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RESUMO. PALAVRAS-CHAVE: Umbanda. Zé Pelintra. Cultura Popular. Teatro. ABSTRACT

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Academic year: 2021

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NASCIMENTO, Vinicius Bolivar. “O Dono do Corpo” – a composição cênica a partir de elementos do ritual da umbanda. Goiânia: UFG. Estudante do Curso de Bacharelado em Artes Cênicas da UFG, orientadora: Renata de Lima Silva, professora adjunta do curso de Licenciatura em Dança da UFG.

RESUMO

Do interesse em dialogar elementos da cultura popular com técnicas de interpretação e o trabalho de dramaturgia corporal surge a montagem cênica

“O Dono do Corpo”, interpretada por Vinicius Bolivar com direção de Renata Lima, tendo como principal mola propulsora o aproveitamento de símbolos que aparecem na manifestação cultural e religiosa da umbanda e mais especificamente que giram em torno da figura de Zé Pelintra. O estudo cênico desenvolveu-se a partir de uma pesquisa bibliográfica, de caráter contextualizador, de pesquisas de campo e nos laboratórios de criação que teve como base os estudos elaborados por Renata Lima em sua tese de doutorado. O objetivo desse artigo é de apresentar e discutir sistemática o processo de criação de “O Dono do Corpo”.

PALAVRAS-CHAVE: Umbanda. Zé Pelintra. Cultura Popular. Teatro.

ABSTRACT

Interest in dialogue with elements of popular culture interpretation techniques and the work of dramaturgy body assembly appears scenic "The owner of the Body", played by Vinicius Bolivar directed by Renata Lima, the main driving force behind the use of symbols that appear in cultural and religious expressions of Umbanda, and more specifically revolving around the figure of Zé Pelintra. The scenic study was developed from a literature search, contextualizing character of field research and laboratory building that was based on studies prepared by Renata Lima in her doctoral thesis. The aim of this paper is to present and discuss the systematic process of creating the "The Owner of the Body."

KEYWORDS: Umbanda. Ze Pelintra. Popular Culture. Theatre.

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1. Umbanda – um breve histórico

No Brasil, práticas religiosas como a pajelança, curandeirismo, que se caracterizam por estarem relacionadas ao culto aos espíritos, encontraram-se com práticas de caráter semelhante, com advento da vinda de africanos escravizados para o país, trata-se do culto aos Orixás, Nkises e Voduns. Tais práticas religiosas por sua vez, acabaram por assumir aspectos cristãos frente a opressão e a aculturação dos colonizadores.

O sincretismo religioso por vezes é apontado com um mascaramento dos deuses africanos por meio dos santos católicos, que alguns autores definem como um processo fundamental para a sobrevivência dos cultos afro- brasileiros, mas que mais tarde passou a tornar-se verdadeira essa assimilação dos santos com os Orixás, Isto é, se a princípio Ogum era disfarçado de São Jorge ou Santo Antônio, para ser cultuado sem censuras, com o tempo Ogum e São Jorge passaram a ser compreendido como uma mesma entidade de fato.

É nessa manobra cultural que a religião Umbanda se constitui.

A Umbanda, além de sua base cristã e influências indígenas e africanas, tem também sua formação apoiada à doutrina espírita kardecista. Segundo o

“mito fundador” assim como denomina Nogueira (2009), a Umbanda teria nascido no inicio do século XX em um centro espírita de Niterói, estado do Rio de Janeiro, tendo sido revelada pelo espírito de um caboclo incorporado em um médium chamado Zélio Fernandino de Moraes.

O Caboclo das Sete Encruzilhadas, por meio do transe mediúnico teria trazido uma mensagem, que anunciava uma nova religião, “que viria para falar aos pobres e humildes em sua linguagem, e incorporaria em seu seio os espíritos humildes de Caboclos e Pretos-Velhos, que não obtinham aceitação em centros espíritas por serem considerados espíritos sem evolução”

(NOGUEIRA, 2009, p.60).

