1 Jorge Cruz
Agente Oficial da Propriedade Industrial
A PROPRIEDADE INDUSTRIAL
E A DEFESA DOS INTERESSES NACIONAIS :
ALTERAÇÕES SIMPLES, MAS URGENTES
1 = Na última dúzia de anos – ou seja desde o início do século – a Propriedade
Industrial em Portugal tem conhecido tempos difíceis, com erros de orientação que se refletem, naturalmente, na qualidade dos direitos privativos que se concedem.
A forma como foi elaborado o Código de 2008, sem a colaboração dos meios interessados, designadamente a Industria e os Mandatários – embora apareça apenas como correcção ao Código de 2003 – é um exemplo dessa deficiente orientação.
Este Código, que se anuncia como excelente, que teria vindo facilitar a simplificação de procedimentos e a redução de prazos para a concessão dos direitos de Propriedade Industrial, representa, em geral, um atraso e uma desilusão quanto ao que seria necessário fazer – e a simplificação de procedimentos, quando existe, prejudica, em geral, os direitos dos interessados, como se verá em dois ou três exemplos, referidos neste trabalho.
2 = Em todo o caso, muito recentemente o INPI sofreu algumas alterações –
algumas das quais já deviam ter sido efectuadas – e espera-se, confiadamente, que a normalidade regresse a este importante sector, que muito pode contribuir para amenizar a grave crise que o País atravessa.
E com esta esperança indicam-se alguns pontos que deveriam ser revistos, a maior parte dos quais sem necessitar qualquer alteração do Código da Propriedade Industrial.
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3 = Fazemos, por agora, referência aos seguintes aspectos, que necessitam ligeira alteração do Código:
a ) – Artigo 10º – Legitimidade para promover actos
A modificação do artigo 10º, introduzida pelo Código de 2008, permitindo que qualquer pessoa promova actos e termos do processo, contribui para aumentar o desemprego, prejudica o País em milhões de euros e apenas beneficia os estrangeiros – a larga maioria dos quais nem sequer pertence à União Europeia. O regresso à disposição em vigor até 2003 é urgente e importante.
Efectivamente, enquanto por todo o Mundo o objectivo é proteger a indústria nacional e os profissionais do próprio país, em Portugal protegem-se os estrangeiros, sem que haja, sequer, uma simples contrapartida.
Como as relações com o Brasil estão na ordem do dia, vejamos o que, a este respeito, preceitua o artigo 217º da Lei da Propriedade Industrial, nº 9279, de 14 de Maio de 1996:
“a pessoa domiciliada no exterior deverá
constituir e manter procurador
devidamente qualificado e domiciliado no País, com poderes para representá-la administrativa e judicialmente, inclusive para receber citações”.
Portanto, no Brasil defendem-se, com firmeza e seriedade, os interesses nacionais.
b ) – Marcas Comunitárias
A invasão das marcas comunitárias, registadas para a totalidade do território dos países que constituem a União Europeia, é um problema difícil de resolver.
Mas é possível minorar os efeitos negativos que essa enorme quantidade de registos produz na economia nacional.
Já tenho escrito sobre este problema mas, até agora, sem qualquer resultado prático.
Em todo o caso, é inadmissível que se recusem registos nacionais (ou mesmo internacionais) com fundamento em pedidos de registo (!) comunitários (ou
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mesmo registos) sem que os respectivos requerentes ou titulares manifestem qualquer interesse nessa recusa.
Este problema exige uma pequena alteração do nosso Código, que permita, por exemplo, uma pré-notificação de recusa provisória ao requerente, para negociar com o titular do registo oposto, que pode ser completada por uma manifestação de interesse na marca comunitária, ou mesmo uma reclamação formal, conforme já divulguei em artigos anteriores.
É um assunto extremamente importante e urgente – que requer a melhor atenção do INPI para se encontrar a solução que seja mais adequada.
c ) – Títulos
Os Títulos de Patentes, de Modelos de Utilidade e de Registos, de harmonia com o preceituado no artigo 7º, nº 1, do Código da Propriedade Industrial, fazem prova dos diversos direitos privativos.
Portanto, é necessário acabar com a estranha fantasia de que os títulos apenas são emitidos e entregues mediante pedido, alterando o artigo 27º e voltando à redacção do Código de 2003.
4 = Alterações de procedimentos administrativos, sem reflexo no Código da Propriedade Industrial
a ) Taxas
E as taxas?
O principio geral do utilizador / pagador deve ser respeitado sempre que possível: quem beneficia ou usufrui de determinadas possibilidades ou regalias deve pagá-las.
No entanto, esses mesmos utilizadores têm sido libertados do pagamento de formalidades que continuam a ser executadas – mas pagas não se sabe por quem.
