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Configurações do processo de envelhecimento no ocidente

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL – UNIJUÍ / FIDENE

DEPARTAMENTO DE HUMANIDADES E EDUCAÇÃO – DHE CURSO DE PSICOLOGIA

ANDRESSA DO NASCIMENTO NORO

CONFIGURAÇÕES DO PROCESSO DE ENVELHECIMENTO NO

OCIDENTE

Ijuí 2015

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ANDRESSA DO NASCIMENTO NORO

CONFIGURAÇÕES DO PROCESSO DE ENVELHECIMENTO NO

OCIDENTE

Trabalho de conclusão de curso

apresentado como requisito parcial para conclusão do curso de formação de Psicologia.

Orientador: Daniel Ruwer

Ijuí 2015

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Dedico este trabalho à minha mãe Fátima Nascimento pоr sua capacidade de acreditar em mim е investir em mim. Seu cuidado е dedicação foi que deram, em

alguns momentos, а esperança para

seguir. Dedico também ao meu pai Nelci Antônio Noro (in memoriam), que hoje não está mais presente mas, contribuiu

para o desenvolvimento do meu

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AGRADECIMENTOS

Aos meus pais Fátima do Nascimento e Nelci Antônio Noro (in memoriam) pelo apoio, incentivando-me a crescer na vida pelos estudos e possibilitando a minha graduação em Psicologia.

Aos meus familiares, por compreenderem que nem sempre pude estar presente em suas vidas.

Ao meu namorado Ricardo Jappe, pela paciência e apoio tanto nos momentos de tensão como nos de alegria.

Às amigas Jaqueline Piccoli, Bruna Pereira, Andrieli Sehnem, Amanda Schmalz, Vanessa Martins e Jéssica Niedvetzki pela amizade de longa data e por entenderem que nem sempre pude estar presente em suas vidas.

Ao meu orientador Daniel Ruwer, pelas contribuições que fizeste para uma escrita tranqüila.

Aos professores do Curso de Psicologia que contribuíram para meu maior conhecimento, em especial Nilson Heidemann e Elisiane Schonardie, esses que puderam me acompanhar em meus dois estágios de ênfase e me orientar para o desenvolvimento do meu potencial dentro da área Clínica e Educacional.

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“Saber envelhecer é a obra-prima da

sabedoria e uma das mais difíceis

tarefas na grande arte de viver.”

(Henri Amiel)

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RESUMO

O presente trabalho tem o objetivo de fazer uma reflexão a cerca do envelhecimento na cultura contemporânea e de suas repercussões no sujeito que o vivencia. Procura também, entender o olhar sobre o envelhecimento no processo histórico desde as sociedades antigas até a contemporânea e de como este se modifica com a criação de instituições asilares e outros meios de convivência para o idoso. Apresenta o envelhecimento como um processo social. Discute as questões culturais e econômicas que influenciam na compreensão do envelhecimento na atualidade e debate o envelhecimento em suas perspectivas psíquica e social. Indaga o papel social do idoso na atualidade e de como ele pode inserir-se nela já que é uma sociedade que valoriza aquilo que é jovial. Aborda, por fim, os conflitos que se passam nesse momento vivenciado pelo sujeito.

Palavras-Chave: Envelhecimento; Contemporaneidade; Processo Social; Asilamento.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 7

1 A HISTÓRIA DA VELHICE NA CULTURA OCIDENTAL ... 9

2 A VELHICE NA CONTEMPORANEIDADE ... 22

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 34

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INTRODUÇÃO

O envelhecimento mobiliza no sujeito a emergência de uma série de questões e emoções que são despertadas por esse processo. Na maioria das vezes conseguimos ver apenas o outro envelhecer e não nos deparamos com a nossa velhice. No campo da psicologia encontramos diversos estudos desenvolvidos sobre essa perspectiva da velhice apontando a negação do sujeito frente à imagem que vê e que a sociedade lhe devolve. Se formos analisar, no ponto de vista do psíquico, o velho sempre será outro, que não é ele próprio.

Entretanto, ao analisar detalhadamente o processo do envelhecimento, nos deparamos com as questões sociais, culturais e econômicas de cada época que, favorece ou desfavorece cada sujeito que está passando por esse momento da vida. Envelhecer nada mais é que um processo natural na vida de cada ser humano porém, não são todas as pessoas que conseguem suportar e passar tranquilamente por essa fase.

Através da história podemos relembrar como se dava a passagem do sujeito pelo envelhecimento e de como isso se modificou. Antigamente o envelhecimento era visto como algo bom pois, o quanto mais velho, ele ficaria mais sábio. Também, ele era o responsável por passar as tradições e os costumes de geração para geração. Mas, conforme as modificações ao longo dos anos, tanto sociais, culturais e econômicas, o idoso perde esse espaço que ele ganhou em sociedade.

Estar envelhecendo já não significa mais ser sábio. Envelhecer é algo que causa horror as pessoas, principalmente para aquelas que vêem de fora e que ainda não passaram por essa experiência de vida. O idoso acaba sendo excluído dessa sociedade que o rejeita e ele nada mais teria que procurar novos lugares de reintegração e de inclusão.

Na tentativa de melhorar não somente a qualidade de vida dos idosos como também os cuidados básicos para sobrevivência, criam-se os asilos. Os velhos de hoje são jogados nesses asilos como se lá eles fossem achar o que procuram sem passar nenhuma necessidade, mesmo sendo emocional. O grande problema é que, não importa quantas instituições criem para o acolhimento desses idosos mas sim, se é confortável para ele deixar da vida privada para conviver em grupo, perdendo sua privacidade e compartilhando tudo.

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Fica evidente que o envelhecimento é um processo social e que não depende apenas do sujeito que envelhece para ser um momento tranquilo e feliz da vida. Há também, várias indagações sobre o envelhecer na vida de cada ser humano pois, ele não afetará somente a parte do biológico, a do orgânico, como também, na área emocional, motora e de pensamento.

Por isso que é muito importante que estudemos como se dá o envelhecimento para cada sujeito pois, ele toca de formas diferentes para cada um pois, é singular, uma experiência própria. É de forma crucial que devemos entender esse processo de envelhecer pois, são várias as áreas de conhecimento que necessitam aprofundar seus estudos frente ao sujeito que envelhece, podendo assim então, compreender alguns sintomas que aparecem e que não se dão apenas pelo orgânico mas também, pelo psicológico.

Para o aprofundamento do debate destas questões, desenvolvemos o presente trabalho em uma perspectiva interpretativa, tomando obras referenciais deste campo para realizamos nossa revisão bibliográfica. Assim nos dedicamos a algumas obras que nos relatam a história da velhice, entre elas temos A Velhice (1990), escrito por Simone de Beauvoir, onde é relatado como era vista a velhice desde a Grécia Antiga até os dias atuais. Outra obra importante e que nos relata também sobre o envelhecimento na contemporaneidade e que faz um estudo sobre o asilamento, é A Reinvenção da Velhice (1999), obra essa escrita por Guita Grin Debert e que relata as modificações culturais que influenciam para a elaboração da velhice. O Sujeito Não Envelhece – Psicanálise e Velhice escrito por Ângela Mucida, por sua vez, nos oferece um olhar psicanalítico sobre o envelhecimento como também, as questões culturais e sociais que se interligam para explicar como se dá o envelhecer.

Para abordarmos os aspectos mencionados com maior clareza, dividimos nosso trabalho de pesquisa dois capítulos. No primeiro apresentamos questões concernentes à evolução histórica do envelhecimento na cultura ocidental, para, no segundo, pensarmos as modificações que a contemporaneidade produziu frente ao que era conhecido como envelhecimento e suas consequências.

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1 A HISTÓRIA DA VELHICE NA CULTURA OCIDENTAL

O conceito de velhice vem sendo modificado ao passar da história. Para entendermos melhor o assunto, precisamos situar o significado de três palavras que são essenciais para o desenvolvimento desse trabalho: Envelhecimento, envelhecer e velho.

Segundo o dicionário Aurélio, Envelhecimento significa ato ou efeito de envelhecer. Mas então o que seria envelhecer? Envelhecer significa fazer ou fazer-se velho; chegar a velho ou melhor ainda: tornar-fazer-se desusado. Já a palavra Velho para esse mesmo dicionário tem vários significados, entre eles: homem velho; Pai; Avançado em idade; Obsoleto; Antigo; Muito usado (antiquado); O pai e a mãe; Em descanso.

