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A efetivação do direito à saúde no Brasil

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GRANDE DO SUL

GABRIELLE CRISTINA ENDRES

A EFETIVAÇÃO DO DIREITO Á SAÚDE NO BRASIL

Santa Rosa (RS) 2015

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GABRIELLE CRISTINA ENDRES

A EFETIVAÇÃO DO DIREITO À SAÚDE NO BRASIL

Trabalho de Conclusão do Curso de Graduação em Direito objetivando a aprovação no componente curricular Trabalho de Curso - TC.

UNIJUÍ - Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul.

DCJS - Departamento de Ciências Jurídicas e Sociais.

Orientadora: MSc. Francieli Formentini

Santa Rosa (RS) 2015

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Dedico este trabalho aos meus pais, pela vida, amor, educação e estímulo à busca

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente a Deus por ter me dado uma família maravilhosa, bem como força e fé ao longo de toda a minha jornada acadêmica, fazendo com que eu pudesse superar as dificuldades encontradas no caminho.

A minha família, porto seguro que nunca falha, pelo apoio, compreensão, incentivo e amor incondicional, que sempre esteve presente me encorajando para seguir em frente e não mediu esforços para eu chegar até aqui.

À minha orientadora Francieli Formentini, pela confiança, incentivo, amizade e auxílio.

Aos meus amigos e a todos que direta ou indiretamente fizeram parte de minha formação e que vão continuar em minha vida com a mais absoluta certeza, o meu mais singelo agradecimento.

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“ Porque há o direito ao grito. Então eu grito.” Clarice Lispector

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O presente trabalho de conclusão de curso faz uma análise sobre a judicialização do direito à saúde no Brasil, o qual está previsto como um direito humano fundamental na Constituição Federal de 1988, sendo um direito de todos e dever do Estado. A prestação da saúde é uma obrigação de fazer, solidária aos Entes Federados, seja qual for a sua esfera de atuação, que deve ser efetivada através de políticas públicas e sociais. Desse modo, o estudo em comento aborda, desde aspectos históricos e conceituais dos temas mais relevantes sobre a matéria, como também demonstra através de estudo sobre pesquisas recentes do Conselho Nacional de Justiça e dados sobre a Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Sul, como vem se dando o processo de judicialização da saúde nos tempos de hoje e as questões envolvendo atendimentos relacionados a demandas na área de saúde. Com isso, a pesquisa tem por objetivo estudar como vem se dando o acesso à justiça no que toca ao direito fundamental à saúde, estudando os aspectos históricos, legais, conceituais e sistemáticos do direito à saúde no Brasil, abordando os principais problemas encontrados para a concretização da tutela jurisdicional.

Palavras-Chave: Acesso à Justiça. Direito à Saúde. Judicialização. Defensoria Pública.

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This course conclusion work is an analysis of the legalization of the right to health in Brazil, which is expected as a fundamental human right in the Constitution of 1988, being a universal right and duty of the state. The provision of health is an obligation to do, caring for loved Federated, whatever their sphere of action, which should be carried out through public and social policies. Thus, the study under discussion addresses from historical and conceptual aspects of the most important issues in this area, but also demonstrates through study of recent research from the National Council of Justice and data on the Public Defender's Office of Rio Grande do Sul State, as has been giving health legalization process in today's times and issues involving related calls to demands in healthcare. Thus, the research aims to study how has been giving access to justice in relation to the fundamental right to health by studying the historical, legal, conceptual and systematic the right to health in Brazil, addressing the major problems encountered in realization of judicial protection.

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INTRODUÇÃO ... 8

1 ACESSO À JUSTIÇA E O DIREITO À SAÚDE ... 11

1.1 Acesso à justiça: aspectos históricos, conceituais e legais ... 12

1.2 Direito à saúde no Brasil ... 18

1.3 A judicialização do direito à saúde ... 25

2 A EFETIVIDADE DO DIREITO À SAÚDE ... 30

2.1 O problema da efetivação do direito à saúde no Brasil – principais entraves para sua concretização ... 31

2.2 Estudo dos dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) sobre a judicialização da saúde no Brasil ... 40

2.3 Defensoria Pública e a efetivação do direito á saúde ... 47

CONCLUSÃO...53

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INTRODUÇÃO

O direito à saúde ganhou o status de fundamental na Constituição Federal de 1988. Constitui-se em direito de todos e dever do Estado, cuja norma é de eficácia plena e aplicabilidade imediata, de modo a envolver tanto questões de promoção, proteção e recuperação da saúde dos brasileiros.

Cumpre aos Entes Federados, através da implementação de políticas públicas e sociais, a tarefa de concretização do direito à saúde. Tal efetivação implica diretamente em investimentos públicos condicionados em prestações de serviços e estrutura. Referente a isso, compete ao Poder Executivo não só a elaboração do orçamento público, ator fundamental em todas as demandas judiciais e extrajudiciais envolvendo o direito à saúde, como também a programação de como irão se destinar os recursos públicos.

É frequente na mídia, frente a estas breves colocações, a discussão sobre o papel do Estado diante da concretização do direito à saúde. Não raramente, depara-se com casos em que a insatisfação dos sujeitos, titulares de tal garantia, é extremamente volumosa, seja por críticas ao Sistema Único de Saúde (SUS) ou pelo gigantesco número de ações judiciais que envolvem a matéria.

Tal análise indica alguns elementos no mínimo interessantes. Por exemplo, demonstra, que a efetividade social dos direitos fundamentais, principalmente, do direito à saúde, é tema comum nas mais variadas rodas de conversa. Mais. Uma população que consegue identificar os problemas e se sente à vontade para

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criticá-los, é uma população que sabe ser detentora de garantias, cuja efetivação imputa aos Entes Públicos.

Neste sentido, a concretização do direito à saúde, de um núcleo de direitos humanos que representam um mínimo existencial, inicia um grande debate que gira em torno da real efetivação dos direitos fundamentais, ou seja, direitos sociais que passam cada vez mais a ser reivindicados pelo povo, real detentor do poder de um Estado democrático de direito, que atualmente, está se mostrando real entendedor de suas garantias e, não está ficando inerte face às omissões do Estado.

O presente trabalho de conclusão de curso versará com isso, os principais aspectos conceituais e históricos do acesso à justiça, a fim de tentar atestar que o desenvolvimento na construção de tal direito passou por grandes e profundas transformações. Essa exposição é altamente necessária face a abordagem do problema central da pesquisa: a efetividade do direito à saúde no Brasil.

Para a realização deste trabalho, a pesquisa se deu de forma exploratória. Foram efetuadas pesquisas em fontes bibliográficas disponíveis em edições e elementos textuais físicos e via internet, bem como análise de pesquisas do Conselho Nacional de Justiça e matérias referentes a Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Sul, com o intuito de enriquecer a coleta de informações buscando um aprofundamento no estudo da efetivação e judicialização do direito à saúde no Brasil.

Inicialmente, no primeiro capítulo, abordar-se-á os aspectos históricos do acesso à justiça, a fim de não apenas trazer um conceito pronto, unilateral e selado do tema, mas sim conceber a ideia de formação de uma concepção abrangente, que demonstra a real magnitude de tal preceito. Segue uma análise da transformação pela qual as ações passaram, assumindo um caráter mais coletivo do que individual, onde o Estado, que antes era visto como secundário, chama para si o dever de decidir as lides.

Far-se-á ainda, uma breve consideração do que tem sido a judicialização do direito à saúde, tanto no sentido de requerer respeito e não interferência, quanto no

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sentido de interpor demandas por proteção e fornecimento de bens. Ainda, irá ser apresentado um panorama da saúde no Brasil, trazendo desde a criação do Sistema Único de Saúde (SUS), seus princípios e diretrizes, como também a formação do sistema brasileiro de saúde, elencando os principais elementos para seu funcionamento.