A umbanda é uma religião que baseia-se na existência de um único Deus supremo: Olorum, Zambi, ou simplesmente Deus. A religião fundamenta- se no culto dos espíritos e é pela manifestação destes, no corpo do médium, que ela funciona e faz viver suas divindades; através do transe, realiza-se

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assim a passagem entre o mundo sagrado dos deuses e o mundo profano dos homens (ORTIZ,1999).

Como aponta Ortiz (1999) diferentemente do Candomblé, na Umbanda as reproduções ligadas à mitologia africana, as aventuras e desventuras dos deuses desaparecem e os Orixás cedem lugar às entidades como, caboclos índios, boiadeiros, baianos, cangaceiros, marinheiros, pretos-velhos, crianças, ciganos e exus, pombas-gira, etc...

As manifestações que fazem parte do ritual umbandista foram agrupadas pelo autor Ortiz (1999, p.71) da seguinte forma:

a) Espíritos de luz: caboclos, pretos-velhos e crianças.

b) Espíritos das trevas: os exus.

Tal divisão pauta-se no maniqueísmo clássico, do bem e do mal, da cosmovisão cristã. Dessa forma a figura de “Exu” a princípio um orixá que aparece na mitologia com característica de trickster, sofreu grande distorção, sendo relacionado com demônio católico (Ortiz, 1999).

Seu Zé Pelintra, principal foco de interesse desse estudo, aparece na Umbanda, como a única entidade, que é aceita em dois rituais diferentes e opostos: a “Linha das Almas” (caboclos e preto-velhos) e o ritual do “Povo de Rua” (Exus e Pombas-Gira). O primeiro marca as relações familiares e o segundo o sem-domínio, incontrolável, o marginal, e é dessa maneira que frequentemente são vistos os exus.

Conforme aponta Birman (1985), a identificação dos exus com o domínio da rua gerou a figura exu Zé Pelintra, com as características do malandro carioca. Sendo o malandro uma figura deslocada das regras gerais ninguém melhor do que Zé Pelintra para representá-lo, pensando em seu livre acesso dentro do ritual umbandista.

A origem da figura de Zé Pelintra como entidade é atribuída ao Catimbó nordestino, é em meado do século XX que acaba por se integrar aos ritos da umbanda, certamente na medida em que o Catimbó atinge as áreas urbanas, território tipicamente da Umbanda ou mesmo o movimento umbandista escoa para o interior, possibilitando o encontro das duas práticas. Na umbanda, Zé Pelintra assume seu traje típico, seu terno branco e engomado, gravata e lenço

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encarnado, chapéu panamá, e sapato bicolor, sendo conhecido por sua demasiada preocupação com a própria elegância.

2. O corpo na encruzilhada

Na abordagem de SILVA (2010), uma roda de capoeira angola ou samba de umbigada, têm o seu sentido criado em uma esfera de significação tecida pelo corpo em um devir de realidades, tempos e espaços sobrepostos – a encruzilhada, um plano de imanência que traz a especificidade do espaço- tempo em que a ancestralidade bantu e/ou yorubá se materializa no corpo criando uma identidade própria. Por sua vez, a encruzilhada é habitada e significada pelo corpo limiar, que é o próprio corpo do ritual, em que é a cultura se movimenta no corpo, é corpo em um estado diferenciado de expressividade, conectado com o presente e o passado.

A partir dessa perspectiva aqui a umbanda pode ser compreendida como uma manifestação de encruzilhada e a incorporação de Zé Pelintra, como o próprio corpo limiar. Assim, a criação de “O Dono do Corpo”, passou primeiramente pela pesquisa de campo, em que se vivenciou o ritual da umbanda, buscando uma compreensão sensível daquele contexto, para ser acionada no processo de criação.

3. Processo de Criação

O processo de criação da cena se deu por meio de exercícios/estímulos para utilização das impressões e sensações obtidas no campo e também lembranças já impressas na memória afetiva do ator.

