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ECLI:PT:TRP:2017: T8PRT.A.P1.2C

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ECLI:PT:TRP:2017:3436.16.1T8PRT.A.P1.2C

http://jurisprudencia.csm.org.pt/ecli/ECLI:PT:TRP:2017:3436.16.1T8PRT.A.P1.2C

Relator Nº do Documento

Vieira E Cunha rp201707123436/16.1t8prt-a.p1

Apenso Data do Acordão

12/07/2017

Data de decisão sumária Votação

unanimidade

Tribunal de recurso Processo de recurso

Data Recurso

Referência de processo de recurso Nivel de acesso

Público

Meio Processual Decisão

Apelação revogada

Indicações eventuais Área Temática

2ª Secção (livro De Registos Nº 778, Fls 13-17) . Referencias Internacionais

Jurisprudência Nacional

Legislação Comunitária

Legislação Estrangeira

Descritores

confissão; prova das circunstâncias; declaração documentada foi produzida; assunção cumulativa da dívida; ratificação pelo credor;

(2)

Sumário:

I – Em função do disposto no artº 360º CCiv, se o adversário do confitente não aceitar a confissão na sua totalidade, ela não valerá também na parte que lhe é favorável, tendo ele portanto de provar o próprio facto confessado.

II – Mas se a Embargante, ao requerer o depoimento de parte do Exequente, declara, ao mesmo tempo, pretender provocar e fazer-se valer, como efectivamente o fez, da confissão da contraparte relativa à alegação respectiva, mais renovando a pretensão nas contra-alegações de recurso, o ónus de prova sobre a inexactidão da confissão complexa encontrava-se transferido para a Embargante.

III – A constituição de hipoteca pode sempre ficar a cargo de um terceiro – artº 686º nº1 CCiv, independentemente de não ser ele o devedor

IV - A declaração posterior de que a dívida inexiste, nos termos da anterior confissão extrajudicial da Embargante, declaração posterior essa produzida no processo pelo Exequente, anula a

confissão extrajudicial anterior da Embargante – podendo por tal motivo relevar a prova das

circunstâncias em que nasceu o crédito garantido pela hipoteca, circunstâncias essas decorrentes da confissão complexa.

V - A prova da declaração não inibe a prova do contexto do documento rectius a prova das circunstâncias em que a declaração foi produzida (artº 393º nº3 CCiv, aplicável à prova

testemunhal, mas igualmente aplicável à prova por confissão, por força do disposto nos artºs 358º nº1 e 360º CCiv).

VI - Requerido o depoimento de parte, mesmo que não obtida a confissão, tal depoimento é consignado à livre apreciação pelo tribunal, à semelhança da norma do artº 466º nº3 CPCiv.

VII – No caso de co-assunção ou assunção cumulativa de dívida, se o acordo se der apenas por via de contrato entre o antigo e o novo devedor, carece apenas de ratificação pelo credor – artº 595º nº1 al.a) CCiv.

VIII – Porque a declaração tácita se deduz de factos que, com toda a probabilidade, a revelam – artº 217º nº1 CCiv, a co-assunção de dívida (e subsequente constituição de hipoteca) pode legitimamente conjecturar-se que ocorreu face à confiança da Embargante e dos restantes

Executados, com ela Embargante conviventes, à data em comunhão de habitação (em local diverso do imóvel hipotecado), no quadro de uma disposição patrimonial mais geral que implicou também a doação do referido imóvel hipotecado (com reserva de usufruto a favor da doadora).

Decisão Integral:

• Rec. 3436/16.1T8PRT-A.P1. Relator – Vieira e Cunha. Adjuntos – Des. Maria Eiró e Des. João Proença Costa. Decisão de 1ª instância de 22/3/2017.

Acórdão do Tribunal da Relação do Porto A Causa

Recurso de apelação interposto na acção com processo especial de embargos de executado por oposição à execução nº3436/16.1T8PRT-A, da Comarca do Porto, Juízo de Execução.

Embargante/Executada – B.... Executados – C... e marido D.... Exequente – E....

