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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ FACULDADE DE MEDICINA DEPARTAMENTO DE SAÚDE COMUNITÁRIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SAÚDE COLETIVA ISABELLE DA SILVA GAMA

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ FACULDADE DE MEDICINA

DEPARTAMENTO DE SAÚDE COMUNITÁRIA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SAÚDE COLETIVA

ISABELLE DA SILVA GAMA

INQUÉRITO NACIONAL SOBRE VIOLÊNCIA NA VIDA DA POPULAÇÃO PENITENCIÁRIA FEMININA BRASILEIRA

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ISABELLE DA SILVA GAMA

INQUÉRITO NACIONAL SOBRE VIOLÊNCIA NA VIDA DA POPULAÇÃO PENITENCIÁRIA FEMININA BRASILEIRA

Projeto de Tese apresentada ao Curso de Doutorado em Saúde Coletiva do Departamento de Saúde Comunitária, da Universidade Federal do Ceará, como parte dos requisitos para obtenção do título de Doutor em Saúde Coletiva. Área de concentração: epidemiologia das causas externas.

Orientador: Prof. Dr. José Gomes Bezerra Filho

Co-orientadora: Profa. Dra. Lígia Regina Sansigolo Kerr

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ISABELLE DA SILVA GAMA

INQUÉRITO NACIONAL SOBRE VIOLÊNCIA NA VIDA DA POPULAÇÃO PENITENCIÁRIA FEMININA BRASILEIRA

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DEDICATÓRIA

A Deus,

(6)

AGRADECIMENTOS

A Deus, por ter me proporcionado saúde para enfrentar, sempre com fé, mais esta jornada. E por ter permitido que meus pais pudessem participar desse momento, tão especial, de crescimento na minha vida acadêmica e profissional.

Aos meus pais Carlos e Célia, pela energia e apoio para que eu pudesse concretizar mais uma etapa importante na minha trajetória de vida. Pessoas sem as quais nada seria possível de ser realizado.

Ao meu irmão Christofer, que mesmo distante sempre se alegrou pelo meu sucesso.

Ao meu professor e orientador Prof. Dr. José Gomes Bezerra Filho, por todos os momentos de confiança, ajuda, compreensão, disponibilidade e, sobretudo, amizade ao longo dos 6 anos de pós-graduação.

Aos meus co-orientadores Prof.ª Dra. Ligia Regina Sansigolo Kerr e Prof. Dr. Carl Kendall, por estarem sempre disponíveis a colaborar com esse trabalho e por terem me proporcionado grandes momentos de aprendizado e amizade no exterior durante uma etapa do doutorado no exterior.

A Prof.ª Dra. Linda Maia, que desde a minha graduação me inspirou profissionalmente e tem me proporcionado momentos únicos de aprendizado e amizade ao longo de toda a minha trajetória acadêmica.

A Prof.ª Dra. Luiza Jane Eyre, a qual sempre colaborou com meu aprendizado pessoal e profissional. Com sua imensa sensibilidade, sempre me apoiou nos momentos mais difíceis dessa jornada.

Ao Dr. Suertônio Moura, pelo incentivo ao meu ingresso na pós-graduação da Universidade Federal do Ceará.

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Aos participantes da pesquisa de todos os estados participantes de pesquisa, que disponibilizaram seu tempo e energia com muito empenho a fim de colaborar, de forma essencial, com esse imenso trabalho.

À Banca examinadora, pelo tempo despendido na avaliação criteriosa e qualificada deste trabalho. Agradeço pelas sugestões, comentários e críticas.

Ao meu marido Caio, pela compreensão, incentivo e apoio incondicional em todos os momentos da minha vida e, em especial, durante esse longo percurso de 6 anos de pós-graduação.

Aos meus amigos de longa data que sempre me apoiaram e compreenderam minha ausência durante mais esse período de dedicação aos estudos.

A Dominik e à Zenaide, secretárias do Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva da Universidade Federal do Ceará, pela disponibilidade e presteza em todos os momentos.

Às mulheres desse estudo que tiveram suas vidas, de certa forma, expostas mesmo que anonimamente. E depositaram confiança na nossa equipe de trabalho, mesmo diante de tanto desespero e sofrimento. Que Deus esteja sempre com essas pessoas.

À CAPES, pela contribuição financeira em forma de bolsa de doutorado no Brasil e no Exterior.

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“O sucesso nasce do querer, da

determinação e persistência em se chegar

(9)

RESUMO

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drogas, ter ido alguma vez para isolamento e ter sofrido violências antes da prisão, foram estatisticamente associados a diferentes tipologias de violências sofridas no interior da prisão. Tais resultados trazem visibilidade à questão do encarceramento feminino e sua relação com violência sofrida e perpetrada. Ademais, fornece dados concretos para efetivação das estratégias existentes com o proposito de reduzir o impacto da violência em prisões femininas e suas consequências à saúde da mulher encarcerada.

(11)

ABSTRACT

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addition, it provides concrete facts to effect existing strategies with the purpose of reducing the impact of violence in women's prisons and its consequences to the health of incarcerated women.

(13)

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Levantamento das unidades prisionais femininas do Brasil segundo Departamento Penitenciário Nacional, 2012 ... 42 Tabela 2 – Levantamento das unidades prisionais femininas do Brasil por estados

segundo Departamento Penitenciário Nacional, 2012 ... 43 Tabela 3 – Levantamento dos presídios por região, estado e faixa do numero de

presas segundo Departamento Penitenciário Nacional, 2012. ... 44 Tabela 4 – População alvo para seleção da amostra composta por unidades

penitenciárias femininas do Brasil segundo levantamento realizado com dados do Departamento Penitenciário Nacional, 2012 ... 45 Tabela 5 – População penitenciária feminina brasileira que deveria compor a

amostra calculada a partir dos dados fornecidos pelo Departamento Penitenciário Nacional, 2012 ... 46 Tabela 6 População penitenciária feminina brasileira que deverá compor a amostra

calculada a partir dos dados fornecidos pelo Departamento Penitenciário Nacional, 2012 ... 47 Tabela 7 População penitenciária feminina brasileira que deveria compor a

amostra por estrato, região, estado, capital ou interior, calculada a partir dos dados fornecidos pelo Departamento Penitenciário Nacional, 2012 48 Tabela 8 – População penitenciária feminina brasileira que deverá compor a amostra

por estrato, região, estado, município e estabelecimento penal calculada a partir dos dados fornecidos pelo Departamento Penitenciário Nacional, 2012 ... 49 Tabela 9 – Presídios selecionados para compor a amostra nacional da população

penitenciária feminina brasileira segundo dados do Departamento Penitenciário Nacional, 2012 ... 50 Tabela 10 – Amostra inicial da população penitenciária feminina brasileira

selecionada para o estudo, segundo dados do Departamento

Penitenciário Nacional, 2012 ... 52 Tabela 11 – Diferença entre a amostra inicial prevista e a amostra real da população

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2015 ... 72 Tabela 13 – Perfil socioeconômico e prisional da população penitenciária feminina

em 8 estados brasileiros e o Distrito Federal, 2013-2015 ... 76 Tabela 14 – População penitenciária feminina vítima de violência antes da prisão em 8 estados brasileiros e o Distrito Federal, 2013-2015 ... 79 Tabela 15 – Violências referidas antes da prisão e seus perpetradores segundo a

população penitenciária feminina em 8 estados brasileiros e o Distrito Federal, 2013-2015 ... 81 Tabela 16 – Sequelas e motivos referidos pela população penitenciária feminina

vítima de violência antes da prisão em 8 estados brasileiros e o Distrito Federal, 2013-2015 ... 82 Tabela 17 – Faixa etária frequência das tipologias de violências sofridas pela

população penitenciária feminina antes da prisão em 8 estados

brasileiros e o Distrito Federal, 2013-2015 ... 83 Tabela 19 Tipologias de violência sofrida pela população penitenciária brasileira

feminina no interior da prisão em 8 estados brasileiros e o Distrito

Federal, 2013-2015 ... 85 Tabela 20 – Atendimento de saúde à população penitenciária feminina vítima de

violência no interior da prisão em 8 estados brasileiros e o Distrito

Federal, 2013-2015 ... 86 Tabela 21 – Violências referidas pela população penitenciária feminina brasileira no

interior da prisão em 8 estados brasileiros e o Distrito Federal, 2013-2015 ... 87 Tabela 22 – Frequência de violência sofridas no interior da prisão pela população

penitenciária feminina brasileira em 8 estados brasileiros e o Distrito Federal, 2013-2015 ... 89 Tabela 23 – Frequência de presas que já foi para a cela de isolamento ou tranca

entre a população penitenciária feminina brasileira em 8 estados

brasileiros e o Distrito Federal, 2013-2015 ... 90 Tabela 24 – Perfil e histórico prisional mulheres associados às tipologias de violência

