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Graduanda em Relações Internacionais pelo Centro Universitário IBMR.

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Academic year: 2021

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O SOFT POWER ECONÔMICO-COMERCIAL JAPONÊS PARA O SUDESTE ASIÁTICO: PERSPECTIVAS SOBRE O PROTAGONISMO DO PAÍS NAS

RELAÇÕES EXTERIORES DA REGIÃO EM TEMPOS DE ASCENSÃO INTERNACIONAL CHINESA

Henrique Magalhães Gomes1 Maria Luiza Cavalvanti Maia2

RESUMO

Durante o final dos anos 80, o Japão alteraria o foco de sua política externa e econômica, passando a priorizar a Ásia, em especial o Sudeste Asiático, reconfigurando, assim, sua imagem na região. Consequentemente, o país seria responsável por liderar um processo de integração regional pioneiro, utilizando do comércio internacional e a utilização simultânea de investimentos públicos e privados, representados, respectivamente, pela Assistência Oficial para o Desenvolvimento e o Investimento Estrangeiro Direto. Entretanto, após três décadas e em tempos de protagonismo internacional chinês, como esta mudança refletiria nas relações entre o arquipélago e a região? No atual cenário mundial, as ações japonesas fariam com que o Sudeste Asiático, majoritariamente, tivesse laços sólidos com o governo japonês e o priorizasse em detrimento de sua vizinha. Logo, o estudo terá como objetivo central a investigação e elucidação das relações entre o Japão e região no atual jogo geopolítico do Ásia-Pacífico. Sendo dividido, basicamente, em uma breve contextualização histórica acerca da ‘reasianisação’ da política externa japonesa, o advento da geoeconomia e as ações do país na região que geraram tal protagonismo e as consequências deste na conjuntura atual da região, além de perspectivas quanto ao futuro de questões geoestratégicas na mesma. Por fim, discorrer-se-á sobre o papel da geoeconomia nas práticas japonesas, com ênfase nas ações políticas e econômicas conjuntas, considerando sua posição de destaque como a terceira maior economia mundial, o carácter internacional dos keiretsu e o novo regionalismo. Metodologicamente, será realizada pesquisa ex-post-facto e bibliográfica com abordagem qualitativa, natureza básica e objetivo explicativo, além de raciocínio dedutivo, usando da Teoria da Interdependência Complexa.

Palavras-chave: Sudeste Asiático; Japão; Interdependência.

Grupo de Trabalho: GT04 – NEGÓCIOS INTERNACIONAIS, COMÉRCIO EXTERIOR, ACORDOS INTERNACIONAIS E ECONOMIA POLÍTICA INTERNACIONAL

1 Pós-graduando em Negócios Internacionais pelo Centro Universitário FMU; Pesquisador do Núcleo de Pesquisa

Maria Rebello Mendes; Bacharel em Relações Internacionais pelo Centro Universitário IBMR.

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2 INTRODUÇÃO

No início dos anos 80, após décadas de crescimento vertiginoso, o Japão já figuraria como terceira maior economia do globo, atrás de Estados Unidos e União Soviética. Todavia, o ocidente passaria a pressionar o país, tendo como alvo a grande competitividade internacional de seus produtos, fruto da desvalorização cambial, além da limitação de importações imposta pelo governo. É de suma importância, primeiramente, salientar o fato que o desenvolvimento econômico do Japão foi fruto de uma política de crescimento através de exportações, bem como, após a segunda guerra, o Japão almejava promover sua nova imagem pacifista e cooperativa para o mundo, em especial ao Ásia-Pacífico. Entretanto, enquanto o Japão estabelecia-se como um dos principais atores do ponto de vista econômico, os países do Sudeste Asiático, por sua vez, buscavam por estabilização política e econômica.