Há várias questões que são consideradas importantes para entendermos o processo do envelhecimento, como por exemplo, as questões socioeconômicas, socioculturais, psicossociais e biológicas pois, elas interferem na vida dos sujeitos. Alguns estudos feitos por Guita Grin Debert em sua obra A Invenção da Velhice (1999) nos confirmam que para falarmos de velhice, precisamos pensar em várias mudanças que tem ocorrido nos últimos anos frente ao que é visto do velho, no campo social ou cultural.

A Grécia antiga teve um grande papel e influência para o desenvolvimento do pensamento da cultura ocidental e por isso, é importante que a mencionemos para explicar a história da velhice. Simone de Beauvoir em seu livro A Velhice (1990) faz um grande apanhado histórico de como a velhice era vista nas sociedades antigas. Nelas, nota-se o quanto o velho era colocado em um lugar daquele que “possuía o saber” e que, teria privilégios por possuir uma vasta experiência de vida. Os mais novos eram considerados inúteis perto dos mais velhos pois, esses não possuíam experiências o suficiente para assumir papéis importantes na sociedade.

A partir da constituição da Polis Grega, ser velho significava ter uma grande qualificação para assumir grandes cargos. O idoso assumia um papel importante somente pelo seu saber e não por sua capacidade física pois, essa não era venerada pelo povo grego, ela até era criticada pelos grandes poetas, considerada como uma fase da vida de sofrimento e de pouca realização de desejos e vontades.

Beauvoir (1990, p.112) ao mencionar Confúcio, nos diz que antigamente a família era a base das relações e que toda a casa devia obediência ao homem mais

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idoso. Ou seja, os filhos deveriam obedecer ao pai e ele, tinha um total controle sobre a vida dos mesmos como também, o de sua esposa. Podemos perceber isso até hoje como em algumas culturas, os casamentos dos filhos são arranjados pelo pai, submissos ao desejo dele de casar-se com alguém digno e que pudesse desempenhar um papel importante para a família, ou em alguns casos, que trouxesse riqueza e poder para ela.

Segundo Homero, a velhice está associada à sabedoria, e é encarnada em Nestor, o conselheiro supremo; o tempo lhe conferiu a experiência, a arte da palavra, a autoridade. Entretanto, ele aparece como fisicamente enfraquecido. E não é ele quem assegura aos gregos a vitória. Só um homem na força da idade seria capaz de inventar um artifício mais eficaz do que todas as táticas tradicionais (BEAUVOIR, 1990 p. 122).

Entre os principais livros sobre o envelhecimento destaca-se o de Ângela Mucida O Sujeito não envelhece – Psicanálise e Velhice. Nele ela nos coloca como a velhice era representada na Grécia Antiga:

Na Grécia antiga, a velhice é em geral associada à honra: Gera e Géron são palavras que designam a idade avançada e também o privilégio da idade, o direito a ancianidade e à deputação. Para Homero, ela é associada à sabedoria. Contrastando-se a tal ideia, bastante presente nas cidades antigas, encontra-se também o horror, cantado em verso e prosa por diferentes poetas para os quais a perda de força física, mudanças da imagem, perda de poder são associadas à velhice. (MUCIDA, 2014, p.68).

A mulher idosa também ocupava um lugar importante na sociedade pois, por ela possuir grandes conhecimentos de vida e ter criado e educado seus filhos, tinha influência também na criação de seus netos. Em oposição, em algumas culturas a mulher depois de certa idade não teria mais a mesma posição social, identificando-as identificando-assim, como bruxidentificando-as por terem uma aparência muito cruel.

Na Idade Média, nota-se um crescente ódio pelas mulheres idosas pois, geralmente nessa época as pessoas não duravam mais do que 30 anos. Na renascença por volta do século XVI, surgem alguns textos referidos a beleza da velhice, que mesmo ao elogiar essa fase da vida, descreve a mulher idosa como algo repugnante (MUCIDA, 2014 p.69).

O folclore alemão também nos deixa algumas representações do velho, em especial feita pelos irmãos Grimm. Ao mesmo tempo em que eles colocavam o velho na posição de sábio e experiente, também o consideravam uma lástima da vida

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humana. Entre os contos dos irmãos Grimm, destaca-se os que envolviam a mulher velha

Nestes contos, a mulher velha – cuja feminilidade já a torna suspeita – é sempre um ser maléfico. Se alguma vez pratica o bem, é que, na verdade seu corpo não passa de um disfarce (...) As verdadeiras velhas são – como nos poetas latinos – fêmeas de ogros, feiticeiras malvadas e perigosas (BEAUVOIR, 1990 p.168).

Na alta Idade Média, os velhos foram mais ou menos excluídos da vida pública: os jovens conduziam o mundo. Dividida, conturbada, ameaçada, guerreira, a sociedade era regida bem mais pelo acaso das armas do que por instituições estáveis. O homem experiente tinha aí muito pouco espaço (BEAUVOIR, 1990 p. 157 e 159).

Para Mucida (2014, p.66), em algumas culturas o idoso possuía poderes extras que lhes era conferido pela idade, podendo assim, utilizá-los contra os outros, passando a serem representados por ameaça e temor.

Conforme as mitologias gregas, a velhice era tratada sob o ângulo do conflito das gerações pois, encontra-se na história inúmeros ecos dos conflitos que opuseram os jovens aos anciãos, os filhos aos pais. A ideia de honra foi ligada a velhice. A velhice era, portanto, em muitas das antigas cidades, uma qualificação. (BEAUVOIR, 1990 p. 118, 119, 121 e 123).

Nessas sociedades, a velhice era considerada como uma categoria social pois, ao mesmo tempo em que o idoso tinha grande importância para as decisões que eram tomadas dentro de casa, eles podiam também envolver-se com papéis jurídicos e políticos pois, tinha grande influência nas decisões tomadas pelo chefe da Polis.

Para Ângela Mucida

É interessante observar ainda que o conceito de velhice só surge após a revolução industrial, até então privilégio dos ricos, pois os integrantes das classes mais pobres só raramente atingiam a idade avançada. A partir de então, surgem os velhos pobres em contraposição aos velhos ricos e o destino de uns e de outros não é o mesmo (MUCIDA, 2014, p. 70).

Pensar que a velhice antigamente dava-se somente para os que possuíam o poder demonstra o quanto alguns sujeitos eram suscetíveis as questões econômicas que eram colocadas naquela época. Na contemporaneidade, nota-se que há uma

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grande decadência no interesse pela velhice e que é crescente os meios para que possa esconder as marcas da idade.

Alguns dados apontados por Debert (1999, p. 14), nos mostra que a partir da segunda metade do século XIX, a velhice é tratada como uma etapa da vida caracterizada pela decadência física e ausência de papeis sociais. O avanço da idade como um processo contínuo de perdas e de dependência – que daria uma identidade de condições aos idosos – é responsável por um conjunto de imagem negativas associadas à velhice, mas foi também um elemento fundamental para a legitimação de direitos sociais, como a universalização da aposentadoria.

Ainda citando Debert:

A nova imagem do idoso não oferece instrumentos capazes de enfrentar a decadência de habilidades cognitivas e controles físicos e emocionais que são fundamentais, na nossa sociedade, para que um indivíduo seja reconhecido como um ser autônomo, capaz de um exercício pleno dos direitos de cidadania. (DEBERT, 1999, p. 15)

Em vários países, como por exemplo o Brasil, criaram-se programas de inclusão do idoso para que vá para além de uma socialização deste indivíduo, levando-o a expressar-se e criar vínculos com outros sujeitos que se encontram em sua mesma posição. Para Debert

As novas imagens e as formas contemporâneas de gestão da velhice no contexto brasileiro (...) são ativas na revisão dos estereótipos pelos quais o envelhecimento é tratado, desestabilizando imagens culturais tradicionais. (DEBERT, 1999, p.65)

Diferente dos povos antigos, a contemporaneidade tem tentado ver o envelhecimento com outros olhos ou seja, ver então, essa fase da vida como algo natural da vida do ser humano e que poderá trazer danos ao sujeito como em qualquer momento ou idade.

