, estudos mostraram que os valores da TSH podem aumentar progressivamente a partir dos 80 anos, sem que haja evidência de patologia tiroideia. (10)

(30)

30 As diferentes frequências obtidas em vários estudos podem estar associadas a vários fatores locais, incluindo diferenças na ingestão diária de iodo nas diversas populações, variações nos valores de cut-off usados para a TSH e T4l, bem como as diferentes estratégias usadas nas diferentes amostras populacionais.

1.2. Etiologia

O hipotiroidismo pode ter uma causa primária, se a causa envolve a glândula da tiroide e o defeito está na produção e libertação das hormonas da tiroide, ou uma causa secundária ou pituitária se é o HHT que está afetado, existindo um defeito na sinalização com a TRH ou TSH. Estas condições podem ser permanentes ou transitórias. (15) Particularmente no idoso, pode surgir como uma adaptação fisiológica às exigências do consumo exagerado ou catabolismo.

A presença de anticorpos antitiroideus aumenta com a idade, sendo que a tiroidite autoimune crónica (tiroidite de Hashimoto) é a causa mais comum de hipotiroidismo em áreas com ingestão suficiente de iodo. Esta patologia é conhecida pela infiltração difusa de linfócitos na glândula da tiroide associada à presença de anticorpos anti-TPO. (15) A sobrecarga de aporte de iodo com origem em fármacos como a amiodarona, lítio, glucocorticoides, heparina e dopamina ou o uso de produtos de contraste iodados é a segunda causa mais frequente, devido ao seu maior uso na população idosa. (10) Também o hipotiroidismo iatrogénico pós cirúrgico ou causado pelo tratamento da tireotoxicose constituem causas de hipotiroidismo.

O ferro e os sais de cálcio podem igualmente impedir a absorção das HTs exógenas. (15) Também os processos infiltrativos podem levar a um hipotiroidismo primário, assim como a hemocromatose, o linfoma, a sarcoidose e a tiroidite de Riedel. Infeções da tiroide com agentes patogénicos como o Pneumocystis jiroveci, podem levar a uma produção

(31)

31 inadequada das HTs. No entanto, este estado de infeção da tiroide é raro por causa da existência da sua cápsula e drenagem linfática. (15)

1.3. Clínica

Embora médicos experientes possam suspeitar do hipotiroidismo grave na população idosa, muitas vezes os sinais e sintomas desta patologia são subtis, pouco sensíveis e específicos da doença. (36) A apresentação clássica do hipotiroidismo primário não é tão clara nos doentes idosos como nos doentes mais jovens. As comorbilidades típicas desta faixa etária, assim como o processo de envelhecimento fisiológico, podem ser facilmente confundidos com os sinais e sintomas do hipotiroidismo. É uma situação que se instala muito lentamente, acabando por passar despercebida grande parte das vezes.

Entre as queixas mais frequentes no idoso, destacam-se a astenia, fraqueza muscular, obstipação, pele seca, queda de cabelo, intolerância ao frio, anorexia e depressão. (20). A maioria está presente em menos de metade da população idosa com hipotiroidismo clínico comprovado. (10)

O hipotiroidismo no idoso surge associado a um declínio da função cognitiva em vários domínios, incluindo a atenção e concentração, memória, função visual e percetual e linguagem. Particularmente nesta faixa etária, os sintomas psiquiátricos, como a depressão, são muito frequentes. (24) No entanto, a depressão e demência que surgem na sequência do hipotiroidismo são reversíveis. (3) Apesar desta reversibilidade, os efeitos da terapêutica a longo prazo com hormonas exógenas sobre a função cognitiva e humor são ainda desconhecidos. (46)

O hipotiroidismo também pode ter presente disfunção cerebelosa, anemia macrocítica ou neuropatia. (3)

(32)

32 Alguns autores recomendam a determinação dos parâmetros da função tiroideia em todos os doentes com dislipidémia porque mais de 90% dos doentes com hipotiroidismo terão os seus valores lipídicos alterados. (15) A hipercolesterolémia e um aumento marcado de LDL e apolipoproteína B são características do hipotiroidismo devido à diminuição da clearance hepática pelo número reduzido de recetores hepáticos de LDL. Os níveis da lipoproteína de elevada densidade são normais ou até elevados no hipotiroidismo severo por causa da atividade diminuída da proteína transportadora de ésteres de colesterol e lípase hepática, ambas enzimas reguladas pelas HTs. (47)

