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A ESPERA DO FOGO: A LENTA AGONIA DO CERRADO DE CAMPO MOURÃO - PR

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Academic year: 2021

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A ESPERA DO FOGO: A LENTA AGONIA DO CERRADO DE CAMPO

MOURÃO - PR

Mauro Parolin

Departamento de Geografia da Universidade Estadual do Paraná/Campus da Fecilcam, mauroparolin@gmail.com

Marcelo Galeazzi Caxambu

Departamento de Engenharia Ambiental da Universidade Tecnológica Federal do Paraná, mgcaxambu@yahoo.com.br

Oséias Cardoso

Departamento de Geografia da Universidade Estadual do Paraná/Campus da Fecilcam, oseiascardoso@hotmail.com

RESUMO

O cerrado no Paraná tem seu registro para vários municípios. No entanto, em Campo Mourão, segundo o cientista alemão Reinhard Maack (1892-1969), o cerrado ocupava uma área de aproximadamente 102 km2. Com o avanço da urbanização e a exploração agrícola, restam hoje cerca de 0,7% dessa vegetação. Uma pequena parte de 13.300 m2 foi preservada em meados da década de 1980, constituindo a Estação Ecológica do Cerrado de Campo Mourão - EECCM (menor Estação Ecológica do Brasil). Por se tratar de uma estação muito pequena encravada em uma área urbana, a mesma apresenta vários impactos, principalmente em decorrência da proliferação de plantas exóticas ao cerrado e à ausência de queimadas (adensamento populacional). Nesse sentido, foi apresentado ao Ministério Público Estadual da Comarca de Campo Mourão, em abril de 2012, uma solicitação de retirada de espécies exóticas e queima de 10% da área da EECCM. No entanto, embora muito bem embasada cientificamente, a solicitação arrasta-se há mais de um ano, expondo de maneira visceral o dilema entre as necessidades técnicas e as vontades políticas, enquanto várias espécies nativas do cerrado vão lentamente sucumbindo.

Palavras-chave: Estação Ecológica do Cerrado, plano de manejo, unidade de conservação. ABSTRACT

The hold fire: The slow agony of savannah of Campo Mourão. The savannah in Paraná have your

record for several municipalities. However, in Campo Mourão, according to the German scientist Renhard Maack (1892-1969) the savannah area occupied an area of approximately 102 km2.With the advancement of urbanization and farm, today there are about 0.7% of this vegetation. A small part of 13,300 m2 has been preserved in the mid of the 1980s, being the Ecological Station of Cerrado de Campo Mourão - ESCCM (minor Ecological Station of Brazil). Because it is a very small station ingrown in an urban area, it presents many impacts, mainly due to the proliferation of exotic plants to savanna and to the absence of fire (population density).In that sense, was presented to the State Public Prosecutor of the County of Campo Mourão in april 2012 a request for withdrawal of exotic species and flaring 10% of the area ESCCM. However, although very scientifically based, the request has dragged on for over a year, in a manner visceral exposing the dilemma between the technical and political will, while several species in the cerrado will slowly succumbing.

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1. Introdução

As primeiras hipóteses sobre as mudanças climáticas ocorridas nos últimos 2 milhões de anos foram sugeridas por um cientista paranaense: o alemão radicado no Estado do Paraná Prof. Reinhard Maack (1892-1969) que em 1947 já pesquisava vestígios de climas mais rigorosos dentro do Quaternário brasileiro, sendo um dos ardentes defensores da hipótese de que os enclaves de campos nas florestas do Brasil eram remanescentes de climas passados. Segundo Maack, anteriormente predominava um clima de estepes, semi-árido, cujas evidências encontravam-se nos campos do Paraná e nas ilhas de campos cerrados, dentro das matas pluviais e subtropicais. Nesse sentido, Maack informa as áreas paranaenses onde o cerrado predominava, entre elas, os municípios de Campo Mourão, Sabaudia, Senges e Jaguariaíva. No caso de Campo Mourão, Maack calculou uma área aproximada de 102 km2. Desde os estudos desse pesquisador até o presente momento, o cerrado de Campo Mourão foi brutalmente alterado, primeiramente pela pressão da colonização e posteriormente pela pressão imobiliária. Da área estimada originalmente, restaram apenas 0,7% concentrados em pequenas “manchas” no entorno da cidade, e uma área preservada em meados da década de 1980 (Decreto Municipal nº. 596/93), com 13.300 m2 (Estação Ecológica do Cerrado de Campo Mourão - EECCM administrada pela Fecilcam) podendo ser considerada a menor estação ecológica do Brasil.