Desenhos de Kiko Dinucci, sobre entidades da umbanda, foram utilizados como “portas de entrada” para o jogo de experimentação cênica.

Além dessas imagens utilizamos também alguns símbolos presentes no ritual da umbanda, selecionados a partir da experiência pessoal com a manifestação religiosa e também da pesquisa de campo.

Os desenhos e alguns símbolos que já haviam nos surgido como elementos de estimulo para a criação, que citaremos mais adiante, foram se

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desencadeando para algo parecido com o que Ferracini (2006), chama de

“blocos” e aqui chamaremos de pontos ou lugares/momentos.

O recurso metodológicos do processo de criação baseou-se nas noções de “jogo de dentro” e “jogo de fora” extraída de Silva (2010), a grosso modo, o

“jogo de dentro” consiste em experimentações de onde são retiradas os pontos que no “jogo de fora” são organizados, transformados e editados, a partir do olhar de fora.

3.1 Lugares/momentos e o “jogo de dentro”

A vela é um objeto forte em significados para o universo religioso, representando um elo com o sobrenatural. O ato de acender uma vela para uma oração pode ser entendida como uma espécie de conexão com o sagrado.

Essa ação no “jogo de dentro” foi utilizada como uma porta de entrada para um tempo/espaço “ritualístico”.

O lugar/momento do Preto velho é um dos que mais me cativa. Ele surge logo após a vela, criando esse elo direto com o passado, mas também com o futuro. Um túnel do tempo onde se revive a ancestralidade, do mesmo modo que está ligada a velhice que ainda virá. A ideia/sensação que temos nessa imagem faz referência direta ao Preto Velho que se manifesta nos ritos da umbanda e também o jogo de uma das facetas a qual a entidade Zé Pelintra se manifesta – a linha das almas.

A ideia de definir um lugar/momento como sendo o Ponto cantado, parte da significativa importância da música no ritual da umbanda.

“Oi Zé quando vem lá de Alagoas Toma cuidado com o balanço da canoa Oi Zé, faça tudo o que quiser Só não maltrate o coração dessa mulher”.

(Recolhido na Tenda de Umbanda Vovó Maria Conga e Caboclo das Sete Encruzilhadas) A encruzilhada é aqui relacionada ao do povo da rua, é exu quem fala agora, dá receitas e aconselha com sua forma mais bruta e direta. Nesse ponto, vemos clara a relação de incorporação e do não domínio do corpo. É

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esse o momento em que o dono do corpo se manifesta, brinca, ri e se diverte.

Turbulência.

O ponto riscado insere-se como marca “de quem por aqui passou”. Na umbanda essa iconografia é utilizada antes ou depois da incorporação da entidade no corpo do médium.

Esses lugares/momentos definidos no “jogo de dentro” como pontos de um mapa, deveriam na improvisação, serem ligados por passagens que iam se definindo no próprio exercício. Por passagens, entendemos as transições entre um lugar/momento e outro, que aos poucos foram ganhando seus próprios significados.

Entre a vela e o preto velho: Chamamos essa passagem de passarela, onde acontece a transformação do novo em velho; um ir e vir entre passado e futuro; um dos elementos que aparecem aqui são os estalos dos dedos do preto velho. Entre o preto velho e o ponto cantado: metamorfose do velho em novo. Do corpo cansado, cheio de mágoas, dores e marcas, a uma energia jovial, que desemboca no malandro do ponto cantado. Entre o ponto cantado e a encruzilhada: Diferente das outras passagens, essa transição acontece de forma repentina, como quando um capoeira se distrai, e toma uma rasteira.

Uma queda em meio encruzilhada. Entre encruzilhada e o ponto riscado:

impulso da saída (desincorporar) da entidade, seguida do abandono do corpo ao chão. Cansaço. Entrega. Onde o corpo reverbera a ação da encruzilhada.