No segundo capítulo é analisada mais profundamente a judicialização do direito à saúde nos tempos de hoje. Para isso foi usada uma recente pesquisa desenvolvida pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que mostra a grande gama de ações que envolvem o direito à saúde no Brasil. A pesquisa foi realizada utilizando-se alguns parâmetros quantitativos e qualitativos, tendo sido selecionados alguns tribunais, de menor e maior pontuação para a coleta e formação dos dados. Também é feita uma reflexão dos principais entraves para se ter um efetivo acesso à na área da saúde, passando desde aspectos econômicos, como a escassez de recursos públicos, como a tempestividade da tutela pleiteada de forma processual. Por fim, é analisado o papel da Defensoria Pública, órgão de institucionalização recente, que está fazendo toda a diferença nas demandas que versam sobre à saúde.

A partir desse estudo se verifica que o direito à saúde apresenta uma problemática, que passa não só pelo estudo do direito, como também de importância política, social, filosófica e econômica. Esclarece-se, por último, que a pesquisa não busca “erradicar” o problema que existe em torno da efetividade do direito à saúde - o que singelamente relatando-se, seria impossível – mas sim, contribuir para demonstrar o quão extenso e importante é o debate e busca de melhores soluções para o tratamento do tema, eis que a questão aqui abordada é extremamente complexa.

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1 ACESSO À JUSTIÇA E O DIREITO À SAÚDE

Atualmente, a discussão acerca do direito à saúde, no que tange a sua real aplicabilidade e efetividade, é assunto muito recorrente na vida de todos os sujeitos. Dentro disso, são inúmeras as críticas ao Sistema Único de Saúde (SUS), as ações judiciais de pleito de medicamentos e cirurgias e a forma como vem se dando a prestação da saúde pelo Poder Público.

A efetividade do direito à saúde, abre assim, um debate no que toca a realização dos direitos fundamentais, mais precisamente dentro destes, sobre os direitos sociais, cujo respaldo está no artigo 6º, da Constituição Federal de 1988.

Importante frisar assim, que tanto o direito à saúde quanto o direito à vida são garantias constitucionais, sendo à proteção à saúde direito de todos e dever do Estado, de acordo com o preceituado nos artigos 23, inciso II e 196, da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 2015).

Ainda, a saúde é entendida como integrante do fundamento da dignidade da pessoa humana, princípio constitucional insculpido no artigo 1º, da Constituição Federal. Ora, se tal direito é violado, tem-se também uma violação a este fundamento, uma vez que compreende o mínimo que uma pessoa necessita para viver de forma justa.

Com isso, o problema vai tomando significativas proporções, na medida em que, mesmo existindo, não se consegue o mínimo acesso a uma adequada prestação jurisdicional. Ou ainda, mesmo alcançando-se este acesso, acabam surgindo inúmeros conflitos concernentes à qualidade, à tempestividade e a real efetividade do direito a que se busca.

A situação se agrava, desta forma, na medida em que envolver questões atinentes à saúde, considerando que nesses casos o bem envolvido é a vida.

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Feitas essas primeiras colocações, esclarece-se que o presente capítulo tem por objetivo analisar como se dá a efetivação ao acesso à justiça no âmbito do direito à saúde, estudando o tema historicamente, ou seja, trazendo a evolução, conceitos legais e conceituais do acesso à justiça, de forma a elencar sua contextualização no sistema brasileiro, em especial na Constituição de 1988, a fim de possibilitar a posterior averiguação de sua eficácia na concretização do direito à saúde no Brasil.

1.1 Acesso à justiça: aspectos históricos, conceituais e legais

Primeiramente, deve-se aferir que no presente capítulo não irá se elaborar uma definição restrita de acesso à justiça. Com efeito, além dos efeitos da própria expressão, o presente tema apresenta uma gama de interpretações e abordagens, seja econômica, jurídica, política ou até mesmo sociológica, as quais necessitariam de uma pesquisa mais específica.

Desta forma, far-se-á um breve relato histórico da temática, de modo a tentar delimitar os principais aspectos relacionados, para assim tentar-se fazer entender o que representa o acesso à justiça.

Não há, desta maneira, como tratar do assunto sem inicialmente mencionar a composição das “ondas renovatórias”, que representam um marco sobre o tema e foram trabalhadas por Leslie Shérida Ferraz (2010), destacando conhecido trabalho de Mauro Cappelletti e Bryant Garth.

Estas nada mais são do que etapas das reformas do sistema de Justiça, realizadas a partir da detecção de empecilhos ao acesso e da maneira mais correta de encará-los, sendo uma sequência de seguimentos que conferem no próprio papel do direito na sociedade (FERRAZ, 2010).

Assim, a “primeira onda” teve como objetivo fortalecer a assistência judiciária, tomando por base a identificação de que a necessidade que se tem, de contratar um

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advogado é um obstáculo aos menos favorecidos conseguirem acesso ao Tribunal. A “segunda onda”, por sua vez, preceituava a tutela coletiva dos direitos, de modo a entender que o processo tradicional (baseado nas relações individuais) não condizia com a realidade dos conflitos de massa. Já, a “terceira onda” preocupou-se com a efetividade do acesso à Justiça, reclamando por mudanças profundas na administração da Justiça e trazendo que o modelo tradicional poderia não ser o mais adequado para certas espécies de conflitos (FERRAZ, 2010).

No Brasil, as três ondas, que em verdade, coexistem e tornam a terceira uma absorção das outras duas, emergiram praticamente juntas nos anos oitenta (Mauro Cappelletti e Maria Tereza Sadek, citados por Ferraz, 2010).

Mauro Cappelletti e Bryant Garth (1988) salientam que com o passar dos anos o conceito de acesso à justiça vem sofrendo transformações devido a uma significante mudança no processo civil. Historicamente, entre os séculos dezoito e dezenove, nos estados liberais “burgueses”, os métodos utilizados para solucionar os litígios civis existentes refletiam uma filosofia fundada em direitos individualistas, ou seja, o direito ao acesso à proteção judicial nada mais era do que o próprio direito formal do sujeito marcado com a proposição ou contestação de uma ação.

Segundo a teoria existente, partindo-se da ideia de que o acesso à justiça era um direito natural, o Estado não era indispensável para garantir seu protecionismo. Para serem preservados, bastava que o Estado garantisse que tais direitos não fossem violados por quaisquer outros. O Estado era considerado assim, passivo no tocante aos problemas enfrentados pelos indivíduos na busca pelo reconhecimento e defesa dos seus direitos (CAPPELLETTI; GARTH, 1988).

Nas palavras de Cappeletti e Garth (1988, p. 4):

A teoria era a de que, embora o acesso à justiça pudesse ser um “direito natural”, os direitos naturais não necessitavam de uma ação do Estado para sua proteção (1). Esses direitos eram considerados anteriores ao Estado; sua preservação exigia apenas que o Estado não permitisse que eles fossem infringidos por outros. O Estado, portanto, permanecia passivo, com relação a problemas tais como a aptidão de uma pessoa para reconhecer seus direitos e defendê-los adequadamente, na prática.

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O afastamento da pobreza em seu sentido legal, ou seja, a incapacidade que muitas pessoas têm em alcançar plenamente a justiça, não era uma preocupação do Estado. A justiça, no sistema do “laissez faire” só era obtida pelos sujeitos que podiam arcar com seus custos (CAPPELLETTI; GARTH, 1988).