(15)

Tabela 25 – Perfil e histórico prisional mulheres associados às tipologias de violência sofridas no interior das prisões pela população penitenciária feminina brasileira no interior da prisão em 8 estados brasileiros e o Distrito

Federal, 2013-2015 ... 99 Tabela 26 – Perfil e histórico prisional mulheres associados às tipologias de violência

sofridas no interior das prisões pela população penitenciária feminina brasileira no interior da prisão em 8 estados brasileiros e o Distrito

Federal, 2013-2015 ... 101 Tabela 27 – Perfil e histórico prisional mulheres associados às tipologias de violência

sofridas no interior das prisões pela população penitenciária feminina brasileira no interior da prisão em 8 estados brasileiros e o Distrito

Federal, 2013-2015 ... 102 Tabela 28 Consumo de outras drogas associados às tipologias de violência

sofridas no interior das prisões pela população penitenciária feminina brasileira no interior da prisão em 8 estados brasileiros e o Distrito

Federal, 2013-2015 ... 104 Tabela 29 Fatores relacionados às doenças crônicas não transmissíveis

associados às tipologias de violência sofridas no interior das prisões pela população penitenciária feminina brasileira no interior da prisão em 8 estados brasileiros e o Distrito Federal, 2013-2015 ... 107 Tabela 30 – Mulheres punidas na cela de isolamento e as violências sofridas no

interior da prisão pela população penitenciária feminina brasileira no interior da prisão em 8 estados brasileiros e o Distrito Federal, 2013-2015 ... 109 Tabela 31 – Violências físicas sofridas no interior da prisão versus violências físicas

sofridas anterior à prisão associados às tipologias de violência sofridas antes da prisão pela população penitenciária feminina brasileira no interior da prisão em 8 estados brasileiros e o Distrito Federal, 2013-2015 ... 110 Tabela 32 – Violências sofridas no interior da prisão associados às tipologias de

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Tabela 33 – Teste de bondade do modelo Hosmer-Lemeshow. Goodness-of-fit test ... 112 Tabela 34 – Razão de chances não ajustada e ajustada através de regressão

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LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 – População carcerária feminina do Brasil versus quantidade de vagas nas unidades prisionais. ... 29 Gráfico 2 – Encarceramento feminino versus tipos de regime prisional ... 30 Gráfico 3 – Boxplot referente à média de idade das mulheres encarceradas em 8

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

PNSSP Plano Nacional de Saúde no Sistema Penitenciário

PNPM Plano Nacional de Políticas para Mulheres

PNAISP Política Nacional de Atenção Integral à Saúde das Pessoas Privadas de Liberdade no Sistema Prisional

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

DEPEN Departamento Penitenciário Nacional

LEP Lei de Execução Penal

INFOPEN/MJ Sistema Integrado de Informações Penitenciárias

SUS Sistema Único de Saúde

CEP Comitê de Ética em Pesquisa

CEDAW Convenção sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação Contra a Mulher

CNJ Conselho Nacional de Justiça

SPM Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres

PNAMPE Política Nacional de Atenção às Mulheres em Situação de Privação de Liberdade e Egressas do Sistema Prisional

MJ Ministério da Justiça

BOP Federal Bureau of Prisons

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 8

1.1 Dados gerais acerca do sistema penitenciário brasileiro ... 10

1.2 Justificativa ... 13

1.3 Trajetória da autora ... 14

2 OBJETIVOS ... 16

2.1 Objetivo geral ... 16

2.2 Objetivos específicos ... 16

3 REVISÃO DE LITERATURA ... 17

3.1 Breve história das prisões femininas no Brasil ... 17

3.2 Sistema penal e gênero ... 20

3.3 Uma questão de terminologias ... 26

3.4 População penitenciária feminina no mundo ... 27

3.5 População penitenciária feminina no Brasil ... 28

3.6 Violência e a mulher encarcerada: garantia de direitos ... 31

3.7 O ciclo da violência na vida das mulheres encarceradas ... 34

3.8 Conceituação do sistema prisional brasileiro ... 37

3.9 Desafios da pesquisa no sistema prisional ... 39

4 METODOLOGIA ... 41

4.1 Delineamento do estudo ... 41

4.2 População e amostra ... 41

4.3 Critérios de inclusão e exclusão ... 41

4.4 Período e local ... 41

4.5 Amostra ... 42

4.6 Coleta de dados ... 55

4.6.1 Variáveis coletadas ... 55

4.6.2 Histórico de violências sofridas e perpetradas antes e durante a prisão 56 4.6.3 Dos tipos de violência a que se refere à Lei n° 11.340/06 ... 57

4.6.4 Variáveis coletadas relacionadas à violência na vida da população penitenciária feminina brasileira ... 59

4.7 Análise estatística ... 65

4.8 Treinamento dos observadores ... 65

4.9 Aspectos éticos ... 67

4.10 Cronograma e plano de ação ... 68

4.11 Cronograma ... 70

4.12 Orçamento ... 71

5 Resultados gerais ... 74

5.1 Perfil população penitenciária feminina brasileira pertencente a 8 estados brasileiros e o Distrito Federal ... 74

(20)

5.2.3 Faixa etária e frequência da violência sofrida pela população

penitenciária feminina brasileira vítima de violência antes da prisão em 8

estados brasileiros e o Distrito Federal. ... 82

5.3 Violência na vida da população penitenciária feminina brasileira no interior da prisão em 8 estados brasileiros e o Distrito Federal ... 84

5.3.1. Prevalências e tipologias de violências no interior da prisão atual ou em prisões anteriores ... 84

5.3.2. Violências e seus perpetradores no interior das prisões ... 86

5.3.3. Frequência dos episódios de violência sofridos no interior da prisão .. 88

5.4 Possíveis fatores associados à vitimização da mulher no interior da prisão ... 91

6 DISCUSSÃO ... 112

7 Conclusão ... 130

REFERÊNCIAS ... 132

Apêndice A Manual Operacional ... 153

Apêndice B Instrumento de coleta de dados ... 212

ANEXO A PARECER CONSUBSTANCIADO DO CEP ... 264

ANEXO B Termo de consentimento livre e esclarecido... 265

(21)

INTRODUÇÃO

Os sistemas prisionais estão inseridos no contexto da saúde pública no sentido de garantir o princípio da equidade em saúde, tendo em vista sua conformação e relação com a sociedade (BERGH et al., 2011). Ao privar alguém de sua liberdade, o Estado torna-se responsável por oferecer todos os cuidados de saúde reclamados por esse indivíduo, bem como condições que promovam e garantam a integridade física e mental do indivíduo (BRASIL, 1984; MOLLER et al., 2007; BRASIL, 2014f).

Entretanto, nem sempre essas premissas são atendidas e a superlotação é um dos problemas crônicos que afligem o sistema penal. Essa situação, aliada às precárias condições de higiene, à falta de controle de qualidade dos alimentos fornecidos, à falta de atividades laborais e físicas, ao uso de drogas, revela-se como fatores de risco à saúde da população carcerária (BRASIL, 2009; BORGES, 2011a). Diante de todas essas condições, as relações violentas emergem exercendo significativo impacto no panorama penitenciário.

