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DOMINAÇÃO E REPRESSÃO DA SOCIEDADE INDUSTRIAL AVANÇADA EM HOMEM UNIDIMENSIONAL DE HERBERT MARCUSE

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Ramom Gomes da Silva

DOMINAÇÃO E REPRESSÃO DA SOCIEDADE INDUSTRIAL

AVANÇADA EM HOMEM UNIDIMENSIONAL DE HERBERT

MARCUSE

RESUMO

Este trabalho apresenta uma reflexão acerca dos instrumentos de domina- ção e repressão da sociedade industrial avançada. A partir da leitura da primeira parte do livro Ideologia da sociedade industrial: O homem unidimensional, Her- bert Marcuse analisa a sociedade industrial avançada e as tendências do capi- talismo tardio expondo as novas formas de controle e dominação dos indivíduos na contemporaneidade. Os meios de dominação do capitalismo avançado têm- -se mostrado mais eficientes e eficazes do que antigos regimes baseados na vio- lência explícita, isto é, sem uso de um terror aberto, tem o domínio das esferas da existência humana, sejam elas públicas ou privadas. Esses mecanismos de controles proporcionaram a integração entre o pensamento e o comportamento dos indivíduos, de tal modo que o sujeito sente-se livre em situação de não liber- dade, situação em que necessidades impostas são aceitas e ainda repassadas às gerações seguintes sem o menor questionamento.

Palavras-chave: Controle. Repressão. Dominação. Perspectiva de Libertação.

ABSTRACT

This article presents a reflexion about the instruments of domination and repression on advanced industrial society. From the first chapter of the book “One-Dimensional Man: Studies in the Ideology of Advanced Industrial Society”, Herbert Marcuse analyses the advanced industrial society and the late capitalism tendences exposing new forms of individuals’ control and domination contem- poraneity. The advanced capitalism ways of domitaion have shown themselves more efficient and effective then old regims based on explict violence, in other words, without the use of an opened terror, (a partir daqui essa oração está confusa, mesmo em portugues. Creio que um ponto final seria mais adequado) They have the domain of the whole human existence espheres, whether public or private. These controls’ mechanisms provided the integration of the indivuals thoughts and behaviors in a such way that they fell themselves free in a unfree- dom situation, where imposes necessities are being accepted and passed to the nexts generations without the slightest questioning.

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1 INTRODUÇÃO

“A sociedade contemporânea parece capaz de con- ter a transformação social – transformação qualitativa que estabeleceria instituições essencialmente diferentes, uma nova direção dos processos produtivos, novas for- mas de existência humana”. (MARCUSE, 1979, p. 16).

A obra do filósofo Herbert Marcuse (1898-1979),

Ideologia da sociedade industrial: o Homem unidimen- sional (1964) apresenta de maneira mais desenvolvida

a tese de Eros e Civilização: uma interpretação filosófi-

ca de Freud ( 1955). A tese anunciava que só se podia

evitar a fatalidade de um estado de Bem-Estar Social mediante a existência de um estado Beligerante que possibilitaria estabelecer um novo ponto de partida; com o qual seria criado um novo sistema produtivo afastan- do-se das bases mentais que serviram tanto para domi- nação como para exploração dos indivíduos.

Essa sociedade tem se diferenciado das civili- zações passadas pela sua capacidade de controlar e integrar cada vez mais as dimensões da existência humana; sejam públicas ou privadas. Rompendo com os antigos modos de produção, seu modo de adminis- tração, tornou-se uma ameaça à liberdade humana. Sem o uso de violência explícita, com controles mais eficientes, que consegue barrar as forças de oposição que poderiam pôr em risco o sistema estabelecido da ação e do discurso. O avanço do progresso técnico na sociedade industrial avançada ao invés de proporcionar maior libertação dos indivíduos, transformou-se em ins- trumento de dominação mais efetiva tanto do homem como da natureza.

