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A SIMBÓLICA DO ESPAÇO ESCOLAR:

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PELOTAS FACULDADE DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO CURSO DE DOUTORADO

A SIMBÓLICA DO ESPAÇO ESCOLAR:

NARRATIVAS TOPOANALÍTICAS

TESE

ALEXANDRE VERGÍNIO ASSUNÇÃO

PELOTAS/ RS 2011

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PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO CURSO DE DOUTORADO

A SIMBÓLICA DO ESPAÇO ESCOLAR:

NARRATIVAS TOPOANALÍTICAS

TESE

ALEXANDRE VERGÍNIO ASSUNÇÃO

PELOTAS/ RS 2011

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A SIMBÓLICA DO ESPAÇO ESCOLAR:

NARRATIVAS TOPOANALÍTICAS

TESE DE DOUTORADO apresentada ao Programa

de Pós-Graduação da Faculdade de Educação da UNIVERSIDADE FEDERAL DE PELOTAS, Faculdade de Educação, como requisito parcial à obtenção do título de Doutor em Educação.

Orientadora: Profa Dra Lúcia Maria Vaz Peres

Pelotas/RS 2011

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Dados de catalogação na fonte:

Maria Fernanda Monte Borges CRB - 10/1011

A851s Assunção, Alexandre Vergínio.

A simbólica do espaço escolar: narrativas topoanalíticas / Alexandre Vergínio Assunçã: Orientador : Lúcia Maria Vaz Peres ; Co-orientador : Alberto Filipe Ribeiro Abreu Araújo. - Pelotas, 2011.

229 f.

Tese (Doutorado em Educação) – Programa de Pós- Graduação em Educação. Faculdade de Educação. Universidade Federal de Pelotas.

1. Educação. 2. Espaço escolar. 3. Imaginário. 4. Memória. 5. Simbolismo. I. Peres, Lúcia Maria Vaz. , orient. II. Araújo, Alberto Filipe Ribeiro Abreu. ; co-orient. III. Título.

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BANCA EXAMINADORA:

NOME ASSINATURA

PROFa. DRa.LÚCIA MARIA VAZ PERES – UFPEL/RS

(ORIENTADORA)

PROF. DR. ALBERTO FILIPE ARAUJO – UM/PT

(CO-ORIENTADOR)

PROFa. DRa. ELIANE TERESINHA PERES – UFPEL/RS

PROF. DR. MAURO DEL PINO - UFPEL/RS

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Dedico este trabalho aos meus pais Juarez (in memoriam) e Maria Osaila.

Dedico, também, a Lúcia Peres minha orientadora e amiga que me mostrou “os

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A Letícia, filha querida e amiga de todos os momentos, por me ouvir e sugerir melhores arranjos no texto e nos desenhos (plantas baixas).

A Luisa, minha “francesinha” querida, que deu opiniões sobre essas narrativas.

A Karina, companheira, pela paciência, motivação, inspiração e por me ajudar em tudo.

A todos os meus amigos que, de uma forma ou de outra, me ajudaram a equilibrar a pragmática com a diversão da vida.

A Daniele, amiga, pela correção gramatical.

Agradeço ao Professor Doutor Alberto Filipe Araujo, meu co-orientador estrangeiro, que me recebeu com amizade, dedicação e competência, em Braga/PT.

Agradeço aos professores, professoras da banca de qualificação, colegas da pós-graduação e ao GEPIEM pelas valiosas contribuições oferecidas ao debaterem comigo as posições e argumentos que aqui apresento e defendo.

Agradeço também à CAPES pelo apoio ao estágio no exterior, e ao Programa de Pós-Graduação em Educação da UFPel por possibilitar um espaço amplo e plural de discussões sobre educação.

Agradeço à direção dos três colégios analisados, Bom Conselho, Protásio Alves e Nicolau de Araújo Vergueiro, pela disponibilização dos espaços e acesso aos acervos objetivando observações e coleta de documentos.

Em especial, agradeço ao Diko, grande amigo e colega, que me ajudou compreender o sentido “dessas coisas do imaginário”.

Pelo grande apoio, agradeço muito à direção do IFSul, e aos meus colegas da Coordenadoria de Design.

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A imaginação matiza desde a origem os quadros que gostará de rever.

O sonhador de devaneio está presente no seu devaneio.

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ASSUNÇÃO, Alexandre Vergínio. A Simbólica do Espaço Escolar: narrativas

topoanalíticas. 2011. 229f. Tese (Doutorado) - Programa de Pós-Graduação em

Educação. Universidade Federal de Pelotas, Pelotas/RS.

O que motivou esta Tese foi a possibilidade de realizar uma investigação sobre o simbolismo do espaço escolar, sob a perspectiva da fenomenologia e da antropologia do imaginário, procurando, por meio do desenho (croquis) e da escrita (devaneios) apoiada em suportes teóricos, intimações do vivido e das lembranças do autor, contribuir com as discussões sobre os sentidos do simbolismo do espaço escolar, entre professores, alunos, arquitetos e designers. O texto caracteriza-se como uma narrativa topoanalítica sobre os espaços-lembranças de três colégios (Bom Conselho, Protásio Alves e Nicolau de Araújo Vergueiro, em Passo Fundo/RS) e tem como base teórica principal Gaston Bachelard e Gilbert Durand. A topoanálise, como leitura hermenêutica dos fenômenos do espaço escolar, buscou capturar a conformação simbólica e o modo como eles emergiram num dado aspecto particular, que, por sua vez, se moldaram num determinado contexto histórico e sociocultural. O “ser empírico” do espaço escolar - a sua matéria, os documentos, as fotografias - constituiu efetivamente uma matriz de compreensão que permitiu a recolha das substâncias de “verdade”, as ressonâncias e repercussões contidas nos espaços-lembranças. Através da “fenomenotécnica” o espaço pronunciou-se, disse enquanto invenção, enquanto construção. Articulou-se como comprometimento de um corpo/mente symbolicus com a concretude das coisas, dos outros e do mundo. A percepção e a representação do espaço evidenciam-se assim como um processo cultural e simbólico. Finalmente, ressalto que a identidade do espaço escolar só será respeitada se entendida no que cabe dentro das margens dos projetos pedagógicos e arquitetônicos pensados para a escola, mas também no que os excede. A desproporção desafia os conceitos e põe em causa os limites das planificações, das classificações e das assimilações que neles assentam. Hermes e Dionísio que o digam. Para este estudo da Simbólica do Espaço Escolar: narrativas topoanalíticas foram convocadas a dinâmica dos símbolos e a sabedoria primordial dos mitos para que ajudassem a melhor pensar, com a topoanálise e a fenomenotécnica, o sentido oriundo de um novo espírito espacial.

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ASSUNÇÃO, Alexandre Vergínio. The Symbolic of the School Space: topoanalytic

narratives . 2011. 229f. Theory (Doctorate) - Program of Masters degree in Education.

Federal University of Pelotas, Pelotas/RS.

What motivated this thesis was the possibility to accomplish an investigation about the symbolism of the school space, under the perspective of the phenomenology and of the anthropology of the imaginary, seeking, through picture (drawings) and writing (musings) leaned on theoretical supports, citations of the experienced and on the author's memories, to contribute with the discussions on the senses of the symbolism of the school space, among teachers, students, architects and designers. The text is characterized as a topo analytic narrative on the space-memories of three schools (Bom Conselho, Protásio Alves and Nicolau de Araújo Vergueiro, in Passo Fundo/RS) and it has as main theoretical base Gaston Bachelard and Gilbert Durand. The topoanalyses, as hermeneutical reading of the phenomena of the school space, sought to capture the symbolic resignation and the way they emerged in a particular given aspect, and thereby molded themselves in a certain historical and sociocultural context. The “empiric being “of the school space – its matter, documents, pictures - constituted a matrix of understanding that allowed the collection of “true” substances, the resonances and repercussions contained in the space-memories. Through the “phenomenontechnic” the space pronounced itself, as an invention, as a construction. It voiced as a commitment of a body/mind symbolicus with the concreteness of the things, of the others and of the world. The perception and the representation of the space are evidenced as well as a cultural and symbolic process. At last, I point out that the identity of the school space will only be respected if it is understood in what fits inside the margins of the pedagogic and architectural projects thought to the school, but also in what it exceeds them. The disproportion challenges the concepts and it puts in cause the limits of the planning, of the classifications and of the assimilations that dwell in them. As would Hermes and Dionysus say. For this study on The Symbolic of the School Space: topo analytic narratives were summoned to the dynamics of the symbols and the primordial wisdom of the myths so that they helped to think best, with the topo analyses and the phenomenontechnic, about the sense originating from a new space spirit.