Ademais, o Estado, durante este período, não possuía preocupação com a questão social, ou seja, em acabar com a incapacidade que as pessoas tinham de utilizar a Justiça e suas instituições. Somente faziam uso da Justiça, as pessoas que tinham boas condições financeiras para enfrentar seus custos, sendo que se caso assim não tivessem, ficavam responsáveis por sua sorte.

A respeito da temática Cappelletti e Garth (1988) ressaltam que a pouco tempo, ainda se percebiam situações no mínimo semelhantes. Com pequenas exceções, o sistema jurídico continuava se mostrando indiferente a questões de extrema relevância para a concretização ao acesso à justiça, de modo que, estava afastado da verdadeira realidade da população, sendo que diferenças potenciais entre as partes que buscavam acesso aos recursos para litigar, por exemplo, nem eram vistas como problema.

Com uma transformação um tanto quanto radical no conceito de direitos humanos, as ações passaram a assumir um caráter mais coletivo do que individual. No dizer de Cappelletti e Garth (1988, p. 4), “O movimento fez-se no sentido de reconhecer os direitos e deveres sociais dos governos, comunidades, associações e indivíduos”. Essa evolução nos direitos humanos foi e continua sendo essencial para tornar acessível a toda população os direitos anteriormente proclamados. Entre estes direitos, exemplificados na Constituição Francesa de 1946, estão o direito à saúde, à educação, ao trabalho e à segurança material.

Conforme o explanado por Cappelletti e Garth (1988, p.4):

Tornou-se lugar comum observar que a atuação positiva do Estado é necessária para assegurar o gozo de todos esses direitos sociais básicos. Não é surpreendente, portanto, que o direito ao acesso efetivo à justiça tenha ganho particular atenção na medida em que as reformas do welfare state têm procurado armar os indivíduos de novos direitos substantivos em sua qualidade de consumidores,

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locatários, empregados e, mesmo, cidadãos. De fato, o direito ao acesso efetivo tem sido progressivamente reconhecido como sendo de importância capital entre os novos direitos individuais e sociais, uma vez que a titularidade de direitos é destituída de sentido, na ausência de mecanismos para sua efetiva reivindicação. O acesso à justiça pode, portanto, ser encarado como o requisito fundamental — o mais básico dos direitos humanos — de um sistema jurídico moderno e igualitário que pretenda garantir, e não apenas proclamar os direitos de todos.

Tem-se assim, que o Estado, que antes possuía um papel passivo e secundário, passou a ser extremamente fundamental e necessário para assegurar ao povo seus direitos sociais básicos. De tal forma, que o acesso à justiça deve ser encarado como o mais básico dos direitos humanos em um sistema jurídico igualitário e que visa a real e efetiva garantia desses direitos (CAPPELETTI; GARTH, 1988).

Atualmente, no ordenamento jurídico brasileiro, o acesso à justiça está previsto constitucionalmente no artigo 5º, inciso XXXV, que assim discorre: “A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito. ” Tal inciso também é conhecido como o princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional ou ainda princípio do direito de ação (BRASIL, 2015).

Tal princípio, para Alexandre de Moraes (2005), é basilar na existência do Estado Democrático de Direito, cabendo a Constituição Federal – sempre que houver violação do direito, mediante lesão ou ameaça – a sua garantia, mediante a intervenção do Poder Judiciário que aplicará o direito ao caso concreto.

O inciso LXXVIII do artigo 5º da Constituição Federal de 1988, por sua vez, foi inserido no texto constitucional através da Emenda Constitucional nº 45/2004, sendo esta a grande responsável por uma grande reforma no Poder Judiciário. Este inciso traz expressamente o princípio da razoável duração do processo, também chamado de celeridade processual, sendo ainda, um direito/garantia fundamental.

Tal emenda, conhecida como a Reforma do Judiciário, garantiu a todas as pessoas - tanto no âmbito judicial quanto no administrativo - a razoável duração do processo e os meios que asseguram a sua celeridade, trazendo consigo

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mecanismos de transparência e controle de qualidade da atividade jurisdicional (MORAES, 2005).

Entre esses mecanismos podem ser citados alguns elencados por Moraes (2005, p.94), a saber:

Como mecanismos de celeridade e desburocratização podem ser citados: a vedação de férias coletivas aos juízes e tribunais de segundo grau, a proporcionalidade do número de juízes à efetiva demanda judicial e à respectiva população, a distribuição imediata dos processos, em todos os graus de jurisdição, a possibilidade de delegação aos servidores do Judiciário, para a prática de atos de administração e atos de mero expediente sem caráter decisório, a necessidade de demonstração de repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso para fins de conhecimento do recurso extraordinário, a instalação da justiça itinerante, as súmulas vinculantes do Supremo Tribunal Federal.

Os processos administrativos e judiciais têm o dever de garantir todos os direitos às partes, sem deixar de lado a importância da desburocratização de seus procedimentos e a busca pela qualidade e eficácia de suas decisões (MORAES, 2005).

Apesar de todo o avanço, ressalta Moraes (2005, p.94), que a EC nº 45/2004 trouxe, no entanto, poucos mecanismos processuais que asseguram maior celeridade às demandas bem como diminuição na morosidade da justiça brasileira, esclarecendo que: “O sistema processual judiciário necessita de alterações infraconstitucionais, que privilegiem a solução dos conflitos, a distribuição de Justiça e maior segurança jurídica, afastando-se tecnicismos exagerados”.

Desta forma, depreende-se da união e observação destes dois princípios - princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional e princípio da razoável duração do processo - que todo cidadão tem direito de ter apreciado o seu pedido, dentro de um prazo razoável e com todas as garantias existentes, por um juízo competente, tratando-se assim, de dispositivo garantidor do acesso à justiça.

Muito bem delineado, neste sentido, o afirmado por Ana Flavio Mello Torres (2015): “O acesso à justiça é direito humano e essencial ao complexo exercício da

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cidadania. Mais que acesso ao judiciário, alcança também o acesso a aconselhamento, consultoria, enfim, justiça social. ”

O que se quer dizer com isso, é que o princípio do acesso à justiça vai muito mais além do que o alcance ao Judiciário e suas instituições por uma lesão ao direito por exemplo. Isso porque também existe a ameaça ao direito e a partir daí, segue-se com muitos/ outros valores e direitos fundamentais inerentes ao ser humano (TORRES, 2015).

À vista disso, aquele que busca a defesa dos seus direitos, seja por haver ameaça ou efetiva lesão, espera que o Judiciário resolva seu problema, impondo uma decisão que objetiva pacificar a situação e trazer ordem social.

Ademais, conforme já mencionado, embora atualmente tenha se dado uma grande evolução ao efetivo acesso à justiça, o real alcance de sua efetividade ainda é muito genérico. Cappelletti e Garth (1988, p.6) assim assinalam:

Embora o acesso efetivo à justiça venha sendo crescentemente aceito como um direito social básico nas modernas sociedades, o conceito de “efetividade” é, por si só, algo vago. A efetividade perfeita, no contexto de um dado direito substantivo, poderia ser expressa como a completa “igualdade de armas” — a garantia de que a condução final depende apenas dos méritos jurídicos relativos das partes antagônicas, sem relação com diferenças que sejam estranhas ao Direito e que, no entanto, afetam a afirmação e reivindicação dos direitos. Essa perfeita igualdade, naturalmente, é utópica. As diferenças entre as partes não podem jamais ser completamente erradicadas. A questão é saber até onde avançar na direção do objetivo utópico e a que custo. Em outras palavras, quantos dos obstáculos ao acesso efetivo à justiça podem e devem

ser atacados? A identificação desses obstáculos,

consequentemente, é a primeira tarefa a ser cumprida.

