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Revista de Arte, Política e Filosofia #3

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Academic year: 2021

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Revista de Arte, Política e Filosofia

#3

Junho de 2014

ESPECIAL

“Copa pra Quem?”

P

R

Á

X

I

S

ARTIGOS *A ascensão liberal - A reação conservadora – A Velha Mídia * POEMAS

*Pacifica(dores) – Poema I – Poema II - Usina Comum

- O Cínico * ENSAIOS * Poesias e Revoluções *

CRÔNICA * Dia de Copa, Dia de Luta *

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Revista Virtual Práxis

http://www.revistapraxisonline.blogspot.com.br/

Diagramação & Capa George dos Santos Foto: Anistia Internacional

Colaboradores George dos Santos, Genard Eduardo,

Rennan Martins, Diego Ruas, Frota Pessoa

(C) Copyleft - É livre, e inclusive incentivada, a reprodução deste arquivo,

para fins estritamente não comerciais, desde que a fonte seja citada e esta nota incluída.

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ÍNDICE ARTIGOS *A Ascensão Liberal *A Reação Conservadora *A Velha Mídia POEMAS *Pacifica(dores) *Poema I *Poema II *Usina Comum *O Cínico ENSAIOS *Poesias e Revoluções CRÔNICA

*Dia de Copa, Dia de Luta

POSFÁCIO

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ARTIGOS

A ascensão liberal, a falência do modelo e o caminho a

ser tomado

Por Rennan Martins

O avanço da direita liberal-conservadora, iniciado após Pinochet, Thatcher e Reagan, foi de tamanho ímpeto que, na atualidade, a ascensão de um genuíno social-democrata, a saber, Rafael Correa, se dá num projeto político alcunhado Revolución Ciudadana. O espectro do debate político-econômico foi tão puxado pra direita, que propor um Estado de bem-estar social é revolucionário.

Correa, que tem mandato até 2017, já fala em emenda constitucional no tocante a reeleição. Tem consciência da dificuldade que é enfrentar a reação, cada vez mais inescrupulosa e virulenta.

Em discurso comemorativo ao aniversário da Revolução Liberal do Equador, ocorrida em 1895, as palavras mais enérgicas que proferiu foram em relação a imprensa corporativa, definida inúmeras vezes como “corrupta e corruptora”. O papel de oposição suja exercido pela grande mídia na América Latina é facilmente constatado em todos os países que questionam, ainda que minimamente, a abordagem econômica neoliberal. A própria Judith Brito, na época, presidente da Associação Nacional de Jornais, admitiu.

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projeto político e mídia está ainda mais quente. Ignacio Ramonet, em seu publicação intitulada Brasil, futebol e protestos, considerou que nas próximas eleições presidenciais brasileiras está em jogo não só o futuro do país, mas de todo o continente abaixo dos Estados Unidos. A atual conjuntura dá sinais de que somente por aqui há correlação de forças no sentido da construção de um regime mais inclusivo e participativo.

Wallerstein, no ano passado, já apontava, em seu artigo Capitalismo, austeridade e saídas, que vivemos um período de bifurcação, o qual resultará num regime mais autoritário, pra garantir a opulência do 1%, ou, no sentido inverso, atingiremos algo mais democrático e igualitário. Pontuou ele que a instabilidade que o capitalismo financeiro desregulado produz nos força a uma transição.

Soma-se a essa visão o livro Capital no Século XXI, de Thomas Piketty, que já entrou pra história, ao demonstrar, com estatísticas exaustivas, que o capitalismo é um regime oposto a democracia, pois paga melhor a riqueza que o trabalho, construindo então uma oligarquia.

A imprensa-empresa lançou seu time de articulistas, que, de forma afobada têm tentado reduzir os danos dessas revelações. Porém, a histeria e insegurança que demonstram perante Piketty diz mais do que as críticas que dirigem a ele.