Nesse cenário, uma população ainda frequentemente é posta à margem do sistema penitenciário brasileiro: a população carcerária feminina. Segundo o Sistema Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen), o encarceramento feminino até 2014 havia aumentado 256% em relação aos 12 anos que antecedem a pesquisa, ocasionando um déficit de aproximadamente 14 mil vagas nos presídios femininos. Mesmo assim, essas mulheres representam, em média, 7% da população carcerária, correspondendo a aproximadamente 36 mil presas (BRASIL, 2013). A maioria condenada por envolvimento com tráfico de drogas, com variação de percentual entre 40 e 80% na literatura (SOARES; ILGENFRITZ, 2002; RAMPIN, 2011; BRASIL, 2012c).

Dentre as especificidades do sistema carcerário vigente no Brasil, a institucionalização da violência de gênero é um problema característico. Representa

“a perpetração da violência contra a população carcerária feminina brasileira a partir

da imposição de um sistema penal e penitenciária androcêntricos” (RAMPIN, 2011a, p. 29), negando a dignidade às mulheres. A concepção do sistema penitenciário acaba por institucionalizar a violência como um fator “intrínseco” ao seu

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Embora algumas unidades prisionais femininas não registrem prática de violência física, outras unidades recebem frequentes denúncias de graves violações contra a integridade emocional e física dessas mulheres (SOARES; ILGENFRITZ, 2002; CEJIL, 2007). Soares e Ilgenfritz (2002) revelam que mais de 95% das mulheres encarceradas em uma unidade prisional no Rio de Janeiro já foram vítimas de violência na infância e/ou na vida adulta. Na infância por parte de seus responsáveis e, na vida adulta, tanto por parte dos companheiros(as) em ambiente doméstico quanto em situação de prisão por parte de policiais civis, militares ou federais.

Embora estudos voltados ao entendimento das questões voltadas às mulheres encarceradas ainda sejam insuficientes, pesquisas existentes indicam que essa população experimentou situações mais severas e frequentes de violência interpessoal em relação à população feminina geral (BROWNE et al., 1999; SOARES; ILGENFRITZ, 2002; BYRD; DAVIS, 2008a; DE RAVELLO et al., 2008; DEHART, 2008; WOLFF et al., 2008; PEREZ et al., 2010; SUNG, 2010; SCHENK; FREMOUW, 2012; MACDONALD, 2013; FUENTES, 2014; KELLY et al., 2014).

Sabe-se que o ambiente prisional no todo necessita de reformas em diversos âmbitos: estrutura física, recursos humanos, ambiente de convívio, etc.. Tais reformas exercem impacto direto ao sujeito aprisionado tanto em seu estado emocional quanto psicológico. Contudo, ao constatar a atual estrutura prisional, a situação se agrava quando esses sujeitos são mulheres, pois sabe-se o ambiente prisional é inadequado às peculiaridades de gênero (RAMPIN, 2011). Tal condição é exemplificada por Dráuzio Varella (2012), no livro Carcereiros, ao revelar que a Penitenciária do Estado de São Paulo, hoje prisão feminina, decadente e em condições insalubres, era exclusivamente masculina na época que foi considerada modelo internacional, décadas de 1920 a 1940. Outro caso é descrito no Paraná, onde detentas estiveram alojadas de forma precária em vários locais improvisados e principalmente na enfermaria do presídio masculino (Penitenciária Central do Estado-PCE) antes da criação do definitivamente no presídio feminino em 1970 (PRIORI, 2012).

(23)

relação às mulheres, por muito tempo, revelou-se em segundo plano (SOARES; ILGENFRITZ, 2002; RAMPIN, 2011).

Contudo, em 2014 foi instituída a portaria interministe256rial n.1, de 2 de janeiro de 2014, marco político notável referente à saúde das pessoas em privação de liberdade, sem diferenças de gênero. Instituiu-se a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde das Pessoas Privadas de Liberdade no Sistema Prisional (PNAISP) no âmbito do SUS (BRASIL, 2014f). O foco envolve a importância da definição e implementação de ações e serviços que viabilizassem uma atenção integral à saúde da população compreendida pelo sistema prisional brasileiro.

Além da PNAISP, o Ministério da Justiça instituiu em 2014 a Política Nacional de Atenção às Mulheres em Situação de Privação de Liberdade e Egressas do Sistema Prisional (PNAMPE) (BRASIL, 2014e), por meio de portaria interministerial publicada no Diário Oficial da União. Segundo o texto, a PNAMPE tem como objetivo, com a atuação conjunta e articulada de todas as esferas de governo, a prevenção de todos os tipos de violência contra mulheres em situação de privação de liberdade e a humanização das condições do cumprimento da pena. Ademais, a portaria também propõe o incentivo à construção e adaptação de unidades prisionais para o público feminino.

Entretanto, no cenário atual, a política nacional tenta resgatar o sentido da instituição prisional, além de dar o devido enfoque às necessidades peculiares ao gênero em relação às mulheres encarceradas. Portanto, visto as violências a que estão submetidas as mulheres no sistema prisional, esta tese buscará subsidiar a aplicação de políticas públicas direcionadas às mulheres em privação de liberdade no Brasil, em especial a PNAISP e a PNAMPE.

Para tal, pretende investigar, além do perfil da população penitenciária feminina brasileira, o histórico de violência na vida dessas mulheres tanto antes quanto durante a prisão. Dessa forma, buscar-se-á caracterizar a violência na vida da população penitenciária feminina brasileira através de um Inquérito Nacional.

(24)

Mais de 10 milhões de pessoas vivem em unidades prisionais em todo o mundo. O sistema prisional brasileiro é o quarto no ranking internacional em número de pessoas, com população carcerária estimada em aproximadamente 711.463mil (levam em conta as 147.937 pessoas em prisão domiciliar) ficando atrás apenas dos Estados Unidos (2,2 milhões), da China (1,5 milhão) e da Rússia (870 mil) (BRASIL, 2009). A população penitenciária feminina brasileira obteve crescimento de 567% entre os anos de 2000 e 2014, enquanto a taxa de crescimento geral da população penitenciária foi de 119% no mesmo período (BRASIL, 2014).

Cerca de 90% desses presos estão custodiados no sistema penitenciário, seja em caráter provisório ou condenação. Convivem com essa população 104.455 servidores penitenciários (funcionários públicos na ativa), sendo 71.679 agentes prisionais e os demais distribuídos entre as milhares cadeias públicas e/ou delegacias nacionais masculinas, femininas ou mistas (BRASIL, 2012b).

O histórico de cada pessoa presa determina onde ela é alojada. O Brasil possui 1.478 estabelecimentos penais públicos de diversos tipos. Essas unidades são administradas pelo Poder Executivo com a finalidade de custódia de sentenciados ou não, mediante determinação do Poder Judiciário. De acordo com o Portal Brasil do Governo Federal Cidadania e Justiça, são consideradas unidades exclusivamente femininas: 53 penitenciárias, 4 colônias agrícolas, 7 casas do albergado e 5 hospitais de custódia e tratamento psiquiátrico (BRASIL, 2014a). Entretanto, existem diversas unidade prisionais consideradas mistas, onde são detidos homens e mulheres em alas diferenciadas. De acordo com levantamento realizado para a execução esta pesquisa, foram identificados 259 presídios onde mulheres estão sob custódia do Estado ou Município1.

Quanto ao “perfil criminológico”, homens e mulheres não apresentam o mesmo padrão. Em São Paulo, a maioria das mulheres está encarcerada em razão de envolvimento com o tráfico de drogas (RAMPIN, 2011). Por outro lado, percebe-se que os delitos cometidos por mulheres nas ultimas décadas estão equiparados

aos chamados antes “delitos masculinos”; além do tráfico de drogas, há casos de roubo, sequestro e homicídio (BORGES; COLOMBAROLI, 2011).

Até a maior parte do século XX, grande parte das instituições de confinamento feminino continuou funcionando à margem do sistema carcerário

(25)
(26)

1.2 Justificativa

Estudos no âmbito da população carcerária feminina ainda são escassos. Diversos pesquisadores tem se dedicado aos estudos acerca da problemática violência e da criminalidade, mas poucos são os que se voltam para realidade prisional (JULIÃO; ONOFRE, 2013).