Com isso, tem-se uma imensa lacuna no que tange a efetividades dos direitos. É importante ter em mente que o real alcance ao acesso à justiça envolve diversas questões sociais e culturais, que usando como parâmetro o direito à saúde, serão aprofundadas no decorrer desta pesquisa.

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1.2 Direito à saúde no Brasil

A partir do conceito explanado por Ricardo Augusto Dias da Silva (2010), pode ser verificado que durante muito tempo, a saúde foi entendida somente como a ausência de doenças no sujeito. Com o desenvolvimento social e tecnológico, tal conceito foi alargado de tal maneira que passou a englobar, além dos aspectos físicos e biológicos, os psicológicos e sociais.

Segundo a Constituição da Organização Mundial da Saúde (1946) “a saúde é um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não consiste apenas na ausência de doença ou de enfermidade. ”

Tal constituição traz expressamente que um dos direitos fundamentais de todos os seres humanos, é o gozo do melhor estado de saúde possível, sem nenhuma distinção de raça, religião, credo político ou condição econômica e social.

Semelhantemente, expressa-se a Constituição Federal Brasileira de 1988, em seu artigo 196: “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. ” (BRASIL, 2015).

Para Germano S. Schwartz e Ricardo Jacobsen Gloeckner (2003), o artigo 196, da Constituição Federal pode ser tratado como a pedra angular em nosso sistema jurídico no que toca à saúde. Tal referência pode ser compreendida pelo fato de ali estar estabelecida a saúde preventiva quanto a competência sobre redução do risco de doenças.

Sob esse prisma, o direito à saúde é regulado pelo Poder Público, que é a quem cabe, nos termos da lei, o papel de regulamentar, fiscalizar e controlar os serviços a tal direito (Art. 197, da Constituição Federal de 1988).

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Nos termos de Alexandre de Moraes (2005, p.722), da conjugação destes dois artigos 196 e 197, da Constituição Federal, resta que:

A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantindo mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário a ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação (CF, art. 196), sendo de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou por meio de terceiros e, também, por pessoas física ou jurídica de direito privado (CF, art. 197).

A partir do contexto deslindado sobre o direito a saúde, tem-se que este deve ser compreendido sob um conjunto de deveres do Estado para com os indivíduos, de modo a não só minimizar ou curar as enfermidades, mas também trazer a garantia de um desenvolvimento de vida saudável, inclusive utilizando-se de maneira mais criteriosa de meios de prevenção.

Tal constatação também vem confirmada no artigo 2º, parágrafo 1º, da Lei 8.080/90 (BRASIL, 2015), in verbis:

Art. 2º A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício. §1º O dever do Estado de garantir a saúde consiste na formulação e execução de políticas econômicas e sociais que visem à redução de riscos de doenças e de outros agravos e no estabelecimento de condições que assegurem acesso universal e igualitário às ações e aos serviços para a sua promoção, proteção e recuperação.

Importante faz-se trazer o delineado por Ricardo Augusto Dias da Silva (2010, p.76):

Nesse passo, entendimento doutrinário sustenta que conceituação da saúde deve ser entendida como algo presente e sua compreensão passa pela afirmação da cidadania plena e pela aplicabilidade dos dispositivos garantidores dos direitos sociais da Constituição Federal.

Atualmente, no Brasil, a saúde é regida pelos princípios da universalidade da cobertura do atendimento; da equidade; da descentralização da gestão administrativa, cujo trabalho é realizado de forma democrática uma vez que é

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fundado na participação da comunidade, e na solidariedade financeira, já que é financiado pela sociedade como um todo, consoante o disposto nos artigos 194 e 195, ambos da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 2015).

Partindo de tais princípios, insta entender o funcionamento e criação do Sistema Único de Saúde – SUS, que, de acordo com Mariana Filchtiner Figueiredo (2007, p.96), é resultado de propostas de reforma sanitária que foram defendidas e apresentadas na Assembleia Nacional Constituinte de 1986/1987, quando da insatisfação e inadequação do sistema de saúde vigente na época.

A esse respeito, preceitua o Ministério da Saúde (2002, p. 13):

O processo de redemocratização do País, na década de 80, com a ampliação da organização popular e a emergência de novos atores sociais, produziu a ampliação das demandas sobre o Estado e desencadeou um forte movimento social pela universalização do acesso e pelo reconhecimento da saúde como direito universal e dever do Estado. O Movimento da Reforma Sanitária reuniu atores diversificados em uma batalha política pelo reconhecimento da saúde como direito social, pela universalização do acesso aos serviços de saúde e pela Integralidade da atenção à saúde, na luta mais ampla pela construção da cidadania que marcou o final do regime militar.

Corroborando a isso, importante mencionar que as Conferências da Saúde sempre foram imprescindíveis para a democratização da área. Neste aspecto, a 8ª Conferência Nacional de Saúde, segundo o Ministério da Saúde (2002), teve como consequência a incorporação na Constituição de 1988, da saúde como direito social, da universalização do acesso aos serviços de saúde, a integralidade da atenção à saúde e, a determinação da responsabilidade do Estado nas ações visando a garantia deste direito.

Isto é, o relatório final da 8ª Conferência Nacional da Saúde, serviu de base para a formulação do artigo 196 da Constituição Federal de 1988. Em concordância, transcreve-se o seguinte trecho fundamentado no site do Ministério da Saúde (2015):

As Conferências de Saúde sempre foram fundamentais para a democratização do setor. Em 1986 foi realizada a histórica 8ª

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Conferência Nacional de Saúde, cujo relatório final serviu como subsídio para os deputados constituintes elaborarem o artigo 196 da Constituição Federal - "Da Saúde". A partir da promulgação da Constituição, em 1988, a saúde ganhou rumos diferentes com a criação do Sistema Único de Saúde (SUS).

Mais. Tal Conferência reconheceu a saúde como um direito do cidadão, traçando os fundamentos do SUS, tomando por base o desenvolvimento de estratégias que permitiram a coordenação e transferência de recursos entre as instituições de saúde federais, estaduais e municipais. (PAIM et al., 2015).

Mediante o instruído por Figueiredo (2007), o SUS, ao contrário do que se imagina, já havia sido criado no ano de 1975, quando da Lei nº 6.229/75, representando um marco significativo para época. No entanto, era considerado inapto, ineficiente e não era universal, de forma a alcançar somente os trabalhadores de economia formal, segurados do Instituto Nacional de Previdência Social e seus dependentes. Importante mencionar ainda, que as ações de promoção de saúde eram desenvolvidas quase que em sua integralidade pelo Ministério Público.

Frente a esta realidade, faz-se capaz entender a enorme mudança representada pela criação do Sistema Único de Saúde (SUS), nas políticas sociais instituídas pela Constituição Federal de 1988, cujo respaldo infraconstitucional encontra-se nas Leis nº 8.080/90 e 8.142/90. Além disso, o SUS vem encontrando cada vez mais apoio jurídico, sendo implementado também por vários outros instrumentos normativos.

Nesta perspectiva, Carmen Teixeira (2015, p.02) ensina que foi criado o atual Sistema Único de Saúde (SUS), política de Estado, adotada pelo Congresso Nacional quando dá promulgação da Constituição Federal de 1988, com a materialização de considerar a Saúde “direito de cidadania e dever do Estado”.

Germano A. Schwartz e Ricardo Jacobsen Gloeckner (2003, p.55) assim discorrem sobre o tema: “O Sistema Único de Saúde – SUS é o órgão responsável pela saúde do cidadão brasileiro. O Estado ainda, toma para si o dever de promoção

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(qualidade de vida), proteção (prevenção) e recuperação (saúde terapêutica ou curativa). “

O artigo 198, da Constituição Federal de 1988 institui o SUS. Segundo a Assembleia Nacional Constituinte, tanto a rede pública quanto a privada formam uma única rede hierarquizada e regionalizada, sendo que a partir daí decorrem três princípios a saber: integralidade, participação da comunidade e igualdade.