Em concomitante, assistimos aqui e ali declarações de mea-culpa de algumas lideranças do capital. O Valor Econômico do dia 27 do mês passado publicou artigo de Paul Polman, CEO da Unilever, e Lynn Forester de Rothschild, CEO do E.L Rothschild no qual eles diagnosticam que a exclusão social massiva ameaça a ordem social, e, de forma intrigante, assumem que somente “uma ação conjunta de empresas e outras instituições” é capaz de construir uma alternativa a nosso modelo em crise. Mas o que importa nesse ponto é o próximo passo a ser dado. Se diante da bifurcação continuarmos seguindo receitas excludentes, o resultado será o fortalecimento do autoritarismo e a consolidação da plutocracia, extinguindo o que ainda nos resta de democrático. Se, por outro lado, encamparmos a construção coletiva de um arranjo mais inclusivo e participativo, temos uma boa perspectiva.

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A reação conservadora mostra a cara em São

Paulo

Por Rennan Martins

Desde o evento histórico que ficou conhecido como Jornadas de Junho no ano passado, o Movimento Passe Livre ganhou projeção no cenário nacional. Movimento este que se caracteriza por uma base de militância considerável e pauta clara, o que o difere da organicidade e suposta obscuridade de objetivos que imputaram as massas que tomaram as ruas em 2013.

A vitória obtida, a revogação do aumento em diversas cidades do país, contrariou as expectativas dos setores dominantes. As prefeituras em conluio com as empresas mafiosas de transporte público foram obrigadas a reajustar as contas a fim de fazer a vontade do povo. A grande mídia se viu perplexa, pois, tentou manobrar a pauta, mas suas intenções foram notadas e a manipulação só funcionou em pequena proporção.

A vontade da população de aprofundar a participação nos processos decisórios é gritante e a massificação da internet catalisa a organização dos cidadãos engajados. O regime representativo não está mais a altura da sociedade brasileira.

O sucesso do MPL e de outros movimentos sociais é acompanhado atentamente pelos interessados, e, como não poderia deixar de ser, a reação daqueles que visam a manutenção de privilégios também se manifesta. No ano passado, após ato realizado em São Paulo no dia 25/10, foi aberto o inquérito policial 1/2013. Inquérito o qual pretendem aplicar, inclusive sob coerção, à 22 integrantes do movimento. Este não visa apurar delitos individuais, suas perguntas são de cunho político e nos remetem aos terríveis dias de autoritarismo que vivemos. Vejamos algumas das questões:

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Já participou de outras manifestações? Qual seu objetivo nessas manifestações?

Participou de outros eventos que resultaram em quebra-quebra? Como estava trajado no dia da manifestação?

Você tem perfil no Facebook ou outro meio similar de comunicação disponível na internet, redes sociais ou e-mail? Você é um Black Bloc? Por quais motivos?

Qual o objetivo e propósito dessas pessoas (Black Blocs)? Como funcionam as manifestações?

Existe algum partido político envolvido ou que custeia o movimento? Você é filiado a algum partido? Qual?

Existe algum lugar onde os senhores se concentram para deliberar sobre as ações do grupo?

Conhece as pessoas citadas na reportagem da revista Época de 11/11/2013?

Recebeu algum treinamento para confronto com policiais?

Soma-se a essa investida 57 ordens de busca e apreensão que vasculharão a vida destes militantes.

A criminalização de ativistas não atinge somente o MPL, está descarada em São Paulo. Na segunda-feira, Rafael Marques Lusvarghi, 29 anos, professor de inglês e Fabio Hideki Harano, 26 anos, universitário, foram presos por policiais a paisana, sem identificação e acusados por “associação criminosa”. O secretário estadual de Segurança Pública de São Paulo, Fernando Grella, alega que eles são os temidos “black blocs”, mesmo sem nem sabermos ao certo do que se trata esse termo. O padre

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Júlio Lancellotti, presente no acontecimento, afirma que o flagrante foi forjado e a prisão arbitrária. Disponível nas redes está, inclusive, os vídeos das detenções.

Ontem realizou-se mais uma manifestação na Avenida Paulista intitulada “Libertem nossos presos políticos!”, em favor dos citados Rafael Marques e Fabio Hideki. O grupo permaneceu grande parte do tempo cercado pela polícia, impedido de se movimentar em qualquer direção. O contingente repressivo muito provavelmente era maior que o de manifestantes.

A quebra de vidraças e patrimônio, sempre dramatizada e escandalizadora pra velha mídia, é tachada de violenta, a despeito de não causar prejuízo humano algum. Enquanto isso, essas mesmas corporações de comunicação se calam diante da brutalidade e das sistemáticas violações de direitos praticadas pela polícia, principalmente nas periferias.