Durante muito tempo, a análise da criminalidade feminina era limitada aos chamados delitos de gênero (infanticídio, aborto, homicídios passionais) ou outros delitos relacionados aos crimes envolvendo cônjuges (BUGLIONE, 2000; BORGES, 2011a; RAMPIN, 2011). Entretanto, pesquisas indicam relatos de experiências mais severas e frequentes de violência interpessoal por mulheres encarceradas do que pela população feminina em geral (BROWNE et al., 1999; HLAVKA et al., 2007; MUFTIC et al., 2007; BYRD; DAVIS, 2008a; DE RAVELLO et al., 2008; TUSHER; COOK, 2010; LEWIS, 2011; SHECHORY et al., 2011; WOLFF; SHI, 2011; SCHENK; FREMOUW, 2012; WALSH et al., 2012; KUO et al., 2013; MACDONALD, 2013; TRIPODI; PETTUS-DAVIS, 2013; FUENTES, 2014; KELLY et al., 2014).

Apesar dos estudos referidos acima terem investigado o comportamento relacionado a traumas interpessoais em populações prisionais femininas, Banyard et al. (2001) afirmam que pouco se sabe acerca do impacto dessas experiências na vida de mulheres privadas de liberdade. Portanto, a possível relação entre os traumas violentos e o comportamento criminoso na vida de mulheres necessitam de investigação mais aprofundada (BYRD; DAVIS, 2008a; FUENTES, 2014; KELLY et al., 2014).

A importância da abordagem dessa questão reside no propósito de verificar relatos de violência nas diferentes fases da vida dessas mulheres: na infância, por parte de seus responsáveis; na vida adulta fora da prisão, por parte dos companheiros(as); ou na vida adulta já na prisão, por parte de outras mulheres ou de funcionários(as) institucionais. Dessa forma, será possível constatar se o histórico de violência transcorre a vida dessas mulheres encarceradas.

A Constituição Federal estabelece, em seu artigo 5º, inciso III, que

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nacional é conhecido como ambiente onde torturas psicológicas e físicas passam a

ser “inerentes” ao sistema, independente das questões de gênero (SOARES; ILGENFRITZ, 2002; RAMPIN, 2011). Agrega-se a esse cenário pessoas doentes sem atendimento médico mantidas em celas em que não há condições mínimas de salubridade. No caso das unidades femininas, muitas vezes, a situação é agravada (BRASIL, 2009).

Diante disso, dentre as estratégias desenvolvidas para reduzir o impacto da violência tanto em unidades prisionais masculinas quanto em femininas, a Secretaria Especial de Políticas Públicas para Mulheres da Presidência da República firmou acordo entre os estados brasileiros para a efetivação do Pacto Nacional pelo Enfrentamento à Violência contra a Mulher, lançado em 2007, na 2ª Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres, em Brasília. Entre as prioridades, está a consolidação da Política Nacional de Enfrentamento da Violência contra as Mulheres e a promoção dos direitos humanos de mulheres presas (BRASIL, 2011b).

A despeito da relevante Política Nacional de Atenção Integral à Saúde das Pessoas Privadas de Liberdade no Sistema Prisional (PNAISP) (2014f) e da Política Nacional de Atenção às Mulheres em Situação de Privação de Liberdade e Egressas do Sistema Prisional (PNAMPE) (2014e) e o Pacto Nacional pelo Enfrentamento à Violência Contra a Mulher (2011b), até o momento não existem estudos de abrangência nacional avaliando os agravos gerados pela violência na vida da população penitenciária feminina brasileira.

Visto a dificuldade de pesquisadores em adentrar o campo peculiar da prisão, a falta quase absoluta de dados impede o planejamento e a execução das políticas públicas existentes, além de ações voltadas para essas populações. Os resultados deste estudo, portanto, devem subsidiar a implementação de referidas políticas públicas já citadas anteriormente, no que diz respeito ao controle e redução dos agravos à violência e suas consequências à saúde da mulher encarcerada.

1.3 Trajetória da autora

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Defesa da Mulher (DDM) de Fortaleza e, como principal resultado, concluiu-se que essas denúncias formais realizadas pela mulheres vítimas de violência diminuíam o risco de agressão física por parte do(a) parceiro(a). A dissertação foi publicada como livro, em 2014 pela editora Novas Edições Acadêmicas, com o título Violência contra a mulher por parceiro íntimo: magnitude de fatores associados (GAMA et al., 2014) . Além do livro citado como um dos produtos da dissertação, a autora participou da organização do livro Acidentes e violências: um abordagem interdisciplinar, publicado pela editora EdiçõesUFC em 2014. Faz parte dessa obra o capítulo de livro intitulado “Violências contra a mulher: magnitude e fatores

associados”, desenvolvido em parceria com o orientador Prof. Dr. José Gomes Bezerra Filho e o Prof. Francisco Herlânio Costa Carvalho.

A autora faz parte do grupo de estudos sobre violência Ação pela Paz, pertencente ao Departamento de Saúde Comunitária da Universidade Federal do Ceará (UFC), e trabalha em parceria com o Núcleo de Estudos e Pesquisas em Acidentes e Violência (NEPAV), sediado na Universidade de Fortaleza (UNIFOR). Como um dos produtos dessa parceria, publicou-se o artigo intitulado “Fatores

associados à violência física denunciada por mulheres” na revista Journal of Health and Biological Sciences, em 2014.

Diante da trajetória acadêmica dedicada aos estudos sobre violência e mulher, a autora foi convidada a participar do Inquérito Nacional de Saúde do Sistema Penitenciário Feminino Brasileiro, que investigará, com a participação de outros pesquisadores, as condições de saúde das mulheres em privação de liberdade no Brasil. Dentre as condições de saúde, serão investigados aspectos relacionados à violência sofrida por essas mulheres antes e durante a prisão, ou seja, o objeto deste estudo a ser apresentado.

Referido inquérito é financiado pelo Ministério da Saúde, CNPq e CAPES. Logo, os resultados somente poderão ser divulgados após a apresentação ao Ministério da Saúde. Contudo, a primeira proposta de veiculação de resultados

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OBJETIVOS

2.1 Objetivo geral

Caracterizar a violência na vida das mulheres em situação de privação de liberdade através do Inquérito Nacional sobre Violência na População Penitenciária Feminina Brasileira.

2.2 Objetivos específicos

 Descrever o perfil sociodemográfico da população penitenciária feminina brasileira.

 Estimar a prevalência dos tipos de violência sofridos pela população penitenciária feminina antes e durante a prisão.

 Identificar os perpetradores das violências sofridas antes e durante a prisão.

 Identificar os possíveis fatores associados à ocorrência dos eventos das violências durante a prisão.

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REVISÃO DE LITERATURA

3.1 Breve história das prisões femininas no Brasil

Na Antiguidade, a prisão era um lugar destinado a deter indivíduos e fazê-los aguardar por seu castigo, seja a morte, seja a venda como escravo, por exemplo. Apenas em torno do século XVIII, é que nasce o estabelecimento prisional: a criação da pena de encarceramento em que a punição seria a partir de então determinada pela restrição de liberdade. Todavia, à medida que ainda se acredite na sua reforma, elas podem ser o lugar para recuperação daqueles que tiveram suas condutas socialmente condenadas (MAIA et al., 2009).

As prisões modernas parecem já ter sido construídas em processo de colapso e esgotamento, já que os governos parecem não considerar a prisão um relevante tema político e local de investimento adequado; mas, Ao longo do tempo, tem-se observado o descaso dos governos em relação às prisões, excluindo-as do investimento público, o que as leva a um processo de abandono e esquecimento (MAIA et al., 2009). Michel Foucault, filósofo francês, motivou grandes mudanças que se produziram nos sistemas penais ocidentais durante a Era Moderna, aproximou a prisão da realidade acadêmica e, inclusive, exerceu importante influencia no Brasil no que diz respeito ao tema (FOCAULT, 1975; MAIA et al., 2009).