Embora preservada, é notória a alteração verificada na área representada, principalmente pelo adensamento da vegetação, bem como pela presença de plantas invasoras. A expressiva urbanização e ausência de queimadas contribuíram significativamente para essa situação.

No tocante às queimadas, a princípio podem dar a ideia de impacto, no entanto, são comuns e extremamente importantes para essa vegetação, como pode ser visto em vários trabalhos que serão elencados adiante. Com mais de 25 anos sem ser queimada, houve acúmulo de material lenhoso no solo da Estação, aumentando consideravelmente a espessura da serapilheira. Essa situação aumenta a eutrofização do solo, e, com mais nutrientes a vegetação outrora esparsa se adensa.

Diante do exposto, o estudo apresenta a luta empenhada pelos autores e demais atores envolvidos, para o corte e retirada de espécies exóticas ao cerrado e realização de uma queimada controlada em 10% da área da EECCM desde 10 de abril de 2012, data do primeiro ofício encaminhado ao Ministério Público Estadual (Promotoria de Justiça da Comarca de Campo Mourão).

2. Materiais e Métodos

O trabalho teve por base as pesquisas que discutem o manejo com fogo em áreas de cerrado; a documentação em acervo na EECCM; o histórico das reuniões realizadas junto ao Ministério Público do Estado do Paraná e os documentos a ele anexados.

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3. Fundamentos Teóricos

Considerando que os maiores problemas no manejo das unidades de conservação são advindos da relação complexa entre os grupos humanos e os recursos reunidos nessas áreas, é possível entender que no espaço urbano essa relação ainda é mais complexa, visto que nesse espaço a ocorrência de articulações e desarticulações entre os elementos formadores do conjunto urbano é significantemente maior. Diante do exposto, pode ser considerado que o problema em se manter uma pequena área de Cerrado, preservada em meio a um sítio urbano, é ainda mais potencializado.

O Cerrado ou Savana é o segundo maior Bioma Brasileiro, correspondendo a 22% do território nacional. No Paraná, originalmente, ocupava uma área de 1.700 km², ocorrendo nos municípios de Arapoti, Campo Mourão, Carlópolis, Cianorte, Cruzeiro do Oeste, Jaboti, Jaguariaíva, Londrina, Piraí do Sul, São Jerônimo da Serra, São José da Boa Vista, Sabáudia, Sengés, Tibagi, Tomazina e Wenceslau Brás (HATSCHBACH et al. 2005).

Roderjan et al. (2002) consideram que no Paraná, o cerrado se apresenta na forma de encraves (ilhas), representando o limite austral de distribuição desta formação no Brasil.

O Cerrado de Campo Mourão foi brutalmente alterado, principalmente pela pressão de colonização, e posteriormente, pela pressão imobiliária. Para Mizote (2005), dos 102 km² de área original, restaram apenas 0,7%, sendo que os remanescentes ficaram basicamente concentrados em quatro áreas: a Estação Ecológica do Cerrado, o Lote 7-H, na área do DNIT de Campo Mourão; e em outra área de propriedade particular, às margens da rodovia BR-158, em direção a Maringá (Figura 1).

Ainda hoje, além da pressão imobiliária, o cerrado tem enfrentado a ação predatória de pessoas que buscam obter medicamentos por meio de sua vegetação, contribuindo para a morte de algumas plantas pela retirada da casca (ex: angico-do-cerrado Anadenanthera

peregrina var. falcata (Benth.) Altschul e o barbatimão Stryphnodendron adstringens (Mart.)

Coville), a coleta de frutos de maneira predatória (ex: o pequi Caryocar brasiliense Cambess.), o depósito irregular de resíduos sólidos, como o que ocorre no lote 7-H, a invasão por espécies exóticas invasoras (ex: a leucena Leucaena leucocephala (Lam.) de Wit) ou ainda por espécies florestais nativas, não típicas do cerrado.