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ASSUNÇÃO, Alexandre Vergínio. La Symbolique de l’Espace Scolaire: récits

topoanalytiques. 2011. 229f. Thèse (Doctorat) – Programme D’études Supérieures en

Éducation. Université Fédérale des Pelotas, Pelotas/RS.

Ce qui motive cette Thèse est la possibilité de réaliser une recherche sur le symbolisme de l'espace scolaire, sous la perspective de la phénoménologie et de l'anthropologie de l'imaginaire, en cherchant, à travers les desseins (les croquis) et l'écriture (les rêveries) appuyée sur des supports théoriques, des intimations du vécu et des souvenirs de l'auteur, contribuer avec les discussions sur les sens du symbolisme de l'espace scolaire, parmi les enseignants, les élèves, les architectes et les designers. Le texte se montre comme un récit topoanalytique sur les espaces-souvenirs de trois écoles (Bom Conselho, Protásio Alves et Nicolau de Araújo Vergueiro, à Passo Fundo /RS) et a pour base théorique principale Gaston Bachelard et Gilbert Durand. La topoanalyse, en tant que lecture herméneutique des phénomènes de l'espace scolaire, cherche à capturer la conformation symbolique et le moyen par lequel ils ont émergé dans un tel aspect particulier, qui, à son tour, se sont modulés dans un certain contexte historique et socioculturel. L'« être empirique » de l'espace scolaire - sa matière, ses documents, ses photographies - a constitué de manière efficace une matrice de compréhension qui a permis la collecte des substances de la « vérité », les résonances et les répercussions contenues dans les espaces-souvenirs. À travers la « phénoménotechnique » l'espace s'est prononcé, s’est dit une invention, une construction. S'est articulé en tant qu’un engagement d'un corps/esprit symbolicus avec la concrétude des choses, des autres et du monde. La perception et la représentation de l'espace se prouvent ainsi en tant qu'un processus culturel et symbolique. Finalement, je renforce que l'identité de l'espace scolaire ne sera respectée si comprise dans un contexte concernant l'intérieur des marges des projets pédagogiques et architecturaux pensés pour l'école, mais également en ce qui les dépasse. La disproportion défie les concepts et met en cause les limites des planifications, des classements et des assimilations qui sont basées sur ces mêmes concepts. Hermes et Dionísio peuvent l’attester. Pour cette étude nommé La Symbolique de l'Espace Scolaire: récits topoanalytiques, la dynamique des symboles et la sagesse primordiale des mythes ont été convoqués afin de mieux réfléchir, à l’aide de la topoanalyse et de la phénoménotechnique, le sens originaire d'un nouvel esprit spatial.

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FIG. 1 Espaço/lugar: uma aula no Egito. Fonte: ASSUNÇÃO, 2011. / 51

FIG. 2 Aula-passeio. Croqui: ASSUNÇÂO, 2011. Fonte: QUERO SABER: RENASCIMENTO, 2008. / 52 FIG. 3 A escola de La Salle. Croqui: ASSUNÇÃO, 2011. Fonte: LA SALLE COLLEGE, 2009. / 55 FIG. 4 A disciplina ortopédica.Croqui: ASSUNÇÃO, 2011. Fonte: FOUCAULT, 2009. / 56

FIG. 5 Escola Napoleônica de Ensino Mútuo. Croqui: ASSUNÇÃO, 2011. Fonte: FOUCAULT, 2009. / 60 FIG. 6 J. Bentham. Planta do Panopticon. FONTE: FOUCAULT, 2009. / 62

FIG. 7 O “espírito disciplinar” do espaço escolar. Croqui: ASSUNÇÃO, 2011. Fonte: LOCKTON, 2009. / 63 FIG. 8 As relações simbólicas do espaço escolar. Croqui: ASSUNÇÃO, 2011. Fonte: DESIGNSHARE, 2009. / 71 FIG. 9 Colégio Bom Conselho. Fonte: ASSUNÇÃO, 2011. / 104

FIG. 10 Colégio Bom Conselho, 1970. Fonte: ACERVO CBC, 2011. / 106 FIG. 11 Banda Escocesa, déc 1960. Fonte: ACERVO CBC, 2011 / 110 FIG. 12 Hall de entrada, déc. 1960. Fonte: ACERVO CBC, 2011. / 110

FIG. 13 Irmã Salvatoriana e seus alunos na escadaria frontal, déc. 1960. Fonte: ACERVO CBC, 2011/ 110 FIG. 14 Brasão do Colégio com o “Cristo Salvador”, déc. 1960. Fonte: ACERVO CBC, 2011 / 110 FIG. 15 Educar e salvar, déc. 1960. Fonte: ACERVO CBC, 2011. / 110

FIG. 16 Croqui da fachada do Colégio Bom Conselho. Fonte: ASSUNÇÃO, 2011. / 111 FIG. 17 Croqui escadaria e porta. Fonte: ASSUNÇÃO, 2011. / 114

FIG. 18 Croqui espaço sala de aula. Fonte: ASSUNÇÃO, 2011. / 118 FIG. 19 Croqui Cristo Crucificado. Fonte: ASSUNÇÃO, 2011. / 122 FIG. 20 Croqui a banda. Fonte: ASSUNÇÃO, 2011. / 125

FIG. 21 Croqui do herói. Fonte: ASSUNÇÃO, 2011. / 131

FIG. 22 Colégio Protásio Alves, década de 1970. Fonte: ACERVO EEPA, 2011 / 134 FIG. 23 Colégio Protásio Alves, década de 1970. Fonte: ACERVO EEPA, 2011 / 136 FIG. 24 Praça Ernesto Tochetto, quadra poliesportiva. Fonte: ACERVO EEPA, 2011 / 141 FIG. 25 Sala de aula Colégio Protásio Alves, déc. 1970. Fonte: ACERVO EEPA, 2011 / 141 FIG. 26 Evento cívico, Praça Ernesto Tochetto, déc. 1970. Fonte: ACERVO EEPA, 2011 / 141 FIG. 27 Evento cívico, Praça Ernesto Tochetto, déc. 1970. Fonte: ACERVO EEPA, 2011 / 141 FIG. 28 Croqui Colégio Protásio Alves. Fonte: ASSUNÇÃO, 2011. / 142

FIG. 29 Croqui da sala de aula na Praça. Fonte: ASSUNÇÃO, 2011. / 145 FIG. 30 Croqui: a biblioteca. Fonte: ASSUNÇÃO, 2011. / 149

FIG. 31 Croqui: o aviãozinho na sala de aula. Fonte: ASSUNÇÃO, 2011. / 152

FIG. 32 Croqui: o jogo de futebol na pracinha Tochetto. Fonte: ASSUNÇÃO, 2011. / 155 FIG. 33 Croqui: hasteando a bandeira. Fonte: ASSUNÇÃO, 2011. / 158

FIG. 34 Croqui: Prometeu dá o fogo aos homens. Fonte: ASSUNÇÃO, 2011. / 163

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FIG. 39 Pátio interno. Fonte: Acervo EENAV, 2011 / 177 FIG. 40 Auditório. Fonte: Acervo EENAV, 2011 / 177 FIG. 41 Sala de Aula. Fonte: Acervo EENAV, 2011 / 177

FIG. 42 Pátio interno. À direita o saguão sob pilotis. Fonte: Acervo EENAV, 2011 / 177 FIG. 43 Croqui: os espaços do CENAV. Fonte: ASSUNÇÃO, 2011. / 178

FIG. 44 Croqui: o corredor. Fonte: ASSUNÇÃO, 2011. / 180 FIG. 45 Croqui: o auditório. Fonte: ASSUNÇÃO, 2011 / 183 FIG. 46 Croqui: a sala de aula. Fonte: ASSUNÇÃO, 2011. / 186 FIG. 47 Croqui: o saguão. Fonte: ASSUNÇÃO, 2011. / 190