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Tese da Embargante

O requerimento inicial é inepto, porque não identifica claramente a causa de pedir; nunca pediu dinheiro emprestado ao exequente, pelo que não existe qualquer obrigação subjacente aos documentos dados à execução; estes documentos não reconhecem nem constituem qualquer obrigação; não se recorda de ter assinado a constituição de hipoteca e a confissão de dívida e, finalmente, o mútuo é nulo por falta de forma.

Tese do Exequente

Impugna motivadamente a alegação da Embargante, por via da força probatória da escritura, bem como pelo facto de o acordado e transcrito na referida escritura ter correspondido à efectiva vontade das partes.

Sentença

A Mmª Juiz “a quo”, conhecendo de mérito, julgou os embargos procedentes, e, em consequência, determinou a extinção da execução de que eram dependência.

Conclusões do Recurso de Apelação do Exequente:

1º - O Tribunal “a quo” julgou procedentes os embargos porque, no essencial, não foi provado aquilo que foi levado aos temas de prova isto é que “A embargante não tem nem nunca teve qualquer relação pessoal ou profissional com o embargado que justificasse o empréstimo”. “A embargante não pediu emprestada ao exequente/embargante qualquer quantia nem nunca dele recebeu qualquer quantia em dinheiro”.

2º - O embargado, em depoimento de parte, requerido pela contraparte, confessou que não emprestou dinheiro à embargante, sendo certo que este facto foi apenas provado por confissão, mas declarou também que no próprio cartório e no dia da Escritura a embargante disse ao

embargado que assumia como sua a divida da sua neta e marido, que assinaria o documento de confissão de divida e daria ao embargante de hipoteca o seu apartamento e disse ainda no seu depoimento que esta situação foi bem explicada pelo embargado à embargante fora do Cartório e no Cartório.

3º - Mesmo que assim não fosse, quaisquer depoimentos de testemunhas que fossem contrários ao conteúdos do documento autêntico, não poderiam abalar a prova plena de documentos autênticos, nos termos do nº1 e 2 do artigo 393º do C.Civil,

4º - Nos termos do artigo 360º do C.C., quer se trate de uma confissão qualificada, quer de uma confissão complexa, a confissão é sempre indivisível e, como tal, quem quiser aproveitar-se dela, tem de aceitá-la na íntegra, facto favorável e facto desfavorável-salvo provando a inexactidão dos factos que lhe são desfavoráveis.

5º - Ora, o Tribunal violou o disposto no artigo 360 do código Civil, porque tinha de ter julgado provada toda confissão do embargado, isto é que este não emprestou nenhum dinheiro à embargante (facto desfavorável ao confitente) mas que esta deu de hipoteca o seu imóvel para garantir o pagamento da divida da neta e do marido, ao embargado, assumindo a divida destes (facto favorável ao confitente).

6º - E, nesta medida deveria o Tribunal Julgar os embargos improcedentes, com as consequências legais inerentes.

7º - Por outro lado, no despacho saneador, o tribunal fez as seguintes considerações: “Artigo 458 nº1 do C.Civil. Se alguém, por simples declaração unilateral, prometer uma prestação ou

reconhecer uma divida, sem indicação da respectiva prova, fica o credor dispensado de provar a relação fundamental, cuja existência se presume até prova em contrário”. E a seguir escreveu-se

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no douto despacho saneador: “pelo que o exequente não está obrigado a alegar ou provar a relação subjacente, é à embargante que incumbe provar que a mesma não existe (…)”

8º - Ora, a embargante limitou-se a alegar que o exequente/embargado nunca lhe tinha emprestado dinheiro.

9º - Existe aqui uma contradição entre as premissas do saneador e da sentença e a conclusão da sentença, porquanto, não tendo o embargado que alegar e provar a relação subjacente, e

incumbindo à embargante alegar e provar que a mesma não existe, sendo verdade para a

embargante e para o embargado que nenhum empréstimo houve entre ambos (como resultou da confissão), tendo a embargante a consciência que estava a assinar uma escritura de hipoteca e não uma escritura de doação, só poderia concluir-se que ela quis reconhecer da divida da sua neta e do marido e constituir a garantia de hipoteca ao embargado.