O coma mixedematoso constitui um problema major em doentes com idade mais avançada uma vez que, apesar do tratamento intensivo, apresenta altas taxas de mortalidade. Para além das manifestações típicas do hipotiroidismo, pode observar-se um nível de consciência reduzido, associado por vezes a crises convulsivas. A hipotermia pode chegar aos 23ºC. Este diagnóstico pode levar à suspeita de hipotiroidismo com fraca adesão terapêutica ou falha no diagnóstico atempado. (12)

1.4. Diagnóstico

O diagnóstico de hipotiroidismo no idoso deve ser feito com um elevado grau de suspeição porque a presença de sinais e sintomas, como referido anteriormente, pode facilmente ser atribuída à idade. Dada uma grande maioria dos doentes não apresentar sintomatologia, muitas vezes o sinal mais precoce do início da falência da tiroide é o aumento dos valores da TSH. Posto isto, o diagnóstico definitivo de hipotiroidismo clínico requer sempre a quantificação dos valores da TSH e T4l (Tabela 5). Também o doseamento dos anticorpos anti-TPO e anti-Tireoglobulina (anti-Tg) poderá auxiliar na pesquisa da sua etiologia.

(33)

33

Primário Subclínico Secundário ou Terciário

TSH ↑↑ TSH ↑ TSH ↓ ou N ↑

T4l ↓ T4l N T4l ↓

AAT +/- AAT +/- AAT -

Legenda: ↑ - ligeiro aumento; ↓ - diminuída; ↑↑ - aumento; + positivo; - negativo; N - normal; AAT -

anticorpos antitiroideus

Tabela 5 - Diagnóstico diferencial de hipotiroidismo (adaptado de (48)).

Todos os doentes sintomáticos devem fazer a quantificação dos valores da TSH. (49) Como a sintomatologia no idoso é mais fruste, várias entidades procuraram propor um período ideal para fazer a determinação laboratorial destes valores de modo a intervir antes do aparecimento da sintomatologia. A American Academy of Family Physicians afirma-se contra o rastreio da patologia da tiroide em doentes com idade inferior a 60 anos baseado na falta de evidência e nos resultados limitados ou contraditórios acerca dos possíveis benefícios do tratamento. (49) Pelo mesmo motivo, o consenso formado pela U.S. Preventive Services Task

Force, a Canadian Task Force e a Bristish Royal College of Physicians também se mostrou

contra o rastreio em adultos ou idosos assintomáticos. (49). No entanto, este grupo considerou um controlo mais apertado para grupos de risco (Tabela 6). (38,50)

(34)

34

Idade> 60 anos Sexo feminino Bócio

Doença nodular tiroideia

História familiar de doença tiroideia Radioterapia da cabeça e pescoço Antecedentes de doença auto-imune Fármacos (lítio, amiodarona)

Tabela 6 - Fatores de risco (adaptado de (38)).

Por seu lado, a Norma n.º 039/2011 da DGS assume uma posição intermédia: não se

mostra a favor em doentes assintomáticos mas recomenda o rastreio aos doentes que estão sob

medicação suscetível de alterar a função tiroideia, doentes com patologia

hipotálamo-hipofisária, doentes com anemia de causa inexplicada, hipercolesterolémia, variações

ponderais, doenças autoimunes, arritmias e osteoporose.

1.5. Tratamento

Os principais objetivos do tratamento do hipotiroidismo primário são o alívio dos sinais e sintomas e evitar a progressão da doença para mixedema, sendo que o último, ainda que raro, ocorre quase sempre em idosos. (34)

Independentemente da idade, o tratamento com reposição hormonal com levotiroxina (L-tiroxina) é o tratamento de primeira linha para os doentes com diagnóstico de hipotiroidismo e deve ser iniciado em todos os doentes com patologia evidente. (20) A L-tiroxina é convertida em T3l, a forma ativa da hormona T3. Com uma semivida de 7 dias, é administrada normalmente numa dose única diária. No entanto, existem diferenças entre as várias faixas etárias: uma vez que o idoso é mais sensível a hormonas tiroideias exógenas, este deve iniciar a terapêutica com doses mais baixas, indicando uma redução de 20 a 30%

(35)

35 comparativamente com a dose preconizada nos doentes mais jovens. (24) Para além da idade, também a patologia cardíaca interfere com a dose diária recomendada: para doentes sem doença cardíaca associada, a dose de L-tiroxina ajustada ao peso é de 1.5 µg/kg/dia (75 ou 100µg/dia para mulher, 100 ou 125µg para homem); para doentes com doença cardíaca associada e com idade avançada, deve-se começar com uma pequena dose de L-tiroxina: 25 ou 50µg diárias. A L-tiroxina deve ser tomada em jejum, cerca de uma hora antes da primeira refeição ou antes de ir dormir (2 horas ou mais depois da última refeição). Os medicamentos que interferem com a absorção da L-tiroxina devem ser evitados ou administrados, pelo menos, 4 horas depois da L-tiroxina.