3.2 “Jogo de Fora”

No “jogo de fora”, acontece a ação mais diretiva por parte da direção e de outros participantes do grupo, nesse momento o trabalho é lapidado e finalizado.

Inicio: a entrada do público acontece ao som da musica Labará, um canto em ioruba retirado do álbum CANDOMBLÉSS de Carlinhos Brown, pois buscamos algo que nos remetesse a figura de Exu como é tratado no candomblé, onde é um orixá a quem é atribuído muita importância pelo fato de ser ele o mensageiro entre os deuses e os humanos. Visto que essa figura é deturpada na umbanda, dando origem a noção de “exu”.

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Incelênça: desde o inicio do trabalho, intuitivamente, apontou-se o desejo de inserir na cena algo da intérprete Clementina de Jesus, por vermos nela a imagem simbólica encontrada nas mães de santo. Assim incluímos a musica Incelência.

“Uma Incelênça que pra ele Uma Incelênça que pra ele Mãe de Deus, mães de Deus Oh mãe de Deus, rogai a Deus por ele”.

(Álbum Marinheiro Só Clementina de Jesus, 1973).

A incelência é um tipo de canção, de caráter religioso, cantada em velório e enterros, na cena ela aparece relacionada com a morte de Zé Pelintra e é cantada em forma de prece.

Samba: a relação entre o malandro e o samba e tratada no ponto cantado, que evoluiu coreograficamente em passos de dança próprias do universo do samba e foi nesse momento que a presença de música ao vivo se tornou fundamental recurso, que passa a ser utilizado em toda a cena.

Altar: objeto central dentro do culto da umbanda, o altar é trazido para a cena na forma de cenário, que é incluído de forma interativa. Para chegar ao altar, incluímos a música que é cantada na despedida da entidade Zé Pelintra.

“Seu Zé Pelintra, onde é que o senhor mora?

Seu Zé Pelintra onde é sua morada?

Eu não posso lhe dizer”.

Porque cuncê não vai me compreender.

Eu nasci no juremá.

Minha morada é bem pertinho de Oxalá.

(Recolhido na Tenda de Umbanda Vovó Maria Conga e Caboclo das Sete Encruzilhadas) História: uma das historias contadas na pesquisa de campo por Zé Pelintra, foi adaptada e inserida na parte final da cena, momento em que o ator interage com outros elementos que fazem parte no universo da entidade Zé Pelintra tais como, a cachaça, o terno branco, o sapato branco, o gravata encarnada, o cachimbo e por fim o chapéu.

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Bibliografia

FERRACINI, R. Café com Queijo: Corpos em Criação. São Paulo: Ed. Fapesp, 2006.

LIGIÉRO, Zeca. Malandro Divino: A vida e a lenda de Zé Pelintra, personagem mítico da Lapa carioca. Rio de Janeiro: Record : Nova Era, 2004.

Acessado em : Abril de 2011.

ORTIZ, Renato. A morte branca do feiticeiro negro: umbanda e sociedade brasileira. 2 ed .São Paulo: Brasiliense, 1999.

SILVA, Renata de Lima. Mandinga da rua: a construção do corpo cênico a partir de elementos da cultura popular urbana. 2004. Dissertação de Mestrado, Programa de Pós-Graduação em Artes, Universidade Estadual de Campinas.

Instituto de Artes, Campinas, SP: [s.n.], 2004. Disponível em:

http://cutter.unicamp.br/document/?code=vtls000350580 Acessado em: 17 de maio de 2011.

_____________. O corpo limiar e as encruzilhadas: a capoeira angola e os sambas de umbigada no processo de criação em dança brasileira contemporânea. 2010. Tese de Doutorado, Programa de Pós-Graduação em Artes, Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Artes, Campinas SP:

[s.n], 2010. Disponível em: http://www.bibliotecadigital.unicamp.br/document/?

code=000615943 Acessado em: 17 de maio de 2011.

SODRÉ, Muniz. O samba: o dono do corpo. Rio de Janeiro: Maud, 1998.

Referências

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