A proposta desse artigo se limitará à apresentação do capitulo primeiro, As novas formas de controle, base para o desenvolvimento desse trabalho. Marcuse abor- da as mudanças e as características que tornaram essa civilização diferente daquelas que a antecederam. Tanto pela resolução dos antagonismos internos como pela ad- ministração total da existência humana, e tais caracterís- ticas atestam a perda do protesto individual, da autono- mia do indivíduo e das forças que poderiam amenizar a luta por sua existência, passaram a agir, em contraparti- da, como fator de repressão e coesão do sistema.

Dessa forma, temos como objetivo apresentar meios de controle e dominação que impedem os indivíduos de agirem e pensarem por si mesmos, também tentaremos mostrar o nível de dominação do homem na sociedade, na qual não consegue reconhecer as suas próprias ne- cessidades. Em suma, a partir da assertiva marcuseana na qual pensar é negar, e esse pensar negativo é negar a realidade dos fatos dados, temos como objetivos espe- cíficos, a partir dos expostos suscintar uma inquietação nas pessoas para que diante dos fatos dados possam encontrar as inadequações internas na sociedade.

2 A SOCIEDADE INDUSTRIAL AVANÇADA MODIFI- COU A ESTRUTURA SOCIAL PROPORCIONAN- DO UMA DOMINAÇÃO EFETIVA NA DIMENSÃO DA EXISTÊNCIA HUMANA

“A sociedade industrial avançada faz suas a tecno- logia e a ciência é organizada para a dominação cada vez mais eficaz de seus recursos. Torna-se irracional quando o êxito desses esforços cria novas dimensões de realidade humana”. (MARCUSE, 1979, p.36)

Marcuse, a partir das análises das tendências do capitalismo norte-americano define a sociedade avan- çada como fechada em seu interior, abrindo-se apenas para a expansão econômica, política e militar. A socieda- de se torna fechada por meio da assimilação das forças e dos interesses, que antes eram opostos, da adminis- tração dos instintos humanos, com tendência para uma administração total da sociedade. As necessidades e aspirações são impostas e aceitas pelo conformismo ao sistema, “as próprias forças que tornaram a sociedade capaz de amenizar a luta pela existência serviram para reprimir nos indivíduos a necessidade de tal libertação” (MARCUSE, 1966, p. 13). Essa sociedade caracteriza- -se pela produção do supérfluo, dos novos inventos e do obsoletismo planejado como meio de manter o ciclo vicioso do consumo.

Na sociedade industrial avançada as forças de negação foram dominadas, o protesto individual foi suprimido e o antagonismo das classes foi superado. Os elementos dissociativos foram unidos num sistema de assimilação e reprodução e a democracia passou a exercer a função de dominação de forma mais efetiva que o antigo regime, o absolutismo. “A nossa sociedade se distingue por conquistar as forças sociais centrífu- gas mais pela tecnologia do que pelo terror, com dúpli- ce base numa eficiência esmagadora e num padrão de vida crescente” (MARCUSE, 1979, p.14).

O modo pelo qual a sociedade está organizada, por mais racional que se apresente aos indivíduos, é em si mesma irracional. Pois uma sociedade que tem seus valores cujos fins últimos se distanciam do processo de humanização não pode ser considerada uma socieda- de organizada de forma racional, mas, antes vê na pro- dutividade seu bem maior que é considerado o motor de todo o processo de produção. O progresso técnico tinha como função, a principio, a satisfação das neces- sidades humanas de forma mais eficiente, no entanto, transformou-se em destruição, não apenas das livres satisfações, mas também da natureza. Portanto, nos encontramos diante da situação na qual o sujeito não é livre, “perdeu ou está perdendo, a individualidade, a liberdade e a habilidade de discordar e de controlar seu próprio destino” (MARCUSE, 2015, p. 21).