FIG. 48 Croqui: Hermes, o mensageiro. Fonte: ASSUNÇÃO, 2011. / 195

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

EENAV ESCOLA ESTADUAL DE EDUCAÇÃO BÁSICA NICOLAU DE ARAÚJO VERGUEIRO CENAV COLÉGIO ESTADUAL NICOLAU DE ARAUJO VERGUEIRO

FAURB FACULDADE DE ARQUITETURA E URBANISMO / PELOTAS IFSUL INSTITUTO FEDERAL SUL RIO-GRANDENSE

MEC MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA UCPEL UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PELOTAS UFPEL UNIVERSIDADE FEDERAL DE PELOTAS

UFRGS UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL

PUCRS PONTIFICIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL UPF UNIVERSIDADE DE PASSO FUNDO

UFSM UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA

GEPIEM GRUPO DE ESTUDOS E PESQUISA SOBRE IMAGINÁRIO, EDUCAÇÃO E MEMÓRIA EEPA ESCOLA ESTADUAL DE ENSINO MÉDIO PROTÁSIO ALVES

CBC COLÉGIO SALVATORIANO BOM CONSELHO

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Introdução - 13

Topos 1: Ponto de partida - 21

1.1. Noções-chave - 22 1.2. Matriciamentos - 31

Topos 2: Natureza do fenômeno - 38

2.1. Natureza Antropológica e Imaginária - 39 2.2. Natureza Histórica - 50

2.3. Natureza Ideológica - 65

2.4. Natureza Arquitetônica e de Design - 68

Topos 3: Regras para a caminhada - 76

3.1. Escolha do Método - 77 3.2. Topoanálise Simbólica - 80 3.5. Decifração das imagens - 90 3.6. Noções Operatórias - 96

3.7. Passo a Passo Topoanalítico - 99

Topos 4: Topoanálises – 100

Considerações sobre o seu uso - 101 Topoanálise 1: Colégio Bom Conselho - 104 Topoanálise 2: Colégio Protásio Alves - 134 Topoanálise 3: EENAV - 168

Topos 5: A simbólica do espaço escolar - 198 Referências Bibliográficas - 209

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Introdução

A Simbólica do Espaço Escolar:

narrativas topoanalíticas

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Introdução

O símbolo revela-nos um mundo.

Gaston Bachelard

É no campo concreto e vivo dos símbolos que deve ser buscado o sentido de um fenômeno.

Gilbert Durand

Prezado leitor, apresento aqui uma investigação que denominei A

simbólica do espaço escolar: narrativas topoanalíticas1, uma análise sobre os

espaços escolares, das três primeiras escolas onde estudei2, o Colégio Bom Conselho, o Colégio Protásio Alves e o Colégio Estadual Nicolau de Araújo Vergueiro3, todos em Passo Fundo-RS, minha terra natal, envolvendo os elementos simbólicos de seus espaços.

As idéias que exponho estão ancoradas no grupo do qual participo desde 2002 - Grupo de Estudos e Pesquisa sobre o Imaginário, Educação e Memória (GEPIEM), lotado no Programa de Pós-Graduação em Educação, na Faculdade de Educação, da Universidade Federal de Pelotas. Nele estudamos o Imaginário, na perspectiva antropológica, com suas representações, ou seja, com os sentidos e as configurações simbólicas que fomentam as maneiras de pensar e agir do humano. Esses estudos, somados aos “fluxos teórico-práticos” provenientes da minha pesquisa de mestrado: Por uma Razão Sensível – o método e a

imaginação criadora no design industrial (2004) e ao meu percurso de vida,

influenciaram-me sobremaneira na decisão de fazer esta pesquisa.

1 Esclareço antecipadamente que estarei utilizando a palavra topos (lugar), para demarcar a

abertura dos capítulos ao longo da tese. Topos é um “lugar pontual” (DURAND, 2003, p.115). 2 Justifico a escolha dessa amostra (as três primeiras escolas) pelo seu caráter matriz, ou seja,

por serem consideradas como “intimações primeiras” do que hoje sou como ser humano arquiteto e professor de design - profissional da educação. Trata-se, portanto, de uma seleção semântica (BROWN & DOWLING, 1998), um sistema auto-referido que tenta ser coerente entre os conceitos, as relações sociais, o desenvolvimento linguístico e o desenvolvimento cognitivo. Com isso busco permitir que o valor de um esteja implicado no valor de outros.

3 Nessas escolas frequentei, pela ordem acima, a pré-escola, o ensino fundamental (antigo

primário) e o ensino médio (antigo ginasial). Com os novos decretos e mudanças de lei os nomes dos dois últimos colégios foram alterados para Escola Estadual Protásio Alves e Escola Estadual Nicolau de Araujo Vergueiro.

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Escrevo esta tese para professores, alunos, arquitetos, designers e todo aquele que esteja como eu, intrigado com essa questão: o que é mesmo a simbólica do espaço escolar? Componho-a na esperança de contribuir para “desvelar”, pelo menos um pouco, esta problemática.

A base teórica principal desta investigação está ancorada em dois autores: Gaston Bachelard e Gilbert Durand. Gaston Bachelard (1884-1962), químico francês, foi também epistemólogo, filósofo e poeta, estudou a epistemologia da ciência e a fenomenologia da imaginação. Influenciou Gilbert Durand na noção de “trajeto antropológico”. Durand (1921- ) foi professor emérito de Antropologia Cultural e de Sociologia na Universidade de Grenoble, França, onde fundou o Centro de Pesquisa sobre o Imaginário. Escreveu As Estruturas

Antropológicas do Imaginário (2002), em que as estuda do ponto de vista

ontológico e fenomenológico na direção de uma “nova” antropologia.

A partir dessas bases penso esta tese como arquiteto e professor de Design. Minha graduação foi em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Federal de Pelotas - RS e, atualmente, sou professor da área de Design do Instituto Federal Sul-rio-grandense (IFSul), na mesma cidade. Interesso-me pela questão da Arquitetura e do Design na constituição do espaço escolar que, segundo alguns autores (BENCOSTTA, 2005; BUFFA, 2002; FOUCAULT, 2009; VIÑAO FRAGO, 2001 e ESCOLANO, 2001), é vista como fator de interferência no processo de ensino e aprendizagem. Foi dentro da história da escola como realidade antropológica - social, material e simbólica - e como cultura específica, que a questão do espaço escolar adquiriu importância nos últimos anos. “A antropologia do espaço não pode deixar de ser, ao mesmo tempo, física e lírica” (VIÑAO FRAGO, 2001, p. 39). Michel Foucault (1979) também diz surpreender-se em ver como o problema dos espaços levou tanto tempo para aparecer como problema social, cultural e político. Diz que a fixação espacial deve ser detalhadamente estudada.

Em Passo Fundo, nos três colégios, procurei coletar as seguintes informações: dados históricos e motivos ideo-pedagógicos para as implantações, desenhos arquitetônicos, fotos do passado e atuais. Procurei, principalmente, capturar através de símbolos iconográficos que são croquis4 meus, repercussões

4 O croqui, do francês croquis, costuma se caracterizar como um desenho à mão, ligeiro e

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que plasmam imagens-lembranças, momentos matrizes passados nos espaços desses colégios. Esses croquis são produções gráficas que atuam como uma

fenomenotécnica (BACHELARD, 2008), aqui entendida como um meio de

construção e interpretação de fenômenos. E o fenômeno analisado é o espaço

escolar, o seu simbolismo. Nessa análise, a imagem de um croqui nunca é uma

mera reprodução da realidade, pois mais do que coisa em si ela é relação, criação. Parafraseando Bachelard, eu diria que o croqui é uma construção onde o ponto de vista cria o objeto.

Esse é um constructo bachelardiano: é o ponto de vista que cria o objeto. Desse modo o olhar cria o objeto, visto que se torna reservatório do imaginário [...], e é dele que provém a magia de fazer aparecer detalhes até então invisíveis. Há no ponto de vista do olhar a intenção de ver. Por isso sonha-se, fabula-se, imagina-se, institui-se realidade. O mundo que pensamos ‘conhecido’ é, de algum modo, instituído seletivamente pela consciência do lugar social, invariavelmente atravessada pela razão e pela emoção como um amálgama (PERES, 2009, p.109). [grifo meu].