Contíguo a isso, Teixeira indica que o SUS é um projeto que efetiva os princípios da Universalidade, Equidade e Integralidade da atenção à saúde dos brasileiros, de forma a “garantir o acesso universal da população a bens e serviços que garantam sua saúde e bem-estar, de forma equitativa e integral. ” (TEIXEIRA, 2015, p.02).

Nesse sentido, Figueiredo (2007, p.97) nos ensina:

O SUS é um sistema público e nacional, baseado no princípio da universalidade, a indicar que a assistência à saúde deve atender a

toda população. Tem como diretrizes organizativas a

descentralização, com comando único em cada esfera

governamental; a integralidade do atendimento e a participação da comunidade.

Cumpre destacar, o explanado no próprio Portal da Saúde do Brasil (2015), em que o SUS é colocado como um dos maiores sistemas públicos de saúde do mundo, que garante acesso de forma integral, universal e gratuita para todo o povo brasileiro.

Figueiredo (2007), seguindo esta premissa, dispõe que o SUS, constituído como sistema público, compreende tanto as redes públicas como privadas de saúde, uma vez que se utiliza da contratação ou convênio com o Poder Público. Sobre isso afirma a autora (2007, p.97): “Ambas formam uma rede regional, para adequação às particularidades locais; e hierárquica, ou seja, que deve estrita observância ao conjunto de princípios que regem o sistema (integralidade, igualdade e participação da comunidade). ”

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Tendo em vista as especificidades, uma das características mais importantes do SUS é a gestão democrática das questões de saúde. Isso significa dizer que, consoante a Lei nº 8.142/90, no SUS existem normas de participação da comunidade, nas quais podem ser criadas a Conferência de Saúde e o Conselho de Saúde, instâncias colegiadas com representação em casa esfera do governo, que atuam como incentivadores da cooperação e gestão democrática do sistema (BRASIL, 2015).

Em conformidade com os parágrafos 1º e 2º do artigo 1º, da referida lei, a Conferência da Saúde reúne-se em um período de quatro em quatro anos, mediante representação dos vários segmentos sociais, com a finalidade de avaliar asituação da saúde, propondo diretrizes para a construção da política da saúde nos níveis correspondentes, sendo convocado pelo Poder Executivo ou de maneira extraordinária, por ela própria ou pelo Conselho de Saúde (BRASIL, 2015).

O Conselho de Saúde, por sua vez, possui caráter permanente e deliberativo, sendo composto por representantes do governo, prestadores de serviço, profissionais de saúde e usuários, o que permite que as decisões sejam tomadas por representantes de diversos segmentos. Sua atuação acontece com o objetivo de formular estratégias e controlar a execução da política de saúde na instância equivalente, de modo que as decisões devem ser homologadas pelo chefe do poder legalmente constituído em cada esfera do governo (BRASIL, 2015).

Quanto ao sistema brasileiro de saúde é imprescindível referir que a sua formação se dá por uma rede de prestadores e consumidores de serviços, competitivos entre si, que acabam criando uma combinação público privada financiada principalmente por recursos privados. Abarcando isso, o sistema de saúde apresenta três subsetores, a saber: subsetor público, subsetor privado e subsetor de saúde suplementar, como Jairnilson Paim et al, transcrevem no trecho abaixo (2015, p. 19):

O sistema de saúde tem três subsetores: o subsetor público, no qual os serviços são financiados e providos pelo Estado nos níveis federal, estadual e municipal, incluindo os serviços de saúde militares; o subsetor privado (com fins lucrativos ou não), no qual os

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serviços são financiados de diversas maneiras com recursos públicos ou privados; e, por último, o subsetor de saúde suplementar, com diferentes tipos de planos privados de saúde e de apólices de seguro, além de subsídios fiscais. Os componentes público e privado do sistema são distintos, mas estão interconectados, e as pessoas podem utilizar os serviços de todos os três subsetores, dependendo da facilidade de acesso ou de sua capacidade de pagamento.

Por meio de tudo isso, cumpre transcrever um dos maiores desafios que o SUS enfrenta atualmente, os quais são destacados pelo Ministério da Saúde (2002, p. 15):

Os maiores desafios atuais estão ligados à estruturação do novo modelo de atenção à saúde que, a partir das grandes funções da saúde pública, subordine os conceitos e programas da assistência médica individual aos preceitos e programas dos interesses coletivos e direitos da cidadania, e realize efetivamente as atividades de promoção e proteção à saúde, sob os Princípios Éticos da Universalidade, Equidade e Integralidade.

Ou seja, nesta ótica, os desafios dizem respeito a melhoria da qualidade da atenção básica de saúde, aumento da resolução de soluções da rede de Unidades Básicas de Saúde, maior garantia de acesso aos serviços de média e alta complexidade, de modo que ofereça cobertura à toda população, objetivando vencer as desigualdades de acesso atualmente existentes.

Portanto, atualmente são muitos os desafios encontrados para o efetivo acesso ao direito à saúde, sendo importante consignar que, especialmente a limitação financeira para a implementação de políticas públicas capazes de alcançar todas as necessidades relacionadas ao direito à saúde - como a concessão de medicamentos e prestação de atendimentos médicos e hospitalares adequados - o Estado não consegue atender administrativamente a todos os requerimentos da área; matéria que será aprofundada no capítulo seguinte.

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1.3 A judicialização do direito à saúde

Partindo-se da ideia de que quando se fala em Constituição, existe uma relação imprescindível com o Estado, é necessário relatar que o Direito passou por várias mutações.

Segundo o relatado por Germano A. Schwartz e Ricardo Jacobsen Gloeckner (2003), mesmo com a proliferação das Ciências Sociais, que redundaram na fragmentação da premência da lei e com a incorporação bem como esmaecimento de tantos vetores, os direitos básicos – direitos fundamentais - sobreviviam e mantinham sua importância.

Coetâneo a isso, Schwartz e Gloeckner (2003, p. 26) explicam: “Nesse diapasão, as Constituições serviram como resguardo contra quaisquer violações desses direitos, constituindo o cerne, o ponto de gravidade em cuja órbita transitavam todos os demais. ”

Feitas essas primeiras colocações, a maneira mais adequada de explicar o direito à saúde como direito fundamental e autoaplicável, é analisar a existência da fundamentalidade do artigo 6º da Constituição Federal de 1988. Nas palavras dos autores (2003, p.112): “Centra-se, no aspecto de justiciabilidade, o direito autoaplicável, como detentor de toda a gama de oportunização jurídico-constitucional de acesso ao Poder Judiciário. ”

O artigo 5º, § 1º, da Carta Magma, traz que todos os direitos fundamentais são autoaplicáveis. No dispositivo, em seu título I, centram-se no elenco: “Dos Direitos Fundamentais e Garantias Fundamentais”, e, assim sendo, o direito à saúde, elencado dentro deste, se torna consolidado como um direito fundamental e, portanto, autoaplicável (BRASIL, 2015).

Assim, estabelecendo a noção dos direitos fundamentais, ou seja, de justiciabilidade do direito à saúde, segundo Figueiredo (2007), indica para o reconhecimento de posições jurídico-subjetivas em favor dos sujeitos titulares deste

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direito. Isso é referido tanto no sentido de requerer respeito e não interferência, quanto no sentido de interpor demandas por proteção e fornecimento de bens.

Com isso, quer-se cuidar da verificação dos limites e possibilidades aos quais o direito é exigido, ou seja, capaz de se tornar eficiente e assecuratório, mesmo que para isso tenha que haver o ingresso à via judicial.