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Marcuse expõe o caráter de dominação da civili- zação industrial avançada afirmando que se chegou ao ponto em que a sua irracionalidade mostra-se racional. A produtividade e a eficiência integram todas as dimen- sões da vida humana e a ausência de uma dimensão crítica no homem torna explícito o grau de aceitação e introjeção21 desses controles. O aparato técnico de produção e distribuição passou a funcionar não apenas como uma soma de meros instrumentos que poderiam ser isolados dos seus efeitos sociais e políticos, mas passaram a funcionar, segundo Marcuse, “como um sis- tema que determina “apriori” tanto o produto do aparato como as operações, manutenções e ampliação” (MAR- CUSE,1979, p.18), quer dizer, essa sociedade se dis- tingue das anteriores pela capacidade de subjugar as forças sociais críticas de oposição mais pela tecnologia do que pelo terror, mais pela eficiência do sistema técni- co-científico do que pela opressão explícita.

Além disso, considera esta sociedade como tota- litária, onde totalitário não é “apenas uma coordenação política terrorista da sociedade, mas também uma co- ordenação técnica-econômica não terrorista que opera através da manipulação das necessidades por meio de interesses adquiridos” (MARCUSE,1979, p.24). Por conta dos aspectos citados desta sociedade, ele rejeita o conceito tradicional de “neutralidade da tecnologia”; uma vez que os controles tecnológicos que tiveram seu início com a inserção das máquinas em fábricas se es- tenderam às outras áreas da existência humana, tanto nas organizações da vida social quanto no trabalho, la- zer e descanso, alcançando os níveis da subjetividade e da sexualidade.

Todavia, vale destacar que ao longo do pensamento marcuseano, o qual se refere ao caráter não neutro da tec- nologia, não vemos sua recusa, ao contrário, afirma que a vida alcançou níveis de existência em que o retrocesso se torna inviável. A crítica passa a residir no aspecto político de dominação por meio do avanço tecnológico. “O proces-

21 1Quando Marcuse nos diz que os controles sociais são “in-

trojetados” na realidade das pessoas rompendo com protesto in-

dividual, ele esclarece que o conceito de “introjeção”, devido à

forma como tem se perpetuado a dominação, não expressa de forma precisa esse modo de dominação, mas a “Mimese” seria o termo mais apropriado para descrever essa realidade. “Assim, introjeção subentende a existência de uma dimensão interior dis- tinta e até antagônica das exigências externas, uma consciência individual e uma consciência individual separada da opinião e do comportamento público. A ideia de ‘Liberdade interior’ tem aqui sua realidade: designa o espaço privado no qual o homem pode torna-se e permanece ‘ele próprio’ ”. Em outras palavras, “intro- jeção” sugere um “eu” (Ego) que transferia de forma espontânea a realidade exterior para o interior. Mas Marcuse diz que atual- mente, esse espaço privado se apresenta invadido ou desbastado pela realidade tecnológica, logo o resultado é a identificação ime- diata do indivíduo com a sua sociedade, logo tal identificação não significa introjeção, mas “mimese”. MARCUSE, Herbert, Ideologia

da Sociedade Industrial.

so produtivo do capitalismo avançado tem alterado a for- ma de domínio: o véu tecnológico esconde por detrás das mercadorias a exploração de classes” (MARCUSE, 1977, p.25). A tecnologia e a ciência podem servir de veículos de libertação, contudo o uso desses agentes numa sociedade repressiva os transforma em veículos de dominação em massa. A máquina em si não é repressiva, nem a tecno- logia ou a ciência, mas a presença daqueles que fazem desses produtos parte da sua existência.

3 DIFICULDADE DE RECONHECIMENTO DAS VERDA- DEIRAS NECESSIDADES HUMANAS SOBRE O DO- MÍNIO DA CIVILIZAÇÃO INDUSTRIAL AVANÇADA

“O homem unidimensional não conhece suas ver- dadeiras necessidades, porque suas necessidades não suas próprias – são administradas, sobrepostas e hete- rônomas; não é capaz de resistir à dominação, nem de agir autonomamente”. (MARCUSE, 2015, p.22).