10º - Sendo que os devedores (neta e marido) estavam ali presentes no acto de ambas as

escrituras, que sabiam que iam receber aquele imóvel por doação já onerado pela hipoteca, mas que tudo aceitaram, porque eram eles os devedores.

11º - A embargante não alegou factos que afastassem a presunção de reconhecimento da divida e que consta de dois documentos assinados perante a Senhora Notária, que são aliás dois títulos executivos e que fazem prova plena da existência da divida.

12º - Tendo sido violado os princípios jurídicos que constam no nº1 do artigo 371º e nº1 do artigo 458º do C.Civil.

13º - Não tendo a embargante ilidido a presunção a que se reporta o artigo 458º nº1 do C. Civil, deveriam os embargos ser julgados improcedentes.

14º - Pelo que, também por esta via, deverá revogar-se a douta sentença.

15º - Caso se considere que a factualidade dada como provada não é suficiente para julgar improcedentes os embargos, revogando a douta sentença, deverão V. Ex.as mandar ampliar a matéria de facto, com os factos atrás descritos, ao abrigo do disposto na alínea c) do nº2 do artigo 662º do C.P.Civil.

Por contra-alegações, os Apelados sustentam a confirmação da sentença recorrida;

preliminarmente, sustentam que o recurso, quanto à impugnação da matéria de facto, deverá ser rejeitado, por falta de observação dos ónus de alegação impostos pelo disposto no artº 640º nº1 CPCiv.

Factos Provados

1. Através de Escritura Pública exarada a fls. 73 a 74 do respectivo livro 268 do Cartório Notarial de F..., no dia16 de Fevereiro de 2011, a 1ª executada C... declarou constituir a favor do exequente, uma hipoteca voluntária da fracção autónoma designada pela letra “F” correspondente a uma habitação no quarto andar direito com entrada pelo nº8, inscrita na matriz sob o artigo 1593-F. A referida fracção faz parte do prédio urbano em regime de propriedade horizontal, sito na rua ..., nº..., freguesia ..., concelho do Porto, descrito na competente Conservatória do Registo Predial sob o número 1810, da freguesia ....

2. Mais declarou constituir tal hipoteca «para garantia do bom e integral pagamento da divida no valor de trinta mil euros, a qual vence juros à taxa anual de sete por cento ao ano, desde a data da escritura, acrescida de quatro por cento ao ano em caso de mora e a titulo de cláusula penal e das despesas judiciais e extra judiciais incluindo honorários de advogados e solicitadores que o credor tenha de fazer para garantia dos seus créditos, em caso de incumprimento pela devedora e que,

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para efeitos de registo se fixaram em mil e duzentos Euros, sendo o montante máximo de capital e acessórios de quarenta e um mil e cem Euros.» (cfr. doc. junto a fls. 6 a 8 da execução e aqui se dá por reproduzido).

3. Por documento particular com assinatura reconhecida presencialmente por notário, a executada B... declarou «que se confessa devedora ao Dr. E... (…) da quantia de trinta mil euros em capital, que, desde esta data, vence juros anuais à taxa de sete por cento. Para garantia do pagamento das responsabilidades emergente da escritura lavrada hoje no Cartório Notarial do Porto de F... exarada a fls. 73 do respectivo livro 268.», conforme documento junto a fls. 9 e 10 da execução, que aqui se dá por reproduzido.

4. O exequente promoveu o respectivo registo da hipoteca a seu favor pela apresentação 4255 de 24/02/2011, conforme certidão emitida pela respectiva Conservatória de Registo Predial que pode ser consultada pelo código de Acesso nº PL-1223-97509-131201-001810.

5. Através de outra Escritura exarada no mesmo dia 16 de Fevereiro de dois mil e onze, a 1ª executada B... declarou doar, com reserva de usufruto, a fracção autónoma atrás identificada e hipotecada à executada C..., casada com D..., respectivamente, segundos executados e a segunda executada C... aceitou a doação.

6. A doação e a reserva do usufruto foram registadas pelas apresentações 4265 de 24/02/2011, conforme certidão Predial atrás identificada.

