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Ética e Estética: por um ideal estético de uma vida ética

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DIAS, M.C. Ética e Estética: por um ideal estético de uma vida ética. In: GONZALEZ, M.E.Q., BROENS, M.C., and MARTINS, C.A., eds.

Informação, conhecimento e ação ética [online]. Marília: Oficina

Universitária; São Paulo: Cultura Acadêmica, 2012, pp. 81-90. ISBN: 978-65-5954-063-1. Available from:

http://books.scielo.org/id/ddfb2/pdf/gonzalez-9786559540631-07.pdf. https://doi.org/10.36311/2020.978-85-7983-344-1.

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Parte I - Informação, auto-organização e ação ética

Ética e Estética: por um ideal estético de uma

vida ética

(2)

é

tica E

E

stética

:

por uM

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E

stético dE uMa

V

ida

é

tica

Maria Clara Dias

O

.objetivo.desta.exposição.é.pensar.a.relação.ente.ética.e.estética. e,.mais.especificamente,.a.possibilidade.de.um.ideal.de.vida.estético.que. contemple.nossa.demanda.atual.pela.satisfação.de.princípios.morais..Para. tal.pretendo.primeiramente.fornecer.um.breve.histórico.do.emprego.dos. conceitos.de.ética.e.moral.e.analisar.as.peculiaridades.de.seu.âmbito.de. aplicação..Em.seguida,.pretendo.(1).resgatar.uma.concepção.de.ética.como. a.disciplina.voltada.para.as.prescrições.capazes.de.conduzir.a.realização. de.uma.vida.plena.e.(2).apontar.a.capacidade.de.nos.compreendermos. enquanto.participantes.da.comunidade.moral.como.um.possível.integrante. da.nossa.concepção.do.que.possa.ser.uma.vida.“lograda”.ou.“feliz”.

I

Ao. ouvirmos. falar. de. ética. e. moral. ocorre-nos. muitas. vezes. indagar. acerca. das. semelhanças. e. dissimilitudes. de. ambas.. quanto. a.

(3)

sua. origem. histórica,. ética. e. moral. podem. ser. consideradas. sinônimos. (TUGENDHAT,. 1993).. Ética. tem. sua. origem. no. termo. grego. éthicos,. cuja.tradução.latina.vem.a.ser.moralis,.da.qual.derivamos.o.termo.moral.. O.radical.grego.ethos.possui.basicamente.dois.sentidos..Em.sua.primeira. acepção. êthos. (longo). diz. respeito. às. faculdades. do. caráter.. Ética. seria. assim.o.estudo.das.faculdades.do.caráter..Em.sua.segunda.acepção.éthos. (curto).diz.respeito.aos.costumes..A.tradução.de.éthicos.por.moralis.faz.jus. à.esta.segunda.acepção,.sendo.o.radical.mores.também.uma.referência.aos. usos.ou.costumes..Ética.ou.moral.seria.assim.a.disciplina.que.investiga.os. costumes..Deste.modo.a.tradução.latina.parecer.ter.deixado.à.margem.o. que.hoje.tentamos.resgatar.ao.falarmos.de.ética.em.contraposição.a.moral.. A. ética. na. tradição. grega. deve. fornecer. as. diretrizes. para. que. possamos.desfrutar.de.uma.vida.plena..Ela.prescreve.uma.dietética.do.bem. viver..Neste.sentido.deverá.ditar.as.regras.que.estabelecem.a.relação.do. indivíduo.para.consigo.mesmo.e.para.com.os.demais..A.prática.ideal.de. esportes,. a. iniciação. musical,. a. alimentação,. bem. como. a. vida. sexual. e. afetiva.de.cada.cidadão,.deveriam.estar.cuidadosamente.relacionados.dentre. as.prescrições.éticas..A.moral,.tal.como.se.impõe.a.nós.na.modernidade,. deve.ser.compreendida.antes.de.mais.nada.como.o.conjunto.das.regras. ou.princípios.que.orientam.a.vida.social,.ou.melhor,.que.prescrevem.o. nossa. modo. de. agir. frente. aos. demais.. Com. isso. a. moral. restringe. seu. âmbito.de.aplicação,.deixando.de.lado.a.esfera.da.vida.privada..questões. que.dizem.respeito.exclusivamente.a.projetos.individuais,.ou.seja,.que.não. interferem.no.bem.estar.comum.ou.nos.deveres.relativos.ao.outro,.já.não. pertencem.à.alçada.da.moral..Neste.sentido,.podemos.também.pensar.a. relação.entre.ética.e.moral.como.uma.relação.entre.um.todo,.a.ética,.e.uma. de.suas.partes,.a.moral..Em.qualquer.das.acepções.acima.mencionadas,. a. ética. possui. caráter. prescritivo,. ou. seja,. ela. não. se. limita. à. descrição. ou.análise.do.modo.como.as.coisas.são,.mas.dita.o.modo.como.devem. ser.. Deste. modo. seria. inútil. buscar. na. experiência. empírica. o. correlato. ou. fundamento. de. seus. juízos.. Contudo,. seu. caráter. prescritivo. torna. ainda.mais.patente.a.necessidade.de.um.fundamento..A.moral.impõe-se. muitas.vezes.contra.nossos.desejos.mais.imediatos..Por.que.então.devemos. considerar. necessário. fazer. jus. a. seus. mandamentos?. De. onde. vem. a. autoridade. reclamada. pelos. princípios. morais?. Chegamos. assim. ao. que.