A região enfrentaria um intenso processo de descolonização, com conflitos domésticos que perduraram por décadas, chegando a envolver, indiretamente, seus vizinhos, como no caso da Guerra do Vietnã, onde parte do sul do Laos fora utilizada na Trilha Ho Chi Minh3. Ao passo

que os países alcançavam sua independência e certa estabilidade doméstica, os esforços governamentais se voltariam para sua projeção no cenário internacional, bem como o desenvolvimento econômico e a expansão do comércio exterior. Apesar de fundada em 1967 objetivando acelerar o crescimento econômico da região e promover a paz e a assistência mútua, a ASEAN não atingiria seu potencial, à princípio, uma vez que metade dos estados do Sudeste Asiático não iriam aderir à organização devido, em partes, ao temor, pelos membros fundadores, do comunismo, somado a instabilidade regional e o cenário conflituoso. Somente na década de 1990, com o fim da Guerra Fria e o ingresso de novos membros, que a organização emergiria como a voz integracionista para a região, abordando desde questões comerciais a agendas de segurança e ambientais. (ECCLESTON et al., 1998)

A política japonesa para a região passaria por distintas fases, a princípio com o objetivo de reparar financeiramente as investidas militares japonesas durante a Segunda Guerra e reconstruir os lações diplomáticos com os países da região. Posteriormente, envolver-se-ia mais ativamente, como na assistência na criação do Banco de Desenvolvimento Asiático, que, tradicionalmente, viria a ter apenas presidentes japoneses. Entretanto a ASEAN, para o Japão, apesar de ser estratégica, não receberia atenção apropriada uma vez o almejo, à época, em reobter soberania sob o arquipélago de Okinawa, administrado pelos EUA desde a rendição japonesa. Cenário sustentado até o Acordo de Reversão de Okinawa, em 1971 (SUEO, 1992).

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3 Segundo Sueo (1992), até meados de 1970, os países da ASEAN valorizavam quase que exclusivamente questões militares dentro de sua doutrina de segurança regional, trazendo certa insignificância à uma possível forte aproximação com o Japão. E, após a organização oficializar sua política de neutralização, passaria a ser vista como perniciosa para a política externa japonesa, claramente ligada aos Estados Unidos. Notar-se-ia, portanto, um cenário de pouco interesse, por ambas as partes, em uma aproximação política, econômica e comercial entre o país e o bloco, que resistiria até a adoção, pelo Japão, da Doutrina Fukuda4, a qual enfatizaria os comprometimentos japoneses e os laços de amizade entre o país e o Sudeste Asiático. Entretanto, conforme exposto pela JICA5 (2013), em 1970, “a onda de atividades comerciais japonesas no Sudeste da Ásia causou uma reação crescente, como visto nas grandes manifestações anti-japonesas que ocorreram na Indonésia e na Tailândia em 1974”.

Para Gilpin (2004), todavia, a antiga tese de sustentação de um crescimento militar contínuo como único, ou principal, meio de criação ou manutenção de um cenário de segurança para determinado estado ou região, passaria a ser cada vez mais questionada. Logo, o conceito de “segurança econômica” tomaria o lugar de destaque nas doutrinas de estados e blocos, e faria com que os países membros da ASEAN convertessem seu foco para a bem-estar econômico da organização, passando a considerar o Japão como um parceiro decisivo na contribuição para um desenvolvimento econômico e manutenção da estabilidade política. No mesmo período, em 1985, o Acordo de Plaza6 traria a valorização do iene diante do dólar estadunidense e, consequentemente, o governo japonês facearia a perda de competitividade de seus produtos.

Por outro lado, o endaka7 transformaria Tokyo em um dos maiores centros financeiros mundiais e seria um dos principais responsáveis pela Bolha financeira e imobiliária que atingiria o Japão em 1986. Cinco anos depois chegaria ao fim o ‘milagre econômico japonês’8 e se iniciaria a ‘década perdida9’. Emerge-se, assim, um novo cenário de reestruturação político-econômica pelo Japão, a fim de sustentar seu crescimento econômico, enquanto que o Sudeste Asiático já apresentava maior estabilidade política e passara a olhar o país como um possível parceiro estratégico para o seu desenvolvimento, tornando-o o primeiro parceiro de diálogo do bloco e participar de reunião regulares (JICA, 2013).

4 Anunciada em Manila, nas Filipinas, pelo ex-primeiro-ministro Takeo Fukuda. 5 Agência de Cooperação Internacional do Japão.

6 Acordo assinado em 1985, no Plaza Hotel em Nova York, entre a França, Alemanha Ocidental, Japão, Estados

Unidos e Reino Unido, a fim de desvalorizar o dólar dos EUA em relação ao iene japonês e marco alemão.