7. A embargante não tem nem nunca teve com o exequente qualquer relação, pessoal ou profissional, que justificasse o empréstimo de € 30.000,00

8. A Embargante não pediu emprestada ao exequente/embargado qualquer quantia nem nunca dele recebeu qualquer quantia monetária.

9. A Embargante deu de hipoteca o seu imóvel para garantir o pagamento ao Embargado de uma dívida da neta e do marido, assim assumindo a dívida destes (facto provado nesta instância, consoante fundamentação infra).

Factos Não Provados

a) A embargante assinou os documentos que lhe foram apresentados convicta de que se referiam apenas à doação do imóvel à sua neta C....

b) A embargante à data dos factos tinha 88 anos, o que limitava os seus actos e declarações e a colocava em situação de particular fragilidade e confiança perante os que a rodeiam, mormente a sua neta.

A Apreciação dos Factos e do Direito

As questões substancialmente colocadas pelo presente recurso são as seguintes:

- previamente, saber se devem ser rejeitado o recurso, quanto à impugnação dos factos, por falta indicação dos concretos factos que se pretende venham a ser reapreciados, bem como do sentido em que tal reapreciação é requerida;

- saber se se deve considerar provado, em decorrência do depoimento de parte do Exequente, não apenas que o Exequente não emprestou dinheiro à embargante (facto provado apenas por

confissão), mas também que “a Embargante deu de hipoteca o seu imóvel para garantir o

pagamento da dívida da neta e do marido, ao Embargado, assumindo a dívida destes”; nos termos do artº 360º CCiv, tais factos deveriam ter resultado provados na íntegra;

- mesmo que assim não fosse, quaisquer depoimentos de testemunhas que fossem contrários ao conteúdos do documento autêntico, não poderiam abalar a prova plena de documentos autênticos,

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nos termos dos nºs 1 e 2 do artº 393º CCiv.

- de resto, a Embargante não alegou factos que afastassem a presunção de reconhecimento da dívida, dívida essa que consta de dois documentos que fazem prova plena da respectiva existência. Apreciaremos tais questões de seguida.IComo ponto prévio de análise, e como vem invocado nas doutas contra-alegações, cumpre saber se deve ser rejeitado o recurso, quanto à impugnação factual, por falta de indicação dos concretos factos que se pretende venham a ser reapreciados, bem como do sentido em que tal reapreciação é requerida.

Tal exigência decorre directamente do disposto no artº 640º nº1 als. a) e c) CPCiv. Com o devido respeito, não podemos concordar, neste ponto, com a Apelada.

Está em causa o facto provado nº8, no sentido de que “a Embargante não pediu emprestada ao Exequente qualquer quantia, nem nunca dele recebeu qualquer quantia monetária”.

Tal facto ficou assente, em exclusivo, pela confissão do Exequente em audiência.

Acontece que o Exequente pretende se julgue igualmente provado o teor integral da sua confissão, apontando expressamente que visa, com as respectivas alegações, se julgue também provado que “a Embargante deu de hipoteca o seu imóvel para garantir o pagamento da dívida da neta e do marido, ao Embargado, assumindo a dívida destes”, consoante conclusão 6ª.

Essa a decisão que deve ser proferida, e sobre a qual o tribunal se não pronunciou, no entender do Recorrente – esse, por igual, o facto incorrectamente julgado.

Tais factos foram genericamente alegados pelo Exequente nos artºs 66º a 78º da Contestação. Encontram-se preenchidos, portanto, os requisitos para a impugnação da matéria de facto, cabendo conhecer do mérito do recurso, nesse particular.IISaber agora se se deve considerar provado, em decorrência do depoimento de parte do Exequente, e designadamente por força do disposto no artº 360º CCiv, não apenas que o Exequente não emprestou dinheiro à embargante (facto provado apenas por confissão), mas também que “a Embargante deu de hipoteca o seu imóvel para garantir o pagamento da dívida da neta e do marido, ao Embargado, assumindo a dívida destes”.

Tem razão o Exequente/Apelante no sentido de que inexiste qualquer outra prova, para lá da que resultou do respectivo depoimento de parte, que corrobore o facto que pretende ver aditado ao rol dos provados.

