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LITERACIA E CIDADANIA

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REVISTA ALENTEJO EDUCAÇÃO – N.º3 (2011)

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LITERACIA E CIDADANIA

Lurdes Pratas Nico*

1. Do conceito de analfabetismo funcional ao conceito de Literacia

Tradicionalmente, utiliza-se a palavra analfabeto para designar uma pessoa iletrada e que, literalmente, designa uma pessoa que não conhece o alfabeto, e por isso, não sabe ler e escrever (Nico, 2009:72).

No nosso país, os valores reflectem bem a dimensão do problema do analfabetismo. No início do século XX, a taxa de analfabetismo era superior a 60% e, na década de 70 (1974), atingia os 40% (Melo, 2005:37). Em 1991, essa taxa atingia os 11% e, em 2001, reduziu 2% (9,1%) (INE, 2002).

A análise do problema do analfabetismo está, sempre, ancorada numa determinada estrutura económica, social e política e poderá decorrer de um conjunto de factores, que poderão contribuir, para uma maior ou menor prevalência desse problema. Esteves (1995:8-9) aponta alguns desses factores:

(i) o índice de desenvolvimento económico dos países, o que é verificável

comparando as taxas de analfabetismo por região;

(ii) as políticas assumidas em matéria de educação de adultos; (iii) a ausência de motivação das pessoas para a educação;

* Coordenadora da Equipa de Projecto Novas Oportunidades de Adultos – Direcção Regional de Educação do

Alentejo.

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(iv) as questões religiosas e culturais, tomando os países nórdicos, como exemplo,

que, desde cedo, assumiram o protestantismo, o que exigia que as pessoas soubessem ler a Bíblia. Logo, no século XVI, começou-se a ensinar a ler e a escrever à população. No final do século XVII, quase todas as pessoas, na Suécia, sabiam ler e escrever. Isto já era uma manifestação de uma postura séria e de uma política de forte incentivo à Educação de Adultos.

Em oposição ao analfabetismo coloca-se o conceito de alfabetização que, tradicionalmente, traduz “…o acto de ensinar e de aprender a leitura, a escrita e o cálculo” (Benavente et al, 1996:4). Melo (2006; 2007:8) refere, acerca do conceito de alfabetização, que ela deve ser entendida como “um meio de participação social e política na nova

sociedade em construção, e não como um fim em si, uma técnica de ligar letras”.

Actualmente, toda essa realidade conceptual é associada a novos conceitos (Benavente et al, 1996:4; Simões, 1990:459).

Desde os anos 80, que os países industrializados (mais desenvolvidos) constatam a existência de uma nova concepção de analfabetismo. Algo que era apenas conotado com os países menos desenvolvidos, chegava agora a sociedades que se deparam com indivíduos que, tendo aprendido a ler e a escrever, não são capazes de traduzir e aplicar essas capacidades nas situações que a sociedade, agora mais exigente sob o ponto de vista técnico e profissional, lhes exige (analfabetismo funcional). Sendo as condições laborais mais exigentes, torna-se necessário dotar os indivíduos de competências nos diferentes domínios da literacia (científica, digital, económica, tecnológica, numérica, linguística,…), para que estes se possam adaptar às alterações constantes do mercado de trabalho (Nico, 2009:77).

A partir da década de 70, do século XX, há, também, estudos sobre a Alfabetização que vêm confirmar esta realidade. Apontamos aquele que foi realizado em 1985 (EUA) designado

“Young Adult Literacy Survey” que serviu de base para o “National Adult Literacy Survey”

(NALS), em 1992 (EUA), onde se desenvolveram estudos de alfabetização funcional. Assim, o conceito de alfabetização funcional passa a constar no discurso de teóricos de vários contextos geográficos e científicos. Mais tarde, em 1996, doze países seguiram o exemplo dos EUA, desenvolvendo, nos respectivos países, contextos de estudos de avaliação do alfabetismo funcional. Portugal também viria a participar, em 1997 e 1998 (Nico, 2009:77).