7 Endaka termo usado para referir-se ao estado em que o valor do iene é alto em comparação com outras moedas. 8 Período de crescimento econômico recorde do Japão entre o pós-Segunda Guerra Mundial e o fim da Guerra Fria 9 Período de estagnação econômica no Japão, entre 1991 a 2001, causado pelo colapso da bolha de preços de ativos

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4 1. Primeiros Anos: Estreitamento e Integracionismo

Imerso em um novo contexto internacional, o governo japonês necessitaria reformular sua estratégia político-econômica. O ocidente passaria a ser visto com desconfiança e os países asiáticos em desenvolvimento, como uma oportunidade de associar objetivos distintos, por meio de uma estratégia econômico-comercial, como a manutenção de seu desenvolvimento econômico, além de promoção intra-regional e reposicionamento geopolítico. O Japão passaria, então, a apresentar uma visão mais regionalista, promovendo ações políticas e econômicas com o objetivo não apenas de autopromoção, mas de criar um ambiente comercial, político e econômico favorável e estável. A nova estratégia japonesa focaria na criação de uma economia pacífico-asiática integrada sob sua liderança, por meio de ações governamentais, como a assistência oficial para o desenvolvimento, e da iniciativa privada, como os investimentos estrangeiros diretos, realizados pelos keiretsu10 (GILPIN, 2004).

A distinção em AODs e IEDs, basicamente, é feita pelos concessores e os objetivos. Enquanto que a Assistência Oficial para o Desenvolvimento decorre de uma ação governamental e visa auxiliar outros estados no desenvolvimento socioeconômico e do bem-estar, o investimento estrangeiro direto é realizado por entidades privadas almejando a internacionalização e, consequentemente, adentrar uma economia diferente estrangeira. No contexto japonês, usualmente, a concessão de AOD fica a cargo da Agência de Cooperação Internacional do Japão, considerada a maior organização de desenvolvimento bilateral do mundo, por meio de três modalidades distintas: cooperação técnica; empréstimos; e subsídios. Ao passo que o MOFA11, quase exclusivamente, focara na concessão de subsídios, considerando a política diplomática. Já o uso de IEDs contariam com participação dos keiretsu.

Para Robert Gilpin (2004, p.358), tal estratégia “exigia um empenho bem coordenado da elite governante no sentido de usar os gigantescos recursos de capital e a tecnologia superior do país” a fim de integrar economicamente o país e a região. Para tal finalidade, associar-se-ia AOD e IED, fazendo com que o país fosse capaz de obter ganhos econômicos, políticos e comerciais. No Sudeste Asiático, apenas Singapura demonstrara grande desenvolvimento industrial e infraestrutura satisfatória. A região já não mais apresentara a instabilidade política de outrora e mostrara um potencial econômico significativo, mas faceava grandes obstáculos principalmente quanto a sua infraestrutura precária e pouca qualificação da mão-de-obra.

10 Nome dado aos conglomerados empresariais japoneses. 11 Ministério das Relações Exteriores do Japão

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5 Após a queda da União Soviética, já como maior economia asiática e segunda maior economia mundial, somado ao seu posicionamento pacifista, o Japão seria, cada vez mais, visto como principal parceiro da região. Politicamente, Tailândia e Filipinas mantiveram ininterrupto alinhamento com os Estados Unidos por quase um século, o que traia poucos impedimentos para uma aproximação japonesa. Por sua vez, o Vietnã, após o conflito sino-vietnamita12 e o Đổi Mới13, almejava crescer economicamente ao tempo que mantinha uma postura de

desconfiança quanto a Pequim, o que proporcionaria um cenário perfeito para uma aproximação japonesa. O interesse mútuo faria nascer uma relação que ultrapassaria questões comerciais, e atingiria agendas econômicas, sociais e políticas.