No cenário brasileiro, as prisões tiveram papel significativo na implementação dos mecanismos de dominação após a independência. Eram situadas em edifícios insalubres sem controle de entrada e saída de presos, categoria ou delito cometido. Resumiam-se a locais de detenção para suspeitos ou delinquentes já condenados que aguardavam a execução da sentença que, muitas vezes, ainda incluíam execução pública, marcas, açoites e trabalho forçado. Faziam parte dessas instituições de confinamento, cadeias, postos policiais e militares, centros privados de detenção (onde delinquentes e escravos eram confinados e obrigados a exercer trabalho forçado), casas religiosas para mulheres desamparadas, entre outros (MAIA et al., 2009).

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mulheres, talvez tenha sido uma das poucas inovações nos países latino-americanos durante a segunda metade do século XIX.

No Brasil, a iniciativa de criar centros de detenção para mulheres advinha, em grande parte, de grupos filantrópicos e religiosos, não de autoridades do Estado nem reformadores das prisões. As noções iniciais de reabilitação ou regeneração das presas partia do pressuposto de que elas não precisavam de um regime rigoroso como os homens, e sim de um ambiente amoroso e maternal, pois a figura feminina era tida como frágil e, muitas vezes, com pouca inteligência (MAIA et al., 2009).

É evidente que debates que geriram a construção de penitenciárias inspiradas na criminologia positivista da década de 1870, não deram devida importância para o caso de mulheres criminosas e seu encarceramento. Dessa forma, as casas de detenção para mulheres “funcionavam como entidades semiautônomas não sujeitas à regulação ou supervisão estatal , violando claramente

a lei, ao permitirem as reclusão de mulheres sem mandado judicial.” (MAIA et al., 2009, p. 25). Guiavam-se pelo modelo de casa-convento, estando sob domínio das ordens das freiras e monjas, que tinham o dever, como acreditavam, de afastar as mulheres de tentações e desvios mundanos. No entanto, as evidências disponíveis revelam que o maltrato às presas, como por exemplo o castigo físico, era incessante e que os abusos das monjas se caracterizava como um elemento de manutenção das relações extremamente hierárquicas estabelecidas dentro dessas unidades de prisão-convento. Além disso, a superlotação era denunciada com frequência, apesar da violência não ter sido recorrente como nas prisões masculinas (MAIA et al., 2009).

Na década de 1920, o Estado passou a exercer maior autoridade sobre as mulheres presas; porém algumas prisões femininas ainda foram postas sob direção e administração de ordens religiosas (MAIA et al., 2009). Somente com o Código penal de 1940, parágrafo 2º do artigo 29, é que foi prevista pela primeira vez

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presídios femininos, como o Chile, em 1864; o Peru, em 1871; e a Argentina, no início de 1880 (MAIA et al., 2009; ANGOTTI, 2011).

O principal ideólogo das prisões femininas no Brasil foi Lemos de Brito2.

Em sua obra As prisões do Brasil, são descritas as primeiras prisões brasileiras inspiradas pelo modelo europeu (SOARES; ILGENFRITZ, 2002). Segundo Soares e Ilgenfritz (2002), Lemos de Brito foi designado pelo então ministro da Justiça, João Alves, a compor um projeto de reforma penitenciária em 1923. No ano seguinte à designação, após percorrer o país visitando as prisões, Lemos de Brito ofereceu um plano geral propondo a construção um “reformatório especial” para mulheres

condenadas há mais de 3 anos no Distrito Federal (e às mulheres que fossem remetidas por outros estados).

Nota-se que a proposta feita por Lemos de Brito indicava a necessidade de um tratamento específico para as mulheres por parte do sistema penitenciário, ou

seja, a construção de um “reformatório especial e não um ambiente prisional nos

moldes tradicionais da época destinados aos homens (SOARES; ILGENFRITZ, 2002).

A primeira instituição prisional brasileira foi o Reformatório de Mulheres Criminosas (posteriormente denominado Instituto Feminino de Readaptação Social), instaurado ainda no ano de 1937 (denominado Reformatório), em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul. Na cidade de São Paulo, no bairro Carandiru, em 1941 foi instituído o Presídio de Mulheres de São Paulo, de maneira improvisada, com instalações na antiga residência dos diretores penitenciários, localizada no terreno da Penitenciária do Estado. Nos Arquivos Penitenciários do Brasil (APB), aparece o registro da inauguração do Presídio de Pernambuco, ainda em 1941, em que se menciona uma ala destinada exclusivamente às mulheres: o Presídio de Mulheres. E, em 1942, inaugurou-se a Penitenciária de Mulheres de Bangu em um estabelecimento erguido exclusivamente para este fim, na cidade do Rio de Janeiro (MAIA et al., 2009; ANGOTTI, 2011).

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3.2 Sistema penal e gênero

O crescimento da violência nutre o sistema prisional brasileiro; o número de detentos ultrapassou 700 mil em 2014, considerando que 147.937 dessas pessoas estão em prisão domiciliar (BRASIL, 2014b). A superlotação desafia a condição humana dos indivíduos privados de liberdade, o que leva à disseminação das drogas e dos diversos tipos de violência, contrariando, assim, as condições humanas mínimas exigidas por organismos internacionais como a Organização das Nações Unidas (ONU) (MAIA et al., 2009).

O Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN), através do Sistema de informações Penitenciárias (Infopen), afirma o esforço em resgatar o passado e projetar o futuro da execução penal no país. Por meio do monitoramento do déficit de vagas no tempo e no espaço das Unidades da Federação, o DEPEN busca subsídios para pensar mais rigorosamente sobre políticas publicas destinadas à atenção à saúde dessa população (BRASIL, 2015). Esses dados também mostram que o sistema não conseguiu atingir seu objetivo, que é o de recuperar e reintegrar o detento à sociedade (BRASIL, 1984; 2015).

Rampin (2011) aponta para a concepção uníssona de falência do sistema prisional. A veiculação de notícias sobre acontecimentos ilegais confirmam uma

“crise” no sistema, pressupondo “falência prisional”. A autora afirma ainda que não é somente o sistema penitenciário brasileiro que está falido, “mas também estão os nossos Direito, Estados, sociedade e, até mesmo a nossa própria condição humana”

(RAMPIN, 2011, p. 31).

Nessa linha, a ordem institucional atua como impactante na identidade do preso, que o deixa, proporcionalmente, vulnerável. Ao levar à perda da identidade do preso, o sistema penitenciário assume suas divergências, muitas vezes, produzindo a delinquência. Ademais, tal sistema contempla um intenso apelo de gênero, em que o homem reina absoluto, enquanto a mulher é submetida à insignificância asseverando a invisibilidade feminina.

Ao centrar o homem como paradigma, o sistema penal e penitenciário estabelece qual é o sujeito considerado absoluto. Rampin (RAMPIN, 2011) verificou

em seu estudo que “o Homem encarcerado tornou-se ‘Um’ e a mulher encarcerada

tornou-se o ‘Outro’” (RAMPIN, 2011, p. 49). E as decorrências práticas geradas por

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de diferenciação entre a população carcerária feminina e masculina: os crimes cometidos e a estrutura física disposta no sistema penitenciário. A mulher, na maioria das vezes condenada por tráfico de drogas, também é considerada “a outra”

diante da hierarquia do tráfico.

Contudo, é importante compreender a trajetória do feminino no curso da história. Como mostra a realidade, a diferença entre os sexos gera desigualdades naturais e inevitáveis. Logo, muitas sociedades optaram por dimensionar tal desigualdade por meio da chamada dominação patriarcal, trazendo os conflitos pautados nas relações de gênero (HERMANN, 2008). Exemplifica-se esse fato nos dias atuais, onde a participação das mulheres no mercado de trabalho merece destaque. Apesar do aumento da participação das mulheres e da diminuição da diferença salarial média entre os dois gêneros, as mulheres ainda enfrentam grande dificuldade de serem remuneradas e promovidas em relação aos homens (MADALOZZO et al., 2010).