O poder político da sociedade industrial tem se afir- mado por meio do domínio dos processos mecânicos e sobre a organização técnica do aparato produtivo, nos quais os termos tradicionais que definiam a sociedade como livre se tornaram inadequados ou foram ressigni- ficados. Tais termos como liberdade de economia, liber- dade política e também intelectual, tornaram-se inapro- priados, esses termos são considerados inadequados porque se tornaram demasiadamente significativos na sociedade estabelecida. A forma mais eficaz e resisten- te contra a libertação é a implantação das necessida- des, tanto materiais como intelectuais que configuram formas obsoletas de dominação.

Assim, liberdade econômica significaria liberdade de economia – de ser controlado pelas forças e re- lações econômicas; liberdade de luta pela existên- cia, de ganhar a vida. Liberdade política significaria a libertação do individuo da política sobre a qual ele não tem controle eficaz algum (MARCUSE, 1979, p. 25-26).

O homem nessa sociedade é avaliado de acor- do com sua produtividade, sua capacidade de tanto poder melhorar como aumentar as coisas socialmente úteis. Dessa forma, passar a designar o grau de domí- nio e de transformação da natureza, esta sociedade se destaca das civilizações passadas pelo o alcance da dominação sobre o indivíduo ser incomensuravelmente maior como jamais presenciado na história.

As necessidades instintivas, diz Marcuse, são as verdadeiras necessidades que devem ser satisfeitas de forma indiscutível; as demais satisfações que estão além dessa esfera são necessidades históricas, portan- to, são instituídas. Toda forma de satisfação depende de padrões críticos predominantes, dessa forma, a

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maio-ria das necessidades que se apresentam como sendo comuns aos indivíduos na sociedade estabelecida são resultados de satisfações predeterminadas, sendo tais necessidades aceitas sem o menor questionamento e ainda repassadas às gerações seguintes.

A identificação das necessidades como verdadei- ras ou falsas é uma tarefa que só o sujeito enquanto li- vre poder definir. A dificuldade quanto ao reconhecimen- to se eleva mediante a ausência de indivíduos capazes de reconhecer as necessidades como verdadeiras ou falsas. “Em última análise, a questão sobre quais neces- sidades devam ser falsas ou verdadeiras só pode ser respondida pelos próprios indivíduos, mas apenas em última análise; isto é, se e quando estiverem livres para dar a sua própria resposta” (MARCUSE, 1979, p.27).

Contudo, Marcuse acrescenta dizendo que qualquer resposta que venha a ser proferida não pode ser validada como do próprio individuo, “A livre escolha entre ampla variedade de mercadoria e serviços não significa liberda- de se esses serviços e mercadoria sustêm os controles sociais sobre uma vida de labuta e temor” (MARCUSE, 1979, p. 28). O homem perdeu sua autonomia median- te os padrões de vida estabelecidos pela sociedade. O avanço do progresso técnico impôs novas necessidades que, na sua grande maioria, estão a serviço da manu- tenção do sistema por meio do consumo. “O conceito de necessidade engloba tanto alimentação, roupa, moradia quanto bombas, máquina caças níqueis e a destruição de produtos invendáveis” (MARCUSE, 2001, p.117).

A sociedade estabelecida alcançou o nível de do- minação no qual há a anulação do protesto individual do homem cedendo espaço para o conformismo de pensamento e comportamento. A ausência da dimen- são crítica está cada vez mais sendo reduzidas por uma sociedade que tem o controle d as necessidades vitais, nas quais os desejos e aspirações, assim como os va- lores e medos, estão sendo ditados e administrados. O homem, sob o domínio cada vez intenso da sociedade, passa a não desenvolver suas potencialidades e sua autodeterminação tornando-se “unidimensional” 22, pois se submete à dominação cada vez mais totalizante.