Segundo dados do MOFA (2013), nos países da região, a assistência do Japão foi direcionada a áreas como infraestrutura, educação e desenvolvimento de recursos humanos. Cerca de 20% da capacidade total das instalações de energia elétrica na Indonésia, na Tailândia e no Vietnã são fruto de assistência japonesa, além do grande apoio ao fornecimento de água potável, a expansão de sistema de esgotos e erradicação de doenças, como a poliomielite. Tailândia, Filipinas, Indonésia, Malásia e Vietnã, seriam os principais receptores de assistência japonesa na região, e foco dos keiretsu para IEDs. A estratégia de prover AOD aos estados da região melhoraria a imagem do Japão, proporcionando um cenário diplomático cada vez mais favorável. Ao ponto que, também, investir em infraestrutura em países que receberiam IED, seria proporcionar condições para que as empresas japonesas se instalassem mais facilmente e pudessem ter maiores ganhos. Ademais, o Japão conseguiria expandir seu mercado consumidor e diminuir os custos de produção de insumos básicos para suas linhas de produção, uma vez a mão-de-obra mais barata encontrada nos países do Sudeste Asiático (GILPIN, 2004).

A assistência japonesa, em especial no Vietnã, pode ser notada com a modernização do Porto de Hai Phong e da Rodovia Nacional Nº5, considerados como infraestrutura chave para entrada e saída de mercadorias do Vietnã. Hai Phong era um porto raso, fato que dificultava sua utilização por grandes cargueiros, e não detinha de contêineres suficientes para movimentar uma grande quantidade de mercadorias. Já a rodovia, não conseguiria suportar um grande aumento do tráfego, pois possuía apenas uma faixa em cada direção. Após concessão de empréstimos, pelo Japão, e obras de modernização, o número total de cargueiros operando no porto, bem como de empresas estrangeiras com instalações em Hanói, aumentou significativamente. O projeto criaria a curto prazo mais de 14 mil novos empregos, além de promover e viabilizar a expansão do parque industrial vietnamita (MOFA, 2013).

12 Guerra de fronteira travada entre a China e o Vietnã, após invasão vietnamita o Camboja, em 1979. 13 Reformas econômicas com o objetivo de criar uma economia de mercado de orientação socialista.

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6 A integração comercial no Leste e Sudeste Asiático, à época em processo contínuo de fortalecimento, criara um cenário de interdependência, dentro dos estudos de Keoahane e Nye, e, em 1997, a Crise Financeira Asiática, iniciada na Tailândia com o colapso financeiro do baht, atingiria fortemente a região, levantando um alerta devido ao contágio financeiro. Indonésia, Coréia do Sul e Tailândia seriam os mais afetados, mas a crise traria prejuízos para quase todos os países do Pacífico Asiático. Segundo Pettis (2001), o Japão seria pouco afetado, com os prejuízos concentrados, em grande parte, no fato de ser a economia proeminente na região e ter, portanto, uma balança comercial superavitária. Com a consequente desvalorização das moedas locais em decorrência da crise, como o won sul-coreano e a rúpia indonésia que cairiam, respectivamente, 34% e 83%, o país facearia problemas na concorrência de seus produtos.

2. Novo Cenário Internacional e Questões Atuais

Em 2003, o Ministério de Relações Exteriores do Japão reveria sua política de AOD pela primeira vez em onze anos, findando a época conhecida como ‘Período de Aprimoramento Político e Filosófico’. Para o MOFA (2013), a revisão teve como objetivo “atualizar a AOD japonesa em termos de estratégia, mobilidade, transparência e eficiência, bem como promover uma gama mais ampla de participação pública e entendimento claro”. Durante a Cúpula Comemorativa Japão-ASEAN, o governo japonês oficializaria a Ásia como sua prioridade e que aumentaria a assistência para o continente, com foco na promoção da paz e o crescimento sustentável. Apesar da recessão econômica e períodos de deflação, durante os primeiros anos do século XXI, o governo japonês manteria a Doutrina Fukuda plenamente ativa e seu foco na região, com destaque a Vietnã, Indonésia, Tailândia, Filipinas e Malásia, que futuramente seriam conhecidos como ‘Os Novos Tigres Asiáticos’.

Segundo o Kwak (2015):

“O sudeste da Ásia é a região onde o Japão esteve mais profundamente engajado no pós-guerra. O Japão forneceu mais da metade de sua assistência oficial ao desenvolvimento (AOD) para a região, respondendo em 1960 a 2011 por 34,9% da AOD mundial para os dez países da Associação das Nações do Sudeste (ASEAN). Os valores e categorias de assistência a esses países (no ano fiscal do Japão de 2011) foram de US$ 153,72 bilhões em empréstimos, US$ 16,5 bilhões em subsídios, US$ 1,44 bilhão em cooperação técnica [...]O Sudeste Asiático ainda ocupa a maior parte da AOD do Japão, e o país está redescobrindo a ASEAN e seus países membros como parceiros importantes na promoção dos interesses econômicos, políticos e de segurança do Japão em uma região mutante do Ásia-Pacífico”.