Mesmo podendo refletir todas essas questões positivas sobre o envelhecer, a história nos mostra o quanto a religião influencia em questões culturais frente ao envelhecimento. Com a criação do cristianismo, se começa a pensar diferentemente dos antigos, colocando o velho num lugar obscuro pois aí, o sujeito já não teria tanta consciência de seus atos como quando mais jovem.

Os poderes passam de pai para filho e a figura central do cristianismo seria então Cristo. Para Simone Beauvoir (1990, p. 165-166), esta supremacia do filho

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sobre o pai afirma-se cada vez mais a partir do século XI, representada nas pinturas, destronando assim cada vez mais o Pai, em benefício do Filho.

Nesse período, mesmo entre os mais ricos, ser velho acabava com a vida ativa do homem pelo declínio físico que eles apresentavam, chegando assim à aposentadoria. Os velhos não tinham lugar na sociedade por serem considerados fracos.

Nessa mesma época, a infância não existia pois, as crianças eram obrigadas a crescerem tendo assim, que trabalhar com seus pais nas lavouras, sujeitando-se assim ao aprendizado militar, os colocando em uma posição de pequenos adultos. Durante esse período, os jovens continuam a conduzir o mundo (BEAUVOIR, 1990 p. 163). Podemos observar que nesse período tanto mulheres quanto homens, não duravam por muito tempo.

Um papel que foi muito importante com o passar dos anos foi o de doge, quem exercia um poder quase absoluto na república, pois, o velho era considerado a melhor pessoa para exercer essa função:

Ninguém era mais apropriado do que um velho para preencher essa função; enfraquecido pela idade, prisioneiro de antigos hábitos, podia renunciar mais facilmente do que um jovem a tomar qualquer iniciativa, e a satisfazer-se com as aparências da grandeza (BEAUVOIR, 1990 p. 164).

Voltando a Idade Média, nota-se o quanto a velhice era vista como desvantagem para os humanos pois, o tempo nada mais levaria ao sujeito a uma decadência, chegando assim, à morte. Em Beauvoir (1990, p. 174-175), ao fim da Idade Média, a vida permanecia precária e a longevidade, rara. Entretanto, a sociedade evolui, a burguesia prospera e a última idade aparece essencialmente como o tempo em que nos preparamos para a morte.

Com o surgimento da renascença, prolonga-se as tradições da Idade Média, pretendendo-se assim que o velho encontre a recompensa na saúde e na serenidade da última idade. Contudo nota-se uma diferença entre a Idade Média e a Renascença

A Idade Média desprezava o farrapo humano: julgava-o particularmente repugnante entre as pessoas idosas. A Renascença exalta a beleza do corpo; o da mulher era posto nas nuvens. A feiúra dos velhos só pode parecer mais detestável ainda. (BEAUVOIR, 1990 p. 182-183).

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Nota-se o grande preconceito e repugnância pelas mulheres idosas cada vez mais. Nessa época era prazeroso humilhar a mulher velha comparando-a as jovens. Beauvoir (1990, p. 185) até se questiona se os grandes poetas possuíam um ressentimento sexual por desprezar tanto assim a velhice e principalmente as mulheres idosas. Mesmo assim, indiferente ao sexo, o envelhecimento causava repulsa à literatura e apenas quem era rico poderia possuir a graça e gozo de ser velho.

Os homens velhos causavam repulsa aos jovens pois, usavam de seu dinheiro para presentear ou comprar jovens mulheres, os deixando assim com ódio daquele que possui algo que deveria ser só dele.

Na Renascença, percebe-se que nas imagens populares, a comparação entre as diferentes idades e os momentos do ano tornou-se um clichê. Um calendário da época ilustra os meses com cenas da vida em família. Nessas gravuras, não se trata de descrever-se a vida humana tal como ela se desenrola na sua realidade contingente, mas de fixar uma espécie de arquétipo da existência do homem. Entre os quadros da Renascença, contam-se inúmeros retratos de velhos. Eles tem características muito diferentes, segundo as circunstancias. Na época, velhos ricos e venerados têm orgulho de sua velhice. (BEAUVOIR, 1990 p. 198-199).

O grande significado de ser velho, era possuir barba e cabelos brancos. Entre as literaturas, destaca-se Shakespeare que sempre colocou a velhice numa posição de declínio, sendo ele triste e amargurado.

Em Beauvoir (1990, p. 206), nota-se que no século XVII, os jovens conservam a realidade do poder. Mas, com a contrarreforma dota-se os papas de um grande prestígio por causa de seus costumes, ou seja, a idade seria contribuinte para praticar a virtude. Os papas quase sempre foram muito idosos nessa época.

Já na França, o século XVII foi muito duro para os velhos. A sociedade era autoritária e absolutista. Os adultos que a regiam não abriam espaço para os indivíduos que não pertenciam à mesma categoria que eles: velhos e crianças. A média de vida era de 20 a 25 anos. Aos 50 anos não se tinha mais lugar na sociedade (BEAUVOIR, 1990, p. 206-207).

Outros dois pensadores que foram de grande importância para reflexões frente a velhice foram Platão e Aristóteles mesmo, obtendo conclusões divergentes.

Platão por exemplo, julgou que a alma pode explorar o corpo em seu benefício sem, no entanto, ter a necessidade dele. As decadências da idade não

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atingem o corpo e até mesmo, se os apetites e o vigor do corpo decrescem a alma fica mais livre dele (BEAUVOIR, 1990 p. 135). Então para ele, todo esse processo de envelhecimento nada tem a ver com o corpo mas sim, com a alma.

Já para Aristóteles, é preciso que o corpo permaneça intacto para que a velhice seja feliz. O declínio do corpo acarreta o indivíduo inteiro. Sua concepção da velhice leva Aristóteles afastar do poder os idosos, por ver neles indivíduos enfraquecidos (BEAUVOIR, 1990 p. 136-137).

A partir de Platão e Aristóteles, podemos pensar que para o idoso atravessar essa etapa da vida, ele não somente acarretará mudanças em seu corpo pelos anos vividos mas, também em seu pensamento e alma. Essa é a questão que nos leva a pensar que mesmo o idoso sabendo que estar em um processo de envelhecimento pode acarretar mudanças físicas, ele necessita elaborar algumas questões que se referem a esse corpo que ele adquiriu com o tempo e que pode causar vastos tipos de sentimentos.

Se formos pensar pela questão orgânica, a velhice nada mais seria que um severo declínio das funções do corpo como também da estética corporal. Mas nos dias atuais, percebemos que cada dia mais o velho quer manter uma boa aparência e recorre ao consumismo para poder preencher essa necessidade.

Para alguns, a velhice é marcada pela fase da vida em que se perde o desejo por objetos e pessoas, onde há uma grande queda de investimento seja ele emocional como também, libidinal. Nada faria mais sentido para ele e pensaria somente em ser inutilizável para algumas ações em sua vida.

Com essa perda de investimento, percebe-se que o meio social em que ele vive também se modifica. Seus amigos e familiares já não possuem o mesmo interesse pelo idoso. Muitas vezes, esses sujeitos acham melhor que o idoso fique em lugares que ele se identificaria, colocando-os assim em asilos ou casas de repouso.

Ao mesmo tempo em que o idoso tenta aceitar sua velhice e encaixar-se ao contexto em que vive, a sociedade tenta colocá-lo em outro lugar, quase sempre reafirmando seu envelhecimento.

No Brasil, é considerado idoso quem possui 60 anos de idade ou mais. Existem vários privilégios para esses sujeitos, que são definidas no estatuto do idoso, lei essa constituída em 2003. Como exemplo temos, atendimento preferencial, estacionamento de carro para idoso, banco especial nos transportes coletivos, entre

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outros. Ao mesmo tempo em que isso é visto por um ângulo positivo, cabe-nos pensar se ser privilegiado é o que o idoso gostaria para si pois, sempre esteve em uma posição de quem governava ou tomava decisões importantes tomando hoje, uma posição mais passiva do que ativa.