Como é sabido, o depoimento de parte visa a prova por confissão, como resulta do artº 452º CPCiv, bem como das epígrafes da secção e do capítulo em que tal norma vem inserida no Código.

O Apelante invoca o disposto no artº 360º CCiv, no sentido de que “se a declaração confessória, judicial ou extrajudicial, for acompanhada da narração de outros factos ou circunstâncias tendentes a infirmar a eficácia do facto confessado ou a modificar ou extinguir os seus efeitos, a parte que dela quiser aproveitar-se como prova plena tem de aceitar também como verdadeiros os outros factos ou circunstâncias, salvo se provar a sua inexactidão”.

Portanto, se o adversário do confitente não aceitar a confissão na sua totalidade, ela não valerá também na parte que lhe é favorável, tendo ele portanto de provar o próprio facto confessado -assim, Prof. Manuel de Andrade, Noções Elementares, 1979, pg. 250.

Não é, porém, aquilo que se verifica no caso dos autos – a Embargante, ao requerer o depoimento de parte do Exequente, declara, ao mesmo tempo, pretender provocar e fazer-se valer, como efectivamente o fez, da confissão da contraparte relativa à alegação respectiva de que “a Embargante não pediu emprestada ao Exequente qualquer quantia, nem nunca dele recebeu qualquer quantia monetária” – facto provado 8.

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a outros elementos probatórios que, entre o mais, a própria sentença recorrida invoca.

Todavia, ao aludir a tais “outros elementos de prova”, a douta sentença recorrida pretende justificar ou motivar o facto de não ter considerado a parte da confissão em que se declarava que a hipoteca e a confissão de dívida visavam garantir um empréstimo aos co-Executados D... e C... – fls.111 dos autos, 6º §.

Todavia, como vemos, o ónus de prova sobre a inexactidão da confissão complexa (“o confitente aceita o facto confessado, mas adita-lhe outros que podem servir de base a uma excepção – cf. Prof. Manuel de Andrade, op. cit., pg. 251) encontrava-se transferido para a Embargante.

E a dúvida sobre o referido facto, conforme as regras relativas à distribuição do ónus de prova, deve resolver-se contra ela Embargante – artº 342º nº2 CCiv.

E esta prova não foi conseguida, seja porque inexistiu resposta ao facto confessado e previamente alegado na audiência prévia – artº 3º nº4 CPCiv, quer também porque a substância da matéria alegada pela Embargante (basicamente, que a mesma Embargante não possuía consciência da declaração, no momento em que emitiu esta) não resultou provada – sendo que era essa matéria que poderia, de alguma forma, obviar ao invocado direito do Exequente, proveniente dos títulos executivos apresentados.

Diga-se desde já que são os próprios factos alegados e confessados pelo Exequente que

transportam a discussão da matéria dos autos para a relação fundamental, não podendo, desde aí, considerar-se a pura relação relativa a uma declaração unilateral de dívida (artº 458º nº1 CCiv), que, é certo, foi apresentada como título executivo, em conjunto com uma escritura de constituição de hipoteca, por parte da Embargante.IIIEra possível, porém, enveredar pela prova de que “a Embargante deu de hipoteca o seu imóvel para garantir o pagamento da dívida da neta e do marido, ao Embargado, assumindo a dívida destes”, pese embora uma tal declaração não constar dos documentos exequendos?

Era possível, de facto e em tese, independentemente de a Executada “assumir a dívida” de outros, porque a constituição de hipoteca pode sempre ficar a cargo de um terceiro – artº 686º nº1 CCiv, independentemente de não ser ele o devedor (o Código prevê, em tal caso, um conjunto de regras complementares de protecção ao terceiro – artºs 698º, 701º nº2 e 717º CCiv).

Declarou a Embargante que a hipoteca era constituída para “garantia do bom e integral pagamento da dívida no valor de € 30.000, a qual vence juros à taxa de 7% ao ano”.