Estes acontecimentos evidenciam os limites da democracia liberal. Os direitos de um cidadão são garantidos até o ponto em que suas posições não conflitam em demasiado o status quo, ultrapassando essa linha vermelha, a resposta é arbitrária e autocrática.

As forças conservadoras estão em plena ação no sentido de garantir suas posições e não hesitam se pra isso é necessário recorrer ao aparelhamento do Estado, ao autoritarismo e a violação das leis.

Cabem as forças progressistas responsáveis pela democratização iniciada em 88 e ainda não concluída resistir e responder à altura, a fim de que alcancemos democracia plena e profunda.

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A velha mídia, a internet e o papel dos leitores

Por Rennan Martins

A comunicação enfrenta crise e rearranjo sempre que uma nova tecnologia de mídia é incorporada ao cotidiano da sociedade. Essa por sua vez também tem suas diversas relações reformuladas, por conta da expansão do alcance de informações antes restritas. O maior acesso a informações por parte da sociedade civil normalmente gera um grande abalo nos poderes vigentes.

Este ensaio pretende lançar luz a atual transição que incorpora a internet como meio de comunicação, as mudanças por ela trazidas na prática jornalística e a inserção do leitor na configuração destes meios.

Antes da internet, tínhamos o rádio, o jornal e a televisão como principais formas de comunicação em massa. Todos essas plataformas mantinham uma relação vertical com aqueles que consumiam seu produto, a informação. Ou seja, o leitor-cidadão lia, ouvia ou assistia aquilo que as editorias decidiam, da forma como o veículo escolhia. A possibilidade de interação era mínima, de maneira que tornar pública uma contestação a uma notícia constituía tarefa hercúlea. O público era passivo em relação ao que lhe forneciam.

Este arranjo favoreceu a consolidação de grandes grupos de comunicação. No Brasil, a maioria das iniciativas nasceu e cresceu na ditadura, sob a tutela do regime, servindo de propaganda dos militares por um lado, para do outro, receber gordas verbas publicitárias.

Tal situação pôs esses veículos em um nível considerável de conforto. A interpretação dos acontecimentos se dando de forma conveniente a seus donos homogeneizava as opiniões do público, lhes concedendo grande poder político.

A Copa do Mundo e a barriga do experiente jornalista Mario Sérgio Conti, que entrevistou Wladimir de Castro Palomo, sósia de Felipão, numa ponte aérea Rio-São Paulo é um dos vários exemplos de como a velha mídia é soberba e distante da realidade. O material passou pela editoria da Folha

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de São Paulo e do jornal O Globo, e mesmo assim foi publicado.

E eis que o século XXI trouxe consigo a massificação da banda larga e de dispositivos com acesso à rede. Atualmente, qualquer pessoa com um destes aparelhos pode criar conteúdo, escrever versões e comentar acontecimentos e a emissão destes tem o potencial de correr todo o planeta.

A internet como mais um meio de comunicação alterou todo o panorama do jornalismo. A grande mídia passa por problemas de financiamento e ainda por cima se vê em posição de perigo frente as outras iniciativas que a desmentem, contestam e criam uma alternativa de compromisso real com a democracia.

E é nessa transição que entra o leitor, o público que acompanha estas notícias. Minha tese é a de que não só a mídia, mas também o próprio cidadão passa por um processo de crise, transição e reformulação do seu papel.

O indivíduo que possui a postura analógica perante a internet, ou seja, se depara com uma informação mas permanece passivo perante ela, é o que é propício a ser manipulado e até a contribuir com a desinformação. A partir do momento que não a contesta, há somente a possibilidade de nela acreditar e reagir da forma como querem que ele o faça.

O atual quadro caracteriza-se pelos grandes meios em posição ainda confortável, mas perdendo influência, com uma abordagem enviesada pelo poder econômico, e a internet, onde, como define Ignacio Ramonet, há uma massa de mídias fornecendo uma infinidade de informações e versões.

Ocorre que essa massa de mídias é guiada também por seus interesses e muitas vezes os produtores difundem mentiras deliberadamente no intuito de atingir objetivos escusos.