(4)

Informação,.conhecimento.e.ação.ética

parece.ser.a.questão.fundamental.da.filosofia.prática,.a.saber:.a.questão.da. fundamentação.dos.juízos.morais..

Neste. ponto. devo. estabelecer. uma. distinção. entre. a. moral. moderna.e.a.moral.tradicional..A.moral.tradicional.é.aquela.que.repousa. sobre. a. crença. em. uma. autoridade.. Por. que. devemos. aceitar. tais. e. tais. mandamentos?.Porque.os.mesmos.refletem.a.vontade.divina,.a.vontade. de.um.governante.ou.de.qualquer.indivíduo.no.qual.reconhecemos.uma. autoridade,.nossos.pais,.ídolos.etc..A.moral.moderna.recusa.a.transcendência. e.questiona.o.fundamento.de.autoridade..É.para.ela.que.dirigimos.agora.a. questão:.por.que.devemos.então.aceitar.um.princípio.moral?. Na.história.da.filosofia.teremos.um.extenso.e.igualmente.fracassado. repertório.de.respostas.a.esta.questão..“Porque.faz.parte.de.nossa.natureza”,. dirão.. “Mas,. de. que. natureza?”,. perguntaríamos.. Da. nossa. natureza. enquanto.filhos.de.Deus;.enquanto.seres.que.desfrutam.do.sentimento.de. compaixão.para.com.os.demais.ou.enquanto.seres.livres,.dotados.de.razão.. No.primeiro.caso.verificamos.mais.uma.vez.a.crença.em.uma.entidade. transcendente. como. fundamento. da. moralidade.. No. segundo. seria. necessário.provar.que.de.fato.possuímos.uma.tal.natureza..Bem,.ainda.que. possamos.mostrar.que.um.determinado.grupo.de.indivíduos.apresenta.o. sentimento.de.compaixão,.isto.não.seria.uma.prova.de.que.todo.e.qualquer. indivíduo.de.fato.o.possua..Ora,.não.podemos.exigir.que.alguém.possua. um.sentimento..Sentimentos.ou.bem.são.possuímos.ou.não,.não.podem. ser.exigidos..Se.a.moralidade.devesse.repousar.na.posse.de.algum.tipo.de. sentimento,.então.deveríamos.destituir-lhe.o.caráter.prescritivo..