As plantas típicas de cerrado ocorrem geralmente em solos profundos, bem drenados, ácidos, com presença de alumínio. Frequentemente, estas plantas desenvolvem adaptações para resistir à seca e ao fogo, que é parte integrante deste ecossistema. Entre as adaptações a seca e ao fogo, de acordo com IBGE (1992), está os geófitos (bulbos, rizomas e tubérculos,

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cujas gemas de crescimento são encontradas no subsolo, durante os períodos desfavoráveis) e os xilopódios (“troncos subterrâneos”), a presença de casca grossa nas árvores, cuja função é proporcionar isolamento térmico contra o fogo e a presença da túnica nas gramíneas, que protege as gemas de crescimento.

Figura 1. Localização da cidade de Campo Mourão e perímetro Urbano de Campo Mourão com destaque para a Estação do Cerrado de Campo Mourão e Lote 7H

Coutinho (1977), estudando quatro espécies de cerrado em Pirassununga-SP, dentre as quais duas existem no Cerrado de Campo Mourão (Gomphrena macrocephala A.St.-Hil. e a caroba-do-cerrado Jacaranda decurrens Cham.), registrou um benefício da queima controlada, no sentido de beneficiar a abertura de frutos destas espécies, de maneira concomitante após a queima, potencializando a dispersão de sementes e minimizando a predação, quer seja pela quantidade de sementes liberadas ao mesmo tempo, quer seja pela eliminação de insetos maléficos às sementes por ocasião da queimada, promovendo um aumento das chances de germinação destas sementes.

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Neste sentido ainda, cabe lembrar que Gomphrena macrocephala é espécie ameaçada de extinção no Paraná, de acordo com Hatschbach e Ziller (1995), estando enquadrada por estes autores como rara no Estado.

Sato et al. (2010) observaram que o fogo provoca danos diversos na vegetação arbórea do Cerrado, alterando a sua estrutura. Para Walter e Ribeiro (2010), o fogo influencia a distribuição, a riqueza e a composição biótica, podendo ser um fator fundamental para a manutenção de diversas áreas de savanas no mundo.

Munhoz e Amaral (2010) estabelecem que diversas espécies do estrato herbáceo-arbustivo do Cerrado dependem do fogo para sobreviver. Para Walter e Ribeiro (2010), o fogo é um elemento natural com que o bioma Cerrado convive ou evolui há milhares de anos e não pode ser simplesmente eliminado nas ações de manejo de suas paisagens.

Falleiro (2011), estudando áreas indígenas de quatro etnias com cerrado preservado, no Oeste do Mato Grosso, observa que com exceção da área de uma das etnias, onde ocorria a Floresta Estacional Semidecidual, as outras três rejeitaram o manejo de suas terras com exclusão do uso de fogo, considerando o fogo benéfico para a fauna e a flora. Considera ainda que com o uso do fogo haja melhoria da qualidade nutricional das plantas para a fauna e a maior ocorrência de frutos, sendo constatado que em algumas Unidades de Conservação como o Parque Nacional das Emas e o Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros, os animais saem destas unidades para se alimentar nas áreas de cerrado queimadas.

Falleiro (2011) considera ainda que para as áreas estudadas, a frequência das queimas controladas deve ser de uma a cada três anos, para que possa haver benefícios. Por outro lado, enfatiza a necessidade de estudos científicos que possam mostrar nas Unidades de Conservação os benefícios advindos da queima e postula que não se possa queimar toda a área, observando ainda o período de queima, sob o risco de afetar negativamente a flora e a fauna.

Muniz da Silva et al. (2011) estudando a frequência do fogo, com enfoque em trabalhos realizados no Parque Nacional das Emas observaram os seguintes resultados: em maiores frequências de fogo (queimadas anuais ou bienais) ocorre agrupamento fenotípico, diminuição da competição, diminuição da biomassa vegetal e enriquecimento dos solos; em menor frequência (sem queimadas há doze anos), há maior competição entre as espécies e grande acúmulo de biomassa seca.

Além disso, os mesmos autores consideraram que diferentes regimes de fogo suportam diferentes composições florísticas, com grupos de espécies exclusivos em cada regime, tanto de espécies herbáceo-subarbustivas quanto de arbustivo-arbóreas. Sugerem que

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seja mantido um mosaico com diferentes regimes de fogo e que se evitem áreas de cerrado sem queimadas por muitos anos.