Para Germano A. Schwartz e Ricardo Jacobsen Gloeckner (2003), o sistema jurídico está relacionado com o sistema da saúde assim que o ato decisório é desrespeitado ou não efetivado, oportunidade em que, graças ao processo de comunicação dos ditos sistemas, as regras jurídicas serão analisadas pelo próprio sistema jurídico (o legitimado para tanto), o qual proferirá uma decisão.

Conforme o entendimento de Sandra Regina Vial (2012), as políticas públicas de saúde previstas na Constituição Brasileira são marcadas por expectativas que giram em torno da redução das desigualdades sociais, que vem a causar um grande impacto nas classes sociais que lutam pela concretização à saúde. Nas palavras de Vial (2012, p. 257):

No tocante ao direito à saúde, pode-se dizer que as suas expectativas normativas e a própria redefinição das funções do Estado Brasileiro, em matéria de políticas públicas de saúde previstas na Constituição de 1988, resultam de um longo período de reordenação dos processos de comunicação e das inter-relações dos diversos sistemas sociais [...]

A partir desta análise, é necessário fazer uma breve explicação sobre quem são os indivíduos envolvidos nas relações subjetivas envolvendo o direito à saúde. Assim, consta na Revista da Defensoria Pública do Estado de São Paulo (2008, p.56):

Se começarmos por nos ater a uma perspectiva interna ao sistema, recortamos, em torno do bem saúde, uma série de actores envolvidos, a saber: a) o titular do direito à saúde; b) os destinatários, não apenas os outros, mas o Estado, obrigado a um conjunto de prestações materiais e normativas, entre as quais se contam a criação de entidades responsáveis pelas esferas de prestação de cuidados e de prossecução das outras dimensões de saúde pública.

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Dessa forma, a constitucionalização da saúde como direito fundamental abriu a possibilidade de todo o indivíduo gozar deste direito, passando a ser protegido não somente pelos Entes Públicos como também por toda a sociedade, de modo que trouxe consigo uma lacuna no financiamento à saúde.

No tocante a isto, são as intruções de Vial (2012, p. 259):

A constitucionalização do direito à saúde foi uma tentativa de reduzir a complexidade, porquê, na medida em que se positiva um direito, em tese, atende-se à demanda social de redução da complexidade, mas ao positiva-lo, tem-se a complexidade aumentada, pois, a partir disso, teremos um leque de ações que se constituem obrigação para o Estado, e cria-se uma série de direitos advindos desse. Com a positivação do direito à saúde, assim como de qualquer outro direito, precisamos construir uma estrutura capaz de dar conta da concretização desse direito; temos, também a possibilidade de exigi-lo judicialmente. Ou seja, torna-se mais complexo ainda.

Insta referir, a faceta do direito à saúde – abstenção e prestação – altamente definida por Germano A. Schwartz e Ricardo Jacobsen Gloeckner (2003), configurada como um direito em que o cidadão pode exigir do Estado a sua prestação.

Consoante os autores (2003, p.94):

O Estado evita a maculação de todos os direitos fundamentais elencados como tais na Constituição, mediante uma política absenteísta. Se inevitável for a sujeição de determinado titular a certo constrangimento em seu cabedal de direitos subjetivos, sua atuação deverá ser no sentido de minimizar os riscos, reparar o prejuízo e mitigar a ação periclitante.

Por outro lado, a prestação positiva vige no intuito de conformar o ideal politogicamente constituído na Carta Magma com a realidade social, esta portentora de alto grau de reflexividade e complexidade, cujas prestações o Estado, em sua busca pelo melhoramento e mudança do status quo, visa adequar.

Mediante isso, é possível ter a garantia de acionabilidade do Poder Judiciário. Tal órgão obriga o Estado a cumprir com sua obrigação ou ainda, em alguns casos, a sua não atuação, visando sempre a certeza e segurança jurídica que permeiam o direito subjetivo (SCHWARTZ; GLOECKNER, 2003).

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Como consequência da compreensão do direito à saúde como um direito subjetivo, há a condução de uma relação jurídica obrigacional entre o Estado e o indivíduo. Sob a ótica de dois lados, tem-se o dever jurídico de fazer (prestação positiva) e de não fazer (prestação negativa) e, a opção de o sujeito decidir se vai ou não exigir o cumprimento de tais obrigações (SCHWARTZ; GLOECKNER, 2003).

A prestação ao direito à saúde assim, também intitulada como prestação sanitária, é classificada como uma obrigação positiva, especificando-se em uma obrigação de fazer (SCHWARTZ; GLOECKNER, 2003).

A partir do instante em que o Estado se oculta diante das liberdades fundamentais, fica verificada a abstenção do Estado na essência dos direitos fundamentais coletivos e individuais.

Frente a este quadro, oportuno demonstrar em números reais do CNJ, como é evidente a judicialização da saúde em todos os Estados brasileiros nos dias de hoje. Tais dados correspondem ao Relatório de Cumprimento da Resolução CNJ n. 107, que segue:

*Números fornecidos pela assessoria de imprensa do tribunal.

Fonte: CNJ - Dados extraídos do sistema de acompanhamento da Resolução CNJ n. 107, em junho de 2014.

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Com isso, resta configurada a judicialização, bem como um aumento nas demandas judiciais envolvendo a tutela jurisdicional do direito à saúde, sendo a jurisprudência uníssona quanto a responsabilidade do Estado em prestar esta garantia. No segundo capitulo assim, abordar-se-á aspectos mais específicos acerca dessa questão.

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2 A EFETIVIDADE DO DIREITO À SAÚDE

Para assegurar a efetividade do direito à saúde, existe uma divisão de competências estabelecida pela própria Constituição Federal de 1988.

De um lado, compete ao Poder Legislativo a elaboração das leis e dos regulamentos seguindo sempre o exposto na Carta Magma e a fiscalização dos atos da administração. De outro, a Carta Federal é pontual em seu artigo 196, ao determinar, lato sensu, que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios possuem responsabilidade solidária pelo financiamento das ações e serviços tangentes a saúde, uma vez que o Estado Brasileiro foi constituído sobre a forma federativa (artigo 60, parágrafo 4º, inciso I, da CF).

Schwartz (2003, p.56) assim discorre: “A feitura da legislação que disporá de maneira concreta sobre a regulamentação, fiscalização e controle, caberá à União, aos Estados e Municípios. Porém, sem a perda das garantias imiscuídas constitucionalmente que a tornam realizável”.

Originariamente, em outras palavras, compete, em todas as suas esferas, de forma comum e concorrente, ao Poder Executivo a efetivação do direito à saúde, de forma a elaborar e implementar políticas públicas e sociais necessárias.

Dentro desta perspectiva, Maria de Fatima Ribeiro (2015), relata que as discussões que giram em torno da concretização das políticas públicas que buscam garantir a efetividade dos direitos fundamentais são muitas e geram a apreciação desses direitos pelo Poder Judiciário, que reiteradamente é provocado para decidir sobre a liberação ou não de recursos públicos.

Deste modo, muito bem delineado o exposto por Schwartz (2003, p.93):

Não pode furtar-se o Estado, de se encarregar das prestações sanitárias sempre que o indivíduo se encontrar necessitado. A prerrogativa constitucionalmente arquitetada constitui, ainda, direito indisponível que, entrelaçado indecomponivelmente a outros tantos direitos fundamentais (autonomia), requer sua máxima efetividade.

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Busca-se, com isso, neste capítulo trazer quais são as principais dificuldades atualmente encontradas para o alcance de um efetivo acesso à justiça no que tange ao direito à saúde. Para demonstrar alguns aspectos desta realidade, abordar-se-á perspectivas relevantes da pesquisa realizada pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça), bem como serão apresentados dados da Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Sul.