Depois de iniciar o tratamento, deve ser confirmada a tolerância cardiovascular e, caso esta se verifique, recomenda-se o aumento gradual das doses diárias de 12.5 a 25µg a cada 4 semanas até que a normalização dos valores da TSH seja confirmada. Tal acontece porque o aumento dos níveis das hormonas da tiroide aumenta as necessidades de oxigénio do miocárdio, o que poderá induzir angina pectoris, enfarte do miocárdio ou arritmias, principalmente em doentes com risco de doença coronária aumentado. Por esse motivo, as complicações mais frequentes do tratamento no idoso são a isquemia do miocárdio e arritmias, especialmente a fibrilhação auricular. (34)

Em alguns doentes, uma reposição plena poderá ser impossível de se atingir, mesmo com terapêutica anti-anginosa. (12) Se durante o tratamento com reposição hormonal o doente desenvolver instabilidade cardíaca, este deve ser suspenso durante alguns dias ou semanas até que o doente volte a estabilizar. (3)

Para os doentes que estejam sob terapêutica com fármacos que possam afetar a função tiroideia, a monitorização deve ser feita igualmente com a quantificação dos valores da TSH e de T4l. No caso da amiodarona, a monitorização deve ser feita de 6 em 6 meses e no caso do

(36)

36 lítio de 12 em 12 meses. Com os inibidores da tirosina cinase ou interferão, entre 1 a 3 meses após o início da terapêutica e, posteriormente, em intervalos de 6 meses. (33)

Deve-se tomar especial atenção perante situações que podem aumentar as necessidades de L-tiroxina, como a má absorção (doença celíaca, cirurgia ao intestino delgado), terapêutica com estrogénios (12) e também o uso concomitante de fármacos que podem aumentar as taxas de clearance da tiroxina (fenítoina, rifampicina, carbamazepina) ou diminuir a sua absorção intestinal (colestiramina, hidróxido de alumínio, carbonato de cálcio e sulfato ferroso), levando a aumento das suas necessidades. (24)

O valor da TSH pode demorar mais tempo a normalizar em pessoas com idade mais avançada, muito provavelmente devido ao longo período de latência antes de se fazer o diagnóstico. Além disso, um ligeiro aumento dos níveis da TSH com níveis normais de T4l não é indicação para aumentar a dose de tiroxina. O acompanhamento destes doentes é necessário para evitar a sobredosagem, isto porque a supressão rápida da TSH com L-tiroxina é uma causa frequente de tireotoxicose subclínica. (20) Por esse motivo recomenda-se a monitorização dos valores da TSH: 4 a 6 semanas após o início da medicação com L-tiroxina, a cada 8 semanas após alteração na dose terapêutica e, posteriormente, quando se atingir a estabilidade, deve fazer-se apenas a determinação anual da TSH. (33)

2. HIPOTIROIDISMO SUBCLÍNICO

Existem ainda muitas questões controversas sobre o diagnóstico, avaliação e tratamento do hipotiroidismo subclínico. O seu diagnóstico é laboratorial, definido por níveis de concentração da TSH acima do limite superior do intervalo de referência (definido estatisticamente) quando os níveis de concentração de T4l estão dentro dos valores de referência. A maioria dos doentes com hipotiroidismo subclínico apresenta um aumento ligeiro dos níveis da TSH, acima dos intervalos de referência mas abaixo de 10µUI/L. (20)

(37)

37 A prevalência de anticorpos antitiroideus é elevada em doentes com hipotiroidismo subclínico (3).

O hipotiroidismo subclínico é geralmente classificado em duas categorias, de acordo com os níveis séricos da TSH:

- valores ligeiramente aumentados da TSH (4.5 a 10.0 µUI/L), representando cerca de 90% da população com diagnóstico de hipotiroidismo subclínico;

- valores aumentados da TSH (> 10.0µUI/L).