Atualmente o idoso não ocupa o mesmo papel social que ele ocupava pois, ele não convivem mais com a família ou possui grande influência para esta. O velho não é mais visto como aquele que possui conhecimento e que deve passá-lo de geração para geração mas sim, aquele que causa “incômodos”, em uma sociedade onde os jovens ganham um espaço social muito maior do que eles.

Percebemos como isso mudou conforme o passar dos anos até mesmo na política. Antigamente mulheres e adolescentes não podiam votar, já hoje, adolescentes de 16 anos possuem esse mérito. Eram somente os homens que podiam candidatar-se para qualquer cargo político. Segundo a justiça eleitoral do Brasil, qualquer pessoa a partir dos 18 anos pode candidatar-se vereador e aos 21, pode ser votado como deputado federal, estadual, distrital, prefeito, vice-prefeito e juiz de paz. Aos 30 anos, pode ser eleito à governador e vice-governador. E então aos exatos 35 anos, qualquer sujeito pode ser votado para presidente e vice-presidente da República e também, para senador.

Com essas mudanças dos papéis sociais do idoso, cabe-nos pensar qual posição ele possui na sociedade, esta que hoje, já não é a mesma e que se modificou com o passar dos anos conforme as questões culturais e econômicas.

Em relação as questões econômicas, por volta de 1603 na Inglaterra, notava-se um grande crescimento da população pobre e que viviam na miséria. Naquela época a rainha Elizabeth era quem governava o país e com isso, surgiu a ideia de criar uma lei que favorecesse os pobres que, “durante os primeiros quarenta anos do século XVII, diversas instituições de caridade tentaram paliar essa dureza; asilos e hospitais foram fundados” (BEAUVOIR, 1990 p. 218).

Nessa época, era muito importante que as pessoas trabalhassem pois se não, viveriam na miséria. Só era pobre quem tinha preguiça de trabalhar. Os velhos que não tinham condições, morriam porém, na burguesia ocorria tudo diferente pois, a velhice era valorizada:

(...) Na Idade Média, a família enquanto tal não era idealizada: ela o foi nas classes médias, entre as quais foram recrutados os puritanos. O avô era símbolo e a encarnação da família: era respeitado. Já no século XVI, os

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pais exigiam de seus filhos uma estrita obediência; os casamentos lhes eram imposto (...) No teatro elisabeteano viam-se os jovens lutarem pela liberdade da escolha matrimonial. (...) Em 1606, a convenção anglicana adotou a ideia de um francês, Bodin, de quem se acabara de traduzir a obra: os pais devem ter direito de vida e de morte sobre seus filhos. (BEAUVOIR, 1990 p. 218-219).

O governo naquela época, reconhecia o idoso e o colocava como autoridade. Eles deveriam ser um exemplo aos mais jovens para que um dia eles o pudessem imitar. Hoje encontramos poucas pessoas que querem seguir os passos de seus ancestrais e poucos jovens tem a imagem do idoso como algo a “se seguir” para seu futuro. Podemos perceber que nas peças comediantes sobre a luta dos jovens pela liberdade, “encontram-se ilustrado vários conflitos que se colocavam entre as gerações” (BEAUVOIR, 1990 p. 220).

A partir do século XVIII nota-se uma grande mudança na população européia:

A população cresce e rejuvenesce graças a uma melhor higiene (...) A melhoria das condições materiais favoreceu a longevidade. Muito raros antes de 1749, os homens de 80 anos e mesmo os centenários multiplicaram-se. Entretanto, este progresso só se faz sentir nas classes privilegiadas”. O século XIV foi marcado pelo sustento que a família poderia dar ao idoso, caso essa não o fizesse, ele apenas poderia contar com os auxílios que lhe passava a Igreja (BEAUVOIR, 1990 p. 221-222).

Beauvoir nos coloca que na França em meados do século XVIII,

O homem idoso adquire mesmo uma importância particular, porque simboliza a unidade e a permanência da família: esta última, através da transmissão das riquezas, permite a acumulação dos bens materiais (...) Ao envelhecer, o chefe de família permanece detentor de suas propriedades, e goza de um prestigio econômico; o respeito que ele inspira reverte-se de uma forma sentimental (...) Há uma preocupação complacente com os fracos: a criancinha e o idoso (1990, p. 224-225).

Através desse apanhado histórico, nota-se que a velhice na sociedade de hoje é demarcada por várias questões que já não envolvem puritanismo e muito menos transmissão de conhecimentos. O idoso é reconhecido apenas pelo seu estatuto, ainda mais que isso: quem reafirma e é aliado a essa imagem colocada sob o velho na sociedade de hoje são os sujeitos que nela vivem.

Na contemporaneidade, nota-se que o valor do sujeito é demarcado por algo que é do corpo, ou seja, tudo aquilo que lhe é dado para trabalho, necessita-se de um esforço físico. O que também se deve manter-se são é o pensamento pois, dependendo do tipo da profissão dos sujeitos, necessita-se de uma grande capacidade mental para resolver e ajustar algumas situações. Ou seja, nada seria

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mais frustrante do que uma pessoa não conseguir trabalhar por decadência física ou mental. Todo aquele sujeito que está incapacitado desses dois tipos de esforços é irreconhecível aos outros, tratando-o assim como um estranho.

O velho então, se encaixaria nesse “estranho” que a sociedade não reconhece pois, atualmente ele é visto como alguém que não faz mais nada, ou seja, que é inutilizável. Essa exclusão do velho, faz com que os sujeitos não sejam recíprocos aos seus sentimentos. O adulto o coloca assim, em uma posição de passividade sempre tentando reafirmar sua inutilidade, como se eles fossem inferiores as outras faixas etárias. Segundo Beauvoir

É de maneira dissimulada que o adulto tiraniza o velho que depende dele. Não ousa abertamente dar-lhe ordens, pois não tem direito a sua obediência: evita atacá-lo de frente, manobra-o (...) O velho não fará mais que descer em direção à decrepitude e à morte; não serve para nada. Puro objeto de incomodo, inútil, tudo que se deseja é poder tratá-lo como quantia desprezível. (BEAUVOIR, 1990 p. 268)

Ainda em Beauvoir (1990, p.268), “queremos que os velhos se conformem à imagem que a sociedade faz deles. Impomos-lhes regras com relação ao vestuário, uma decência de maneiras, e um respeito às aparências”. Nota-se então que muitas vezes as pessoas não se flagram que estão reafirmando essa posição social que o velho é colocado pois, fazem comentários desnecessários frente a imagem desse, como um exemplo as mulheres: “você não acha que já passou da idade de usar saia curta?”.

Isso nos faz pensar na repulsa que a imagem do velho, causa nos mais jovens. É muito difícil que alguém goste da imagem de um corpo envelhecido, a não ser que tenha alguma ligação sentimental com essa pessoa. A sociedade então, através de todo esse horror ao envelhecimento, interessa-se nele somente como um objeto de exploração como nos diria Beauvoir: “Nos EUA sobretudo, mas também na França, multiplicam-se clinicas, casas de repouso, residências e até mesmo cidades e aldeias, onde se faz as pessoas idosas que dispõem de meios pagarem o mais caro possível por conforto e por cuidados que freqüentemente deixam muito a desejar” (1990, p. 269).

A expectativa de vida tem aumentado desde a Antiguidade. Foi a partir do fim do século XVIII na França, que o envelhecimento da população começou e pouco mais tarde, produziu-se em outros lugares do mundo. A partir desse século, a

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proporção dos velhos na população dobrou. É na França e na Suécia que o envelhecimento da população é mais acentuado (BEAUVOIR, 1990 p. 272). A partir disso, na democracia capitalista, cabe ao governo tomar decisões frente ao idoso pois, segue-se um estatuto criado para o beneficiá-lo. Com o aumento da população idosa, cresce o número de desempregos, estes ocorridos a partir do século XIX pois, o velho já não tem a mesma capacidade física que antes então, deve-se substituí-lo por alguém com mais força já que antigamente, geralmente os trabalhos exigiam esforços físicos principalmente aqueles que se davam nas áreas rurais.