Então, o papel do leitor-cidadão nessa nova configuração deve ser mais pró-ativo. Considerando a alta interatividade disponível e a possibilidade de ser um difusor, é necessário receber e checar a informação, e só após isso emitir opinião ou até mesmo complementar e contextualizar o fato. Nas palavras do já citado, Ramonet:

“Hoje as redes sociais procuram novas ferramentas, que não nos deixam a sós diante dos meios de comunicação hegemônicos. Antes eu estava a sós ao me deparar com eles. Quando me passavam uma informação, eu não

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sabia se era verdadeira ou falsa, devia confiar neles. Agora não. Posso ir a internet e ver o que fulano disse. E talvez eles também se equivoquem, mas eu posso construir minha ideia. Em suma, informar-se é uma atividade.

Isto quer dizer que ninguém pode se informar passivamente. A pessoa não pode se sentar em frente ao televisor e esperar que lhe digam a verdade. Hoje isso já não pode ser, porque temos ferramentas, dispositivos, que estão permitindo que nos armemos. Por conseguinte, se dizemos que somos manipulados, isso não pode ser uma desculpa. É normal que queiram nos manipular. Mas hoje em dia dispomos de ferramentas que nos permitem que nos defendamos contra essa manipulação. E nós devemos ter um papel ativos em nossa própria informação.”

Trata-se de assumir uma postura digital, independente e ativa perante o que é dito.

A internet trouxe consigo a interatividade e a dita massa de mídias, com essas, é possível aprofundar a cidadania e a democracia, resta agora a sociedade como um todo adaptar-se as novas possibilidades de forma a aproveitar todo este potencial.

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POEMAS

Pacifica(dores)

Por Diego Ruas Passou o tempo

ficaram as cicatrizes. A indústria do medo

produz seus heróis e vilões suas estátuas e suas covas. Um cavaleiro da ordem passa e fica a dor, onde a culpa tem cor

um justiceiro passa e fica o corpo linchado, amarrado ao poste

(o tronco dos antigos senhores da carne) uma bala passa e fica

perdida, num corpo achado um blindado passa e fica baixada a legítima defesa e no alto da resistência, a injustiça blindada. A justiça das serpentes só mata os descalços. Tudo passa e fica

um mar de corpos sem nomes: o corpo favelado,

o corpo arrastado, o corpo arquivado. A Maré passa e fica o sabor amargo, de sal e sangue.

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preso, acorrentado, algemado. A senzala permanece,

o quilombo resiste.

Capitães do mato passam capitães da morte ficam. O tempo passa e não muda. A paz sem voz, sem nós, é

muda. A paz passa e fica o medo, o medo pacifica o mundo.

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POEMA I

Por Diego Ruas 13 de maio de 1888,

a abolição da escravidão chega ao Brasil finalmente, a libertação dos corpos negros. Corpos entregues livres

à cultura do racismo sem terras

sem tetos sem bens

sem um puto no bolso.

Livres de ter, mas não de ser negras e negros.

Grande efeito nas balanças comerciais, baixam os custos da

mão-de-obra.

Negros e negras totalmente livres para vender a única coisa que possuem,

sua força de trabalho. A escravidão moderna, dita seus novos marcos: salários de fome

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POEMA II

Por Diego Ruas Aqui, ali, por toda parte

dia sim dia não, é dia de remoção.

Homens tratoram homens, barracos,

problemas. Problemas?

A gravata burocrata sempre aperta

para o pescoço mais fraco. Desabam os tetos, as casas. as lágrimas. O pranto semi-árido de quem perde

o chão que pisa

e nem tem onde cair. Para onde ir?

Sua pátria despejada, desfavelada. Seu desterro, seu destino: o aterro, o lixo. E para o outro? o luxo, o condomínio, o domínio.

O morro vem abaixo será por dilúvio

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E quando o morro descer com sua gente e sua ira? Do samba de roda se ouvirá um tambor de guerra

e um céu de pipas anunciará: vai desabar, vai desabar! não as palafitas,

não as casas ricas, o mundo

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Usina Comum

Por George dos Santos

Máquinas industriais [de pele macia como o vento

Fumaça negra

[invade os pulmões Carros sem rosto

[devoram, e rasgam o Ventre da Terra

Vida urbanamente normal É o cotidiano que já

[Está morto Peso morto E mais-valia

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O Cínico*

Por George dos Santos Desconfiou

de tudo que parece ser normal

[e da própria normalidade Nos alertou

sobre os olhos vigilantes do Poder

[afinal, o poder nem é tão bom assim

Loucura que revolta A Revolta da Loucura Vigiar, punir

Saber-Poder

[Saber e Poder... Teu cinismo escandaloso que liberta nossos corpos das prisões do Poder [E o poder nem é

tão bom assim Foucault, teu nome seguirá eterno na revolta

sem precisar

nem de estátuas nem de memoriais...