Sabe-se que, quanto à força probatória da escritura, o âmbito da prova plena dos documentos autênticos se cinge aos factos praticados pela autoridade ou oficial público, bem como aos factos atestados com base nas percepções da entidade documentadora – artº 371º nº1 CCiv.

Desta forma, a simples força probatória da escritura cobre e confere força probatória plena ao compromisso contratual dela constante, designadamente à declaração negocial da Embargante relativa a uma dívida de € 30.000, tanto mais que inexiste qualquer invocação de falsidade da escritura, invocação essa que, ela sim, seria apta à ilisão da força probatória do documento autêntico (artº 372º CCiv).

Mas a declaração posterior de que tal dívida inexiste, ao menos nos termos que constavam da confissão extrajudicial, declaração posterior essa produzida no processo pelo confitente, anula a confissão extrajudicial anterior – podendo por tal motivo relevar a prova das circunstâncias em que nasceu o crédito garantido pela hipoteca (neste sentido, cf. Ac.S.T.J. 17/3/2016 Col.I/175, relatado pelo Consº Salazar Casanova).

De todo o modo, conforme a doutrina do Prof. Vaz Serra, Bol.112/191ss. ou Revista Decana, 101/270ss, 103/13ss. ou 107/311ss., a prova da declaração não inibe a prova do contexto do

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documento rectius a prova das circunstâncias em que a declaração foi produzida (artº 393º nº3 CCiv, aplicável à prova testemunhal, mas igualmente aplicável à prova por confissão, por força do disposto nos artºs 358º nº1 e 360º CCiv).

Para mais, no caso dos autos, existe prova escrita que torna verosímil a declaração confessória, quais sejam as “confissões de dívida” no montante total de cerca de € 30.000, subscritas pelos Executados D... e C..., de fls. 48 e 49 dos presentes autos (suporte físico), em data anterior às datas das escrituras e demais documentos aludidos nos factos provados e que constituem título executivo nos autos.

Apesar de a subscrição de tais declarações ter sido impugnada, essa mesma subscrição foi reconhecida por ambos os Executados D... e C... em audiência – apesar de invocarem que, ao menos em parte, tal dívida se mostra saldada presentemente pelos referidos Executados e depoentes (pagamento esse para o qual não concorreu qualquer meio de prova apresentado no processo).

Acresce que o referido D... reconheceu em audiência que, no processo de insolvência do casal, não foi impugnada a dívida reclamada ou reconhecida ao irmão e cunhado, ora Exequente. Em suma, seja por força da prova por confissão judicial complexa e indivisível, seja por livre apreciação dos elementos probatórios existentes no processo (isto é, mesmo que se não

considerassem as declarações em causa como confessórias – artº 466º nº3 CPCiv), o facto não considerado em causa caberia ter sido julgado provado, como decidimos nesta instância, do mesmo tendo já dado nota supra, no rol dos factos provados.

Note-se que, requerido o depoimento de parte, mesmo que não obtida a confissão, tal depoimento é consignado à livre apreciação pelo tribunal, à semelhança da citada norma do artº 466º nº3 CPCiv (aderimos assim de pleno à doutrina pacífica exposta nos Ac.R.C. 23/6/2015, pº

1534/09.7TBFIG.C1, relatado pelo Des. Henrique Antunes, Ac.R.G. 17/9/2015, pº 912/14.4TBVCT-A.G1, relatado pelo Des. Figueiredo de Almeida, ou Ac.R.G. 18/2/2016, pº 7664/13.TBBRG-912/14.4TBVCT-A.G1, relatado pela Desª Isabel Silva).IVDe que dão mostras os factos adquiridos nos autos?

Verifica-se que a Embargante assumiu, perante o Exequente, a dívida de sua neta e marido, em assunção cumulativa, co-assunção, adjunção ou adesão à dívida, nos termos do artº 595º nº2 CCiv. Tornou-se assim a Embargante um novo devedor, respondendo solidariamente com o primitivo devedor.

Como devedor solidário, a Embargante terá apenas sobre os demais obrigados o direito de regresso que a lei lhe confere – artº 524º CCiv.

