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Literatura Brasileira Contemporânea: um mapa do campo

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Academic year: 2021

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V Mostra de Pesquisa da

Pós-Graduação

Literatura Brasileira Contemporânea:

um mapa do campo

Milton Colonetti1, Profa. Dra. Vera Teixeira de Aguiar1 (orientador) 1

Faculdade de Letras, Programa de Pós-Graduação – Doutorado, PUCRS

Resumo

Os estudos sobre o contemporâneo (aqui referente à primeira década do século XXI) na narrativa de ficção brasileira vêm se dedicando à construção de uma adequação diacrônica para as obras, seguindo uma estratégia que foi definida por Candido, em seu artigo O escritor

e o público, da seguinte maneira: “Frequentemente tendemos a considerar a obra literária

como algo incondicionado, que existe em si e por si, agindo sobre nós graças a uma força própria que dispensa explicações” (CANDIDO, 1967).

O que importa, ao que parece, é a justificação da modernidade ou contemporaneidade de uma obra ou autor em relação a um paradigma apriorístico de contemporaneidade, imposto desde fora de acordo com um entendimento tácito e imediatizado de características que são consideradas relevantes na definição do contemporâneo naquele momento (ou naquela abordagem teórica). Trata-se, portanto, de um esforço em autorizar a rotulação de uma obra de narrativa ficcional como contemporânea, e não uma tentativa de determinar o que seja o contemporâneo a partir destas manifestações, movimento este que poderia ser chamado de

estabelecimento sincrônico do contemporâneo.

Para que tal estabelecimento seja realizado, torna-se necessária uma abordagem de conjunto, capaz de dar conta da estrutura estética em sua complexidade integral, e que analise a ciranda social que envolve os autores e modificam a mediação realizada entre contexto e texto. Este eixo sociológico da tese em desenvolvimento tem como ponto de partida as pesquisas de Sérgio Miceli publicadas sob o título Intelectuais à Brasileira, nas quais o autor traça um mapa das trocas sociais e simbólicas que conformaram o sistema literário brasileiro em diversos momentos históricos. Está inclusa, também, a abordagem desenvolvida por Pierre

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Bourdieu, além de contar com as valiosas contribuições do pensamento de Antonio Candido. A análise que será desenvolvida pretende incidir principalmente, mas não exclusivamente, sobre os grupos relativamente autônomos que acabam por formar uma incubadora literária.

O conceito de incubadora literária visa desarmar a inadequação dos termos pequena

editora e editora independente. Tais termos têm sido utilizados de modo intercambiável, tanto

nas análises teóricas quanto no discurso crítico e jornalístico, aparecendo por vezes com a chancela autoritativa dos próprios componentes dos grupos a que se referem. Os termos em questão utilizam como lastro a oposição constituída entre os agentes estabelecidos no campo e os agentes recém-chegados que almejam sua inserção no campo, e partem da prerrogativa de que a distinção entre uma posição e outra se baseia no acúmulo e disposição do capital monetário que possibilita sua agência. Deste modo, o adjetivo pequena faz referência ao tamanho do aparato empresarial que dá suporte ao empreendimento, enquanto que o adjetivo

independente se refere às relações estabelecidas, seja com o campo mercadológico, seja com o

campo do poder.

Entretanto, sugiro que, ao invés da pequenez ou independência, parece haver a reunião temporária de autores com interesses literários afins, dispostos a trabalhar conjuntamente na formação de uma estrutura que permita a publicação e divulgação de suas obras com maior agilidade do que a permitida pelos entraves (sociais e formais) do grande mercado editorial, o que configuraria uma espécie de incubadora literária. Considero que a ideia que conforma as

incubadoras industriais, tecnológicas e empresariais criadas por algumas instituições de

ensino possui uma melhor adequação explicativa em relação ao fenômeno abordado: um espaço experimental de pequena escala, que auxilia o desenvolvimento inicial de um empreendimento, até o momento em que haja condições de autonomia.

Introdução

A instância editorial, em geral tida como transparente, na realidade determina muitos dos parâmetros e práticas que conformam o campo literário, como aceitação ou recusa do manuscrito, a remuneração ou oneração do escritor, o número de exemplares, a abrangência da distribuição, as formas de comercialização e o preço do produto final. Tomar os editores e seus empreendimentos como objeto permite uma visada que leva em consideração não apenas o produto cultural literário em abstrato, como também possibilita explicitar os nexos estabelecidos por este produto em sua circulação subjetiva e objetiva dentro do campo dos

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produtos culturais, além de auxiliar no mapeamento das coordenadas que orientam o campo literário.

Tal modo de análise é importante para o estudo da renovação estilística e formal que se desenrola a cada geração, e que constitui os contornos do desenvolvimento da série histórica do campo literário. Em geral, as estratégias editoriais dos escritores recém-chegados são relegadas a um segundo plano, o que impede a percepção adequada do fenômeno. Assim, os estudos desenvolvidos sobre a literatura contemporânea tendem a ignorar o fenômeno das

incubadoras literárias, que em sua existência transitória reúnem autores interessados em sua

inserção no mercado cultural nacional, o que demonstra uma mudança de perspectiva quanto ao papel do escritor frente à indústria cultural.