Para Fidelis e Pivello (2011), evidências fósseis e palinológicas demonstram que tanto o Cerrado como os Campos Sulinos evoluíram com eventos de fogo, pois diversas adaptações são reconhecidas na vegetação e também em seus processos ecológicos, havendo indicações seguras de que sua própria manutenção seja dependente de queimas periódicas.

A decisão de banir o fogo nas áreas protegidas com esses ecossistemas traz diversos problemas às próprias unidades de conservação, como exclusão de espécies, invasão por espécies exóticas, perturbação de ciclos ecológicos, que comprometem a preservação da diversidade biológica em médio e logo prazo. Sendo expressamente recomendado que os órgãos ambientais brasileiros revejam sua posição em relação ao manejo de unidades de conservação que protegem ecossistemas adaptados a distúrbios de fogo, admitindo a aplicação de ações planejadas e controladas que supram os efeitos causados por esse distúrbio natural (FIDELIS e PIVELLO, 2011).

Trabalho recente de Guerreiro et al. (2011) mostrou franca recuperação de espécies de Cerrado fora da EECCM, mesmo em áreas que paulatinamente sofrem corte e queimadas, como é o caso da área abrangida pelo Aeroporto Municipal de Campo Mourão.

4. Histórico da Estação Ecológica do Cerrado de Campo Mourão

O primeiro registro sobre a necessidade de se estabelecer uma área de preservação de reserva de Cerrado no município de Campo Mourão ocorreu em 09 de julho de 1974, quando então o Prof. José Carlos Cal Garcia, na qualidade de Reitor da Fundação Universidade Estadual de Maringá, apresenta o Prof. Issa Chaiben Jabur ao Prefeito de Campo Mourão, na época o Sr. Renato Fernandes, para tratar do assunto. Não há registros sobre uma resposta a esse ofício.

Em 1984, com a criação do Curso de Geografia na Faculdade de Ciências e Letras de Campo Mourão (Fecilcam), a discussão sobre a necessidade de preservação do Cerrado volta à tona, e em 1987 é formalizada pelo projeto intitulado “Preservação da Relíquea Ecológica do Cerrado de Campo Mourão” coordenado pelos professores Léia Denarde, José Antônio da Rocha e Ivone Pereira da Silva. O Projeto em questão previa a preservação das quadras 28 e 29 do Jardim Nossa Senhora Aparecida de Campo Mourão, escolhidas por sua riqueza paisagística e específica. Ainda em 1987, a área foi decretada de Utilidade Pública (Decreto Municipal nº175/87 de 04 de novembro de 1987), assinado pelo então Prefeito Municipal Sr. José Pochapski.

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Embora as duas quadras tenham sido declaradas de utilidade pública, somente uma foi efetivamente preservada (Quadra 29). Na quadra 28, em meados de 1988, houve uma remobilização de solo operada pela Prefeitura Municipal de Campo Mourão, ocasionando a inutilização da mesma para fins de preservação (Figura 2).

Figura 2. Foto datada de 04 abril de 1988 na qual é possível observar a terra tombada pela Prefeitura em 04/04/1988.

Por meio do Decreto nº 191, de 25 de abril de 1990, a área foi declarada de Patrimônio Público para fins de desapropriação, porém, pela falta de empenho do setor público em fazer cumprir a Lei, foram necessárias novas reivindicações. O tombamento só foi efetivamente concretizado em 01 de junho de 1993, pelo Decreto nº 593 que revogou o Decreto anterior. Por meio do Decreto nº 596, em 02 de junho de 1993, criou-se a Estação Ecológica do Cerrado de Campo Mourão. Em 03 de agosto de 1993, a Prefeitura Municipal de Campo Mourão firmou convênio com a Faculdade Estadual de Campo Mourão (referendado pela Resolução nº20/93 de 21 de setembro de 1993), que desde então passou a administrar a área.

5. Da solicitação de corte de espécies exóticas e queimada da área ao Ministério Público

Em 13 de setembro de 2011 foi realizado na Universidade Tecnológica Federal do Paraná/Campus de Campo Mourão o I Workshop do Cerrado de Campo Mourão, entre as discussões empreendidas durante o evento, abordou-se a questão da queimada, principalmente devido ao adensamento da população, o controle de plantas invasoras e a quebra de dormência de sementes.