Podendo o credor aceitar a prestação de terceiro, nos termos do artº 767º CCiv, o acordo entre ele e o assuntor pode fazer-se independentemente da intervenção do antigo devedor – cf. Ac.R.C. 25/10/2011 Col.IV/43, relatado pelo Des. Jorge Arcanjo.

Mas se o acordo se der apenas por via de contrato entre o antigo e o novo devedor, carece apenas de ratificação pelo credor – artº 595º nº1 al.a) CCiv.

No caso dos autos, na falta de vontade directa que o manifeste, a co-assunção de dívida (e subsequente constituição de hipoteca) pode legitimamente conjecturar-se que ocorreu face à

confiança da Embargante e dos restantes Executados, com ela Embargante conviventes, à data em comunhão de habitação (em local diverso do imóvel hipotecado), no quadro de uma disposição patrimonial que implicou também a doação do referido imóvel hipotecado (com reserva de usufruto a favor da doadora).

A declaração tácita de acordo para a co-assunção de dívida deduz-se assim de factos que, com toda a probabilidade, a revelam – artº 217º nº1 CCiv.

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Quanto à ratificação pelo credor, ela decorreu desde logo da apresentação do título enquanto fundamento da execução nos presentes autos.

Nada obstava assim à exequibilidade dos títulos, cumprindo assim, no nosso entendimento, a revogação da douta sentença recorrida.

Resumindo a fundamentação:

I – Em função do disposto no artº 360º CCiv, se o adversário do confitente não aceitar a confissão na sua totalidade, ela não valerá também na parte que lhe é favorável, tendo ele portanto de provar o próprio facto confessado.

II – Mas se a Embargante, ao requerer o depoimento de parte do Exequente, declara, ao mesmo tempo, pretender provocar e fazer-se valer, como efectivamente o fez, da confissão da contraparte relativa à alegação respectiva, mais renovando a pretensão nas contra-alegações de recurso, o ónus de prova sobre a inexactidão da confissão complexa encontrava-se transferido para a Embargante.

III – A constituição de hipoteca pode sempre ficar a cargo de um terceiro – artº 686º nº1 CCiv, independentemente de não ser ele o devedor

IV - A declaração posterior de que a dívida inexiste, nos termos da anterior confissão extrajudicial da Embargante, declaração posterior essa produzida no processo pelo Exequente, anula a

confissão extrajudicial anterior da Embargante – podendo por tal motivo relevar a prova das

circunstâncias em que nasceu o crédito garantido pela hipoteca, circunstâncias essas decorrentes da confissão complexa.

V - A prova da declaração não inibe a prova do contexto do documento rectius a prova das circunstâncias em que a declaração foi produzida (artº 393º nº3 CCiv, aplicável à prova

testemunhal, mas igualmente aplicável à prova por confissão, por força do disposto nos artºs 358º nº1 e 360º CCiv).

VI - Requerido o depoimento de parte, mesmo que não obtida a confissão, tal depoimento é consignado à livre apreciação pelo tribunal, à semelhança da norma do artº 466º nº3 CPCiv.

VII – No caso de co-assunção ou assunção cumulativa de dívida, se o acordo se der apenas por via de contrato entre o antigo e o novo devedor, carece apenas de ratificação pelo credor – artº 595º nº1 al.a) CCiv.

VIII – Porque a declaração tácita se deduz de factos que, com toda a probabilidade, a revelam – artº 217º nº1 CCiv, a co-assunção de dívida (e subsequente constituição de hipoteca) pode legitimamente conjecturar-se que ocorreu face à confiança da Embargante e dos restantes

Executados, com ela Embargante conviventes, à data em comunhão de habitação (em local diverso do imóvel hipotecado), no quadro de uma disposição patrimonial mais geral que implicou também a doação do referido imóvel hipotecado (com reserva de usufruto a favor da doadora).

Deliberação (artº 202º nº1 CRP):

Julga-se procedente, por provado, o interposto recurso de apelação, e, em consequência, revoga-se a douta revoga-sentença recorrida, julgando agora a oposição à execução por embargos improcedente, por não provada, absolvendo o Exequente do pedido.

Custas pela Embargante. Porto, 12/VII/2017

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Maria Eiró João Proença

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