4 A SOCIEDADE INDUSTRIAL AVANÇADA BARROU A PROPOSTA DO HOMEM ENQUANTO NEGA- ÇÃO VIVA DO ESTABELECIDO

“O progresso tecnológico mudou fundamentalmen- te a balança do poder social. O alcance e eficácia dos

22 2 Marcuse propõe a interpretação do termo “Unidimensional”

como conformidade ao pensamento e comportamento existente, e, tal vez o aspecto mais importante, a ausência de uma dimen- são crítica e de uma dimensão de potencialidades que poderiam transcender a sociedade existente. MARCUSE, Herbert, Ideologia

da Sociedade Industrial.

instrumentos de destruição controlados pelos governos tornaram obsoletos e românticas as formas clássicas de luta social”. (MARCUSE, 1978, p. 406)

Marx já mostrava que a ideia de progresso como possibilidade de pacificação da existência humana foi desviada do seu objetivo inicial. O conceito de progres- so técnico que não é um conceito neutro, pois carrega em sua própria existência a produtividade como seu maior valor, com isso temos uma sociedade em que a sua engrenagem tem como motor propulsor o proces- so produtivo. Isso implica que as relações na sociedade avançada são mediadas pela produção, como resultan- te temos reificação e fetichização total dos indivíduos.

Nesse contexto da sociedade industrial, Marx, cita Marcuse, acreditava na possibilidade de mudança qualitativa por meio da socialização do aparato técnico de produção, o homem de posse da organização produtiva faria uso da mesma para a satisfação das necessidades livremente desenvolvidas. “E tal modificação pressuporia que as classes trabalhadoras estivessem, em sua própria existência, alienadas desse universo, que a sua consciên- cia fosse à da impossibilidade de continuar a existir nesse universo” (MARCUSE, 1979, p.42). Entretanto, diz Marcu- se, que embora essa consciência de negação pudesse surgir de dentro da sociedade estabelecida e tenha se tor- nado, posteriormente, uma pedra angular na teoria marxis- ta, o protesto individual e coletivo, ambos foram modifica- dos em decorrência do desenvolvimento produtivo.

O homem não é mais uma negação viva da socie- dade como fora antes, hoje à modificação dos aspec- tos do trabalho é rompida pela troca de esforço físico pelo esforço mental, o trabalho que antes era símbolo de exaustão física passou a ser exaustão mental. “a au- tonomia ‘profissional’ anterior do trabalhador era, antes sua escravidão profissional. Mas esse modo específico de dominação, era ao mesmo tempo, a fonte de seu poder específico, profissional de negação” (MARCUSE, 1979, p.45), a maquina afirma sua dominação quando reduz à autonomia do trabalhador, o poder que o ho- mem tinha em parar um processo produtivo lhe dava certa autonomia profissional.

Diante do moderno conceito de progresso, a exis- tência da separação entre as necessidades social e ne- cessidade individual, acaba por resultar é que a vida se resume apenas ao trabalho, “que o próprio trabalho se torna o conteúdo da vida. O trabalho é concebido como socialmente necessário e útil; sem ser absolutamen- te concebido como trabalho individualmente satisfató- rio, individualmente necessário” (MARCUSE, 2001, p. 116), Logo, o trabalho que advém do conceito de pro- gresso que fez surgir essa Moderna civilização indus- trial é o trabalho desprazeroso. O indivíduo trabalha sem visar sua plena realização, o trabalho que lhe é a própria vida é agora trabalho alienado.