Em 10 de abril de 2002, o Coordenador da EECCM encaminha o Ofício nº05/2012-Lepafe para a Promotoria de Justiça de Proteção ao Meio Ambiente de Campo Mourão,

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informando os problemas enfrentados pela EECCM em decorrência da ausência do fogo, entre eles a proliferação de plantas invasoras, e a eutrofização do solo gerada pela decomposição da serrapilheira. Em 01 de maio de 2012, o Professor Dr. Marcelo Galeazzi Caxambu, Curador do Herbário HCF, responde o Ofício nº188/2012-1ª, referente à instrução do Procedimento Administrativo nºMPPR-0024.12.000131-8 da Promotoria de Justiça de Proteção ao Meio Ambiente de Campo Mourão, sobre à viabilidade de queima controlada na EECCM, em sua resposta, o Professor elenca vários artigos sobre queimada em cerrado, bem como endossa a necessidade de tal prática na EECCM.

Diante do processo aberto junto ao Ministério Público, a Secretaria de Agricultura e Meio Ambiente do Município de Campo Mourão encaminha Ofício nº 69/2012-SEAMA para a Coordenação da EECCM e solicita a elaboração emergencial de um plano de manejo com vistas à queimada controlada. Com base nesse documento, realiza-se no dia 31 de maio de 2002, nas dependências da EECCM a primeira reunião entre representantes do IAP, Fecilcam e UTFPR para avaliar o pedido de queimada. Como resultado imediato da reunião foi protocolado junto ao IAP (07.972.273-1), em 02 de julho de 2012, o projeto intitulado “Quebra de dormência de sementes e controle de invasoras na Estação Ecológica do Cerrado Prof.ª Diva Aparecida Camargo através da queimada controlada”, assinado pelos professores Mauro Parolin (Fecilcam) e Marcelo G. Caxambu (UTFPR). Os objetivos elencados nesse projeto são: a) queima de 10% da EECCM, visando a renovação da vegetação e a eliminação de espécies invasora; b) monitoramento do processo de recuperação pós-queima, estabelecendo e registrando o processo de recuperação; c) repasse dos primeiros subsídios para o Plano de Manejo da Área.

A área escolhida para a queima representa o equivalente a 10% da área da EECCM, correspondendo a 1.300 m2 (80x16m) conforme pode ser visualizado na Figura 3.

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Figura 3. Imagem de satélite (Google Earth®) da Estação Ecológica do Cerrado de Campo Mourão com destaque para a área escolhida para a queimada.

Em 28 de agosto de 2012 o IAP dá parecer ao projeto de queimada então protocolado, encaminhando ao Ministério Público e à Fecilcam o Ofício nº271/2012-ERCO, dentre as considerações agrupadas nesse ofício podem ser destacadas:

“...a referida unidade de conservação é de responsabilidade da esfera municipal, cabendo ao executivo municipal analisar o projeto técnico de queimada e postular tal solicitação perante a este instituto, visto que quaisquer danos ambientais a unidade e nas propriedades de terceiros será de responsabilidade exclusiva do município... deverá ser retirado do local, através de manejo direto as espécies que não são representantes do Bioma de Cerrado... todas as ações de manejo deverão ser precedidas de autorização ambiental pelo IAP, devendo ser pedido através do município de Campo Mourão, ou, que pelo menos tenha sua anuência em caso de existência de convênio junto a Fecilcam para gerir esta unidade de conservação...no Paraná, em Unidades de Conservação de forma experimental houve uso de fogo no Parque Estadual de Vila-Velha, sem, no entanto apresentar resultados que justificassem tal prática numa unidade de conservação....embora haja uma série de estudos para a vegetação de Cerrado no território nacional, com recomendação de uso de fogo para controle de espécies invasoras, dada a particularidade da área em questão (tamanho e localização) não se pode preconizar que a recuperação da área se dará apenas com o uso de fogo sem observar antes outras práticas alternativas...após estas ações deverá ser reavaliada a

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solicitação de queimada controlada nesta Unidade de Conservação”.