Ao tratar das discussões de gênero, Scott apud Frota e Osterne (2004) destaca que a compreensão do próprio termo “gênero”, como todo evento histórico, depende da história e do contexto em que ele é empregado. Em síntese, trata-se de um modo de dar significado às relações de poder (opressor versus oprimido). Por conta disso, especifica-se que as incursões sobre o tema mulher e gênero, no presente estudo, se dirigem a um grupo particular de mulheres submetido a uma contingência especial de exclusão ou opressão: a mulher encarcerada.

Quando se relacionam as discussões de identidade e gênero com a criminalidade feminina e a vida na prisão, as mulheres que cometem crimes são definidas como infratoras, violentas, criminosas ou outra denominação que lhes seja dada. Logo, alude-se ao rompimento que essas mulheres tiveram com o normativo de gênero atribuído à sua identidade como mulheres (PRIORI, 2011). Não seria errôneo dizer que quando a mulher não desempenha o papel de esposa ou mãe impostos pela cultura, é tida como desviada perante os códigos sociais (SILVA, 2011).

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albergado, hospitais, unidades de reabilitação e regime aberto). Dessas, 55 são exclusivamente femininas (ANEXO C).

Em 2009, foi instaurada uma Comissão Parlamentar Inquérito (CPI) para investigar a situação do sistema carcerário brasileiro, que contemplou um capítulo,

intitulado “Mulheres encarceradas: vergonha nacional”, exclusivamente destinado a

investigar as condições da população carcerária feminina. Com isso verificou-se que não há estruturas significativas reais que diferenciem, nas unidades prisionais mistas, os pavilhões e as celas adaptados às mulheres das instalações destinadas aos homens. Esse fato revela, na prática, a indiferença das políticas de execução penal relacionadas à questão de gênero (BRASIL, 2009).

Logo, quando a mulher é encarcerada, o preço pago por elas e suas famílias é devastador. Segundo Rampin (2011) “ao adentrar o sistema, ela [a mulher encarcerada] perde vários referenciais ... não é mais mãe nem filha, nem feminina. As mulheres perante os homens, são menos. As encarceradas, perante as libertas,

são menos ainda” (RAMPIN, 2011, p. 59).

A restrição da visita íntima nas penitenciárias femininas, por exemplo, é um aspecto que aprofunda a violência de gênero institucionalizada. Apesar de essas visitas serem um direito assegurado aos sujeitos encarcerados no sistema penitenciário brasileiro, a maioria dos presídios femininos proíbe que a mulher as desfrute, o que não é observado na realidade masculina (BORGES; CALOMBAROLI, 2011).

Várias questões surgem relacionadas com a prisão: a violência estrutural vivida em comunidades marginalizadas; o papel de classe e etnia como precursores de prisão; a desumanização e o abuso que acontecem nas unidades de encarceramento; a perda de direitos e o estigma; etc. Todos são fatores de vida dessas mulheres que surgem amplificados quando são presas (BRASIL, 2008; BORGES; CALOMBAROLI, 2011; RAMPIN, 2011; SILVA, 2011).

Sobre tal temática, Borges (2011a) objetivou compilar estudos na busca da investigação da “complexa relação existente entre o sistema penal e a questão

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Segundo o relatório final elaborado para o projeto de reorganização e reformulação do sistema prisional feminino (2008), as mulheres preferem permanecer em estabelecimentos carcerários provisórios para ficarem perto de seus familiares – mesmo que esses ambientes, muitas vezes, sejam insalubres, superlotados e distante do acesso aos direitos – do que irem para penitenciárias mais aparelhadas, com possibilidades de trabalho, educação e remição de pena, mas longe do acesso de familiares (BRASIL, 2008; 2009).

Todavia, preocupação com o universo fora das grades é maior, as mulheres tendem a priorizar o companheiro e a família. Em uma direção oposta, o homem encarcerado é quem recebe o apoio incondicional da mulher, que não mede esforços pessoais para facilitar a vida do seu companheiro quando ele está preso (BRASIL, 2008; 2009).

Outras evidências marcam a mulher encarcerada: quase sempre ela sofreu influências masculinas, diretas ou indiretas, que a levaram à prisão. Além disso, muitas são induzidas ao cometimento, ou à participação do crime, ou a assumir a culpa sozinha para livrar o homem do cárcere, servindo como escudo contra a ação policial (BRASIL, 2008).

É importante compreender a trajetória do feminino no curso da história. A diferença entre os sexos gera desigualdades naturais e inevitáveis não exclusivamente inerentes à raça humana que, contudo, privilegiadamente dotada de consciência, opta por amenizar ou ampliar essa desigualdade (HERMANN, 2008). A vigilância social sobre a vida da mulher transita nos meios de controle formais pertencentes ao direito penal e nos meios de controle informais presentes nas

relações de convívio social. Portanto, é “forçoso reconhecer que o sistema penal trata a mulher de maneira preconceituosa. Sob esse aspecto, o campo penal, muitas vezes soluciona questões essenciais, mas, de outra, age reforçando velhas

discriminações” (SILVA, 2011).

A fim de ilustrar a discriminação entre as relações de gênero, cita-se que, no decorrer das décadas de 1920 e 1930, houve o crescimento na absolvição dos assassinos de mulheres. A cultura patriarcal, também no âmbito legislativo, permitia aos advogados culparem as mulheres por sua própria morte, alegando crime de

“legítima defesa da honra”. Diante desse fato, os assassinatos de mulheres foram

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Tal comprovação assevera a restrição do sistema penal em relação às mulheres. Ratifica-se, portanto, que o controle social não é limitado ao sistema penal, pois atua impetuosamente na estrutura familiar, nas relações sociais e na opinião pública. Nesse sentido, por ser o Direito Penal uma modalidade de controle formal, acaba por reproduzir os valores reconhecidos na sociedade (BORGES, 2011a).

Sobre a mulher em privação de liberdade, Borges (2011a) assegura o modo pelo qual ela é decodificada no sistema penal. Na maioria das vezes, alega-se a relação da mulher com o tráfico como produto de influência de relações afetivas anteriores, no papel de esposas, irmãs, filhas ou mães de traficantes. No entanto, isso é mais um reflexo da relação de submissão da mulher perante o homem, também no crime, aludindo à desigualdade social (BORGES, 2011a). A prisão de mulheres por conta do tráfico, muitas vezes, deve-se ao fato de elas ficarem mais expostas à ação policial, normalmente em posição de menor importância, subalternas ou periféricas na estrutura do tráfico, tendo poucos recursos para negociar sua liberdade quando capturada pela polícia (SOARES; ILGENFRITZ, 2002). Acrescenta-se a esse tratamento diferenciado os interesses masculinos na perpetuação do dogma da superioridade masculina (BORGES, 2011a).

Entretanto, nos anos de 1960, surgiu a criminologia crítica, considerada um movimento emancipatório que revitalizou a discussão sobre a utilização do Direito Penal e a valorização dos problemas femininos. A introdução da questão de gênero na criminologia crítica contribuiu para a compreensão sobre o funcionamento do sistema penal e social e legitimou a visão dominantemente masculina no sistema. Contudo, Silva (2011) ressalta que toda mudança é um processo

“doloroso e traumático” (SILVA, 2011, p. 24). A autora afirma que, nesse contexto, estão imersas as mudanças relacionadas à cultura patriarcal e machista. Logo, é difícil apelar ao Direito Penal, carregado de cultura de discriminação de gênero e reprodução dos comportamentos impostos pelo patriarcalismo, para resolver essa questão complexa e raízes profundas. Ainda, as esferas de controle social e informal (religião, família, medicina, mídia e opinião pública) agem de forma tão severa quanto sobre as mulheres.

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em relação ao masculino (SOARES; ILGENFRITZ, 2002; RAMPIN, 2011; SILVA, 2011).