*Em homenagem a Michel Foucault, filósofo cuja a morte completa 30 anos no dia 25 de Junho

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ENSAIOS

POESIAS E REVOLUÇÕES

Por George dos Santos

[CONTINUAÇÃO]

IV - Manifesto por um Socialismo Hedonista CONSIDERANDO QUE...

...o Capital é o novo mito e o patrão seu sacerdote;

...que a Alienação da vida cotidiana é fruto direto da automatização e mecanização do cotidiano;

...que o Desejo separado do Real nas variadas formas de representação e interpretação colocam o Ser das coisas acima do Ser das pessoas (feitichização do desejo como mercadoria);

...que a ideologia revolucionária que visa a desalienação econômica é ineficiente quando se trata de desalienação desejante;

... e que uma nova forma de revolução, que complemente a antiga, mas que vise a revolução de si mesmo por meio das práticas do dia-a-dia não é só desejável mas altamente necessária;

Damos inicio ao seguinte manifesto por um SOCIALISMO

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ATO PRIMEIRO - A DENÚNCIA

Desejo e mercadoria. Tentemos por um só instante imaginar a nossa vida

cotidiana em seus diversos aspectos. Repare em cada microprocesso que acompanha seus gestos, sua fala, suas ações e atitudes as mais banais que sejam. Pensemos por um momento, afinal, por que faço isso ou aquilo. Por que digo isso e não isso? Por que como macarrão e bife, se não gosto de ambos? Por que deito-me as nove, quando queria ir pra cama de madrugada? Por que trabalho, se não ganho o que deveria? Para quem trabalho aliás?

Encontrar as respostas para tais questionamentes é uma atividade exaustiva. Isso por que estamos imersos numa estrutura que simplesmente não nos permite questionar o que fazemos no nosso cotidiano. É como ter um PM dentro de você que te ameaça toda vez que tenta refletir muito. Mas é fácil enganar PMs, a inteligência não é seu forte. Para isso, pare e reflita aos poucos, contornando as idéias repressoras até chegar no nucleo duro de seu questionamento.

Comece pensando por que você é o que é hoje. Depois questione por que tem o emprego que tem. Em seguida, eleve seu pensamento a seguinte questão: sinto prazer na minha vida? Se o PM ainda não atirou em você, então saiba que conseguiu quebrar a primeira barreira que o fabuloso mito social nos impõe. Ainda, saiba que já deu um passo importante para se livrar da atual sociedade dentro de si mesmo.

Mas o que é o prazer? E por que deveria senti-lo em sua vida? Prazer é intuitivamente algo bom - a não ser que seja cristão, nesse caso o Padre ou o Pastor substitui o PM e além de impedi-lo de pensar ainda extorque seu desejo sobe a forma de contribuições. Mas a positividade do prazer é uma característica que diz pouco sobre ele. Indo mais afundo, encontramos no prazer uma zona ampla de intensidade, ao qual poderiamos provisoriamente chamar de Desejo. O Desejo é uma parte dentro de você e que faz a ligação com o prazer. Mas repare que desejo não é mera falta de algo, mas vontade de intensificar alguma coisa, o seu objeto de prazer. Dai surge a necessidade de se criar desejos para se sentir prazer. É a dialética desejante.

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Mas de que forma essa dialética nos é negada? Sim, pois é negada todos os dias enquanto vivemos. Na sala de jantar, na praia, na escola, no hospital, é uma conspiração aberta contra o desejo e por consequência contra o prazer. Não, não uma conspiração, isso seria refinado demais, diriamos que é uma guerra. O desejo é negado, o prazer é enjaulado. Mas o prazer não pode sumir. Assim surge a nova onda do capitalismo: ao invés de simplesmente negar o prazer junto com o desejo, ele cria desejos artificiais para realizar o prazer de modo controlado.