Os keiretsu também não recuariam os investimentos, tornando-se cada vez mais presentes e proeminentes na região. Segundo Hays (2014), atualmente a Tailândia, por exemplo, é conhecida como ‘Detroit da Ásia’, alusão ao fato de ser a maior fabricante de automóveis dentre os países da ASEAN, com foco majoritário na exportação. Em 2018, o país

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7 produziria dois milhões de automóveis, sendo pouco mais da metade destes visados à exportação. A exportação de automóveis representa uma parcela importante do PIB tailandês e emprega um número significativo de trabalhadores, principalmente nas regiões próximas a Bangkok. Isso se deve pela presença forte e consolidada de montadoras japonesas no país, responsáveis pela expansão do parque industrial nacional, e que controlam cerca de 85% do mercado de carros do país, com destaque para Toyota, Isuzu, Honda, Mitsubishi, Nissan, Mazda, Suzuki e Hino.

A realidade geopolítica e econômica na região mudaria nos dez primeiros anos do século XXI, com a China atingindo, em 2010, o posto de segunda maior economia mundial, ultrapassando o Japão e tornando-se a maior economia da Ásia. O IED chinês no Sudeste da Ásia apresentaria um rápido crescimento, especialmente nos países mais pobres e com foco no setor de metais, devido, em partes, ao aumento dos custos trabalhistas na China totalizando US$ 123 bilhões, entre 2003 e 2017. Comparativamente, o IED japonês na região sustentaria seu crescimento contínuo, atingindo, no mesmo período, US$ 220 bilhões em investimentos, em variados setores, com destaque para o automobilístico e extrativista (REED, 2018).

Os investimentos intra-regionais figurariam, também, a frente dos chineses atingindo US$ 193 bilhões. Claramente a proposta integracionista da ASEAN, com destaque para a livre circulação de pessoas e a criação da Zona de Livre Comércio, consolidou o comércio e o investimento intra-regional. Em 2008, seria promulgado o ASEAN-Japan Comprehensive

Economic Partnership (AJCEP), com foco não somente no comércio, mas na expansão dos

investimentos e da cooperação entre o Japão e os estados da ASEAN. Contudo, a China, que anteriormente representava 5% do comércio exterior da região, se tornaria o principal parceiro comercial, quadruplicando sua participação e ultrapassando o Japão.

Segundo dados do The Observatory of Economic Complexity (2020), somando dados chineses e de Hong Kong, a participação comercial do país com as quatro maiores economias da região atingiu números significativos durante os últimos anos. Dentre as exportações de Indonésia, Tailândia, Filipinas e Vietnã, a China representa, respectivamente, cerca de 16%, 15,5%, 28% e 22%, enquanto que o Japão corresponde a 10,5%, 9,5%, 11,5% e 7,5. Na via oposta a diferença se acentua, com a China sendo responsável, em média, por 22% das importações da região, com destaque para o Vietnã. Já o Japão, em média, representa cerca de 11%, sendo o segundo principal parceiro exportador de todos os países, exceto do Vietnã, onde a Coréia do Sul aparece à frente. Segundo Reed (2018), “o crescimento das exportações do sudeste asiático para a China reflete em grande parte sua demanda por materiais básicos”, sendo dois terços delas referentes a matérias-primas e commodities.

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8 Analisando cruamente os dados numéricos apresentados pelas movimentações comerciais a tendência seria de um ceticismo quanto as relações entre a região e Tokyo. Todavia, a expansão comercial chinesa não tiraria o protagonismo japonês, sendo o país, atualmente, visto para além de um simples investidor ou aportador. A fim de compreendermos o papel japonês e sua posição na política externa da região, devemos considerar dados comerciais e econômicos juntamente à uma análise política multilateralista. Deste modo, o país aparece como um parceiro geopolítico estratégico, principalmente em questões sensíveis e complexas, que transitam sob as esferas sociais, militares e territoriais. Fato exemplificado pelo apoio, pelo governo japonês, por meio de AOD, à promoção de saúde e qualificação profissional na região, associada a criação de programas de estágio e intercâmbio, que proporcionara certa integração social benéfica e mútua entre as partes.