Esse “desvelamento das imagens” (ASSUNÇÃO, 2009, p.27) dos espaços escolares é o que tento fazer através das impressões emanadas dos croquis e das narrativas sobre eles. Por outras palavras, o “funcionamento analítico” desses croquis e das narrativas sobre os meus primeiros espaços escolares explica-se através da compreensão, interpretação e criação que eu mesmo, influenciado pelo meio sociocultural, atribuo a eles, em uma análise antropológica e fenomenológica.

Nesses espaços são determinadas as relações de uso e permanência das pessoas e objetos. Neles, separações e hierarquizações permitem certas ações. A determinação dessas possibilidades e impossibilidades mostra quão comprometido o espaço está na constituição daquilo que frequentemente identificamos como escola. O espaço escolar, segundo Augustin Escolano, é:

problematizar graficamente as primeiras noções de um projeto, bastante caracterizado pela imaginação criadora manifestada no gesto de seu autor (ASSUNÇÃO, 2010).

(19)

Um programa, uma espécie de discurso que institui em sua materialidade um sistema de valores, [...] marcos para a aprendizagem sensorial e motora e toda uma semiologia [uma simbólica] que cobre diferentes símbolos estéticos, culturais e também ideológicos. [...] No quadro das modernas teorias da percepção, o espaço-escola é mais que um mediador cultural em relação à gênese e formação dos primeiros esquemas cognitivos e motores, ou seja, um elemento significativo do currículo, uma fonte de experiência e aprendizagem. Mais ainda: a arquitetura escolar pode ser considerada inclusive como uma forma silenciosa de ensino (ESCOLANO, 2001, p.27). [grifos meus].

Nessa abordagem antropológica, acrescento que o espaço escolar é compreendido como um conjunto de ambientes construídos (instalações, móveis) e não construídos (pátios, acessos, jardins) com finalidade educativa, que interagem semanticamente com os seres humanos. Estes o utilizam por meio de uma linguagem material e simbólica que transmite hierarquias, valores, princípios de ordem e classificação, representações mentais, sentimentos e significados mais ou menos evidentes. Há que se levar em conta que esse simbolismo do

espaço

escolar

informa ou sobredetermina todo outro simbolismo material, seja natural, arquitetural, artístico ou gráfico, desde que esse se encontre no espaço.

Sobre esse fenômeno, Carl G.Jung (2002) diz que até eventos esquecidos podem, de alguma forma, emergir do inconsciente para o consciente quando nos deparamos com uma situação significativa, que ressoa em nós. Assim, no espaço escolar, um cheiro, uma imagem, uma cor, uma escultura, uma ornamentação, uma história, uma visita ou um sonho, podem desencadear uma série de imagens-lembranças: ressonâncias e repercussões simbólicas. Segundo Bachelard (1993, p. 7), as “ressonâncias” e “repercussões” são dois movimentos cruciais na análise fenomenológica: “as ressonâncias dispersam-se nos diferentes planos de nossa vida no mundo; a repercussão convida-nos a um aprofundamento de nossa existência”. São conteúdos subliminares (ecos) que podem “voltar à tona” na consciência como representações ou valorizações de um reencontro de si para si mesmo e para com os outros, em uma transubjetividade. “A imagem singular”, diz Bachelard (1993, p.3), “pode reagir – sem nenhuma preparação - em outras almas, em outros corações, apesar de todas as barreiras do senso comum”. Instaura-se assim o que Bachelard denomina jogo infinito das imagens, no qual aquele que lê, ouve, vê, percebe ou representa dá

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prosseguimento à criação do criador (artista, poeta, literato, cientista, técnico), em um estado intersubjetivo de imaginação aberta.

No reino das imagens, a toda imanência se junta uma transcendência. Há uma “filiação regular” (BACHELARD, 1990, p.7) do real ao imaginário, onde somos arrebatados por matérias fundamentais. Na “imaginação material” (idem, ibidem), para além das seduções da imaginação das formas5, esse arrebatamento vai pensar a matéria, devanear a matéria, viver a matéria – “materializar o imaginário” (idem, p.8). A fisiologia da imaginação criadora e simbólica obedece à lei dos quatro elementos: fogo, terra, água e ar. Cada elemento, afirma Bachelard (1990), é imaginado em seu dinamismo especial - não numa fixidez ou monotonia - : “um elemento material é o princípio de um bom condutor que dá continuidade a um psiquismo imaginante” (idem, ibidem). Assim, todo elemento adotado com entusiasmo pela imaginação material prepara, para a imaginação simbólica, uma sublimação especial6, uma transcendência característica7. Então, a linguagem simbólica do espaço escolar, através desses “ecos” psíquicos/materiais, vai muito além das questões “utilitárias”, considerando, portanto, o quimérico. Bachelard (1997), valorizando o interesse quimérico afirma:

Nenhuma utilidade pode legitimar o risco imenso de partir sobre as ondas. Para enfrentar a navegação, é preciso que haja interesses poderosos. Ora, os verdadeiros interesses poderosos são os interesses quiméricos. São interesses que sonhamos, e não os que calculamos (BACHELARD, 1997, p.76).

Por conta disso, admito a hipótese de que o espaço escolar, mais do

que racional, é um espaço simbólico; existindo-lhe, por isso, outros sentidos,

além dos evidentes. Desejo, através dos possíveis reconhecimentos evocados pelos dados empíricos por mim recolhidos nessas escolas, desvelar a possível

5 Gaston Bachelard frequentemente alude ao vício de ocularidade, que caracteriza a cultura

ocidental, tendente a privilegiar a causa formal em detrimento da causa material. Uma excessiva valorização da visão em relação aos outros sentidos humanos. Para Bachelard as imagens seriam originárias do contato “corpo-a-corpo” com a matéria. O espaço, em Bachelard, está ligado profunda e diretamente à matéria, quer esta se apresente sólida, líquida ou luminosa. “A matéria é o inconsciente da forma” (BACHELARD, 1997, p.53).

6 Sublimação: processo no qual as pulsões inconscientes se transformam em imagens.

7 Os quatro elementos de Bachelard funcionam como “arquétipos” ou imagens primordiais. Não

são vistos somente enquanto elementos realmente existentes, mas principalmente como elementos do devaneio poético.

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compreensão de como esse tipo de espaço teria afetado a minha formação, bem como interpretar sobre o sentido simbólico do espaço nas relações pedagógicas, em caráter amplo.

Contudo, esse (re)conhecimento não se limita à mera observação, numeração, medição e explicação do fenômeno: pelo contrário, postulo um sentido não puramente objetivo em si, alheio ao ser humano, à subjetividade, mas sim ao que poderia chamar, com Gilbert Durand (2002), de sentido antropológico ou de sentido humano do espaço escolar. Pergunto-me então: como se instituiu esse espaço escolar? Como se configura a sua simbólica? Ou, em síntese: como

esse espaço “fala”?8

Desta forma, procuro assumir uma ruptura com o conhecimento usual (as questões métricas e funcionais do espaço escolar9), ruptura que, como mostra Gaston Bachelard (1978), instaura uma modalidade de novos processos frente aos mistérios e as complexidades, nem sempre passíveis de mensuração.

Assim, levando em conta esses pressupostos teóricos, interessa-me investigar o espaço escolar dentro de uma perspectiva bio-psíquica e sociocultural em que o elemento simbólico seja considerado importante, acenando para outra dimensão educativa desse espaço de ensinar e aprender que não seja somente o espaço material. Defino, então, como forma de contextualizar e justificar essa investigação, a estrutura desta tese em cinco etapas, que chamo de topos (lugar).

No primeiro topos - ponto de partida - esclareço algumas noções

fundamentais para esta investigação. Busco também os meus guardados, rememorando e narrando minhas imagens-lembranças. Examino na minha história escolar alguns “matriciamentos” (PERES, 1999, 2005, 2006), aqui entendidos como as marcas/saberes da experiência pessoal, subsumidas da dramática vivida, na constituição do imaginário, que, de algum modo, tenham influenciado o meu interesse por esse assunto. Ainda nesta etapa, outro fator a considerar acerca da importância deste estudo, é a suposição de que o espaço

8 Esta comunicação é uma “fala” simbólico/antropológica que procura evidenciar o sentido

humano do espaço escolar além do processo de ensino e aprendizagem, na tradição do pensamento e da obra de Gilbert Durand (1993 e 2002).