A dialética desejante é substituida pela mecanização mercantil. O esquema desejo-mercadoria-prazer substitui a equação desejo-experiência-prazer. Seus desejos, por mais autênticos que te pareçam, são criados por chefes de departamentos de marketing de alguma empresa. Talvez você goste desse refrigerante, mas é provável que isso não tenha sido escolhido por você. Desejo criado, prazer controlado, vida alienada.

Mas a mercadoria não substituí o desejo subjetivo, mas a propria subjetividade. O que você é afinal, você mesmo ou a cópia de algum programa de televisão? É melhor encontrar rápido a resposta para essa questão, ou sua vida simplesmente irá se desfazer no próximo comercial.

A negação do erótico. Temos assim desejos criados que geram um prazer

cientificamente controlado. Feito isso, está "livre" a busca pelo prazer. É quando surge um hedonismo fajuto, um hedonismo burguês que quer devorar todas as mercadorias que lhes é indicado. Esse hedonismo é permitido por que funciona bem para o sistema. Ele é como um animal insaciável que sente fome apenas daquilo que seus donos lhe dizem para ter fome. Os alimentos devem ser fast-foods, os filmes devem ser os blockbusters ideologicamente preparados, os livros tem que ser os dramas adolescentes infidáveis que no fundo não tem sentido algum. E o sexo deve ser banalizado ou deturpado, retirado de sua zona erótica para ser posto numa região de obrigação social. Faça sexo, mas como eles dizem para fazer.

O nosso corpo nos é negado. A experimentação de si mesmo se torna uma ficção. Uma alegoria. Não somos livres para experimentar nossas sexualidades plenas. Mas não é uma repressão, está mais para uma indução. Uma espécie de indução coletiva que nos nega outros caminhos

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possiveis para nossas sexualidades. O desejo é mera pulsão sexual que deve ser contida pelo bem da civilização. E assim caminhamos nos auto-reprimindo sem nem ao menos saber o por quê.

O trabalho e o prazer. Mas precisamos reconhecer que a eficácia do

sistema capitalista em controlar seus servos é algo que nem um outro sistema conseguiu. A repetição de valores através das gerações, principalmente quando falamos de trabalho, é a arma mais eficaz na recuperação pelo sistema de um transgressor. O trabalho é a fonte de toda a felicidade. Devemos trabalhar para ser alguém na vida. Mas há algo errado ai. Trabalhamos, mas não nos tornamos ninguém. Ou melhor, nos tornamos uma cópia. E o prazer do trabalho reside justamente na mentira mitológica e sistemática, diríamos, na estrutura de indução coletiva Não há prazer direto no trabalho, ele é apenas uma ferramenta para se conseguir um prazer posterior. Com ele ganho meu dinheiro para comprar roupas, sapatos, comida industrializada. Meu dinheiro é fruto de uma tortura mecanizada que repito dia após dia. É essa a realidade do trabalho alienado. A indução coletiva nos obriga desde de cedo a amar o trabalho como fonte de libertação. É como ensinar aos animais a amar suas jaulas. E funciona muito bem. Nos mantendo dentro de um espaço limitado, onde nossa vida é controlada e nosso prazer induzido por desejos artificiais. Não se trata por tanto de liberar o desejo de supostas amarras repressoras, mas produzir novos desejos que afrontem os atuais, criando novos prazeres. O trabalho é um desejo primitivo do sistema, mas ainda sim é superficial. O trabalho é uma ficção, não uma verdade natural do ser humano. Na estrutura dominante, objetivar o trabalho em sua forma mais sórdida (escravismo assalariado) é a pervação da produção. Produzir é criar algo que se terá posse. Trabalhar é criar algo que não deixa de ser seu. Não há prazer em trabalhar, e toda e qualquer ideologia que pregue isso é por si mesma uma farça.

ATO SEGUNDO - UMA (POSSÍVEL) SOLUÇÃO

O hedonismo revolucionário. O desejo como zona de multiplas

intensidades, ou seja, como ato de intensificar um objeto ou experiência, deve ser criado no nosso dia a dia. Não basta liberar a mente da opressão

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midiática, a produção da opressão trabalhista, mas também deve-se igualmente libertar o corpo da opressão biopolitizante que normaliza uma conduta certa e uma errada. É preciso escapar das formas de indução coletiva que nos dizem que "isso é normal" e "isto é patológico". Ou que "isto é aceitável", mas "isso é depravado". Mas ainda é pouco. Quando falamos em hedonismo, entenda-se a busca pela felicidade. E por felicidade entenda-se a realização plena do prazer. O que o Socialismo Hedonista quer, basicamente, é a coletivização imediata de todas as formas de felicidade. Redistribuir o prazer de modo que todos possam intensificar desejos, criar desejos.