É importante realçar que existem diferenças nos valores da normalidade da TSH em pessoas com idade superior a 80 anos (4.0-7.0 µUI/L), entendida como uma adaptação fisiológica associada à idade. (22,51)

O uso de valores de referência da TSH adaptados às diferentes faixas etárias reduz o número de doentes que são rotulados com diagnóstico de hipotiroidismo subclínico: para 2% em doentes com idade superior a 75 anos e para 5% em doentes com idade superior a 90 anos. (20)

2.1. Epidemiologia

Esta é a patologia tiroideia mais comum no idoso. A sua frequência varia entre 4% e 10% em diferentes populações. (20) no idoso, a sua prevalência é mais elevada – entre 6.5% a 15% (24), sendo maior em indivíduos de origem caucasiana e em populações onde a ingestão de iodo é maior. (20) Em mulheres com idade superior a 60 anos, o hipotiroidismo subclínico pode estar presente em 20%, e em homens em 8%. (1)

2.2. Etiologia

Existe uma forte evidência que um número significativo de doentes com história de tiroidite de Hashimoto veja a sua progressão para hipotiroidismo primário. (37) Uma vez que

(38)

38 a tiroidite autoimune crónica é uma das causas mais comuns de hipotiroidismo subclínico, marcada pela presença de anticorpos anti-TPO e/ou anti-Tg, a sua determinação permitirá estabelecer um diagnóstico etiológico de tiroidite autoimune. (29) A presença de anti-TPO é a primeira evidência da presença de doença tiroideia autoimune e revela um maior risco de desenvolvimento de hipotiroidismo subclínico ou mesmo hipotiroidismo primário. Contudo, muitas das pessoas que apresentam anti-TPO positivo não chegam a desenvolver hipotiroidismo subclínico ou clínico, o que prova que a sua presença não é sinónimo de disfunção tiroideia. (36) Tal facto foi constatado no estudo NHANES III que mostrou que, entre as pessoas que apresentavam anti-TPO positivo, 62.2% apresentavam valores da TSH abaixo de 3.0µUI/L.

Outras causas possíveis para o hipotiroidismo subclínico incluem a recuperação prolongada da tiroidite subaguda, o distúrbio hipotalâmico e terapia inadequada com L-tiroxina em doentes com hipotiroidismo conhecido. (37) Também a recuperação da doença não tiroideia, a variabilidade do exame laboratorial realizado, a elevação dos valores da TSH devido à presença de anticorpos heterofílicos na circulação sanguínea, a resistência às HTs devido a mutações no seu recetor, o tratamento prévio com 131I, a tireoidectomia e a

radioterapia, podem resultar em hipotiroidismo subclínico. (52)

2.3. Clínica

Existe alguma controvérsia quanto à sua apresentação clínica. Algumas diretrizes definem como um estado em que o doente é frequentemente assintomático enquanto outras afirmam que podem estar presentes alguns sintomas mas sem especificar quais podem estar envolvidos. (34) Um aspeto a ter em conta é que existe um ponto de ajuste individual do eixo hipotálamo-hipófise-tiroide que pode justificar a diferente sintomatologia apresentada por doentes com valores idênticos da TSH. (34)

(39)

39 A interpretação de valores e informação de doentes com idade mais avançada tem-se mostrado mais complicada que em doentes mais jovens devido a todos os fatores anteriormente mencionados.

Das possíveis complicações do hipotiroidismo subclínico destacam-se a disfunção cardíaca, a aterosclerose, a elevação do colesterol LDL e colesterol total, sintomas neuropsiquiátricos e progressão para hipotiroidismo primário.

Um estudo de corte transversal conduzido por Ashizawa et al. mostrou um aumento significativo de um conjunto de fatores de risco de doença cardiovascular metabólica entre as pessoas com hipotiroidismo subclínico: hipertensão, diabetes mellitus, dislipidémia e hiperuricemia. (53)

Como existe um aumento de risco cardiovascular nestes doentes e eventual alteração da função cognitiva, antes de iniciar qualquer tratamento num doente idoso dever-se-á avaliar a preexistência de risco cardiovascular, as comorbilidades existentes e o estado de fragilidade do doente.

2.4. Diagnóstico

O diagnóstico é essencialmente laboratorial e definido como um valor da TSH acima do limite superior dos valores de referência (0.45 a 4.5µIU/L) com uma T4l dentro dos valores normais.