9 O espaço escolar como um tipo de espaço funcional e material que já está devidamente

explicado pelos compêndios técnicos. Vide: PANERO, Julius (2002); NEUFERT, Ernst (2004); SCHNEIDER, Friederike (2007); GIBBS, Jenny (2006).

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escolar possa ser um lugar de interações, de ação e reação entre o indivíduo e o

meio. Daí as relações pedagógicas às quais me refiro como espaço de estímulos e de transformações.

No segundo topos, trato de mostrar a natureza do fenômeno “espaço

escolar”, considerando seus aspectos históricos, antropo-imaginários, ideológicos, arquitetônicos e de design.

No terceiro topos, a partir das regras para a caminhada, exponho os

pressupostos metodológicos com a problematização da escolha do método, as noções operatórias e o passo a passo metodológico.

Após, no quarto topos, parto efetivamente para as topoanálises10 das três

escolas em que estudei: o Colégio Bom Conselho, o Colégio Protásio Alves e o Colégio Nicolau Araújo Vergueiro, obedecendo ao seguinte critério metodológico: 1) Teço considerações sobre o uso da topoanálise e apresento os colégios; 2) topoanaliso os croquis e os devaneios que são os espaços-lembranças de cada colégio (recenseando seus topologemas e estabelecendo seus núcleos

simbólicos); 3) busco as convergências dos núcleos simbólicos de acordo com as

“estruturas antropológicas do imaginário” (leitura isotópica); 4) realiso a

topoanálise final de cada colégio.

No quinto topos, narro o que descobri e aprendi nesta tese. Descrevo

“como” o espaço me falou. Exponho os achados sobre o sentido simbólico do espaço nas relações pedagógicas em caráter amplo. Conto, afinal, o que é a Simbólica do Espaço Escolar.

Por último, apresento as referências bibliográficas e os apêndices.

.

10

Topoanálise: noção criada por Gaston Bachelard (1993) que adaptei para esta investigação. Ver terceiro topos desta tese.

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Topos 1 – Ponto de partida

A Simbólica do Espaço Escolar:

narrativas topoanalíticas

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Topos 1 – ponto de partida

1.1. Noções-chave

Fundamentado nas ideias anteriores, busco para esta investigação um estudo dos “indícios” (GINZBURG, 1990) dos níveis de representação e dos níveis de realidade que reclamam o emprego de outros métodos de análise. De acordo com essa perspectiva, opto por fundamentar minha análise, como disse antes, a partir das teorias do imaginário, das noções desenvolvidas na minha dissertação de mestrado e da minha história como aluno e professor com a intenção de problematizar a questão principal desta pesquisa, qual seja: investigar o simbolismo do espaço escolar.

Para tal intenção, penso que é necessário imediatamente esclarecer algumas noções, além da de “espaço escolar” já apresentada na introdução, que penso serem fundamentais para esse campo de estudo: “imagem”, “imaginação”, “imagem-lembrança”, “imaginário”, “símbolo”, “simbólica” e “mito”.

A imagem “é uma representação concreta, sensível (como reprodução ou como cópia) de um objeto (modelo, referente), material (uma cadeira) ou ideal (um número abstrato) presente ou ausente do ponto de vista perceptivo” (ARAÚJO, 2009, p.13). Nesse campo de estudo a imagem deixa de ter o seu estatuto degradado e marginal para assumir uma reabilitação enquanto instância mediadora entre o sensível e o racional. A imaginação “passa a ser vista como necessária para vida humana, não por falar de ‘coisas que não existem’, mas porque essas ‘coisas’ criam sentidos para a existência, participam do real” (KUREK, 2009, p. 35). Ela é representação para Durand. Como consequência disso a racionalidade, longe de se identificar com uma espécie de palácio de cristal das idéias claras e distintas, compreende contrastes de luz e sombra. “A imagem enquanto sombra favorece na realidade uma profundeza das coisas e assegura uma melhor difusão da sua luminiscência” (WUNENBURGER; ARAÚJO, 2003, p.37). Segundo Bachelard (1993, p.3), “há uma ação mutante nas imagens poéticas”. As subjetividades transubjetivadas não podem ser determinadas definitivamente, pois as imagens são essencialmente variacionais, não constitutivas – como os conceitos. No método fenomenológico bachelardiano

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há uma dimensão (subjetiva) criadora da imagem. A imaginação, através de

devaneios, instaura novas imagens e “outros mundos” – outras possibilidades. O

devaneio não é um desligamento do real. A imagem devaneada tem sempre uma consciência. “O devaneio é uma atividade onírica na qual subsiste uma clareza de consciência. O sonhador de devaneio está sempre presente no seu devaneio” (BACHELARD, 2006, p.144). O devaneio, então, é um alargamento da consciência do sujeito criador de imagens. O mundo é imagem no universo do devaneio: “as imagens são, do nosso ponto de vista, realidades psíquicas. Em seu nascimento, em seu impulso, a imagem é, em nós, o sujeito do verbo imaginar” (BACHELARD, 1990, p.14). A fenomenologia desvela, pois, o devir que propicia ao criador (poeta, cientista, técnico, artista) a experiência da ressonância e da repercussão nas imagens. No devaneio imaginamos o que desejamos, a imagem é uma “aventura da percepção” (BACHELARD, 2001, p.3). A criação das imagens está associada à vontade que, ao lado da imaginação, é postulada por Bachelard como uma das mais importantes qualidades psíquicas: a atuação da vontade é imperativa, e a consciência é ativa e realizante. A imaginação bachelardiana inaugura novos mundos que estão além da visão11 (da imaginação formal, do homem como mero espectador do mundo). A imaginação, para Bachelard (2001), dá vida à causa material e solicita a intervenção ativa do homem-demiurgo. Os elementos materiais/poéticos se constituem como sentido, e não como dado técnico ou científico. O devaneio busca o elemento material em sua intimidade simbólica. O elemento que domina o devaneio é, portanto, uma disposição íntima tanto quanto uma realidade objetiva; daí a relação micro-macrocosmo. Estabelece-se a união eu-coisa em um determinado elemento privilegiado, que não é de ordem puramente física. O elemento, assim, se torna

orientação, tendência. E o que orienta e organiza as tendências são as imagens

primitivas ou matrizes inconscientes (os arquétipos). Então a imaginação simbólica é um “dinamismo organizador (...), fator de homogeneidade na representação (DURAND, 2002, p.30). As imagens que aí afloram ultrapassam as da percepção, transcendem e transfiguram o real, permitindo que esse ser demiurgo exerça sua faculdade de sobre-humanidade.

11 Essa hegemonia da visão, o vício da ocularidade, transparece no próprio vocabulário básico

da filosofia e da ciência: “evidência”, “perspectiva”, “ponto-de-vista”, “visão-de-mundo”, “enfoque”, etc.

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As imagens-lembranças de que nos fala Bachelard (2006, p.99) são forças subjetivas profundas, ocultas e invasoras: imagens individuais e coletivas vividas misturadas e guardadas como lembranças que estão sempre em movimento. Assim, são simbólicas do que compreendo como elementos constitutivos da minha formação, que significam, ao mesmo tempo, dimensões concretas ou visíveis - que apelam para as percepções ou para as imagens sociais; e dimensões invisíveis - ressonâncias e repercussões - que apelam para emoções, sentimentos, sentidos e valores próprios. Como se diz aqui no Rio Grande do Sul, são “causos” importantes emocionalmente que de vez em quando relembro, reconto (recrio) como quem estende ao sol, para arejar, roupas guardadas no fundo de um baú. Nas análises aqui realizadas a idéia de

imagem-lembrança pode ser compreendida como um espaço-imagem-lembrança.