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A análise da sociedade fechada, que se abre ape- nas para a expansão externa da economia. Alcançou o nível pelo qual só pode ser definida com novos valores e novas categorias23. “Quanto mais racional, produtiva, técnica e total se torna a administração repressiva da sociedade. Tanto mais inimagináveis se torna os mo- dos e os meios pelos quais os indivíduos administrados poderão rompe sua servidão e conquistar sua própria libertação” (MARCUSE, 1979, P 28). A principal altera- ção no caráter do trabalho, nos instrumentos de produ- ção, junto com a mudança na atitude e a consciência do trabalhador, reflete a grau de integração social e cultural do proletariado na sociedade capitalista. Essa Integra- ção priva o indivíduo de práticas históricas que pode- riam transcender o universo estabelecido da ação e do discurso, caso houvesse transcendências estas seriam de ordem metafísicas, contudo, inaceitáveis.

Com o progressivo avanço da civilização industrial, se alcançou elevados padrões de vida. A satisfação dos desejos e aspirações é mantida por meio do consumo das mercadorias e o estado de Bem-Estar que configura o padrão de vida da sociedade avançada, é um estado marcado por restrição completa da liberdade em virtu- de do alto grau de administração da existência humana. Deparamo-nos com indivíduos completamente satisfei- tos e felizes com as mercadorias e serviços que lhe são servidos por essa sociedade administrada. Logo, se as mercadorias satisfazem as necessidades em nível de sentimento, desejos, pensamento, imaginação, não há razões para desejarem, pensarem e imaginarem por si mesmo. Se as satisfações administradas das necessi- dades resulta em felicidade não há motivos para pensar numa mudança dessa estrutura social.

O alto padrão de vida juntamente com as conquis- tas sobre o homem e o domínio da natureza afirma o po- der sobrenatural, que a sociedade industrial avançada impõe aos homens e mulheres. Diante disso, as força de oposição são derrotadas ou reconciliadas com o sis- tema estabelecido, Marcuse a firma que não é preciso esperar que as próximas bombas sejam detonadas ar- rasando cidades inteiras para que as pessoas possam abrir seus olhos para as crueldades dessa sociedade.

23 Marcuse no diz que a análise desta sociedade exige novas categorias tanto morais, políticas e estéticas, e, como forma in- trodutória faz uso da categoria “Obsceno” para definir essa socie- dade da abundancia, nos diz que esta sociedade é obscena em produzir exibir indecorosamente uma abundancia sufocante de mercadoria, ao mesmo tempo em que priva largamente as suas vítimas da satisfação de necessidades vitais. Obsceno não é uma gravura de uma mulher nua que expões os pelos dos púbis, mas um general completamente vestido que exibe suas medalhas de recompensa numa guerra de agressão. MARCUSE, Herbert, Um

ensaio para a libertação, Livraria Bertrand. Lisboa, 1977.

5 AS SATISFAÇÕES DAS NECESSIDADES LIVRE- MENTE DESENVOLVIDAS ATESTAM A DIFEREN- ÇA QUALITATIVA DA SOCIEDADE

A particularidade distintiva da sociedade industrial desenvolvida é a sufocação das necessidades que exi- gem libertação - libertação também do que é tolerável e compensador e confortável (MARCUSE 1967, p. 28). A crítica de Marcuse reside, nesse contexto, não ao materialismo dessa forma de vida imposto pela socieda- de industrial avançada, mas sim ao falso modo de vida no qual os indivíduos são submetidos junto ao alto grau de repressão. A satisfação das necessidades livremente desenvolvidas reflete em termos a proposta marcuseana, de uma sociedade poder ser regida por novos valores, por um novo principio de realidade. Dessa forma, o pro- testo contra a produtividade se torna a recusa em aceitar a dominação cada vez mais totalizante, evidenciando a proposta de mudanças qualitativas e o distanciamento da sociedade com base nos valores da produção.