Deve ser salientado que o ofício do IAP não esclarece de maneira objetiva ou mesmo elenca trabalhos que desaconselham o fogo em unidades de conservação, principalmente no tocante ao Cerrado. Chama atenção o item “c” no qual o IAP solicita que todas as ações sejam solicitadas pela Prefeitura de Campo Mourão, ou com sua anuência. Considerando que o Ofício nº 69/2012-SEAMA já dava essa prerrogativa à Fecilcam com anuência da Prefeitura, tal argumentação não se fundamenta.

Diante da resposta do IAP que solicitava à Prefeitura de Campo Mourão o pedido para a queimada, e, do Convênio existente entre a Prefeitura e a Fecilcam, o Ministério Público convocou para o dia 03 de outubro de 2012, a primeira reunião sobre a queima controlada do cerrado. Nesta reunião houve a participação do IAP, da Polícia Militar, do Corpo de Bombeiros, da Secretaria Municipal do Meio Ambiente, da UTFPR e da Fecilcam. Entre os pontos acordados nessa reunião ficou decidido que a Fecilcam e a UTFPR apresentariam até maio de 2013 um inventário de espécies que seriam alvo da queimada.

Em 11 de junho de 2013 através do Ofício nº26/2013-Lepafe, assinado pelos professores Marcelo Galeazzi Caxambu e Mauro Parolin, é apresentado ao Ministério Público, IAP e Secretaria Municipal do Meio Ambiente, o inventário de espécies (Tabela 1) e um croqui de posicionamento das mesmas. Nesse ofício, também é indicada a necessidade de retirada das espécies exóticas ao Cerrado, somando 78 árvores/arvoretas. Diante desse ofício, o Ministério Público convoca outra reunião como os atores envolvidos no processo para o dia 02 de agosto de 2013. Nessa reunião, embora tenham sido mostrados todos os cuidados e procedimentos que seriam tomados para a realização da queimada, como por exemplo: a) a poda de árvores na área limítrofe (3m) objeto de queima; b) visita aos moradores do entorno da EECCM explicando os motivos da queimada; c) cuidados com a fiação elétrica; d) palestras nas escolas, esclarecendo os motivos da queimada; e) a ação do Corpo de Bombeiros, entre outras; a representação do IAP argumentou que o pedido deveria partir da Prefeitura Municipal de Campo Mourão, afirmando que este posteriormente seria encaminhado para área técnica do IAP em Curitiba. Embora tal argumentação tenha sido aceita pelos representantes da Prefeitura Municipal de Campo Mourão, e, embora a Prefeitura com base no levantamento realizado tenha solicitado a retirada das espécies exóticas da área e queimada controlada, o fato desse pedido ter agora de passar por estâncias superiores, torna quase impossível a realização da queimada ainda no ano de 2013.

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Tabela 1. Resultado do inventário de espécies realizados na área objeto de queima na Estação Ecológica do cerrado de Campo Mourão.