De modo recente, o DEPEN (2012a) desenvolveu um projeto junto ao

Ministério da Justiça intitulado “Projeto Mulheres”, visando à efetivação dos direitos das mulheres no Sistema Penal. O objetivo é o atendimento às necessidades da população feminina no Sistema Penal por meio do planejamento de ações com foco nas seguintes estratégias:

a) aperfeiçoamento permanente e modernização da política de garantia dos direitos das mulheres no Sistema Penal;

b) realização de pesquisas, estudos e estatísticas voltados à mulher no Sistema Penal;

c) construção, adequação e reforma de unidades prisionais femininas; d) fortalecimento e ampliação das políticas de acesso aos direitos das

mulheres no Sistema Penal;

e) estruturação de rede social, formada por entidades governamentais e não governamentais;

f) articulação de ações com foco no intercâmbio de boas práticas sobre a temática.

Acredita-se que a maior representatividade de mulheres nas esferas governamentais tenha possibilitado tal avanço. Diante do aumento do encarceramento feminino em 256% nos últimos 12 anos (BRASIL, 2014c), estratégias com o enfoque na população penitenciária feminina têm despertado o interesse de autoridades.

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3.3 Uma questão de terminologias

A cartilha Politicamente correto & Direitos humanos, elaborada pela Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República, afirma que o

termo “preso” tecnicamente refere-se à pessoa condenada sob custódia do Estado mantida em penitenciária ou cadeia pública. Entretanto, abusa-se do termo em referência a qualquer pessoa detida, ainda que temporariamente, sem condenação. Na visão dos autores da cartilha tal condição pode estigmatizar o indivíduo pelo resto da vida (QUEIROZ, 2004). Referido embate sobre a terminologia advém da conceituação do sistema prisional que define a pena de detenção e a pena de reclusão. Na pena de detenção, o individuo julgado e condenado seria o

denominado “preso”. Já na pena de reclusão, o individuo detido provisoriamente seria o “recluso” (BRASIL, 2010)

Outros termos podem ser encontrados na literatura em geral sobre a situação do preso ou do Sistema Prisional para se referir às pessoas privadas de liberdade (provisória ou de detenção), dentre eles: “reeducando”, “apenado”,

“ressocializandos”, “reabilitando”, “interno”. Isso é justamente uma tentativa das

instituições de desestigmatizar o indivíduo, através de eufemismos, tratando-o de

maneira mais “humanizada” (PEREIRA, 2011).

No entanto, a pedagoga e advogada Leiva Custódio Pereira (2011) apresenta uma visão interessante acerca dessas terminologias utilizadas para definir a população privada de liberdade, indo de encontro à criação dos termos citados no parágrafo anterior que tentam desmitificar a figura “preso”. A autora afirma que afirma que em diversas unidades prisionais, o preso é denominado de “reeducando”, mas na realidade é tratado simplesmente como “preso”.

Uma das críticas da autora, considerando inadequado o termo, é o fato de a maioria daqueles que estão privados de liberdade nem sequer terem passado pelo processo de educação básica obrigatória. De fato, pequena parte dos indivíduos participa de atividades integradoras, socializadoras; assim, não poderiam ser tidos

como “educandos” ou “reeducandos” (PEREIRA, 2011).

Ainda segundo Pereira (2011), a palavra “preso” se origina de “prisão”,

que corresponde à supressão da liberdade mediante o recolhimento do acusado ou do condenado em um estabelecimento prisional. A palavra “prisão”, por sua vez, tem

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capturar alguém, abarcando também o local onde se mantém o indivíduo preso; sinônimo de claustro, clausura, cadeia, cárcere.

Logo, a palavra “preso” parece dura, desumana, mas essa é a condição

em que a maioria da população presa, encarcerada, reclusa ou detida está. “Prisão” tem três significados básicos: segregação, captura e custódia; assim, “quem está na

prisão é preso. Embora a palavra reeducando, ressocializando e tantos outros termos, que se parecem, mas não são sinônimos, sejam mais pulcros, muitas vezes,

não representam o que de fato são naquele momento” (PEREIRA, 2011). Contudo, acredita-se que independente da situação de privação de liberdade a qual o individuo esteja, ele não deixa de ser um cidadão pertencente à sociedade, portador de uma identidade nominal e de direitos constitucionais.

Neste trabalho, serão adotadas diversas terminologias como sinônimos, já que no sistema carcerário brasileiro é difícil que haja separação entre condenados e não julgados, ou seja, reclusos ou detentos. Todas essas pessoas estão em situação de privação de liberdade, ou seja, na condição de presas ou encarceradas.

3.4 População penitenciária feminina no mundo

Em 2006, o International Center for Prison Studies (ICPS) publicou um documento intitulado “World female imprisonment list: women and girls in penal institutions, including pre-trial detainees/remand prisoners”, onde é descrita a situação de mulheres e meninas em 212 prisões no mundo. Referido documento é o segundo desde 2000 (WALMSLEY, 2006b).

De acordo com o ICPS, mais de 625 mil mulheres e meninas estão detidas em instituições penais em todo o mundo, de forma preventiva ou sentenciada (WALMSLEY, 2006b). Praticamente um terço dessas estão encarceradas nos Estados Unidos (201.200), ou seja, 32,2% de todas as encarceradas do mundo. De acordo com Glaze (2013), desde 2010 a população carcerária feminina no EUA tem tido rápido crescimento com aumento médio de 3,4% ao ano. Em2013, essa população prisional feminina estava em torno de 8,8%.

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encarceradas. A Tailândia está em quinto, com aproximadamente 29.000 presas. Os únicos outros países com mais de 7.000 mulheres presas são: Índia (15.406), Vietnã (12.591), México (10.072), Ucrânia (9.697) e Filipinas (7.726) (MCCARTHY, 2015).

Outro relatório publicado pelo ICPS intitulado World prison population list (2007), mostra que a população carcerária feminina está crescendo nos cinco continentes. O total dos 187 países, cujos dados foram apresentados na primeira edição do documento do ICPS (2006a), aumentou em mais de 16%, com o maior aumento nas Américas (até 23%) e menor aumento em países europeus (até 6%) (WALMSLEY, 2007).

Tais fatos reafirmam a necessidade de maior investigação nesse campo, da situação das mulheres que vivem em privação de liberdade, que só tem crescido no mundo.

3.5 População penitenciária feminina no Brasil

As mulheres constituem um grupo especial dentro das prisões simplesmente por conta do sexo (ONU, 2009). Historicamente, têm representado a minoria (2 a 9%) da população prisional mundial (MOLONEY et al., 2009; VAN DEN BERGH et al., 2009), apesar de recentemente ter tido um notável aumento dessa população (VAN DEN BERGH et al., 2011), como o de 256% ocorrido nos últimos 12 anos em território nacional (BRASIL, 2014c). Mesmo com essa reduzida presença de mulheres encarceradas em relação aos homens, não é justificável a violação de seus direitos.

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Gráfico 1 – População carcerária feminina do Brasil versus quantidade de vagas nas unidades prisionais.

Fonte: Departamento Penitenciário Nacional. Sistema Nacional de Informações Penitenciárias (2012c).

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Gráfico 2 – Encarceramento feminino versus tipos de regime prisional

Fonte: Departamento Penitenciário Nacional. Sistema Nacional de Informações Penitenciárias –

Infopen (2012c).

De acordo com o Infopen (2011a), havia em 2011 aproximadamente 33.2892 mulheres em situação de prisão no Brasil, o que representava cerca de 7% do total da população penitenciária brasileira. Ainda que seja a minoria, a média de crescimento populacional carcerário feminino, no triênio 2008-2011, foi de 32,73%, enquanto a média de crescimento masculino no mesmo período foi de 15,37% (BRASIL, 2011a). Barcinski (2011) defende que a liberação feminina alcançada nos últimos anos trouxe inúmeros avanços em todos os aspectos da mulher como ser humano e cidadã e, também, a deixou mais vulnerável a diversos fatores que levam, até, a um maior risco de ser encarcerada.