A construção da perspectiva analítica assumida depende de um instrumento epistemológico triangular, que toma como vértices hermenêuticos três conceitos estabelecidos por Pierre Bourdieu: campo, habitus e capitais.

Segundo Bourdieu (1996, p. 262-263), um campo (seja literário, artístico, político ou do poder) é uma “rede de relações objetivas (de dominação ou de subordinação, de complementaridade ou de antagonismos, etc.)”, estruturado pelas “oposições sincrônicas entre as posições antagonistas (dominante/dominado, consagrado/novato, ortodoxo/herético, velho/jovem, etc.)”. Tais posições são lugares estruturais que podem ser ocupados por produtos, grupos ou agentes individuais.

O habitus pretende explicitar as ações dos agentes no campo, englobando simultaneamente a esfera consciente das tomadas de decisão e a esfera inconsciente que delimitam tais tomadas, sem que seja feita uma diferenciação entre o que seja consciente e o que seja inconsciente. Bourdieu afirma que “era preciso revelar e descrever uma atividade cognitiva de construção da realidade social que não é, nem em seus instrumentos, nem em seus passos, a operação puramente intelectual de uma consciência calculadora e raciocinadora” (BOURDIEU, 1996, p. 205).

Por fim, o capital, como deixa clara a escolha terminológica, é a moeda de troca utilizada nas transações entre os agentes. Para um escritor, por exemplo, o capital simbólico acumulado diz respeito (entre outras coisas) à sua carreira dentro do campo literário, enquanto o capital social dá conta das relações estabelecidas dentro ou fora do campo, sendo seu

capital cultural constituído (entre outras coisas) pelas referências a autores ou obras que pode

mobilizar, seja em suas relações com outros agentes ou na textualidade de sua obra, e tratando o capital econômico do montante monetário de que dispõe o escritor. Via de regra, os capitais

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são conversíveis entre si, sendo que as regras de câmbio são determinadas pela posição do agente no campo e pelo habitus específico do campo.

Metodologia

A pesquisa, que conta com o apoio da Bolsa de Produtividade – Doutorado concedida pelo CNPq, tem caráter bibliográfico e de campo, centrada na análise dos romances de agentes recém-chegados ao campo, editados pelas incubadoras literárias e grandes editoras; de sua fortuna crítica (acadêmica e jornalística); e dos discursos autodefinidores enunciados por estes agentes recém-chegados. Incluído neste primeiro passo bibliográfico, há a investigação de teóricos da sociologia da leitura e da literatura, com aportes de dados estatísticos que quantifiquem o campo literário. A pesquisa de campo dá conta das interações concretas entre os agentes, o mercado e o público, e inclui entrevistas com representantes de cada segmento e observação da participação destes agentes em acontecimentos literários (feiras do livro, cerimônias de lançamento, prêmios literários, etc.). Para tanto, algumas questões norteadoras foram elencadas:

– Qual a contribuição e posição dos novos autores no campo literário brasileiro?

– Quais os autores que fazem a transição das incubadoras literárias para as grandes editoras? – O que os diferencia de outros autores, e o que os aproxima mutuamente?

– Quais os tipos de associação que desencadeiam a existência de incubadoras literárias? – De que modo os editores formatam sua identidade social e das incubadoras?

– Qual foi o processo de formação das grandes casas editoriais?

– Quais os pontos de semelhança e diferença entre o ciclo atual do campo literário e outros momentos da série histórica?

Resultados

Como se trata de uma pesquisa em andamento, os resultados ainda não podem ser determinados em toda sua extensão. Mesmo assim, algumas hipóteses iniciais encontram lastro parcial nas análises realizadas até agora.

É o caso, por exemplo, do fenômeno das incubadoras literárias e sua relação, quase umbilical, com os novos suportes e mídias introduzidas durante a revolução digital, iniciada no final dos anos 80 e acelerada na transição entre a década de 90 e o novo século. Segundo Chartier (1999, p. 16), o campo literário (francês) do século XIX possuía uma estrutura de

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divisão do trabalho claramente delineada, que separava o papel de autores daquele de editores, tipógrafos, distribuidores e livreiros. Esta divisão, fruto da revolução industrial da imprensa, se intensificou durante o século XX graças à ênfase profissionalizante e corporativa exercida desde dentro pela indústria cultural, fixando a forma socioeconômica que foi disseminada e adaptada aos vários contextos geopolíticos do mercado mundial. Entretanto, a revolução digital oferece oportunidades e ferramentas através das quais os papéis que regulam a estrutura desta forma sofrem uma convergência. Para Chartier (idem), “um produtor de texto [no mundo eletrônico] pode ser imediatamente o editor, no duplo sentido daquele que dá forma definitiva ao texto e daquele que o difunde diante de um público de leitores”. Há indícios de que as incubadoras literárias, algumas vezes motivadas e estruturadas dentro do mundo digital, realizem a transposição deste modelo de autor-editor para o mundo do mercado editorial em papel, e no processo promovam a reorganização do campo literário, estabelecendo compromissos de estabilidade que atualizam o mercado editorial em relação às novas práticas do campo.

Referências

BOURDIEU, P., As regras da arte. São Paulo: Companhia das Letras. 1996.

CANDIDO, A., Literatura e sociedade. São Paulo: Companhia Editora Nacional. 1967.

CHARTIER, R., A aventura do livro. São Paulo: UNESP. 1999.

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