A libertação da sociedade estabelecida pressupõe uma transformação a nível “biológico” das necessida- des instintivas, caso contrário, o protesto acabaria se tornando incompleto. Marcuse faz uso do termo “biológi- co” para enfatizar que essas necessidades são aquelas em que não podem deixar de ser satisfeitos. São aque- las em que não se podem encontrar um substituto, pois acabaria por comprometer o funcionamento de todo o organismo, “A necessidade de possuir, consumir, mane- jar e renovar constantemente os inventos, os utensílios, as máquinas, imposta ás pessoas […] tornou-se uma necessidade biológica”. (MARCUSE, 1977, p. 24).

O triunfo do capitalismo avançado é marcado quan- do o processo produtivo tem altera a forma de domínio na sociedade, quando as pessoas não conseguem rejeitar a dominação que lhe é imposta, quando as mercadorias que consomem se tornaram parte de sua própria existên- cia. As necessidades e satisfações, nessa esfera, confi- guram uma vida de “servidão voluntária”. O progresso na civilização não só reduz o ambiente de liberdade huma- na, mas também o desejo de tal libertação. O véu tec- nológico não só esconde, por detrás das mercadorias, a exploração e dominação das classes, mas, ao consumi- rem os produtos, as pessoas estão consumindo também parte de sua vida e, nesse sentido, o véu tecnológico não só esconde a exploração, mas transfigura-a.

A liberdade depende pois largamente do progresso técnico, do avanço da ciência. Mas este facto facil- mente nos levas a esquecer a condição prévia es- sencial: afim de se tornarem veículos de liberdade, a ciência e a tecnologia terão de mudar a sua atual direção e objetivos: terão de ser formadas por uma nova sensibilidade (MARCUSE,1977, p.34).

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As necessidades que são geradas em função des- se sistema são necessidades estabilizantes e conserva- dores que militam a favor da contrarrevolução. Uma so- ciedade qualitativamente diferente necessita de novas fundamentações, novos valores de um novo princípio de realidade. Uma sociedade que seja organizada por homens cujas necessidades, desejos e aspirações se- jam a negação determinadas desta sociedade repres- siva, “o homem só é livre quando está livre das coações internas e externas, físicas e morais - quando não é reprimido pela lei nem pela necessidade” (MARCUSE, 1968, p.167).

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Marcuse compreende que a classe trabalhadora ainda é essencialmente, o agente histórico de revolução, embora reconheça que existencialmente não o seja, isto devido ao controle de sua consciência, devido à satisfa- ção das necessidades de consumo que auxiliam a per- petuação da servidão dos trabalhadores nesta sociedade controlada pela administração capitalista. Reconhece que as conquista da ciência e da técnica negaram um objetivo humano. Quanto mais a tecnologia se desenvolve, mais poderia tornar-se capaz de criar melhores condições de satisfações das necessidades humanas. No entanto, a so- ciedade industrial se organizou e fez uso para uma domi- nação efetiva do homem e da natureza. As novas formas de controle na sociedade contemporânea têm como obje- tivo a continuidade da produção sem levar em considera- ção as verdadeiras necessidades humanas. “As criaturas se reconhecem em suas mercadorias; encontra sua alma em seu automóvel, hi-fi, casa em patamares, utensílios de

cozinhas” (MARCUSE, 1977, p. 29).

Uma mudança qualitativa na sociedade corres- ponderia a uma transformação da sociedade, rompendo os objetivos atuais da política conforme a racionalidade da dominação, em que corpo e mentes são mantidos num estado de mobilização em defesa do status quo. A transformação no caráter repressor da ciência e da técnica pressupõe a construção de uma nova sociedade regida por valores humanos, uma sociedade que neces- sitaria de homens e mulheres com sensibilidade e cons- ciência diferenciada, isto é voltadas para sua própria felicidade. Marcuse propõe uma mudança nos valores vigentes na sociedade, de modo que o trabalho penoso seja substituído pelo trabalho não alienado, seus afaze-

das necessidades não sublimadas, isto é, a partir das necessidades que não foram desviadas de seus propó- sitos iniciais, para as quais não foi encontrado um subs- tituto. Dessa forma, está posta a base biológica para uma sociedade mais livre, mais humana. Sabendo que a tarefa e o objetivo de toda libertação é a melhor satis- fação das necessidades, “mas, ao progredir em direção a tal objetivo, a própria liberdade deve tornar-se uma necessidade instintiva e, enquanto tal deve mediar as demais necessidades” (MARCUSE, 1993, p.08.).