2.1 O problema da efetivação do direito à saúde no Brasil – principais entraves para sua concretização

Com a promulgação das Leis n.º 8.080/90 e n.º 8.142/90, pode-se dizer que houveram inúmeros avanços na construção do Sistema Único de Saúde brasileiro.

Segundo o Ministério da Saúde (2002), destacam-se entre esses a descentralização da gestão, de modo a conferir maior legitimidade e realismo às decisões e permitindo celeridade nas respostas às demandas populacionais; criação e desenvolvimento dos Fundos de Saúde nas três esferas do governo; fortalecimento da rede pública de serviços de saúde em todos os níveis de complexidade, especialmente nos referentes a Saúde Básica; criação e funcionamento de Conselhos de Saúde em todos os Estados, Distrito Federal bem como na maioria dos municípios, entre outros.

Não se pode deixar de consignar ainda, o lembrado por Figueiredo (2007, p.215):

[...] a efetivação do direito à saúde tem passado pela implementação de políticas públicas de redução de custos dos remédios, inclusive daqueles chamados de “última geração”, de forma a facilitar o acesso da população, em termos de qualidade e quantidade das prestações materiais alcançadas.

No entanto, mesmo com todas estas melhorias e respaldo constitucional, no qual a saúde é posta como direito de todos e dever do Estado, ainda existe um

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longo caminho a percorrer para que se tenha a real efetividade desse direito tão fundamental e essencial.

Ainda que a política do SUS seja muito boa e disponibilize listas com o rol de medicamentos que englobam sua atuação, atualmente, grande parte da população acaba não tendo acesso ao tratamento de saúde que realmente precisa.

Na maioria das vezes, isso ocorre porque a forma administrativa dos entes públicos, não contêm ou mesmo não possui em estoque os fármacos que o sujeito necessita. Tal condição de ausência se dá tanto por falta de orçamento público, como também pelo fato de alguns medicamentos não estarem contemplados nas listas do SUS.

Neste sentido, importante trazer à tona o fato de a medicina ter avançado nos últimos anos, fazendo com que medicamentos que até pouco tempo eram recomendados para tratarem certas enfermidades, já não o são mais, o que cria uma elevada discrepância entre o que está sendo receitado pelos médicos e o que consta na lista do SUS.

Como já salientado, o direito fundamental à saúde é um dever do Estado, estando seus governantes obrigados a se responsabilizarem de tal forma, não interessando quais são os elementos imprescindíveis para a concretização da tarefa, uma vez que a Constituição Federal é de caráter vinculativo e dirigente também aos Poderes Públicos.

Esta questão prática, de aplicação e execução das políticas públicas, merece deste modo, ser mais trabalhada pelos Entes Federativos.

Verifica-se, de todo o exposto, que na atualidade há uma grande violação ao artigo 196 da Constituição Federal, como disserta Germano Schartz (2001, p. 148):

Há um flagrante desrespeito e uma facciosa não-aplicação do artigo 196 da CF/88, o direito à saúde como dever do Estado e direito de todos. Como direito social e processo sistêmico que é, a saúde depende de ação positiva estatal, de um Estado Intervencionista em sua mínima complexidade – garantidor da vida -, esbarrando em

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sistemas sociais jurídicos, burocráticos, econômicos, políticos entre outros, para sua efetivação, bem como das próprias decisões derivadas de ditos sistemas.

Concernente a estes fatos, a limitação financeira é um dos principais motivos da não efetivação do direito à saúde. No entendimento de Schwartz (2001, p. 148): “Por motivos vários, os recursos destinados à saúde são insuficientes para atender à demanda da população. Os governos optam pelo ajuste das contas públicas em detrimento dos gastos sociais. ”

Consabido a isso, disciplina Maria de Fatima Ribeiro (2015): “Com isso, é necessário verificar a possibilidade de aplicar os dispositivos constitucionais pertinentes, com vistas às ações do Estado, deliberadamente em políticas públicas, considerando a costumeira escassez de recursos. ”.

No bojo de fazer valer a pretensão obrigacional, tornando-a eficaz, não se pode, segundo Germano A. Schwartz e Ricardo Jacobsen Gloeckner (2003), aceitar a resposta de que é necessária uma dotação orçamentária prévia ao exame do caso, sob pena de estar se afetando o direito à saúde e consequentemente, mostrando uma despreocupação para com as pessoas e seus direitos humanos, de forma que para eles (2003, p.95):

Primeiramente, o Estado instituiu o mecanismo do tributo, em especial, da CPMF, destinado exclusivamente à melhoria do sistema sanitário nacional. Volvendo aos preceitos atinentes ao Direito das Obrigações, a prestação a ser adimplida pelos solvens corresponde a uma prestação sanitária, não pecuniária.

Se o Estado tem a tarefa de organização, não pode se esquivar de seu cumprimento sob o pretexto de que não existem recursos alocados em orçamento prévio, pois assim fazendo, estará infringindo os ideais de justiça social e distributiva altamente veiculados ao Estado Democrático de Direito (SCHWARTZ; GLOECKNER, 2003).

Nota-se que por consequência, o orçamento público acaba sendo o principal instrumento de efetivação das políticas públicas.

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Nesta perspectiva, surge o princípio da reserva do possível, no qual os direitos sociais a prestações materiais estão contemplados sob a reserva da capacidade financeira dos Entes. A respeito do referido princípio Mariana Filchtiner de Figueiredo dispõe (2007, p.133) que:

A reserva do possível, no que se refere ao orçamento público impõe restrições em dois sentidos: por um lado, trata da escassez dos recursos financeiros existentes, ou seja, da limitação à efetividade dos direitos sociais a prestações materiais diante da carência ou insuficiência de verbas públicas destinadas ao atendimento dessas prestações; de outro ângulo, a reserva do possível traz a lume a discussão acerca dos limites da intervenção judicial na efetivação dos direitos sociais a prestações materiais, notadamente dos direitos originários a prestações, uma vez que as decisões alocativas, pela incidência do princípio da separação dos poderes, estão precipuamente afetas à esfera de competência do Legislativo.

A reserva do financeiramente possível acaba sendo um entrave a efetividade dos direitos fundamentais. Isso porque, seria necessário respeitar as decisões orçamentárias realizadas pelo legislador, atentando-se a escassez de recursos disponíveis e a concretização desses direitos.

Segundo o artigo 36, da Lei nº 8.080/90, o processo de planejamento e orçamento do Sistema Único de Saúde (SUS) compatibilizará “as necessidades da política de saúde com a disponibilidade de recursos em planos de saúde dos Municípios, dos Estados, do Distrito Federal e da União. ” (BRASIL, 2015).

Maria de Fatima Ribeiro (2015) refere que no orçamento público devem estar especificadas as políticas públicas das esferas do Executivo, de modo que tanto este quanto o Legislativo devem ser partes presentes por meio do processo orçamentário, que inclui tanto a elaboração do plano plurianual, a lei de diretrizes orçamentárias e a lei orçamentária anual:

E, nesse contexto, destaca-se que o orçamento é o palco no qual devem estar explicitadas as políticas públicas de um Estado em um determinado momento. E, nele, o Estado, conjuntamente as funções Executiva e Legislativa devem se fazer presente via processo orçamentário, desde a elaboração do plano plurianual, passando pela lei de diretrizes orçamentárias, e com a lei orçamentária anual.

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Schwartz (2001), por sua vez, explica que o percentual de aplicação de recursos públicos na área da saúde não vem aumentando, sendo que a maioria da população ainda depende muito do Sistema Único de Saúde – SUS.