Em Beauvoir

Compreendemos que a pensão foi, a princípio, concebida como uma recompensa. Desde 1796, Tom Paine sugeria recompensar com uma pensão trabalhadores de 50 anos. Na Bélgica, na Holanda, pensões foram concedidas no setor público, a partir de 1884. Na França, no século XIX, os militares e os funcionários públicos foram também os primeiros a receber pensões; o Segundo Império concedeu-as, em seguida, aos mineiros, aos marítimos, aos operários dos arsenais e aos ferroviários. Considerava-se que elas recompensavam, em profissões perigosas, um longo período de leais serviços. A concessão dessas pensões tornou-se organizada e habitual, com duas condições: longos anos de trabalho e uma idade determinada. (BEAUVOIR, 1990, p.274)

A partir dessa data, começa-se a pensar a questão da aposentadoria, se ela deveria ser somente para aqueles que se esforçaram por muitos anos no trabalho duro ou também, para os que necessitavam de um suporte econômico para sobrevivência a partir da idade que o sujeito era considerado idoso em cada país. Assim, a velhice foi até considerada como uma invalidez e por isso, tinha direito a pensão e aposentadoria.

(...) toda essa discussão seria ociosa se o aposentado recebesse uma pensão confortável. Deveríamos, então, felicitar-nos pelo fato de se conceder a ele o mais cedo possível o direito ao descanso. Dada à miséria à qual é condenado sua dispensa aparece mais como uma negação do direito ao trabalho (...) As razões são essencialmente históricas. (BEAUVOIR, 1990 p. 286-287).

Com todas essas questões voltadas a pensão, aposentadoria e também frente a imagem que a sociedade enxerga do velho, pertence a nós questionar se é confortável essa posição que o colocamos pois, muitas vezes algumas pessoas não estão preparadas para envelhecer ou não assumem seu avanço de idade. Tem

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muitos idosos hoje em dia, que não se sentem velhos, e também, há jovens que se sentem anciãos. Afinal, quando se fica velho?

Segundo Mannoni (1995, p. 16) “a velhice nada tem a ver com uma idade cronológica. É um estado de espírito. Existem “velhos” de 20 anos, jovens de 90”. A aposentadoria pode até demarcar o envelhecimento e o fim da vida ativa mas, não devemos levar em consideração apenas os aspectos sociais e biológicos pois, cada sujeito possui uma subjetividade que o difere dos demais e que pode fazer questão ao estudarmos o envelhecer. Por isso, que muitas vezes um velho não se sente velho pois, geralmente a velhice implica para aquele que a vê de fora.

É difícil para alguns jovens e adultos aceitarem que esses velhos não querem estar nessa posição que eles demandam que ele esteja, fazendo com que assim seja complicado conviverem no mesmo teto. Ao mesmo tempo em que quem convive com o idoso, vive reforçando sua posição passiva e decadente, vê-se uma dificuldade em conviver com aquele que representa a imagem do que ele um dia será.

A partir disso, o idoso é colocado em asilos e casas de repousos pelos seus filhos e familiares, pelo horror que aquela imagem representa a esse que não é capaz de aceita-la como também, por pensar que estar idoso, é estar na pior fase da vida, ou seja, aquela que recebe um carimbo cultural de morte.

Com o avanço da idade, o idoso necessita de alguns cuidados básicos para sobrevivência e muitas vezes ele mesmo não consegue fazê-los, necessitando da ajuda do outro. Questiono-me até que ponto o idoso quer esses cuidados pois, mesmo sabendo que necessita-os, sente-se muito mal por precisar dos outros para isso. E hoje em dia é o que mais escutamos das pessoas que estão envelhecendo... Falas que muitas vezes nos deixa a pensar em que lugar esse sujeito quer estar e que não o deixam estar: “Eu não preciso de ninguém”, “Eu tenho pés e mãos para quê?”, “Eu posso fazer sozinho”, “Não necessito de ajuda”.

Através desse assunto, abre-se várias portas para estudo, que comprovam cada vez mais que as questões do envelhecimento não se colocam meramente ao estudo da biologia como também, da história, das relações sociais e principalmente, do psíquico dos sujeitos.

Esses dados encontrados no livro de Beauvoir (1990) nos mostram que, a ideia de velhice não modificou muito com o passar dos anos pois, na antiguidade as

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pessoas pensavam que o velho era visto somente como aquele que deveria transmitir valores para a família e não como uma fase da vida que era boa de viver.

Antigamente, nos teatros e para os poetas a velhice era bem representada como um momento de horror. Mesmo naquela época, já haviam preconceitos frente a imagem do velho e que na contemporaneidade não modificou-se. O idoso de hoje tenta modificar sua imagem para que a sociedade o aceite e entrar em um estereótipo que ela propõe mas, mesmo assim, ele não é aceito da mesma forma.

O que cabe-nos a ressaltar é a questão da sabedoria desse velho, que antigamente era muito valorizada e era ele quem tomava as decisões mais importantes da família e até envolvia-se em assuntos de governo. Será que nos dias de hoje, os idosos terão espaço na sociedade para passarem seus costumes e tradições, podendo assim também, resolver assuntos da família, posicionando-se como o principal mesmo da família? Que espaço é esse então que o idoso ocupa na contemporaneidade, sendo essa que valoriza a juventude? Esta questão norteará nossa discussão no segundo capítulo.

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2 A VELHICE NA CONTEMPORANEIDADE

A forma como convivemos em sociedade, nos revela o lugar que damos ao envelhecimento. Simone de Beauvoir nos deixa claro que com o passar dos anos, em várias culturas, modifica-se o modo como é pensada a velhice tanto para aquele que envelhece, como também, para aquele que o vê.

Conforme abordado no capítulo anterior, nas sociedades antigas, o velho era muito valorizado por ser uma pessoa sábia, mas no decorrer da história, houve uma grande queda de papéis sociais do mesmo. Atualmente, cada vez mais nota-se esse grande esforço em que as pessoas fazem para destacar o idoso como um sujeito estranho, como se possuísse um prazo de validade para poder fazer e sentir muitas coisas em sua vida.

Debert, em sua obra, nos cita Kohli e Meyer para falar um pouco sobre a sociedade moderna, destacando-nos que:

Uma forma de vida, em que a idade cronológica era praticamente irrelevante, foi suplantada por outra, em que a idade é uma dimensão fundamentalmente na organização social. Estágios da vida são claramente definidos e separados e a fronteira entre eles mais estritamente organizada pela idade cronológica. (KOHLI e MEYER apud DEBERT, 1999, p.50-51).

Essa padronização tem afetado o pensamento dos sujeitos pois, define-se mais o sujeito de hoje, por suas características e capacidades, destacando-se assim então: a infância, adolescência idade adulta e velhice. Debert (1999), ressalta que provavelmente essas modificações se dão em relação ao desenvolvimento da economia, essa que tem como base hoje, o mercado de trabalho.

A partir disso, denota-se que o velho é colocado em um lugar daquele que “não faz mais nada” ou de que “não serve mais para nada” pois, já que com essa grande evolução tanto da economia como também, das tecnologias, não necessita-se daquele que um dia possuiu grande saber pois, não há nada que ele possa fazer, já que fisicamente há grande perda das capacidades motoras.

Maud Mannoni, em sua obra O nomeável e o inominável - A última palavra da vida, nos descreve vários aspectos do envelhecimento, destacando o velho e suas profissões, a velhice diante da morte e a medicalização da morte. O seu principal questionamento e que coloca aos leitores a pensar seria então, o que fazer com nossos velhos de hoje? (1995, p. 29).

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Pode-se afirmar que, em razão dessa questão, o idoso é “dispensado” dos empregos que lhes eram oferecidos pois, já passou do tempo desse sujeito ter capacidade de pensar e agir do mesmo modo que na vida adulta. Assim, muitos sujeitos conformam-se que não estão mais capacitados para fazerem tal trabalho que lhe satisfazia e que causava prazer, não somente pelo lado econômico, como também pelo desejo.

Assim, após essa afirmação feita pelo social de que esse sujeito não “serve mais para nada”, o velho passar a ir a busca de sua aposentadoria. Mas, talvez somente essa aposentadoria não baste para cobrir as necessidades desse indivíduo.

Na sociedade atual, em alguns países, a velhice é destacada como a “melhor idade” pois, mesmo depois da aposentadoria, o velho teria então, essa oportunidade de incluir-se, podendo assim, recriar seus laços sociais. Através da aposentadoria, nota-se o quanto mudou os signos do envelhecimento pois, ficam invertidos e assumem novas designações como por exemplo, “nova juventude” e “idade do lazer” (DEBERT, 1999, p.61).