Nº Família Espécie Tipo

1 Fabaceae Leptolobium elegans Vogel C

2 Fabaceae Anadenanthera peregrina var. falcata (Benth.) Altschul C

3 Rutaceae Citrus latifólia Tanaka EX

4 Erythroxylaceae Erythroxylum suberosum A.St.-Hil. C

5 Moraceae Brosimum gaudichaudii Trécul C

6 - - -

7 Apocynaceae Tabernaemontana cathariensis A. DC. EX

8 Sapindaceae Allophylus guaraniticus (A.St.-Hil.) Radlk. EX

9 Sapindaceae Matayba elaeagnoides Radlk. EX

10 Erythroxylacea Erythroxylum cuneifolium (Mart.) O.E.Schulz C

11 Moraceae Maclura tinctoria (L.) D.Don ex Steud. EX

12 Salicaceae Casearia sylvestris Sw. C

13 Sapindaceae Matayba elaeagnoides Radlk. EX

14 Myrtaceae - -

15 Myrtaceae Campomanesia adamantium (Cambess.) O.Berg C

16 Sapotaceae Chrysophyllum marginatum (Hook. & Arn.) Radlk. C

17 Moraceae Sorocea bonplandii (Baill.) W.C.Burger et al. EX

18 Myrtaceae Myrcia sp. C

19 Myrsinaceae Myrsine balansae (Mez) Arechav. EX

20 Rubiaceae Cordiera concolor (Cham.) Kuntze C

21 Apocynaceae Aspidosperma tomentosum Mart. C

22 - - -

23 Myrtaceae Myrcia cf. laruotteana Cambess. C

24 Cyperaceae Rhynchospora corymbosa (L.) Britton C

25 Myrtaceae Eugenia myrcianthes Nied. C

26 Melastomataceae Tibouchina gracilis (Bonpl.) Cogn. C

27 - -

28 Vochysiaceae Vochysia tucanorum Mart. C

29 Myrtaceae Eugenia sp. C

30 Bignoniaceae Handroanthus ochraceus (Cham.) Mattos C

31 Annonaceae Duguetia furfuracea (A.St.-Hil.) Saff. C

32 Euphorbiaceae - -

33 - - -

34 Lauraceae Ocotea lancifolia (Schott) Mez C

35 Rubiaceae Cordiera concolor (Cham.) Kuntze C

36 Sapindaceae Serjania erecta Radlk. C

37 Symplocaceae Symplocos tetrandra Mart. C

38 Melastomataceae Miconia cinerascens Miq. C

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40 Lacistemaceae Lacistema hasslerianum Chodat C

41 Bignoniaceae Handroanthus ochraceus (Cham.) Mattos C

42 - - -

43 Asteraceae Lepidaploa chamissonis (Less.) H.Rob. C

44 Annonaceae Duguetia furfuracea (A.St.-Hil.) Saff. C

45 Myrtaceae Myrcia cf. laruotteana Cambess. C

46 Fabaceae Stryphnodendron adstringens (Mart.) Coville C

47 Lamiaceae Aegiphila verticillata Vell. C

48 Bignoniaceae Jacaranda cf. Caroba (Vell.) DC. C

49 Rosaceae Rubus brasiliensis Mart. C

50 Anacardiaceae Lithrea molleoides (Vell.) Engl. C

51 Vochysiaceae Vochysia tucanorum Mart. C

52 Myrtaceae - -

53 Sapindaceae Matayba elaeagnoides Radlk. EX

54 Myrtaceae Myrcia splendens (Sw.) DC. C

55 Fabaceae Bauhinia holophylla (Bong.) Steud. C

56 - - -

57 Myrtaceae Eugenia sp. C

58 Lacistemaceae Lacistema hasslerianum Chodat C

59 Asteraceae Gochnatia polymorpha (Less.) Cabrera C

(C) Espécies típicas de cerrado e que permanecerão na área para acompanhamento

(EX) Espécies exóticas para o cerrado, embora possa ser uma espécie nativa, ela não é pertencente da formação

vegetacional do cerrado, dessa forma deve ser retirada da área, com a finalidade de diminuir o risco de incêndio, a partir da queima controlada. Estas espécies foram confrontadas com as listas, Federal e Estadual de espécies ameaçadas de extinção para garantir que a sua retirada não provoque perdas irreparáveis.

(-) Não foi possível a identificação da espécie, portanto não serão cortados, porém se não tiverem adaptações ao fogo (e.g.

geófito, xilopodium, super desenvolvido ou túnicas) naturalmente morrerão.

6. Considerações Finais

Em que pese todos os esforços e dificuldades enfrentados na preservação de uma quadra com vegetação de Cerrado no Município de Campo Mourão, após 27 anos outro desafio se apresenta, o de se manter e manejar tal vegetação. Desde que foi criada a Estação Ecológica do Cerrado, todas as instituições envolvidas e responsabilizadas de maneira direta ou indireta pela sua manutenção e segurança (Fecilcam, Prefeitura Municipal de Campo Mourão e IAP) executaram, cada uma em sua esfera, diversas ações. No entanto, o problema que se apresenta nesse momento envolve riscos e, principalmente, incertezas. Enfrenta-se um paradoxo extremo, pois se de um lado os estudos técnicos apresentam uma necessidade de ação mais invasiva na área, do outro lado, temos uma questão política e socioambiental a ser enfrentada, caso essa ação ocasione ainda mais impacto ambiental ou não surta o efeito desejado. Fato é que a inoperância e o medo de se tentar, e, principalmente de ser um dos protagonistas do erro, fazem nesse momento com que a prudência seja encarada como o algoz

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que lenta e continuamente irá destruir a vegetação do Cerrado, sem, no entanto, despertar a população para sua possível extinção.

7. Agradecimento

O primeiro autor agradece à Fundação Araucária pela bolsa de produtividade. 8. Referencias

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Referências

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