A partir do instinto de liberdade não sublimado que teríamos as raízes para uma liberdade política e social, teríamos as exigências de uma transformação social qualitativamente diferente, um momento de ruptura com a lógica de dominação e perpetuação do progresso ma- terial que gera novas necessidades heterônomas. Um novo princípio de realidade a partir dessa fundamen- tação libertaria a base biológica dos valores estéticos, “porque a beleza, o repouso, a harmonia, são neces- sidades orgânicas do homem, cuja repressão e a ad- ministração mutilam o organismo e ativam a agressão” (MARCUSE, 1993, p.10. Tradução do Autor).

A técnica pode transformar-se em arte, rom- pendo as barreiras da alienação, da identificação dos indivíduos ao trabalho controlado pelo capital. Tornan- do-os conservadores e contra revolucionários. “Quan- do homens e mulheres agirem e pensarem livre dessa identificação […] eliminaria as causas que tem feito da historia a humanidade a história do domínio e servidão” ( MARCUSE, 1977, p. 41). Numa sociedade estritamen- te autêntica o homem jogaria ao invés de labutar, sua vida seria mais de realização pessoal e social do que trabalho árduo. O resultado seria uma sociedade regida por um novo princípio de realidade, por uma nova sen- sibilidade, em que a ciência e a técnica não estariam a serviço da manutenção do sistema, seria uma socieda- de autenticamente humana.

REFERÊNCIAS

MARCUSE, H. A ideologia da Sociedade Industrial: o homem Unidimensional. Tradução de Giasone Rebuá. 5. ed. Rio de Janeiro: Zahar Editora, 1979.

. Cultura e Psicanálise. Tradução de: Wolfgang Leo Maar, Robespierre de Oliveira, Isabel loureiro. São Paulo: Ed. Paz e Terra, 2001.

res devem tornar-se entretenimento, a tecnologia e au- . Eros e Civilização: Uma interpretação filosofi- tomação hoje já o permitem. “Reduzi-se-ia á alienação

com a progressiva redução do dia de trabalho, mas este permaneceria um dia de sujeição, racional, mas não li- vre” (MARCUSE, 1977,p. 36).

As bases para uma mudança na sociedade es- tabelecida deveriam iniciar-se a partir das satisfações

ca de Freud. Tradução: Alvaro Cabral, Ed. Rio de Janei- ro: Zahar Editora, 1972.

. O Homem Unidimensional: estudos da ideo- logia da sociedade avançada. Tradução de Robespiee- re de Oliveira, Deorah Antunes e Rafael Cordeiro Silva. São Paulo: Edipro Editora, 2015.

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. El Hombre Unidimensional: ensayo sobre la ideología de la sociedad

industrial avanzada. Buenos Aires: Ed. Planeta Agosti- ni, 1993.

. Razão e revolução: Hegel e advento da teoria social. Tradução de Marília Barroso.- 2. ed. Rio de janei- ro: Paz e Terra, 1978.

. Um Ensaio Sobre a Libertação. Tradução de Maria Ondina Braga. Lisboa: Livraria Bertrand, 1969.

SOBRE O AUTOR Ramom Gomes da Silva

Graduando em Filosofia pela Universidade Estadual do Ceará (UECE). Ex-monitor da disciplina de Lógica I (2013) e Filosofia Social e Politica I (2014). Membro do Grupo de Estudos de Atualidades do Pensamento de Herbert Marcuse, Além de interesses na filosofia Medie- val (Santo Agostinho) e autores do período clássico (os Pré-Socráticos e Platão).

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