Resta,. assim,. a. terceira. alternativa.. Fundamentar. o. caráter. prescritivo. da. moralidade. no. conceito. de. ser. racional,. não. deixa. de. ser. até.hoje.a.mais.engenhosa.tentativa.de.fundamentação.da.moral..Somos. livres.quando.somos.capazes.de.deixar-nos.guiar.unicamente.pela.razão,.ou. seja,.quando.somos.capazes.de.abstrair.de.todos.os.mobiles.sensíveis.que. determinam.o.agir,.diria.Kant.(1785).em.sua.Fundamentação à metafísica dos costumes..quando.assim.fizermos,.só.nos.restará.eleger.como.norma. ou.máxima.do.nosso.agir.aqueles.princípios.que.possam.ser.igualmente. reconhecidos. por. todos.. Na. Crítica da razão prática (KANT,. 1788). a. argumentação. kantiana. seguirá. os. seguintes. passos.. Em. primeiro. lugar. devemos.reconhecer.que.somos.conscientes.do.nosso.agir..Isto.significa:.

(5)

ser.capaz.de.refletir.sobre.o.mesmo..Ora,.se.somos.capazes.de.refletir.sobre. o. nosso. agir,. devemos. ser. igualmente. capazes. de. justifica-lo.. Uma. ação. deve.ser.justificada.com.base.em.normas..Normas,.por.sua.vez,.só.podem. ser.justificadas.com.base.em.um.princípio..Tal.princípio.será.para.Kant.o. princípio.de.universalização.das.máximas..Com.isto.segue-se.que.ao.aceitar. a.capacidade.de.agir.de.forma.refletida.nos.comprometemos.igualmente. com.o.agir.de.acordo.com.princípios.morais,.ou.seja,.normas.que.possam. ser.reconhecidas.como.válidas.por.todos..Mas.por.que.ser.capaz.de.refletir,. ou.seja,.ser.racional,.deve.já.conter.em.si.o.comprometimento.com.o.agir. moral?.A.fundamentação.kantiana.parece,.portanto,.estar.comprometida. com.um.conceito.de.razão.nem.um.pouco.trivial,.o.que,.consequentemente,. afetará.sua.própria.validade.. Uma.tentativa.de.fundamentação.análoga.será.também.proposta. por.Habermas..Em.Habermas.(1983).o.conceito.de.uma.razão.pura.será. substituído.pelo.conceito.de.razão.comunicacional..Nossa.capacidade.de. refletir.acerca.de.nossas.ações.cederá.lugar.à.capacidade.de.integrar.um. discurso.de.fundamentação.racional..Os.princípios.subjacentes.ao.mesmo. serão.os.chamados.princípios.da.ética.do.discurso..Nossa.pergunta.pode. ser.então.recolocada:.por.que.devemos.aceitar.que.ser.racional,.agora.no. sentido.de.ser.capaz.de.integrar.um.discurso.racional,.já.nos.comprometa. com.a.aceitação.de.princípios.morais? Mesmo.abandonada.sua.tentativa.de.fundamentação,.o.princípio. de. universalização,. o. imperativo. categórico. kantiano. em. sua. primeira. formulação,. acrescido. do. que. em. Kant. aparece. como. sendo. a. segunda. formulação.do.imperativo.categórico,.qual.seja,.o.princípio.do.respeito. a.cada.indivíduo.como.um.fim.em.si.mesmo,.ditam.até.os.nossos.dias.as. diretrizes.da.discussão.moral.

II

Vimos. até. aqui. que. nossos. juízos. morais. possuem. um. caráter. prescritivo.. Eles. estabelecem. como. devemos. agir.. Um. tal. dever. deve,. contudo,.poder.ser.justificado,.caso.contrário.estaríamos.erguendo.com. nossos.juízos.morais.uma.pretensão.ilegítima..Ora,.se.todas.as.alternativas. até.então.fornecidas.de.legitimação.foram.de.algum.modo.abandonadas,.