Através desse rótulo imposto pela sociedade, podemos notar que hoje em dia, aumentou significativamente o número de grupos de interação dos idosos, sejam eles, na igreja, nas academias, nos cursos de artesanato, entre outros.

De fato, em busca de preencher o vazio que a não atividade deixa no velho, procura-se outros meios para realização de seus desejos. E esses grupos seriam nada mais do que isso, algo para preencher aquele vazio de não poder fazer mais nada com sua capacidade física.

Debert nos diz que

No Brasil, as novas imagens e as formas contemporâneas de gestão da velhice, são ativas na revisão dos estereótipos pelos quais o envelhecimento é tratado, desestabilizando imagens culturais tradicionais. As novas imagens oferecem também um quadro mais positivo do envelhecimento, que passa a ser concebido como uma experiência heterogênea em que a doença física e o declínio mental, considerados fenômenos normais nesse estágio da vida, são redefinidos como contribuições gerais que afetam as pessoas em qualquer fase. Possibilitaram, ainda, a abertura de espaços para que novas experiências de envelhecimento pudessem ser vividas coletivamente. Neles é possível buscar a autoexpressão e explorar identidades de um modo que era exclusivo da juventude. Esses espaços estão sendo rapidamente ocupados pelos mais velhos. (DEBERT, 1999, p.65)

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Ainda em Debert (1999, p. 67), temos algumas sugestões feitas por Featherstone (1994), que falam que para se tornar um humano aceitável e confiável na sociedade, necessita-se possuir alguns tipos de competência, entre eles temos: habilidades cognitivas, controles do corpo e controles emocionais. Assim, fica bem destacado que possivelmente os indivíduos de hoje, pensam que estar velho, perde-se muito dessas competências, fazendo uma grande exclusão social desperde-se sujeito. Assim, nota-se que a sociedade atual conforma-se com somente aquilo que vê, não aquilo que pode perceber através da fala dos sujeitos.

A partir disso, observa-se o quanto o contemporâneo difere das sociedades antigas pois, ao mesmo tempo em que ela tenta incluir esse velho, o excluí. É interessante como fica marcada essa ambivalência pois, isso deixa muitas marcas no sujeito que está envelhecendo tanto emocionalmente como fisicamente.

O idoso já não sabe mais o lugar que ele pode ocupar na sociedade, colocando assim em dúvida seus desejos como também, do que ele próprio pensa e vê de si mesmo. A contemporaneidade invés de fazer com que esse idoso perceba que é livre para fazer o que for referente ao seu desejo, o deixa a indagar sua posição como sujeito em sociedade, provocando vastas alterações emocionais.

Isso, coloca-nos a pensar que o sujeito modifica-se tanto pelo social como também, pela ordem psicológica, podendo entender que muitas das atitudes e comportamentos adotados pelo idoso, dependem também de um espaço interno que esse indivíduo possui, lugar esse concebido como subjetividade1.

A subjetividade é uma designação muito utilizada pela psicanálise, teoria esta que também possui, algumas interpretações acerca do que o envelhecimento pode ocasionar ao sujeito.

No que se refere a esta linha de pensamento, após o nascimento de uma criança, ela necessita passar por algumas experiências ao longo de sua infância para que se estruture psiquicamente. Entre essas experiências, temos o Narcisismo

2, que nos remete a um momento da vida onde o próprio corpo do sujeito é usado

como objeto sexual.

1 Termo designado pela psicanálise para explicar as questões singulares de cada sujeito.

2 Termo empregado pela primeira vez em 1887 pelo psicólogo francês Alfred Binet (1857-1911), para

descrever uma forma de fetichismo que consiste em se tomar a própria pessoa como objeto sexual. O termo foi depois utilizado por Havelock Ellis, em 1898, para designar um comportamento perverso relacionado com o mito de Narciso. Em 1899, em seu comentário sobre o artigo de Ellis, o criminologista Paul Nacke (1851-1913) introduziu o termo em alemão. Ref. Dicionário de Psicanálise (pg. 530-533). ROUDINESCO, E. PLON, M.

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Primeiramente, o narcisismo estaria voltado a um autoerotismo, onde a criança procuraria satisfação em seu próprio corpo, momento esse em que ainda a criança não sabe diferenciar o mundo pois, isso somente se dá a partir da relação que essa criança possui com os pais. Não há constituição ainda de nenhuma instância psíquica no bebê (id, ego, superego), então, somente a partir de seu corpo, encontrará satisfação.

Após passar essa experiência, os pais começam a participar mais da vida da criança, instaurando-se assim o narcisismo secundário pois, a partir dessa relação mãe-filho-pai, a criança começa a ter noção do mundo e de que nele, possui outros objetos que possam satisfazer seus desejos sexuais pois, já tem ciência do que pode satisfazê-lo ou não.

Isso nos deixa claro que o sujeito se constitui a partir da relação com o outro, esse sendo seu pai, mãe ou qualquer outra pessoa que possa exercer algum tipo de função na vida da criança. A partir da teoria psicanalítica, nota-se que o narcisismo é muito importante para o desenvolvimento infantil pois, se formos pensar na velhice através dela, percebemos o quanto várias questões que são colocadas na clínica com idosos, remetem-se a esse momento experiencial da criança.

De alguma forma, repete-se essa experiência ao longo dos anos pois, o narcisismo, em sua organização secundária (objetal) nada mais é do que encontrar uma forma para a realização do desejo e satisfação das energias sexuais. Nas questões referentes ao envelhecimento, encontramos o desejo do sujeito decaído muitas vezes, então, pode-se pensar que esse sujeito possui traços de sua infância, de como ele obteve essa experiência quando era criança.

A partir do Narcisismo, podemos perceber na clínica com idosos a forma como ele investe em seus objetos de prazer, entre eles os amorosos. Como já explícito, muitas vezes o velho é visto como aquele que não possui desejos e que seria terrível e nojento se ele expressasse-os.

A psicanálise desenvolve um estudo muito grande referente ao sexual e que pode nos explicar várias questões psíquicas que não se dão por uma ordem temporal ou que demande determinada idade. O que nunca devemos esquecer é que, é na relação com o outro, que o sujeito irá se constituir, podendo assim, fazer com que cada experiência de sua vida, seja significada para ele e que deixe marcas, essas que um dia serão lembradas e talvez reelaboradas.

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para a velhice, criando-se assim registros em sua vida, esses que talvez sejam difíceis de lembrar ou divulgar. Talvez essa dificuldade que o velho encontra em falar de suas questões frente ao envelhecimento nem tenha se dado pela sua condição mas sim, pelo modo que os outros lhe mostram que ele possa estar. Como dito anteriormente, eles estão tão confusos se estão inclusos ou exclusos nessa sociedade moderna que tanto valoriza o jovem, conseguindo até afirmar que é por escolha própria que decidem ir para as casas de acolhimentos ou asilos. Hoje nem conseguimos ver mais as pessoas preocupando-se com esses idosos pois, segundo Debert

É para o modo pelo qual, nesse contexto, a velhice é transformada em uma responsabilidade individual e por isso, pode ser excluída do nosso campo de preocupações sociais que interessa atentar, discutindo o caráter possivelmente libertário, bem como a lógicas de exclusão que poderiam estar orientando o curso dessas transformações. (DEBERT, 1999, p. 58-59).

O velho é tratado como aquele que possui o corpo adoentado. A decodificação de hoje remete a doença e o corpo doente a um espaço social definido em termos de integração ou de não integração social, de dependência ou de independência (Mannoni, 1995, p.25).

Podemos pensar a partir disso que, há uma grande questão social frente ao envelhecimento e que ela cada vez mais cresce pois, as pessoas que estão vendo o outro envelhecer, não toleram a imagem que estão observando. Assim, podemos destacar Mannoni (1995, p. 29), quando nos diz que,

Se existe uma decadência psíquica no velho doente, isolado ou mal tolerado em sua família ou na instituição, é porque, na sua relação com o outro, a pessoa idosa não é mais tratada como um sujeito, mas torna-se unicamente objeto de cuidados (...) É aqui que, despreparados em nossa relação com os idosos, falhamos na nossa surdez, em poder fazê-los se relançar como sujeitos desejantes.