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Na perspectiva de Lima (1990, citado por Nogueira, 1996:67), o analfabetismo funcional:

“(…) exigirá um exame atento. Ou se reconhece que todos nós somos de alguma forma analfabetos funcionais em alguma coisa – na utilização das novas tecnologias de informação ou na compreensão dos complexos mecanismos de economia - por exemplo, ou nos arriscamos a generalizar um rótulo, a produzir um estereótipo e mais um estigma que penalizará, mais uma vez como quase sempre, determinados estratos sociais.”

O analfabetismo funcional (e o regressivo, também1), conduzem à introdução do

conceito de literacia. Este conceito, segundo Benavente et al (1996:4) “traduz a capacidade

de usar as competências (ensinadas e aprendidas) de leitura, de escrita e de cálculo”. Deixa

de haver uma conotação negativa, como outrora, e passa-se a falar em níveis de literacia. É o

continuum de competências que passa a ser considerado, ou seja, uma pessoa pode ter

mais ou menos competências, maiores ou menores níveis de literacia. O conceito de

literacia centra-se no uso das competências e não na sua obtenção ou posse (Nico, 2009:79). Em Portugal, no campo da Literacia, destacam-se os estudos da autoria de Sim-Sim e Ramalho (1993) e de Benavente et al (1996). No que respeita à população adulta portuguesa, no estudo de 1996, quase 50% dos inquiridos revelou sérias dificuldades em utilizar a informação escrita em situações do quotidiano, sendo reduzida a percentagem daqueles que foram capazes de efectuar tarefas mais exigentes, situadas nos Níveis 3 e 4 (Ávila, 2008:157).

No contexto internacional, destacamos o estudo PISA, lançado pela OCDE (Organização para o Desenvolvimento e Cooperação Económico), em 1997. O PISA procura “medir a

capacidade dos jovens de 15 anos para usarem os conhecimentos que têm de forma a enfrentarem os desafios da vida real, em vez de simplesmente avaliar o domínio que detêm sobre o conteúdo do seu currículo escolar específico”

(http://www.gave.min-edu.pt/np3/157.html), onde se destaca, entre outros, conhecer o grau de literacia dos alunos.

1 Fernandes (1998:117) acrescenta que esse fenómeno pode decorrer de uma situação de não escolarização ou de uma situação de “escolarização deficiente”.

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Em Abril de 2011, foi divulgado pela Comissão Europeia um relatório (http://ec.europa.eu/education/news/news2900_en.htm), que revela assinaláveis progressos, realizados por Portugal, em matéria de educação e formação. Destacamos, entre outros, três pontos, desse relatório:

i) a referência ao PISA: no âmbito das competências dos alunos nos domínios da

leitura, matemática e ciências, Portugal foi um dos países que mais progrediu, entre 2000 e 2009, no domínio da leitura, pois a percentagem de alunos que registaram fracos resultados regrediu 33,1%;

ii) a referência à Iniciativa Novas Oportunidades e o envolvimento da população adulta

em medidas de qualificação e de aquisição/ actualização de competências;

iii) a referência à implementação do Plano Nacional de Leitura e do Plano Tecnológico

da Educação.

No ponto seguinte, incidiremos, particularmente, sobre o referido nas alíneas ii) e iii).

2. A valorização da Literacia no Novas Oportunidades a Ler+

Com a Iniciativa Novas Oportunidades, criada em 2005, foram implementadas medidas que visam, não apenas reconhecer, validar e certificar as competências adquiridas ao longo da vida (os adquiridos experienciais, através de um processo designado Reconhecimento,

Validação e Certificação de Competências), como também promover a aquisição e/ou

actualização de competências em áreas fundamentais como a leitura, a escrita, o cálculo e as tecnologias de informação e comunicação, concretizadas através de acções como: a Formação Modular Certificada, o Programa de Formação em Competências Básicas, os Cursos de Educação e Formação de Adultos, entre outras, enquanto respostas flexíveis, integradas e mobilizadoras do princípio de aprendizagem ao longo da vida (ALV).