(6)

Informação,.conhecimento.e.ação.ética

não.teremos.que.abandonar.também.uma.tal.pretensão?.Minha.resposta. é.negativa,.mas.para.esclarecê-la.devo.antes.distinguir.duas.questões:.(1). A. primeira. diz. respeito. à. tentativa. de. fundamentação. da. moralidade;. (2). a. segunda. diz. respeito. especificamente. à. fundamentação. do. caráter. prescritivo.dos.juízos.morais..É.em.resposta.a.essa.primeira.questão.que. pretendo.retomar.o.conceito.de.ética.grego.e.pensar.a.inicialmente.sugerida. relação.entre.ética.e.estética.

Até. aqui. suponho. ter. deixado. claro. que. não. podemos. mais. fornecer.nenhum.argumento.filosófico.para.que.o.indivíduo.se.submeta. à.moralidade..Aceitar.ou.não.uma.concepção.moral.é.em.última.instância. uma.decisão.de.cada.indivíduo..Não.há,.portanto,.nada.que.nos.obrigue.a. tal..Nós.aceitamos.os.princípios.da.comunidade.moral.quando.elegemos. fazer.parte.desta.comunidade. Resta,.portanto,.nos.perguntarmos,.se.queremos.nos.compreender. enquanto. integrantes. de. uma. comunidade. moral..Tal. questão. deve. ser. compreendida. como. parte. da. questão. que. concerne. à. constituição. da. identidade.qualitativa1.de.cada.indivíduo,.isto.é,.a.pergunta.pelo.“o.que”.

e.“quem”.queremos.ser..À.identidade.de.cada.indivíduo.pertence.sempre. algo.que.já.está.determinado,.tal.como,.por.exemplo,.elementos.de.sua. história.pessoal.ou.talentos.individuais,.e.algo.que.depende.de.cada.um.. A.identidade.qualitativa.caracteriza.esta.porção.de.nossa.identidade.que. cabe.a.cada.um.de.nós.determinar..Sua.constituição.é.uma.resposta.ao. passado.e.ao.mesmo.tempo.a.determinação.do.futuro..O.indivíduo.elege. para.seu.futuro.aquilo.que.considera.fundamental.para.sua.vida.e.para.sua. identidade..Ele.vivencia.sua.vida.enquanto.lograda.ou.feliz,.quando.atinge. uma.identidade.lograda. Ser.filósofo,.seguir.ou.não.uma.carreira.acadêmica,.praticar.ou. não.esportes,.ser.músico,.ser.político,.constituir.fortuna,.ser.pai,.ser.amigo. etc..estão.entre.as.escolhas.que.realizamos.no.decorrer.de.nossa.existência. e.que.constituem.parte.do.nosso.projeto.de.vida..Muitas.dessas.escolhas,. embora. possam. ser. influenciadas. pelo. social,. não. estão. diretamente. relacionadas.a.nossa.relação.com.o.outro,.mas.sim.ao.conjunto.da.imagem.

que.queremos.ter.de.nós.mesmos..É.neste.sentido.que.pretendo.caracterizá-1.Acerca.da.relação.entre.a.constituição.da.identidade.qualitativa.e.a.questão.da.constituição.de.uma.identidade. moral,.ver.DIAS.(1993,.1995).

(7)

las.como.escolhas.estéticas..Por.estética.não.entendo.apenas.o.domínio. da. sensibilidade,. mas,. sobretudo,. da. contemplação. e. da. harmonia.. O. objeto.estético.é.aquele.que.desperta.em.nós.admiração.e.complacência. desinteressada..Ele.exibe.a.“justa.medida”,.a.perfeita.harmonia.das.partes. que. projeta. em. nós. o. sentido. da. plenitude. e. um. ideal. de. felicidade.. A. constituição.de.uma.identidade.qualitativa.é.assim.antes.de.tudo.a.busca. de.um.ideal.estético..