Já o imaginário não é apenas um termo que designa uma reunião de imagens incomuns, mas remete para uma esfera psíquica onde imagens adquirem forma e sentido devido a sua natureza simbólica. O imaginário não se desenvolve em torno de imagens livres, mas sim lhes impõe uma lógica, uma estruturação, que faz dele um “mundo de representações” (WUNENBURGER; ARAÚJO, 2003, p.28). E esse mundo de representações é abastecido por imagens mentais que reproduzem o real (percepções) e por imagens que produzem/criam novas dimensões da realidade (lembranças, metáforas, alegorias, figuras, símbolos). Por causa disso, o estudo do imaginário permite elaborar uma lógica dinâmica de composições de imagens narrativas ou visuais, de acordo com as suas estruturas antropológicas (DURAND, 2002, p.63), ou seja, com os “protocolos normativos das representações imaginárias agrupadas em torno dos esquemas originais” no regime diurno e noturno das imagens. Ressalta Durand: o esquema “é uma generalização dinâmica e afetiva da imagem, constitui a factividade e a não substantividade geral do imaginário [...] faz a junção entre as dominantes reflexas e as representações. Os esquemas formam o esqueleto dinâmico, o esboço funcional da imaginação” (DURAND, 2002, p.60). Os

esquemas aparentam-se ao que Gaston Bachelard nomeia de símbolos motores.

Quanto a isso, Durand (1993) explica no livro A Imaginação Simbólica que a consciência dispõe de duas maneiras para representar o mundo: uma direta e outra indireta. Na consciência direta, as coisas parecem estar presentes no espírito (na percepção e na sensação); na consciência indireta, as coisas não se

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apresentam “em carne e osso” e os objetos ausentes são re-presentados por imagens. O imaginário pode ser considerado uma grande metáfora do encontro entre natureza e ser humano. Essa noção aparece na teoria durandiana, que é desenvolvida principalmente na obra As estruturas antropológicas do imaginário:

introdução à arquetipologia geral (2002), influenciada, principalmente, pelas idéias

de Bachelard. O imaginário, conforme Durand, é o lugar mental de imagens produzidas no trajeto antropológico em que “a representação do objeto se deixa assimilar e modelar pelos imperativos pulsionais do sujeito, e no qual, reciprocamente, as representações subjetivas se explicam pelas acomodações anteriores do sujeito ao meio objetivo” (DURAND, 2002, p.41). Dito de outra forma, o imaginário é “um conjunto de produções mentais ou materializadas nas obras, constituídas por imagens visuais (quadro, desenho, fotografia) e linguísticas (metáfora, símbolo, narrativa), formando conjuntos coerentes e dinâmicos, provenientes de uma função simbólica que visa o entrelaçamento de sentidos próprios e figurados” (WUNENBURGER, 2003b, p.10). Assim, fico com

a noção de que o imaginário é produto da articulação entre o bio-psíquico e o sócio-cultural cuja união epistemológica é realizada pelo símbolo. E que

trata das formações simbólicas (representações) no universo das organizações sociais considerando o ser humano, mais do que homo sapiens, um animal

symbolicum (CASSIRER, 1994). Enfim, o imaginário consiste no conjunto

inconsciente dos gestos humanos, contudo é também o conjunto de imagens e de relações de imagens que constituem o capital pensado do homo sapiens e o universo das configurações simbólicas e organizacionais. É o local de imagens, lembranças e experiências onde, através de um mecanismo individual/grupal, sedimenta um modo de ver, de ser, de agir, de sentir e de aspirar do humano ao estar no mundo. O imaginário é, portanto, fonte racional e não-racional de impulsos para a ação e se expressa em sistemas e práticas simbólicas como o mito, a linguagem, a arte, a religião, a ciência, as formas de organização e as demais atividades e criações humanas, das quais o espaço escolar também faz parte.

Mais adiante, nessa mesma obra, Durand ressalta que o símbolo, como um signo que se refere a um sentido, é “a melhor figura possível de uma coisa relativamente desconhecida que não conseguimos designar inicialmente de uma maneira mais clara e mais característica” (DURAND, 1993, p.10). O símbolo,

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como uma moeda, compõe-se de duas metades: uma visível, de representação direta e máxima concreção; e outra invisível, de representação indireta e máxima abstração. O símbolo está no centro da vida imaginativa. É o “hormônio do sentido”, diz Durand (2002, p. 30). É muito mais do que um simples signo: transcende o significado e depende de interpretações e predisposições. Está carregado de afetividade e dinamismo. É como uma mola de ação que abre o espírito para o desconhecido, revelando os segredos do inconsciente. Segundo Durand (1993, p.12), o símbolo “é a epifania12 de um mistério”, uma vez que remete ao não-sensível em todas as suas formas – inconsciente, metafísica, sobrenatural e supra-real. Em função de sua inadequação fundamental – porque nunca atinge um objeto – o símbolo opera através de “redundâncias”, entendidas como repetições simbólicas aperfeiçoadoras de um tema. Por meio de aproximações acumuladas, a redundância e a pregnância simbólica13 de gestos (ritos), imagens (símbolos iconográficos) ou relatos é o que possibilita o sentido ao elemento simbólico, acrescentando-lhe um poder adicional. Como exemplo, temos a música em que pequenos temas (refrões, fugas) que são desenvolvidos através de redundâncias persuasivas ou pregnâncias de um tema maior, que é a própria música. Cada pequeno tema é o portador de uma mesma verdade relativa à totalidade do tema maior: há uma relação semântica entre eles e todos têm a mesma importância. Em resumo, o símbolo é uma representação que faz aparecer um sentido secreto.

A simbólica é o conjunto de relações e de interpretações referentes a um tema e seu grupo de símbolos, como por exemplo, a simbólica do espaço escolar. Portanto, a simbólica é a arte de interpretar os símbolos através dos vários processos e técnicas de compreensão que constituem a Hermenêutica Instauradora, proposta por Durand (1993, 2002). Qual a diferença entre a explicação e a compreensão? A “explicação” observa causas, como o cientista as vê no mundo natural físico, ao passo que a “compreensão” persegue razões ou motivos ligados ao mundo das ações humanas. Assim, a simbólica implicaria no exercício da imaginação na busca de uma objetividade compreensiva. “O sentido

12 A epifania é fruto da vida interior (energia psíquica), o aparecimento do latente através do

devaneio, do sonho, da visão, da fantasia, do mito, emanação arquetípica.

13 A pregnância simbólica é, conforme Cassirer (1994), a capacidade da consciência humana de

dar sentido imediato às coisas. É qualidade ou virtude do que se impõe ao espírito, do que produz forte impressão.

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próprio não é suficiente”, escreve Durand (1993, p.94). O sentido figurado é, afinal de contas, o único significativo, pois o sentido próprio “não passa de um caso particular e mesquinho da vasta corrente semântica que drena as etimologias” (p.29). As análises simbólicas mais simples, que se baseiam na simples enumeração do sentido qualitativo do objeto, no estudo de seu “modo de ser” encontram às vezes na associação uma abertura súbita que ilumina o sentido, uma associação com liberdade, sem o determinismo de causalidade única, rumo a essa objetividade compreensiva e semântica. Segundo Cirlot (2005, p. 48), “essa associação não pode ser entendida nunca como mero chamamento externo, produzido na mente de quem analisa, mas revela mesmo a conexão interna”. Durand diz que há duas maneiras de ler, de confrontar um símbolo, duas espécies de hermenêuticas: as que reduzem (hermenêuticas redutoras) o símbolo a um simples efeito, à superestrutura, ao sintoma; e as que, pelo contrário

amplificam (hermenêuticas instauradoras) o símbolo, deixando-se levar pela sua

força de integração para acrescentar uma espécie de sobreconsciente vivido. A legitimação das duas hermenêuticas é possível porque “o símbolo é duplo” (Durand, 1993, p. 93): como significante, organiza-se arqueologicamente entre os determinismos e os encadeamentos causais (mergulhado em todo o passado biográfico, sociológico, ideológico, histórico), é efeito, sintoma; mas como portador de um sentido, tende para uma ordem das essências do espírito através das metamorfoses da nossa situação aqui e agora no mundo. São reminiscências em todas as suas redundâncias vividas pela consciência, em uma epifania instaurativa, constituinte do próprio ser da consciência. E, por isso, a imaginação

simbólica “é a transfiguração de uma representação concreta através de um

sentido para sempre abstrato” (DURAND, 1993, p.11). A imaginação simbólica constitui a própria atividade dialética14 do espírito, dado que “ao nível do sentido próprio da imagem, cópia da sensação, ao nível da vulgar palavra do dicionário, desenha sempre o sentido figurado, a criação perceptiva, a poesia da frase” (DURAND, 1993, p.95). Essa dialética não é uma síntese pacificada, mas sim uma tensão presente dos contraditórios, tensão coerente entre o sentido concreto e preciso, e o sentido alusivo e figurado. Existe um “ritmo comum” das duas realidades postas em comunicação para que ambas se beneficiem das suas