Com a mudança da posição japonesa acerca das questões de segurança, o país passaria a atuar em ações humanitárias, participando de operações de peacekeeping e peacebuilding. Apesar de não ser diretamente afetado pelas questões territoriais do Mar da China Meridional, o Japão acaba por envolver-se uma vez dependendo dos insumos que transitam pela rota, além de seu interesse em sustentar a estabilidade da região. E, apesar da parceira comercial entre a região e a China, os crescentes desconfortos criados pelas reinvindicações chinesas sob Mar da China Meridional, incluindo as ilhas Paracel e Spratly, serviriam como um impulsionador para uma relação militar entre o Japão e o Sudeste Asiático, em especial com o Vietnã e as Filipinas. Mesmo que os países da região e o Japão venham acatando decisões de tribunais internacionais e priorizando o diálogo por mecanismos oficiais, o governo chinês vem sustentando uma escalada militar na região, principalmente após a construção de instalações militares em ilhas reivindicadas por Hanói e Manila (SHOJI, 2014).

3. Considerações Finais

A política de crescimento japonesa, à época criticada pelo ocidente, se enquadra no espectro geoeconômico que emergiria nos últimos anos de guerra fria. Edward Luttwak seria um dos primeiros contribuintes para a tese de que o futuro da competição geopolítica se estenderia à esfera econômica, logo os governantes priorizariam estratégias econômico-comerciais. Para Luttwak (1990, p.17), “os estados buscam coletar as receitas prescritas por seus códigos fiscais e não se contentam em permitir que outros tributem a atividade comercial em seu âmbito”. Logo, as ações de estados ocidentais não eram em oposição a política japonesa, mas apenas um meio de sustentar e expandir seu protagonismo econômico-político internacionalmente.

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9 Ao redirecionar seu foco para o Sudeste e Leste Asiático, Tokyo, convenientemente, proporcionaria uma grande melhora na imagem do país dentre seus vizinhos. Em um mundo multipolar e integracionista, por meio da globalização, ser pioneiro em um processo de integração regional poderia trazer frutos além de uma simples balança comercial favorável, dentro de um conceito neo-mercantilista. Tais frutos seriam notados atualmente, ao passo que, mesmo a intensa ascensão internacional chinesa, o Japão manteria sua posição de principal parceiro da região. Claramente é de interesse dos países do Sudeste Asiático manter boas relações com Beijing, a fim de sustentar e possivelmente expandir o volume de exportações e importações. Contudo, isto não demandaria uma priorização à China, visto que o Japão se mantem como maior apoiador da região, bem como os keiretsu como pilares econômicos.

Simultaneamente, questões políticas e territoriais entre alguns estados da região e a China, somadas a posição japonesa pacifista e pró-cooperação, têm auxiliado ainda mais a consolidação do país. Fato é que o Japão, atualmente, apresenta pouca ameaça aos interesses dos países do Sudeste Asiático, e ainda figura como apoiador econômico e, em certos momentos, militar. Ao passo que a China, nos últimos anos, utiliza-se o hard power para atingir seus objetivos, como a construção de bases em ilhas reivindicadas pelo Vietnã e as Filipinas, além da escalada militar no Mar da China Meridional que prejudica o comércio internacional que transita pela região. Como afirmado por Gilpin (2004, p.355), “mediante uma estratégia nacional de investimento direto estrangeiro, comércio intra-empresarial e AOD, o Japão forjou uma economia de alcance regional” e, embora não exerça uma hegemonia política sobre a região, sua presença e influência significaram o desenvolvimento da mesma, o que justifica a boa relação. Considerando os eventos recentes, espera-se que a China se consolide cada vez mais como principal parceira comercial da região, bem como o Japão, não apenas se mantenha, mas expanda seu protagonismo, aparecendo como parceiro estratégico, militar e econômico, em questões que vão além de importações e exportações.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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10 GILPIN, Robert. O Desafio do Capitalismo Global: a Economia Mundial no Século XXI. 1. ed. Rio de Janeiro: Record, 2004.

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