Cabe-nos.agora.indagar.em.que.medida.a.ética.da.“boa.vida”.ou. um.ideal.de.vida.estético.pode.contemplar.as.demandas.de.uma.moral. moderna..Em.outras.palavras,.em.que.medida.deve.a.identidade.moral. desempenhar. algum. papel. na. constituição. da. identidade. do. indivíduo?. Nós. dissemos. que. cada. indivíduo. elege. para. si. aquilo. que. para. sua. identidade.e.para.sua.vida.considera.fundamental..É.a.identidade.moral. de.um.indivíduo.essencial.para.uma.identidade.ou.para.uma.vida.lograda?. Uma.resposta.a.tal.questão.está.para.além.dos.limites.de.uma. investigação. filosófica.. Tudo. o. que. podemos. apontar. são. algumas. consequências.da.aceitação.ou.recusa.de.um.pricípio.moral.qualquer..Se.não. elegemos.para.nossa.identidade.qualitativa.a.identificação.aos.princípios. de. uma. comunidade. moral,. eliminamos. qualquer. possível. referência. a. sentimentos. morais,. tais. como. culpa,. ressentimento. e. indignação.. Tais. sentimentos.são.uma.reação.da.comunidade.ou.do.próprio.indivíduo.à. infração.de.um.princípio.moral.ao.qual.ambos.estejam.identificados..Se. elegemos.fazer.parte.da.comunidade.moral,.então.nos.comprometemos. a. fazer. de. seus. princípios. nossos. próprios. princípios,. o. que,. em. outras. palavras,.significa.que.nos.comprometemos.a.aceitar.o.caráter.prescritivo. dos. mesmos.. Com. isto. suponho. poder. responder. à. segunda. questão. acima.mencionada,.qual.seja,.a.questão.acerca.do.fundamento.do.caráter. prescritivo.dos.juízos.morais..Agimos.de.acordo.com.princípios.morais,. quando.elegemos.fazer.parte.da.comunidade.moral..

Agir. de. acordo. com. o. imperativo. kantiano,. ou. seja,. agir. de. tal. maneira. que. as. regras. do. nosso. agir. possam. ser. tomadas. como. um. lei.universal2,.é.uma.opção.de.indivíduos.livres..Aceitar.um.tal.princípio.

significa.aceitar.uma.moral.universalista,.a.partir.da.qual.todo.e.qualquer.

2.A.primeira.formulação.do.imperativo.categórico.kantiano.é.aqui.mencionada.por.fornecer.uma.explicitação. do.princípio.comum.a.toda.e.qualquer.concepção.moral.universalista.

(8)

Informação,.conhecimento.e.ação.ética

indivíduo. deve. ser. considerado. como. possuindo. igual. valor. normativo,. como.igual.objeto.de.respeito..Se.aceitamos.os.princípios.de.uma.moral. universalista,. então. reagimos. com. indignação. a. qualquer. tentativa. de. restrição.das.nossas.normas.morais.aos.indivíduos.de.uma.determinada. etnia,.sexo,.ideologia.ou.classe.social..Com.isso,.excluímos.a.possibilidade. de. restrição. do. âmbito. de. aplicação. das. regras. morais,. porém. não. a. liberdade.de.cada.indivíduo.aceitar.ou.não.uma.posição.moral..

Neste.sentido,.podemos.admitir.que.a.nossa.constituição.de.um. ideal. de. vida. estético. não. precisa. estar. comprometida. com. a. aceitação. de. princípios. morais.. A. escolha. de. um. projeto. de. vida. não. exclui. a. possibilidade.de.recusa.da.própria.moralidade..Contra.aqueles.que.recusam. a.moralidade.podemos.apenas.retrucar:.se.queremos.que.nossas.próprias. pretensões. sejam. respeitadas,. então. devemos. eleger. pertencer. a. uma. comunidade.cujo.princípio.supremo.seja.o.respeito.aos.interesses.de.cada. um..E,.se.à.identidade.qualitativa.do.indivíduo.pertence.a.identificação. com.os.princípios.de.uma.moral.universalista,.então.o.respeito.a.todos.os. seres.humanos.será.uma.condição.necessária.para.que.o.indivíduo.possa.ter. consciência.de.uma.identidade.ou.uma.vida.lograda. III