14 “A verdadeira dialética não é uma síntese pacificada, mas sim uma tensão presente dos

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qualidades interpenetradas. A associação de elementos combina seus significados. A significação simbólica de um fenômeno tende a facilitar a explicação dessas “razões misteriosas” (o sentido figurado), porque liga o instrumental ao espiritual, o humano ao cósmico, o casual ao causal, o desordenado ao ordenado. “A função simbólica aparece justamente quando há uma tensão de contrários que a consciência não pode resolver com seus meios naturais” (CIRLOT, 2005, p.27). No seio da própria simbólica, as hermenêuticas opostas (DURAND, 1993, p.73) e a convergência de sentidos antagônicos devem ser pensadas e interpretadas como um “pluralismo coerente” (Bachelard, 2009) no qual a inadequação do significante procura e se reconcilia com o sentido, o significado fugaz e dinamizador da consciência. “O conjunto de todos os símbolos sobre um tema esclarece os símbolos uns através dos outros, acrescentando-lhes um poder simbólico suplementar” (DURAND, 1993, p.13). Na fenomenologia (imaginação material) de Bachelard, a cosmologia dos quatro elementos - água, terra, fogo e ar -, juntamente com seus derivados poéticos, não é “visão” do mundo, mas expressão do sujeito humano no mundo. As nossas imagens enriquecem-se e alimentam-se da simbólica dos quatro elementos materiais, que fornecem “hormônios da imaginação” (BACHELARD, 1990, p.12), que nos fazem crescer psiquicamente. A imaginação simbólica encontra a sua dinâmica criadora na experiência do corpo, no ritmo da expressão lingüística, na resistência da matéria trabalhada pelo gesto que “cria” formas e coisas. Assim, como diz Bachelard (idem, p.13), imaginação simbólica, por ser dinâmica e criadora, é um potente “amplificador psíquico”. Segundo Agustin Escolano, há uma significação simbólica amplificada nos elementos geométricos do espaço escolar:

A esfera, o cilindro, o triângulo e o cubo não são elementos de uma geometria neutra. A esfera transmite a idéia de continuidade e movimento; a cúpula semiesférica pode se associar ao firmamento ou ao útero protetor, como a caverna; a coluna cilíndrica ou piramidal é símbolo de firmeza e virilidade; o triângulo pode sugerir as idéias de energia e dinamismo. O círculo do largo do pátio escolar e a simetria dos caminhos e canteiros do jardim expressam também determinadas formas de gestalt topológico-perceptivas (ESCOLANO, 2001, p.38).

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Existe aí toda uma “linguagem” simbólica que expressa, além de uma ordem construtiva, um sistema de intenções, valores e “discursos”, um jogo de representações atribuídas a uma tradição sociocultural. Se o símbolo revela-nos um mundo, a simbólica fenomenológica explicita esse mundo.

Já o mito, como narrativa imagética e simbólica instauradora de sentido, é uma das figuras mais relevantes do imaginário, constituindo mesmo a sua natureza fundamental. Mito não significa irreal, mas expressão diferente do real, com a função social de agregação.

O mito não é fantasia que se opõe ao real perceptivo e racional. É realmente alguma coisa que se pode manipular para o melhor e para o pior: entendo pelo melhor o desenvolvimento individual e coletivo, o desenvolvimento das virtudes do homo sapiens, porque o homo sapiens tem virtudes bem específicas, virtudes de coordenação coletiva, virtudes de elevação mental; e pelo pior a arregimentação de aventuras tais como as conhecemos na primeira metade deste século [do século passado]. (DURAND, 1981, p.35).

Portanto, os mitos são modelos exemplares. Através deles podemos chegar ao conhecimento da vida e de nós mesmos. O mito, como padrão, apresenta-se como transposição dramática de símbolos e de arquétipos15, através de epopéias, narrativas ou gêneses deixam entrever um processo de racionalização, de organização. Os mitos, para Durand (2002, p.375), confirmam o poder de uma “fantástica transcendental”, a qual designa um poder simbólico/figurativo da imaginação que excede os limites do mundo sensível. Desta forma, é possível tornar inteligíveis “as configurações de imagens, próprias de criadores individuais, dos agentes sociais ou das categorias culturais, identificando as figuras míticas dominantes, reconhecendo a sua tipologia16 e

procurando ciclos de transformação do imaginário” (WUNENBURGER; ARAÚJO, 2003, p.28). Mircea Eliade (1994), nessa mesma linha de raciocínio, ressalta que o mito é sempre uma narrativa instauradora, exemplar e significativa, inscrita num

15 Jung (2006) utiliza a palavra arquétipo para referir-se àqueles símbolos universais que revelam

a máxima constância e eficácia. São temas ou imagens que nos influenciam que reaparecem sempre e por toda a parte, uma imagem primordial ou profunda que só tem conteúdo determinado a partir do momento em que se torna consciente. Não se tratam de representações herdadas, mas sim de certa predisposição inata à formação de representações paralelas, que estão no inconsciente coletivo.

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espaço sagrado e num tempo imemorial, que fornece o modelo arquetipal para as criações humanas, sejam elas biológicas, psicológicas ou espirituais. Executados pelo homem, todo ritual ou toda a ação dotada de sentido repetem um arquétipo mítico. Há um tempo mítico, para além da história, que nada tem a ver com a duração propriamente dita, mas constitui este eterno presente. Conforme Durand (1993, p. 99), em essência, “o mito não é mais do que o método seguido pelos homens para restabelecer a ordem na medida do possível e limitar os efeitos da morte”. Em síntese: o mito é um modo diferente de exprimir o pensamento, a cultura e a forma de observar o mundo. Dirige-se, pois, não apenas ao entendimento, mas também à fantasia e à realidade. O mito surge espiritualmente sobre o mundo das coisas materiais como expressão coletiva, poética e primordial diferente do pensamento lógico.

Posso assim evidenciar que convém efetuar sempre uma dupla abordagem do imaginário: por um lado os temas específicos com os elementos redundantes que permitem elaborar o sentido da existência e do viver; por outro lado o contexto geral que permite dar a trama universal e meta-histórica às imagens, através de um mito. Consequentemente, com base na riqueza descritiva e interpretativa das metodologias do imaginário é que posso analisar o espaço

escolar simbolicamente.

Fico então com a noção de que a percepção e a representação do espaço

escolar é um processo cultural e simbólico. Percebemos e representamos

espaços que são visualizados, contemplados, rememorados e sempre levam consigo interpretações que são resultados não apenas da disposição material que configura tais espaços, como também de sua dimensão simbólica. Para Viñao Frago (2001, p.78) “há um valor didático do símbolo, um aspecto a mais da dimensão educativa do espaço”. Essas precisões de terminologia poderiam ser ainda mais matizadas. Todavia, são suficientes para fazer pressentir a originalidade do símbolo e sua incomparável riqueza antropológica.

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Topos 1 – Ponto de partida

1.2. Matriciamentos

Uma questão é importante para a compreensão da natureza do fenômeno

A simbólica do espaço escolar – narrativas topoanalíticas: por que escolhi esse

tema? Será que existiriam na minha vida outras matrizes geradoras dessa escolha além do fato de eu ser um arquiteto interessado pelas questões espaciais e um professor de Design interessado pelas questões estéticas, funcionais e educacionais? Penso que sim.

O que problematizo aqui, como foi dito antes, é o espaço escolar. Contudo, desde já considero importante contestar a idéia de um sentido único e objetivo de espaço, pois segundo Durand (2002), Bachelard (1993), Cassirer (1994), Kant (2005) e Viñao Frago (2001), o humano tem sobre o espaço múltiplas concepções e percepções. Pode-se até dizer que não há dois autores que falem do mesmo modo sobre o espaço. Em poucas palavras, esse campo será constituído pelas considerações possíveis a uma indagação básica: afinal, como esse espaço “fala”?