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O perfil da mulher aprisionada no Brasil é jovem, não branca, solteira, com baixo nível de escolaridade, pouco apoio familiar e sem garantia de visita de parceiros ou permanência com seus filhos (SOARES; ILGENFRITZ, 2002; CEJIL, 2007; BRASIL, 2009; RAMPIN, 2011). Muitas mulheres em prisões carregam a carga quadruplicada de serem negras, mulheres, pobres e presas (BRAITHWAITE et al., 2008b).

3.6 Violência e a mulher encarcerada: garantia de direitos

A violência contra a mulher é violação aos direitos humanos. A Constituição Federal no seu artigo 5º, com a finalidade de combater tal violência, apresenta uma série de direitos fundamentais da pessoa humana, o que inclui, evidentemente, a pessoa apenada. Dentre esses direitos, citamos:

III – Ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou degradante; XLIX – É assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral; LXVI – Ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança (BRASIL, 2010, p. 13).

Afora todo o elenco de garantia de direitos previstos na Constituição Federal (2010), é importante ressaltar os vários Tratados e Convenções Internacionais sobre os Direitos Humanos dos quais o Brasil é signatário, tais como: a Declaração Universal dos Direitos Humanos – que aborda os direitos pessoais como o direito à igualdade, à vida, à liberdade e à segurança; a Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes; a Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura; a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência Contra a Mulher (Convenção de Belém do Pará); e a Convenção sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação Contra a Mulher (CEDAW) (BRASIL, 2008).

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completamente separada. Ademais, presos preventivos têm de ser mantidos separados dos condenados.

No tocante ao local destinado à reclusão, a ONU (1955), estabelece que acomodações, em principal os dormitórios, devem satisfazer a todas as exigências de higiene e saúde, considerando as condições climatéricas e especialmente a cubicagem de ar disponível, o espaço mínimo, a iluminação, o aquecimento, a ventilação. Quanto às punições, as penas corporais, a colocação em “segredo escuro”, bem como todas as punições cruéis, desumanas ou degradantes, devem

ser completamente proibidas como sanções disciplinares.

Além da série de leis, tratados e convenções direcionadas às mulheres e a pessoas privadas de liberdade em geral, a Resolução n. 14, de 11 de novembro de 1994, estabelece Regras Mínimas para o Tratamento do Preso no Brasil com base nas recomendações da ONU supracitadas (BRASIL, 1995).

Ainda pertinente aos documentos internacionais, destacam-se as Regras das Nações Unidas para o tratamento de mulheres presas e as medidas não privativas de liberdade para mulheres infratoras, também chamada de Regras de Bangkok.

Ainda pertinente aos documentos internacionais, destacam-se as Regras das Nações Unidas para o tratamento de mulheres presas e as medidas não privativas de liberdade para mulheres infratoras, também chamada de Regras de Bangkok, que foram criadas pela Assembleia Geral da ONU e aprovadas em dezembro de 2010. Conforme pontua Cerneka (2012), evidencia-se que a realidade da mulher encarcerada não foi considerada em 1955, muito menos suas necessidades específicas. Por isso, segundo a autora, As Regras de Bangkok procuram complementar as Regras Mínimas para o Tratamento do Preso e as Regras Mínimas para elaboração de medidas não Privativas de Liberdade (Regras de Tóquio), considerando as especificidades das mulheres e reconhecendo ser necessário tratamento diferenciado a elas. Ademais, as Regras de Bangkok reconhecem que as unidades prisionais devem ter em conta a possibilidade de a mulher ter sido vítima de violência em algum momento da vida (Regra 15) (CERNEKA, 2012).

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MAGALETTA, 2010; LEWIS, 2010; CRISANTI; FRUEH, 2011; WALSH et al., 2011; WALSH et al., 2012; KUO et al., 2013; HÄUFLE; WOLTER, 2014). Para comprovação das torturas psicológicas e o desrespeito à integridade moral dos reclusos, basta a existência de celas superlotadas, a falta de espaço físico, a inexistência de água, luz, material higiênico, banho de sol, a presença de lixo entre os encarcerados presos, esgotos e insetos. Além de presos doentes sem atendimento médico mantidos em celas sem a menor condição de salubridade (BRASIL, 2009).

O relatório final para reorganização do sistema prisional feminino (2008)

teve, como um dos seus vários objetivos, o “enfrentamento de questões relativas às torturas, violências e preconceitos” (BRASIL, 2008b, p. 68). Dentre outros, são citados os seguintes objetivos:

Implantar sistema de notificação de violências; capacitar Equipes e demais profissionais do Sistema Penitenciário; criar Ouvidoria nacional sobre violências ou integrar as já existentes (interministerial); realizar campanha nacional para desestigmatização das reclusas (BRASIL, 2008b, p. 68).

Ao lado de outros estudos sobre o tema, eles podem auxiliar a

“implementação” e/ou aperfeiçoamento das políticas públicas já existentes para

prevenir futuras violências e efetivar os direitos a elas destinados (BRASIL, 2008). Ainda nesse documento, propõe-se:

... a imediata inclusão da questão da tortura no cárcere, dentro da

perspectiva de gênero e raça, no “Plano de Ações Integradas para a Prevenção e o Combate à Tortura no Brasil”, da Secretaria Especial dos

Direitos Humanos da Presidência da República, e a implantação do Programa de Vigilância às Violências e Torturas do Ministério da Saúde em todo o ambiente prisional, passando a ser – inclusive – obrigatório a Notificação Compulsória (BRASIL, 2008).

A despeito da relevância do tema e da iniciativa interministerial, até o momento não existem estudos de abrangência nacional avaliando os agravos gerados pela violência entre população penitenciária feminina e de servidoras prisionais. A falta quase absoluta de dados dificulta o planejamento, a execução de políticas públicas e ações voltadas para estas populações, dificultando a implantação do PNSSP, que se tornou política em janeiro de 2014.

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Política Nacional de Atenção Integral à Saúde das Pessoas Privadas de Liberdade no Sistema Prisional (PNAISP) no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Além de contribuir para a definição de ações visando o controle e redução dos agravos à saúde relacionados à violência como parte da resposta aos direitos humanos nesta população.

Em 2009, foi criada a Comissão Parlamentar de Inquérito do Sistema Carcerário para investigar a real situação do sistema carcerário brasileiro e apontar soluções e alternativas capazes de humanizar o sistema prisional do país, contribuindo com a segurança da sociedade (BRASIL, 2009). O motivo de sua criação se deu pelas constantes rebeliões, ou seja, motins frequentes que desencadeiam uma complexo panorama: destruição de unidades prisionais, violências extremas entre os encarcerados, óbitos não explicados, denúncias de tortura e maus-tratos, presas vítimas de abusos sexuais, crianças encarceradas, corrupção de agentes públicos, superlotação, reincidência elevada, organizações criminosas no comando, elevados custos da manutenção de presos, falta de assistência jurídica e descumprimento da Lei de Execução Penal e, entre outros.

A proposta da CPI (2009) é justamente aprofundar o estudo sobre as causas e consequências dos problemas, além de verificar o cumprimento ou não do sistema jurídico nacional e internacional relacionado aos direitos dos encarcerados, além da apurar a veracidade das inúmeras denúncias.

Segundo o Procurador da Justiça João Benedicto de Azevedo Marques (1985):

...o confinamento só favorece à promiscuidade, senão física moral e a violência que em potencial já estava concentrada, tende a se acentuar, principalmente nas prisões fechadas, onde não podemos evitar uma aviltamento das personalidades dos reclusos (MARQUES, 1985, p. 127).

3.7 O ciclo da violência na vida das mulheres encarceradas

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Gráfico  1  –  População  carcerária  feminina  do  Brasil  versus  quantidade  de  vagas  nas  unidades  prisionais
Tabela  1  –   Levantamento  das  unidades  prisionais  femininas  do  Brasil  segundo  Departamento  Penitenciário Nacional, 2012
Tabela  2  –  Levantamento  das  unidades  prisionais  femininas  do  Brasil  por  estados  segundo  Departamento Penitenciário Nacional, 2012
Tabela  3  –  Levantamento  dos  presídios  por  região,  estado  e    faixa  do  numero  de  presas  segundo  Departamento Penitenciário Nacional, 2012
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Referências

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