Mas. como. podemos. enquanto. indivíduos. situados. espaço. temporalmente. eleger. para. nossa. própria. identidade. o. pertencimento. a. uma.comunidade.abstrata.marcada.pelos.ideais.da.igualdade.e.do.respeito. universal?.Para.concluir,.pretendo.agora.ressaltar.o.caráter.essencialmente. imaginativo.do.exercício.da.razão.prática.e.defender.a.expansão.e.cultivo. da. nossa. capacidade. imaginativa.como. o. caminho. mais. adequado. para.

implementação.do.princípio.moral.do.respeito.universal.

Vimos.acima.que.a.adoção.de.uma.perspectiva.moral.universalista. implicaria,.em.linhas.gerais,.a.aceitação.da.subsunção.de.nossas.ações.a. princípios. universais.. Desta. maneira. poderíamos. verificar. e. justificar. o. valor.moral.de.nossas.ações.perante.os.demais.integrantes.da.comunidade. moral.. Tal. procedimento. parece. funcionar,. sobretudo,. nos. chamados. casos.paradigmáticos..Tais.casos.são,.na.maioria.da.vêzes,.casos.em.que. reconhecemos. não-dever. fazer. algo.. O. critério. para. o. reconhecimento.

(9)

da. regra. é,. como. Kant. propõe,. o. reconhecimento. de. que. tal. ação. não. é. desejável. para. pelo. menos. uma. das. posições. envolvidas.. Em. outras. palavras,. são. casos. em. que. a. adoção. de. um. parâmetro. de. conduta. não. pode.ser.universalizável.

A. dificuldade. surge. quando. reconhecemos. que. os. casos. prototípicos.representam.apenas.uma.pequena.parcela.dos.casos.com.os. quais.nos.confrontamos.no.nosso.dia-a-dia..Como.então.solucionar.ou. mesmo.compreender.os.inúmeros.casos.que.não.se.deixam,.pelo.menos. trivialmente,.subssumir.a.regras?.Ou,.dito.de.modo.ainda.mais.radical,. como.buscamos,.até.mesmo.nos.casos.prototípicos,.as.regras.adequadas. para.situações.concretas?.Minha.tese.é.a.de.que.uma.decisão.moral.bem-sucedida.depende.do.exercício.mais.ou.menos.refinado.da.nossa.capacidade. imaginativa..Apenas.este.exercício.imaginativo.nos.permite.bem.explorar,. em.cada.caso,.os.aspectos.relevantes.e.as.alternativas.disponíveis.. Antes.de.prosseguir,.devo.salientar.que.o.uso.da.imaginação,.aqui. proposto,.em.nada.nos.compromete.como.um.procedimento.subjetivista. ou. irracional.. O. que. defendo. é. uma. visão. da. racionalidade. prática. e/ ou. moral. como. imaginativa.. Neste. sentido,. minha. estratégia. consiste. em.apontar.para.os.diversos.recursos.imaginativos.que.tomam.parte.no. raciocínio.prático..

Como. agentes. morais,. nos. compreendemos. a. partir. de. uma. determinada.narrativa.sobre.o.mundo..Somos.aqueles.que.inserem.a.sua. existência.num.campo.específico.de.crenças.e.relações.humanas..Exercemos. certas. funções. e. por. elas. nos. fazemos. reconhecer.. Encarnamos. certos. valores.e.sobre.eles.constituímos.um.projeto.de.vida..Somos.o.fruto.de.um. passado,.de.uma.história.narrativa.alheia.que.tornamos.nossa,.a.cada.vez. que.assumimos.o.papel.de.agentes.de.nossas.próprias.ações..Aprendemos. a.olhar.e.a.interagir.no.mundo.a.partir.de.modelos.e.idealizações.sobre. os. quais,. em. seguida,. aprendemos. também. a. exercer. nossa. capacidade. crítica..Não.há,.portanto,.nada.de.essencial.e.exclusivamente.subjetivo.em. tais.processos..Ao.contrário,.trata-se.de.reiterar.o.caráter.essencialmente. intersubjetivo.de.nossas.escolhas.e.do.significado.que.atribuimos.ao.nosso. modo.de.ser.no.mundo.