Para além da quantificação dos valores da TSH, também o doseamento de anticorpos antitiroideus tem sido sugerida como útil. Um aumento dos valores de anti-TPO foi associado a valores mais altos da TSH como mostra a Figura 7. (21,23)

(40)

40 O consenso que resultou da reunião de entidades como a American Association of

Clinical Endocrinologists, a American Thyroid Association e The Endocrine Society concluiu

que a quantificação dos anticorpos anti-TPO pode ser um importante auxiliar na avaliação de doentes com hipotiroidismo subclínico, porque existe um risco acrescido de desenvolver hipotiroidismo clínico mais tarde (4.3% ao ano, contra 2.1% por ano em pessoas com anticorpos negativos). (14,23)

Deve-se ter em atenção que, por vezes, os níveis da TSH podem estar elevados transitoriamente devido a patologia não tiroideia ou uso de determinados fármacos. (54)

Veríssimo et al. recomendam repetir a quantificação dos níveis da TSH três a seis meses

depois para confirmar o diagnóstico de hipotiroidismo subclínico, visto ocorrer normalização dos valores em metade dos casos. (10)

2.5. Tratamento

Os objetivos do tratamento do hipotiroidismo subclínico são evitar a progressão para a doença clínica, diminuir o risco cardiovascular e outras morbilidades associadas como a alteração dos valores da tensão arterial e do metabolismo dos lípidos, assim como reduzir a sintomatologia eventualmente associada.

(41)

41 Enquanto que para o hipotiroidismo clínico não existe dúvida quanto à indicação para o tratamento, relativamente ao hipotiroidismo subclínico existe ainda alguma incerteza. Embora não existam ensaios clínicos randomizados referentes à diminuição da morbilidade e mortalidade cardiovascular, alguns estudos têm mostrado que o tratamento do hipotiroidismo subclínico associa-se a uma melhoria dos fatores de risco cardiovascular e do perfil lipídico. (24)

A decisão de iniciar tratamento com L-tiroxina deve ter em conta o custo e o inconveniente de uma medicação diária, não aceite por muitos doentes, para além da possibilidade de sobredosagem que pode exacerbar a osteoporose ou causar arritmias. A maioria dos especialistas prefere iniciar o tratamento destes doentes com baixas doses de L-tiroxina. (3)

A American Association of Clinical Endocrinologists, recomenda iniciar o tratamento em doentes com níveis da TSH acima de 10µUI/L ou em doentes com níveis da TSH entre 5 e 10µIU/ml com presença de bócio ou anticorpos anti-TPO, uma vez que estes doentes têm probabilidade elevada de progressão para hipotiroidismo, como já foi mencionado. (24) Caso se opte pelo tratamento, dever-se-á proceder como descrito no ponto 1.5.

3. HIPERTIROIDISMO CLÍNICO

O hipertiroidismo/tireotoxicose é definido como uma síndrome clínica que resulta de alterações fisiológicas, bioquímicas e clínicas motivadas pela exposição dos tecidos a concentrações elevadas de hormonas tiroideias.(48) O hipertiroidismo clínico é definido analiticamente pela elevação dos níveis de T4l ou T3 (total ou livre), com frenação da TSH.

(42)

42 3.1. Epidemiologia

Embora o pico de incidência seja a 2ª e 3ª década de vida (3), a prevalência do hipertiroidismo tem vindo a aumentar no idoso (1), com uma frequência que varia de 0.7 a 2% em doentes com mais de 60 anos. (24)

3.2. Etiologia

Qualquer etiologia conhecida para o hipertiroidismo no adulto jovem pode igualmente ser observada no idoso, no entanto com diferentes frequências. (1) A doença de Graves é a causa mais comum de hipertiroidismo em jovens e em zonas com ingestão diária elevada de iodo, como é o caso dos Estados Unidos da América, enquanto que o bócio multinodular tóxico é a causa mais frequente de hipertiroidismo espontâneo no idoso e em zonas com baixa ingestão diária de iodo. (1,24) A tiroidite subaguda pode ocorrer em idades mais avançadas. Já o adenoma tóxico simples é uma causa relativamente rara. (24) A tirotoxicose também pode surgir depois do tratamento excessivo de reposição com L-tiroxina, pelo excesso de iodo proveniente dos agentes de contraste iodados usados nos testes imagiológicos ou pelo uso de determinados fármacos como a amiodarona. (1) Esta tireotoxicose induzida pelo iodo é conhecida como doença de Jod-Basedow e tem uma incidência elevada no idoso. (3)

A amiodarona, um antiarrítmico de classe III, é usada em pessoas com fibrilhação auricular, arritmias ventriculares, ou insuficiência cardíaca congestiva. Por ser frequentemente prescrita a doentes com idade mais avançada, devemos suspeitar da sua interferência com o HHT quando o doente apresenta variação dos valores da TSH nos exames laboratoriais. (55)

3.3. Clínica

À semelhança do que acontece com o hipotiroidismo, o diagnóstico clínico e a terapêutica iniciam-se frequentemente numa fase mais avançada da doença porque existe

Referências

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