O Capitalismo reduz o desejo a satisfação de uma vontade de consumir mercadoria. E assim dá a alguns poucos privilegiados a chance de "gozarem sem entraves" pois este não precisam se preocupar com sua sobrevivência e consomem até não poder mais. Mas ao operário, ao funcionário publico que trabalha exaustivamente para manter sua mísera sobrevivência, a felicidade é apenas uma hora de descanço na frente da TV. E os desejos mera vontade de consumo.

Coletivizar a felicidade é, antes de mais nada, admitir que cada pessoa tem seus próprios desejos e prazeres. É saber que o corpo de cada um deve ser experimentado como cada um quiser. A sexualidade é criação de desejos, intensificação de prazer, segundo o SH. Se Marx nos disse uma vez que o proletáriado é o coveiro da burguesia, igualmente o são aqueles que livremente experimentam sua sexualidade. Pois a burguesia não admite uma transgressão tão atroz quanto a subjetivização do corpo, e não mais sua objetivação (tornar o corpo um ser de si mesmo, e não mais uma propriedade).

Corpo desejante de prazer. O SH apregoa que todo corpo é não uma

prisão da mente ou uma propriedade material, mas uma extensão real de si mesmo. Assim, nós não temos um corpo, nós somos nossos corpos. O SH quer sentir o mundo e experimentá-lo. Quer não apenas pensar com a cabeça, a razão, mas pensar igualmente com os pés, com a boca, a lingua. Os filósofos se limitaram a interpretar o mundo de diferentes formas, o que importa é experimentá-lo. Assim, o SH não é uma teoria revolucionária, mas uma ferramanta de intensificação desejante.

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Facilitando os conceitos socialista hedonistas aos possiveis adeptos do SH:

...O desejo não é falta de algo, mas vontade de intensificar e experimentar algo;

...O prazer é a realização plena dos desejos, o resultado da prática desejante;

...O trabalho é a apropriação do desejo pelo sistema em prol da perpetuação do mesmo. É produção alienada, objetivada; ...Corpos desejantes só são livres quando criam novos desejos para si e quando experimentam sua sexualidade de modo autêntico;

...O Socialismo Hedonista não quer a mera abolição do capitalismo, mas a abolição do regime de normalização do

prazer. O prazer não é medido por normas!;

...Coletivizar a felicidade é permitir que todos possam criar desejos, experimentar prazeres livremente;

...O SH não substitui as "Grandes Teorias da Revolução" (marxismo, anarquismo etc) mas quer ser parte delas, quer estar

presente em suas práticas;

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CRÔNICAS

Dia de Copa, Dia de Luta

Por Frota Pessoa

Então, teve copa. Teve jogo. Teve festa. Teve o povo comemorando a vitória do Brasil. Teve gente bebendo até cair. Teve fogos. Teve correria. Teve comemoração. Teve alegria. Teve espetáculo. Teve o som da torcida. Teve tudo e mais um pouco. Tivemos Copa. Tivemos uma abertura padrão FIFA. Tivemos uma arbitragem padrão FIFA. Tivemos Jogo padrão FIFA. Tivemos um Espetáculo padrão FIFA.

Mas... Tivemos LUTA. Tivemos pessoas gritando GoL. Guerra ou Liberdade. Se não gritaram, pensaram. Se não pensaram, sentiram. Tivemos gente quebrando a moral do dia. Tivemos gente desrespeitando a cartilha. Tivemos gente em marcha contra o espetáculo. Tivemos lutas em cada canto em que se pronunciasse a famigerada "Copa". Teve bombas, pedra e paus. Teve spray de pimenta em quem já tinha caído. E teve igualmente quem o levantasse com um sorriso no rosto. Teve prisões. Teve violência. Teve humilhação. Teve gente que nem sabia o que fazer. Mas teve gente que sabia exatamente o que fazer. Teve quem se dispusesse a calar. Mas teve quem gritasse. E gritasse alto. E gritasse com toda força que existe num corpo revoltado.