(10)

Informação,.conhecimento.e.ação.ética

O. exercício. da. racionalidade. prática. envolve. a. necessidade. de. refletirmos.sobre.nossa.própria.situação,.sobre.situações.alheias,.sobre.as. consequências.de.nossas.ações.e.as.alternativas.possíveis..Como.então.levar. a.cabo.uma.tal.tarefa.sem.recorrermos.à.capacidade.de.criar.protótipos,. comparar.e.relacionar.modelos.de.vida.e.de.conduta.e,.sobretudo,.sem. assumirmos,. ainda. que. sob. a. forma. de. um. Gedankenexperiment3,. as.

perspectivas. alheias?. Se. tais. processos. puderem. ser. reconhecidos. como. relacionados.ao.uso.da.nossa.capacidade.imaginativa,.então.poderíamos. ainda.perguntar:.como.podemos.conceber.uma.racionalidade.prática.que. já.não.seja.ao.mesmo.tempo.essencialmente.imaginativa?. Chegamos.assim,.ao.ponto.central.desta.terceira.parte,.a.saber:. a.tese.é.de.que.apenas.o.exercício.de.nossa.capacidade.imaginativa.nos. permite.decidir.sobre.a.universalidade.de.uma.regra.de.ação..Em.outras. palavras,.considerando.a.tese.central.kantiana.de.que.o.predicado.moral. deve.ser.aplicado.apenas.às.regras.ou.máximas.do.agir.que.puderem.ser.ao. mesmo.tempo.consideradas.como.lei.universal,.ou.seja,.que.satisfaçam.o. princípio.de.universalização,.podemos.agora.dizer.que.a.efetiva.aplicação. de. um. tal. princípio. supõe. não. um. emprego. formal. da. razão,. mas. seu. uso. imaginativo,. apenas. através. do. qual. podemos. percorrer. as. diversas. posições.a.serem.consideradas..Se.queremos.tomar.uma.posição.a.respeito. de.situações.que.envolvam,.por.exemplo,.aborto,.eutanásia,.suicídio.etc,. então.não.podemos.mais.pensá-las.em.abstrato.mas.teremos.que.analisar. casos. concretos.. Em. cada. caso,. estarão. envolvidas. diversas. perspectivas. que. deverão. então. ser. consideradas. a. partir. de. sua. lógica. interna,. ou. seja,.por.referência.ao.universo.de.desejos.e.crenças.que.constitui.a.base. informacional.e.motivacional.de.cada.agente.. Podemos.assim.concluir.que.ao.elegermos.viver.de.acordo.com. uma.perspectiva.moral.universalista,.segundo.a.qual.nos.dispomos.a.agir. levando.em.consideração.a.perspectiva.de.todo.e.qualquer.indivíduo,.nos. comprometemos.com.um.certo.teatro.imaginativo,.onde.nos.propomos. igualmente. a. ocupar. qualquer. um. dos. papeis. encenados.. Ser. moral,. neste.contexto,.significa.ser.sensível.à.perspectiva.alheia,.compreender.ou.

respeitar.narrativas.diversas,.compadecer-se.do.sofrimento.e.comprometer-3.A. tradução. mais. adequada. em. português,. embora. não. seja. de. uso. comum,. seria. um. “experimento. de. pensamento”.

(11)

se.com.o.florescimento.de.todos.aqueles.que.integram.o.nosso.ideal.ético-estético.de.uma.vida.plena..

referêncIa

DIAS,.M..C..Die soziale Grundrechte em Die sozialen Grundrechte: eine.philosophische. untersuchung.der.frage.nach.den.Menschenrechten..Konstanz:.Hartung-Gorre.Verlag,. 1993.

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