Tendo por base a necessidade de elevar as competências de leitura dos adultos, foi criado o Novas Oportunidades a Ler +, que consiste num projecto do Plano Nacional de Leitura (PNL), em parceria com a Agência Nacional para a Qualificação (ANQ, I.P.) e

“destina-se a apoiar o de“destina-senvolvimento do gosto pela leitura, junto do público da Iniciativa Novas Oportunidades” (http://www.planonacionaldeleitura.gov.pt), pois os adultos têm um papel

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fundamental na promoção dos hábitos de leitura junto dos mais novos, incutindo-lhes o prazer de ler, para conhecer e melhor intervir na sociedade em geral. A promoção dos hábitos de leitura é uma responsabilidade de todos nós, dos diferentes agentes de educação e formação e dos contextos de aprendizagem, quer sejam formais, não formais ou informais, como sejam a escola, a família, a sociedade civil, que integram o percurso vital dos indivíduos.

A importância da literacia na construção da cidadania é o tema de um encontro que a DREAlentejo, através da Equipa de Projecto Novas Oportunidades de Adultos, irá organizar, no próximo dia 28 de Junho, no Auditório da Direcção Regional de Educação do Alentejo (http://novasoportunidades.drealentejo.pt).

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Referências Bibliográficas:

Ávila, P. (2008). A Literacia dos Adultos. Competências-Chave na Sociedade do

Conhecimento. Lisboa: Celta Editora.

Benavente, A., Rosa, A. et al (1996). A Literacia em Portugal. Resultados de uma pesquisa

extensiva e monográfica. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian.

Esteves, M. (1995). Os Novos Contornos do Analfabetismo. Analfabetismo ou Iletrismo: O

que é? Quem são? Onde estão? Lisboa: Ministério da Educação/Departamento da Educação

Básica - Núcleo da Educação Recorrente e Extra Escolar.

Fernandes, J. (1998). “Da alfabetização/educação de adultos à educação popular/comunitária: relevância do contributo de Paulo Freire”. In Michael Apple & António Nóvoa (orgs.). Paulo Freire: Política e Pedagogia. N.º 28. Porto: Porto Editora. pp. 113-150. INE (2002). Censos 2001. Resultados Definitivos: XIV Recenseamento Geral da População: IV

Recenseamento Geral da Habitação. Lisboa: INE.

Melo, A. (2005). “A ausência de uma política de educação de adultos é uma forma de controle social”. In Revista Aprender ao Longo da Vida. N.º 4. Lisboa: Associação O Direito de Aprender. pp.36-38.

Melo, A. (2006). “Da Serra Algarvia à Secretária do Ministro”. In Sessão Comemorativa do

30.º aniversário da Unidade de Educação de Adultos da Universidade do Minho, em 10 de

Outubro (texto cedido pelo próprio).

Melo, A. (2007). “Apresentação e contextualização do estudo”. In ESDIME (Org.). O Impacto

da Certificação de competências na vida das pessoas”. Camarate: IEFP. pp. 7-30.

Nico, L. (2009). Avaliação do(s) Impacto(s) do Processo de Reconhecimento, Validação e

Certificação de Competências (RVCC), no Alentejo (período 2001-2005) [Tese apresentada à

Universidade de Évora tendo em vista a obtenção do Grau de Doutor em Ciências da Educação]. Évora: Universidade de Évora (policopiada).

Nogueira, A. (1996). Para uma Educação Permanente à Roda da Vida. Coimbra: Instituto de Inovação Educacional.

Sim-Sim, I. & Ramalho, G. (1993). Como Lêem as Nossas Crianças? Lisboa: Ministério da Educação – GEP.

Simões, A. (1990). “Alfabetização de Adultos”. In Revista Portuguesa de Pedagogia. Ano XXIV. Coimbra: Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Coimbra. pp.457-476.

Sítios de Internet consultados:

http://www.gave.min-edu.pt/np3/157.html

http://ec.europa.eu/education/news/news2900_en.htm http://www.planonacionaldeleitura.gov.pt

Referências

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