Seguindo esta temática, Schwartz (2001, p.150) ainda ensina que:

Embora legalmente injustificável, visto que as operadoras privadas de saúde devem obedecer às diretrizes do SUS, e, também, moralmente questionável, as instituições privadas recusam-se (ou procuram desculpas para tanto) a internar pacientes que não tenham seguros de saúde privados, pois é certeza de déficit devido à baixíssima contraprestação governamental.

Importante relatar também que os hospitais públicos acabam deixando os sujeitos sem alternativas, de modo a provocar imensas filas de atendimentos, sem contar os pacientes que não raramente são internados nos corredores. Tais fatos, acabam se agravando conforme o tamanho da cidade; a regra é de que quanto maior a cidade, pior o quadro (SCHWARTZ, 2001).

Ademais, conforme ensina Swchartz (2001, p. 153):

Outra realidade é a de que há remédios aos quais somente a casta de maior poder aquisitivo tem condições de compra. Isso agride a pretendida justiça social, pois não é novidade que há cidadãos que veem sua saúde prejudicada porque não possuem os meios para bancar o necessário tratamento, especialmente no que toca à compra de remédios, excessivamente caros em nosso país quando comparado ao preço dos mesmos e outras nações.

A alternativa que resta ao cidadão, frente a este quadro, é a busca de seu direito constitucionalmente garantido, através do ingresso de uma demanda na via judicial.

Corroborando com isso, ainda existem obstáculos a serem transpostos para ter-se um efetivo acesso ao justo também frente ao Poder Judiciário. Entre estes, pode-se citar as custas judiciais, a possibilidade das partes, qualidade dos serviços jurisdicionais, tempestividade da tutela pleiteada de forma processual e a sua real efetividade.

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A esse respeito, leciona Cândido Rangel Dinamarco (2009, p.117):

Mesmo quando se reduza ao mínimo suportável a chamada litigiosidade contida (Kazuo Watanabe), restam ainda dificuldades inerentes à qualidade dos serviços jurisdicionais, à tempestividade da tutela ministrada mediante o processo e à sua efetividade. Isso significa que não basta alargar o âmbito de pessoas e causas capazes de ingressar em juízo, sendo também indispensável aprimorar internamente a ordem processual, habilitando-a a oferecer resultados úteis e satisfatórios aos que se valem do processo. Um eficiente trabalho de aprimoramento deve pautar-se por esse trinômio, não bastando que o processo produza decisões intrinsecamente justas e bem postas mas tardias ou não traduzidas em resultados práticos desejáveis; nem sendo desejável uma tutela jurisdicional efetiva e rápida, quando injusta.

Partindo de tal premissa, insta entender que não basta expandir o campo das possíveis causas para ajuizamento de uma ação, pois se e se somente assim fosse, o problema que atualmente enfrenta-se não seria de tamanha grandeza e abordagem.

É indispensável assim, a aprimoração dos meios e procedimentos para a efetivação da tutela jurisdicional, de modo que ofereçam resultados mais úteis, imediatos e satisfatórios aos que buscam a efetivação do direito à saúde.

Como explanado por Dinamarco (2009), de nada adianta decisões judiciais bem justas e postas que se dão de tardiamente e da mesma forma, decisões injustas que possuem uma célere tramitação processual.

Ou seja, visto que o bem de grande relevância aqui é o direito à vida, muitas pessoas não podem aguardar muito tempo para terem a efetivação do que almejam, mesmo que a decisão no final seja a de provimento. Na maioria das vezes, as pessoas que ajuízam uma ação judicial, na qual, por exemplo, estão buscando a efetiva prestação de um medicamento por parte do ente público, necessitam de tal alcance o mais breve possível, tendo em vista que a saúde se encontra em risco e esta não espera.

Dessa forma, o acesso à justiça deve ser considerado como acesso à uma ordem justa. Não obtém esta justiça substancial quem não consegue o exame de

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suas pretensões pelo Poder Judiciário da mesma proporcionalidade que quem recebe soluções atrasadas, retardatárias ou mal formuladas. Assim, nas palavras de Dinamarco (2009, p.118): “Todas as garantias integrantes da tutela constitucional do processo convergem a essa promessa-síntese que é a garantia do acesso à justiça assim compreendido. ”

Ademais, outros fatores não podem deixar de passar despercebidos. Conforme instrui Daniel Wei Liang Wang (2009), por vezes, uma das principais linhas de pensamento que bate de frente com a justiciabilidade dos direitos sociais é aquela segundo a qual faltaria conhecimento e informação aos juízes para intervir nas políticas públicas que efetivam os direitos sociais.

Esta tese de argumentação defende que a concretização dos direitos sociais não se faz pela sua mera adjudicação, mas sim através de políticas públicas e por meio do gasto de recursos escassos (WANG, 2009).

Com isso, um Poder Judiciário que obrigue os Entes a realizarem uma política pública, estaria determinando o modo como parte dos recursos públicos escassos deveria ser gasta. No entanto, não foi e nem está treinado para tal encargo de tal forma a poder avaliar os critérios que ali estão em jogo (oportunidade e conveniência de uma política pública). (WANG, 2009).

A consequência disso, é que os juízes acabam decidindo as causas mesmo sem saber muito sobre a política pública, a condição das finanças e dos recursos governamentais (WANG, 2009).

Desta forma, para os que defendem esta corrente, a alocação de recursos escassos é ônus do processo político, que é quem tem maior clareza no tocante as prioridades para efetivá-las.

Sobre o ponto da judicialização assim, faz-se necessário refletir sobre sua equidade distributiva. Isso porque, o Judiciário é visto como a via institucional por meio da qual os sujeitos menos favorecidos podem lutar em busca do seu direito, no entanto, a atual realidade mostra que não é bem assim o que ocorre.

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Conforme preceituado por Wang (2009, p. 41):

Primeiramente porque o acesso à Justiça no Brasil, um direito fundamental constitucionalmente garantido, é restrito a uma parcela pequena da população, o que, consequentemente, faz do Judiciário uma instituição em grande parte excludente para os mais pobres também em relação à tutela da saúde. Além disso, a forma como os juízes decidem questões envolvendo direito à saúde no Brasil ignora diversos aspectos importantes para uma política pública, não dialoga com os outros poderes e, por isso, não só colabora pouco para a melhoria nas políticas de saúde para toda a população, como possivelmente traz inúmeras dificuldades para a gestão da política.

Nos dias atuais, essa problemática da equidade distributiva pode ser atribuída a falta de informação dos sujeitos das classes mais baixas e a deficiência que por vezes existe na assistência judiciária gratuita (WANG, 2009).

Ou seja, atualmente mesmo existindo o instituto da assistência judiciária gratuita para os que dela fizerem jus, as partes acabam não possuindo as mesmas condições no que toca ao alcance dos seus direitos, muitas vezes até mesmo porque nem ao mesmo têm conhecimento deles.

Assim, a cada dia que passa, os sujeitos que necessitam de um efetivo e, por vezes, rápido alcance a tal direito fundamental, passam a ter, de modo mais convicto e forte, indagações concernentes sobre qual é o custo, para quem os sistemas jurídicos realmente funcionam, o tempo de espera por sua possível concretização e até que ponto vale a burocrática busca pelo que se almeja.

Isso porque, por diversas vezes, os cidadãos se veem diante de situações muito delicadas no que toca a sua saúde, de forma que mesmo existindo todo um amparo constitucional, a fim de proteger e garantir esse direito fundamental, não alcançam de forma efetiva seu direito. Ou seja, quando mais necessitam, acabam não encontrando uma justa prestação jurisdicional, seja porque a forma judicial vem se tornando cada vez mais burocrática, por vezes faltando até mesmo celeridade processual, ou até mesmo porque a prestação a eles é inacessível.

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