Beauvoir (1990, p. 265) ressalta que, parece que é a classe dominante que impõe às pessoas idosas seu estatuto mas, o conjunto da população ativa se faz cúmplice dela. Nos cabe a pensar o quão bem ou mal fez a criação do estatuto do idoso e se a sociedade vai basear-se somente por ele para obter sucesso nas relações que faz com aquele que está envelhecendo.

A autora ainda ressalta, que hoje, os adultos interessam-se pelo velho de outra maneira: é um objeto de exploração. Nos Estados Unidos sobretudo, mas,

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também na França, multiplicam-se clinicas, casas de repouso, residências e até mesmo cidades e aldeias, onde se faz as pessoas idosas que dispõem de meios pagarem o mais caro possível por conforto e por cuidados que freqüentemente deixam muito a desejar (p. 269).

Vejamos o quanto a sociedade capitalista tem modificado o pensamento dos sujeitos, a ponto de fazê-los tirar seus próprios familiares amados dentro de casa para, colocá-los em asilos, achando que talvez, ele possa ser mais bem cuidado mas, não é sempre isso que acontece.

Quando não podem mais sustentar-se, física e economicamente, o único recurso dos velhos é o asilo. Na maior parte dos países, o asilo é absolutamente desumano: nada mais que um lugar para esperar a morte (BEAUVOIR, 1970 p. 312).

Separado de seu passado, de seu ambiente, muitas vezes vestido com um uniforme, o velho perdeu toda a personalidade, não passa de um número. Em geral, as visitas são autorizadas todos os dias, e a família vem vê-lo de tempos em tempos: isso ocorre raramente, e, em certos casos, nunca há visitas. O velho fica, portanto, abandonado (BEAUVOIR, 1990 p. 317).

Certamente o idoso irá sentir-se desvalorizado, como se não possuísse algum significado para sua família e sociedade. Entretanto, não importa quantos grupos de recreação sejam idealizados para integração desses sujeitos pois, não irá valorizá-los mas, sim, tentar “tapar” um buraco que a sociedade mesmo planejou para este.

Debert (1999) nos fala como os homens e mulheres de mais idades são apresentados aos leitores, nos dizendo que é depois de velho que concretiza-se sonhos que foram alimentados desde a juventude e que não os puderam realizar pelas exigências da vida adulta (p. 211). Contudo, apesar de que esse momento da vida venha sido visto como uma nova oportunidade para a vida, destaca-se essa questão de combater o envelhecimento, ou seja, aí está a sociedade novamente demarcando para este sujeito que ele deve combater esse mau que está aparecendo em sua vida: o envelhecer.

Ainda em Debert (1999), notamos que o idoso é liberado desse papel social que exercia, dedicando-se assim, as realizações pessoais (p. 211).

Nas revistas atuais, encontramos o velho que não é desprezado e muito menos abandonado: nelas encontramos o novo mercado de consumo em que a promessa da eterna juventude é o subtexto através do qual um novo vestuário, novas formas de lazer e de relação com o corpo, com a família e com amigos são oferecidos. Não há espaço para imagens de doença, de decadência física e de dependência como destino dos que envelhecem.

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Mais do que definir a última etapa da vida, trata-se de impor estilos de vida, criando uma série de regras e comportamento e de consumo de bens específicos que indicam como aqueles que não se sentem velhos devem proceder (DEBERT, 1999 p. 212-213).

É comum observarmos, na atualidade, velhos que não se sentem velhos mas sim, jovens e que podem arriscar-se a fazer loucuras que faziam na adolescência. E também há jovens que se sentem velhos. Por isso, que não podemos pensar que o envelhecer é demarcado por tempo e idade cronológica. É de fato que devemos levar isso em consideração porém, já não sabemos mais quando se é velho e quando devemos ser chamados ou chamar alguém de velho pois, afinal, o ciclo vital existe, porém é a maneira de vermos a velhice como processo social.

Outra maneira relevante de pensar o envelhecimento como um processo social contemporâneo, é debatendo as questões do estatuto do idoso pois, algo que lhe é de seu direito, parece estar sendo colocado em um lugar de privilégio.

Isso fica muito exposto no estatuto quando se diz das preferências que o idoso possui. Um exemplo disso, é os atendimentos preferenciais nos órgãos públicos e privados que prestam serviço à comunidade.

Certamente devemos levar em consideração as capacidades físicas do indivíduo para que sigamos esse caminho do estatuto mas, isso já não é mais colocado como um direito para eles e sim, um privilégio, que marca tal sujeito pois, esse foi dado apenas com o ganho de idade.

Esse papel que o idoso assume na sociedade, faz com que ele repense sua evolução durante a vida. Pensar que ele apenas pode ter esses direitos conforme o passar dos anos, os deixa a pensar que sua condição de sujeito modificou-se e que ele já não é mais notado do mesmo jeito que era em sua vida adulta. Com certeza, isso vai deixando traços no sujeito fazendo-o questionar sua posição perante o social.

Outro detalhe que nos faz pensar sobre o estatuto, se refere à priorização do atendimento do idoso por sua própria família, em detrimento do atendimento asilar, exceto dos que não a possuam ou careçam de condições de manutenção da própria sobrevivência.

O que será que se passa na cabeça desse idoso que é colocado nessa condição, ou seja, se não há atendimento dos asilos, a família terá que arcar com as responsabilidades de cuidar daquele sujeito que está morrendo. Pensa-se então,

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que frente à isso, o velho sente-se perdido pois, muitas vezes a família não o quer e nem mesmo os asilos.

Pensa-se também, nas condições que ele terá para se manter e se será possível pois, é de se esperar que tenha um grande número de pessoas que não possui condições de continuar sobrevivendo não só por questões relacionadas à alimentação mas, cuidados físicos e remédios que alguns não conseguem comprar e que muitas vezes o governo não tem possibilidade de dá-los.

Como afirmado anteriormente, muitas vezes o idoso não possui muitas escolhas e acabam dizendo para o outro que a escolha de ir para o asilo foi dele. Segundo Cardozo em sua monografia (2009, p. 11) cita Freitas e Mincato (2007) e Groisman (1999) nos dizendo que os asilos são a modalidade mais antiga e universal de atendimento ao idoso fora do convívio familiar.

Como aponta Groisman, a institucionalização de idosos surgiu ao longo do século XIX, para atender as demandas dos velhos pobres, sem família e/ou os mentalmente enfermos, o que as classificavam de maneira assistencialista e de caridade.

Os asilos não eram vistos como um lugar para recreação dos sujeitos mas sim, um lugar onde poderiam colocar as pessoas que já estavam velhas demais para conviver em sociedade com os demais sujeitos.

Também nesse meio, encontramos os ILPI (Instituições de Longa Permanência para Idosos), onde segundo Chaimowick (1999) citado em Cardozo (2009, p. 14) “é também uma alternativa para situações de saúde, como: necessidade de reabilitação, estágios terminais de doenças, ausência temporária do cuidador e níveis de dependência muito elevados”.

Com essas informações, fica mais do que claro que a velhice é vista como um estágio da vida que se remete ao adoecer ou do “a vir a falecer”. O idoso é colocado no asilo apenas na intenção de cuidados básicos para sua sobrevivência mas, o que os familiares não acabam percebendo é que muitas vezes ele precisa de algo para além desses cuidados, seja esse uma escuta sobre sua condição de sujeito frente à sociedade como também, sobre como está sentindo-se sabendo que está cada dia envelhecendo mais.

O asilamento é um grande assunto a ser debatido frente ao envelhecimento pois, ao mesmo tempo em que ele interage socialmente aqueles que estão envelhecendo, também tira dele, sua privacidade, causando assim várias

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transformações em sua vida. A institucionalização causa grande impacto na qualidade de vida dos idosos pois, o idoso passa a conviver com outras pessoas que estão passando pela sua mesma situação, talvez não os mesmos problemas causados pela velhice mas, estão envelhecendo como qualquer ser humano envelhece.