Pontos de situação incompletos. Mas pontos de situação de pura insurgência. Uma revolta poética, não por que foi assim, mas por que se tornou assim. Pediram paciência. Mas nós não temos paciência. Nossa espera dura anos. Queremos mais do que nos foi dado. Mesmo que isso assuste quem ache que já temos tudo. Não é sobre ter ou não ter copa. É sobre quem nós somos. É sobre fazer o que eles não fizeram. É sobre ir além do que eles foram. Entre pais conservadores e filhos revoltados, temos a síntese do que virá. É uma dialética sem pé nem cabeça. Mas que chegou arrastando tudo.

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Ouve bem, fanáticos admiradores do Espetáculo. Tereis seu Espetáculo, mas nós seremos os protagonistas. E dessas vez, não será no palco. Será na Rua, como uma intervenção revolucionária. Será um happing-blackblock, um concerto musical onde se ouve o som de vozes indignadas. Não, senhores ilustres visitantes, não são vocês os turistas nessa terra. Somos nós. E por isso mesmo a conquistaremos de volta. Para desapropriá-la e distribuí-la à todxs. Teremos dessa vez, chance de vencer? Ao menos teremos chance de tentar.

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POSFÁCIO

Nós Somos o Câncer

"Com cara na parede, mãos imobilizadas para atrás do corpo, ouvia aquela voz, que já tinha me xingado algumas vezes, justificar o porquê de tanta agressividade e ódio: - Vocês são o câncer do mundo, deviam todos morrer." -Karinny Magalhães Sim, nós somos o seu câncer! Nós somos quem destruirá você. Em sua livre opressão, em seu gozo majestoso de palavras sórdidas. Nós somos aqueles que irão tirar seu trono. Nós somos quem ira desbancar sua fé. Sim, nós somos o seu câncer! E em cada parte que houver um único grito de desepero, nós estaremos lá para acudir. Nós somos os que sabem a verdade. Somos nós aqueles que acreditam. Você é só um fantoche. Sistema maldito, você é servo do Sistema maldito. Soberanas palavras de ódio, como raio cortam o céu. E nós vemos e ouvimos enquanto você destila suas frustações em quem não merece. Nós somos aqueles que sabem o que você faz quando ninguem está vendo. E nós podemos te encontrar. Nós somos o seu câncer. O mal que te destruirá.

Não implore perdão. Não peça misericórdia. O tempo de perdoar já passou. Agora é guerra. Em nossos olhos pulsa a raiva de ser nada. Mas nós nos tornaremos tudo. Quebrando as correntes que vocês nos impuseram. Nós nos tornaremos tudo. O futuro ainda não é nosso, mas nós o conquistaremos. Nós somos os que realmente sabem a verdade. Os que destroem as suas mentiras. Nós podemos sentir, em cada canto do mundo, com nossos coraçãos, a dor de um oprimido. E nós ouvimos enquanto você dizia a nossa sentença. Mas você não é o juiz. A história é a juiza soberana. E com nosso sangue e suor nós a mudaremos.

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Como sangue em nossas veias, a liberdade pulsa violentamente. É fúria, é dor, é revolta. Nós somos o seu câncer, e vocês são os mortos. Podem nós xingar. Podem nos humilhar. Podem nos bater. Nos prender. Nos jogar no limbo mais escuro. Teremos quem nos ressucite. Teremos quem não se esqueça do nosso nome. E você nos verá de volta, Um eterno retorno dos bárbaros. Os que não temem você. Pode destruir nossos ossos, mas não podem destruir a nossa vontade de mundança. Somos a pedra no seu sapato. A mosca na sua sopa. A onda que levará tudo. Em cada lágrima que derramarmos, outros mil sorrisos de pura felicidade surgirá. E a cada gota de sangue nossa que você derramar, saiba que surgirá outros mil para se vingar.

Nós somos o câncer do seu sistema. O vírus que destruirá a sua propriedade privada. Nós somos os seus lobos. Em nossos corações reside a força que subverterá a ordem do dia. Não pensem que fugiremos. Nós ainda estamos aqui.

Dedicado a Karinny Magalhães, ativista detida e torturada pela policia apṕos cobrir os atos contra a Copa do Mundo.

Referências

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