Bachelard (1993, p.12) diz que “as coisas nos falam” e que se soubermos dar pleno valor a essa linguagem simbólica poderemos ter um contato com elas. Por isso quero analisar simbolicamente a problemática do espaço escolar, principalmente com o respaldo dos estudos do Imaginário, do Design e da Arquitetura, examinando-o como uma extensão física, mas que também é histórica, antropológica e, principalmente, simbólica.

Afinal, de onde vem esse interesse? Quais são os matriciamentos balizadores dessa intenção? Segundo Peres (1999), essas “matrizes” estão na trajetória de vida e são intimações primeiras de nossos saberes e escolhas pessoais, mesmo que ainda não sejam tratadas de forma consciente. Tais matriciamentos são potencialidades simbólicas de uma espécie de “teia arquetipológica” que fomentam escolhas ou atitudes perante a vida. Assim Peres (1999) esclarece esta noção:

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Nesse movimento, símbolos emergem e tornam-se visíveis, repletos de estímulos, onde cada qual age sobre nossa totalidade, orgânica e não orgânica deixando marcas tipo hologramas que podem matriciar as futuras reações. Logo, todas as ações posteriores dependem da cadeia destes como um complexo conectados entre si, lembrando que a produção individual soma-se à representação do imaginário enquanto capital cultural humano (PERES, 1999, p.39). [grifos meus].

Além disso, o conceito de matriciamento em relação a este estudo do

espaço escolar pode ser entendido como intimações de imagens-lembranças que

se apresentam e ressoam na implicação com o outro e com o mundo, se constituindo em matrizes potenciais que podem encaminhar futuras escolhas na vida. Essas apresentações, repercussões e ressonâncias acontecem pela via das representações e das valorizações, promovedoras de uma produção de si-mesmo. Desta forma, digo que esses matriciamentos podem atualizar-se, no tempo presente, para alargar e enriquecer o capital experencial do indivíduo.

Diante de novas vivências e percepções essas imagens-lembranças matrizes deslocam-se de um lugar profundo para regiões dinâmicas, no instante em que a pessoa faz o contato com o real. São nessas regiões que representações, símbolos, imagens e lembranças aparecem em um complexo indissolúvel, onde, mais que em percepções sobre fatos, as imagens-lembranças estão relacionadas a devaneios motivados por valores psíquicos e pelo imaginário, como se fossem “fugas para fora do real” (BACHELARD, 2006, p.5). Portanto, o relato das imagens-lembranças evocadas pela memória geralmente é re-inventado e re-significado. “A imaginação matiza desde a origem os quadros que gostará de rever” (BACHELARD, 2006, p.99). Desta forma, para visitar os arquivos da memória (onde estão as imagens-lembranças), é importante reencontrar, para além dos fatos, valores que matizam criativa e qualitativamente os seus quadros, pois segundo esse pensador, “não se analisa a familiaridade contando repetições” (ibidem, p.99). É com o devaneio, uma grande dilatação psíquica, que podemos reviver os valores do passado. E é do instante presente que parte o chamado ao qual a imagem-lembrança responde. Neste sentido, em um instante todo o devaneio e percepção já seriam também uma lembrança, ou melhor, uma imagem-lembrança.

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Bachelard (2006) nomeia de “ressonância fenomenológica” esse despertar da consciência a partir de imagens atualizadas pelas lembranças buscadas nos labirintos da memória por ecos, representações, evocações e devaneios atuais.

Nessas ressonâncias de vivências estão imbricadas evocações que atuam na epiderme ativa da esfera prática-utilitária, cobradas pelo sociocultural - em que o corpo e o costume subjetivo a todo instante “lembram” os fatos que não podem ser esquecidos - com lembranças não-utilitárias de cunho mais afetivo e individual - em que lembramos emocionalmente de um rosto, um gesto ou um acontecimento, por exemplo.

Essas matrizes são recordadas e reescritas a cada momento de uma forma original. Na reconsideração sobre o que foram essas experiências, oportuniza-se uma tomada de consciência de caráter subjetivo e intencional mesclada com o caráter eminentemente cultural dos conteúdos dessa própria subjetividade. Essas lembranças de vivências, que têm intensidades particulares, atingem o status de experiências formadoras17 fundamentais a partir de reflexões

sobre o que se passou.

Dito isso, e baseado nas minhas experiências de vida, apresento a seguinte questão: por que estou estudando o espaço-escolar? Para tal, busco em minhas imagens-lembranças acontecimentos matriciadores que me foram emocionalmente importantes para essa escolha, um inventário de experiências passadas que podem ter sido significativas para prospecção de decisões futuras, como trabalhar na área da Arquitetura e do Design e de lecionar nesta última e, por consequência, estudar o espaço escolar. Lembro-me de três

acontecimentos matrizes que são ressonâncias repercutidas na escolha desta

tese.

O primeiro é uma imagem-lembrançada minha infância: um círculo onde minha mãe alimentava a mim e a meus irmãos pequenos, todos sentados ao

17 Experiências formadoras são vivências particulares que se impõem à nossa consciência e

delas extraímos as informações úteis às nossas transações conosco próprios e/ou com o nosso ambiente humano e natural. “Estas vivências atingem o status de experiências a partir do momento que fazemos um certo trabalho reflexivo sobre o que se passou e sobre o que foi observado, percebido e sentido” (JOSSO, 2004, p.48).

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chão18. Lembro-me dela dando organizadamente a comida, pouco a pouco, a

cada um dos filhos. Essa imagem sugere-me de alguma forma o que acontece nos espaço de uma sala de aula. Fui, por isso, questioná-la sobre essa lembrança, dizendo-lhe: “mãe, seria isso um controle, uma técnica para dar a comida, ou uma intenção de carinho, de provimento e de atenção para com os filhos? Disse-me ela assim: “meu filho, é claro que esse era um modo de carinho e de cuidado com vocês, mas também era uma maneira de organizar e controlar o ato de dar comida a vocês”, e continua: “eram muitos filhos pequenos e eu queria ter a certeza de que todos estavam sendo bem alimentados... se eu não tivesse a ideia de colocá-los em círculo eu não teria esse controle... imagine se algum de vocês estivesse só brincando com a comida, atirando tudo fora e eu não visse... ficaria sem comida, além de toda a bagunça na volta”.

Essa imagem da “roda viva alimentar” remete, na “Classificação Isotópica das Imagens” de Durand (1993, p. 80-81), aos regimes noturno e diurno das imagens. O isotopismo durandiano refere-se a grupos de símbolos pertencentes qualitativamente à mesma espécie, às vezes antagônicos com os precedentes, todavia remetendo para o mesmo tronco interpretativo. Neles, estão estruturados sinteticamente os elementos simbólicos harmonizados em uma coincidentia

oppositurum: neste caso um “geometrismo alimentar cuidadoso” de uma mãe

para com seus filhos. A imagem desse círculo aponta para o sentido arquetípico de espaço da distinção e do cuidado: “A mãe”, “O pequeno”, “O alimento”, “O recipiente”, “O microcosmos”, arquétipos que fazem parte de imagens profundas, noturnas, de estruturas místicas, relacionadas a sentidos de perseverança, repetição e esforço, todas presentes na simbólica do espaço escolar. Exerce a função de ligar (estrutura sintética), amadurecer e progredir, unindo o passado com o porvir, a luz com a sombra, o “olho do Pai” (disciplina, autoridade, consciência, tradição) com o “abrigo da Mãe” (cuidado, alimento, instinto, transformação). Assim, essa é uma roda viva que se refere ao aconchego e à intimidade de uma geometria em que as extremidades não têm diferença de distância até o centro, uma roda que simboliza a imagem da sala de aula como

18 Cabe esclarecer que, segundo minha mãe, sentar ao chão é um hábito bastante comum em

famílias do interior do nordeste brasileiro, no qual ela nasceu e viveu até a adolescência, quando veio para o sul (Passo Fundo-RS), onde casou e formou família.

Referências

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