Envelhecer causa uma constante mudança no meio em que o sujeito vive. Quem envelhece, está em constante adaptação em especial esses que vivem em asilos pois, refere-se a uma nova cultura diferente do que ele tinha vivido antes. Segundo Graeff (2007), citado em Barbosa e Cruz (2012)

O asilamento retira do sujeito sua propriedade e privacidade, a opinião dos asilados se divide ao pensar nessa condição, ao contrário do que se acredita, alguns preferem morar no asilo que permanecer nos grupos sociais fora dele, onde perderam sua autonomia. Envelhecer no asilo pressupõe um ajustamento a uma nova cultura, formada pelo convívio com os outros asilados. (GRAEFF apud BARBOSA e CRUZ, 2012, p.01)

Em sua obra Instituições totais e a questão asilar: uma abordagem compreensiva, Graeff (2007), nos diz que

No processo de ajustamento à cultura asilar, o velho – no ritmo da relação que estabelecerá durante o convívio – reaprende a se comportar para se incorporar ao novo grupo social ao qual será inserido. O aprendizado ao novo grupo tem como preocupação o “controle das faculdades fisiológicas e mentais”. Dentre as doenças que levam à institucionalização do idoso a senilidade está em destaque (...) Envelhecer no asilo pode tomar proporções diferentes dependendo das “ocupações, das distrações, dos descansos, dos hábitos das irregularidades e dos intervalos da vida cotidiana”. As diferenciações dos ritmos de envelhecimento dentro do asilo vão variar de acordo com as experiências de habitação dos espaços. (GRAEFF, 2007, p.12;17).

Isso nos mostra que, a qualidade de vida de cada idoso depende dele próprio pois, vai ser ele quem vai administrar suas relações dentro do asilo, mesmo estando em um lugar onde tudo é coletivo. O idoso receberá cuidados mas, não sabemos se ele estará 100% acomodado e feliz emocionalmente para estar em um lugar onde tudo é de todos pois, estava acostumado com aquilo que era de seu íntimo e privado, agora precisando compartilhar com os outros, seu modo de viver.

A condição e qualidade de vida do idoso não depende somente dos funcionários que atuam no asilo mas, também, da sociedade pois, muitas pessoas

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marcam o idoso asilado como aquele que está em uma instituição para cuidados porque já não consegue lidar com si próprio, precisando sempre da ajuda de outras pessoas.

O idoso é olhado e acusado como alguém que já não precisa mais ser honrado por estar em uma vasta decadência biológica e, os sujeitos que convivem com ele em sociedade, esquecem muitas vezes que apesar de que o ser humano está envelhecendo mesmo sendo em instituições, ele possui sentimentos em relação à posição em que ele se encontra.

O asilo apenas abriga e dá cuidados a esses idosos mas, ele não é responsável por “fazer a imagem do velho” pois, como dito anteriormente, tudo vai depender de como o social vai dizer sobre esse velho asilado. Tentando dar espaço para esse que está envelhecendo, o asilo propõe várias atividades em que o sujeito se vê incluso em um meio em que é aceito, podendo assim compartilhar tanto suas alegrias e dores pelo momento da vida que está vivendo.

Percebemos os vastos sentimentos que o asilo e o envelhecer originam no sujeito, provocando assim mudanças psicológicas tanto para aquele que envelhece como também, para aquele que vê o outro envelhecer.

Debert (1999), dedica todo um capítulo de seu livro para falar sobre a vida do velho nos asilos, nos destacando que pesquisar a velhice em asilos é freqüentemente uma tentativa de aproximação de uma experiência que compreende, pelo menos duas facetas distintas: uma negativa, que mostra o asilo como a concreção dramática da solidão e do desprezo, e a outra positiva que reflete as sempre apregoadas vantagens do envelhecimento, sejam elas, experiência acumulada, a sabedoria o desprendimento, a libertação das angustias e da pressa dos mais jovens (p. 99 - 100).

Nos asilos há um número muito grande de brigas entre os que residem lá e os funcionários que lá atuam. Debert (1999, p. 100 - 101), nos diz que para isso, duas orientações são aplicadas para o velho asilado: uma dando dignidade à velhice, colocando o idoso em um lugar de historiador legitimo e imprescindível do passado.

O velho é depositário de uma experiência e de um saber único e exclusivo dado pelos anos vividos. A memória é um bem valioso que, assim como a história, deve ser transmitida às gerações mais jovens. Já a segunda orientação é centrada no abandono e solidão, encontra na utilização de técnicas psicodramáticas o meio de criar uma solidariedade entre os mais velhos, baseada em comunhão de destinos

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dada pela idade cronológica.

Falando ainda um pouco sobre a entrada no asilo, Debert (1999, p. 107) nos diz que ela é representada pelos residentes como uma alternativa capaz de possibilitar sua independência e o resgate de uma multiplicidade de papéis sociais, de uma vida social intensa que estaria ameaçada ou em franco declínio fora do asilo. E é a impossibilidade desse resgate que torna a experiência na instituição decepcionante e dá a ela uma dinâmica própria.

Como dito anteriormente, a entrada no asilo parece uma escolha de quem irá residir lá mas, percebemos muitas vezes esse desejo vem dos familiares e filhos do que realmente daquele sujeito que está envelhecendo. Para Debert (1999, p.108), “essa entrada no asilo tem o objetivo de manter a independência e a autonomia que poderia vir a ser ameaçada”.

Há vários relatos e falas de idosos que foram parar no asilo, citadas no livro de Debert, entre elas destaca-se a de uma senhora viúva e com filhos, que nos deixa claro que a escolha de participar e residir em um asilo não foi dela:

Meu filho arrumou tudo porque eu já estava a quatro anos sozinha. Meu filho achou que estava muito pesado para mim. Então ele disse que iria arrumar um lugar onde eu fosse me sentir bem, ter ambiente cultural. “Vai ser alegre”, e me trouxe aqui e me apresentou para o pessoal da diretoria (DEBERT, 1999, p.109).

Novamente a questão do privilégio volta para discussão. No livro de Debert (1999) encontramos que estar em um asilo é privilégio para quem reside lá, privilégio esse que inclui gastos e que nem todos tem acesso. Entrar no asilo segundo Debert (p.112), possui algumas expectativas para os idosos, entre elas, manter a independência funcional, ameaçada ante as deficiências físicas próprias da idade, não ser um estorvo para os filhos e participar de uma vida social ativa.

O que cabe-nos pensar é se realmente o asilo irá propor e disponibilizar todas essas expectativas que eles almejam pois, apesar de que é um lugar onde oferece-se sociabilidade, ele pode decepcionar e desapontar os sujeitos, em relação a questão da privacidade dos mesmos.

Para alguns residentes, o asilo é um lugar onde eles podem tomar o controle de suas próprias vidas: “Quando eu quero conversar eu converso... Na hora de comer tem comida, quando quero descansar, descanso, gosto muito de ler vou ao meu quarto, tenho a minha vidinha, tudo sozinha, estou feliz. Eu só quero ter paz.”

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(DEBERT, 1999. p.113).

Com essas falas dos idosos, pensa-se sobre o desejo desse sujeito que vive nesse ambiente asilar: ao mesmo tempo em que o sujeito sente-se livre, ele também está aclamando por privacidade e individualidade. Debert (1999) cita que os moradores do asilo optam e preferem morar nos apartamentos individuais, ou seja, nesses que eles não precisam dividir com mais ninguém.

Cada sujeito possui sua subjetividade, sua singularidade e que são construídas a partir da relação com o outro, que constitui-se a partir do convívio com os demais seres humanos que vivem em sociedade. Ao retomar isso, pensa-se no subjetivo de quem envelhece e a chegada do momento de possivelmente ser habitante de asilos e lares de convivência para idosos.

Será que esse sujeito então, ainda possui desejo? Como visto, sim. É comprovado pelas falas de idosos que Debert expõe em seu livro. Sentem desejo de ficar sozinhos, sentem desejo de ter sua liberdade e privacidade... Alguns não expõe esse desejo e muitas vezes acabam ficando assujeitados ao desejo de seus filhos e familiares.

E ao que ele vê no espelho sobre si e do qual a sociedade lhe retorna, seria também referente ao desejo? Desejo de não envelhecer, ou desejo de que a sociedade não o veja como o dessemelhante, como algo que diverge dos padrões expostos pela sociedade.

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