Ora vejamos :
a)Taxas actualmente a custo 0,00 € (indicando-se, também, o valor das taxas anteriormente cobradas):
4 - Modificação de sede – 11,45 € - Junção de documentos – 5,73 € - Desistência de pedidos – 5,73 € - Renúncia de direitos – 5,73 € - Restituição de taxas – 5,73 € - Mandatos – 5,73 € - Pedido de rectificação – 11,45 €
- Publicação / reivindicação de cores – 28,62 €
b ) Actos que foram suprimidos com o novo Código, indicando-se a taxa anterior (e que agora não existe):
- Publicação a cores – 28,62 €
- Pedido especial de registo – 228,93 € - Por cada classe adicional – 45,78 € - DIU – 28,62 €
- Provas de uso – 34,34 €
- Nome de Estabelecimento – 85,86 € - Insígnia de Estabelecimento – 85,86 € - Taxas de concessão – 97,31 €
Deve notar-se que todos os actos praticados “on-line” beneficiam de um desconto de 50%, que suponho superior ao que por vezes é praticado no estrangeiro.
Tudo isto somado, dá muitos milhões de Euros – que o nosso País perde e bem necessários seriam neste momento.
Mas fará algum sentido que quem pretende proteger direitos de Propriedade Industrial não suporte os inerentes encargos?
E como pode entender-se que quem tem interesse em resolver mais rapidamente os seus assuntos não pague uma taxa de urgência?
5 d ) A Consultoria feita pelo INPI
O INPI continua a promover uma consultoria que atropela, manifestamente, os interesses dos Mandatários da Propriedade Industrial, impede a entrada de muitos euros no nosso País e nem sequer serve os objectivos de quem necessita conselhos nesta importante actividade económica e que, frequentemente – ao que consta – manifestam o seu desagrado.
Em qualquer circunstância, é inadmissível que o INPI indique como deve ser resolvido determinado problema… e depois vai “decidir” sobre o mesmo!
Li, há poucos dias, que o INPI vai
“lançar mais dois serviços destinados principalmente ás PME: um pré-diagnóstico de marca e outro de e-learning”,
o que parece ter agradado á Senhora Ministra da Justiça: mas é mais consultoria a fazer pelo INPI e maior sobrecarga para o seu orçamento, uma vez que tudo isto é sempre gratuito.
Como é possível?
Então permite-se que o País perca milhões de euros em altura crítica da economia nacional?
A Senhora Ministra da Justiça (Publico, 6 de Fevereiro de 2013), que – e muito bem –
“recomenda aos magistrados que gastem menos dinheiro em papel e transportes”
fica indiferente perante as ofertas completamente gratuitas de taxas e serviços do INPI?
e ) Revalidação de direitos
Continua a seguir-se uma prática administrativa, para avaliar eventuais prejuízos de terceiros com revalidações de direitos, que vem já de 1940 e está completamente ultrapassada.
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Ainda há poucos meses um Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa teve de corrigir uma decisão do INPI, a este respeito – quando a actualização do critério que vem sendo seguido nem sequer necessita de qualquer alteração do Código da Propriedade Industrial.
f ) Logotipos
O Código de 1995 introduziu um novo direito – os logotipos – com características semelhantes aos nomes e insígnias de estabelecimento.
Este novo direito foi melhorado com o Código de 2003, mas a confusão estabelecida pelo Código de 2008, com os logótipos e os nomes e insígnias de estabelecimento, “completada” por uma Regra incrível – da inteira responsabilidade do INPI – deve ser urgentemente corrigida.
Com o Código de 2008 pretendeu-se – e bem – reduzi-los a um único direito. Em todo o caso, em vez de transformar 3 direitos em 1, transformaram-se os 3 direitos … em 4 !
É que os autores da lei pensavam que os Nomes e Insígnias de Estabelecimento apenas protegiam os espaços físicos, o que é um tremendo erro.
Mas a mudança é basicamente nas Regras e resume-se a considerar idêntica a protecção conferida pelos três direitos anteriores.
g ) Contencioso
É indispensável bom senso, não exigindo prazos demasiadamente rápidos para a concessão de direitos, que só prejudica os interessados.
O prazo de concessão não deve ser longo, como é óbvio, mas será necessário que permita a defesa eficiente dos direitos.
O que é preciso é melhorar a qualidade das decisões, evitando, na medida do possível, o recurso aos Tribunais.
E as exposições ?
A alteração do nº 3 do artigo 17º do Código da Propriedade Industrial não é admissível : as exposições são aceites “quando não tenha sido ainda proferido despacho sobre o pedido”.
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O que não se diz é que à sombra deste autentico engano, têm sido despachados processos no mesmo dia em que é apresentada a Contestação – ou seja, sem dar a mínima hipótese de apresentar exposições!
Assim, é indispensável
a ) Conceder o prazo mínimo de 1 a 2 meses, a contar da data da notificação da contestação, para apresentar as exposições; e
b ) Apresentada a exposição, deverá ser concedido á parte contrária idêntico prazo para responder, conforme exige o importante principio do contraditório, que não tem sido respeitado.
h ) Regras
A elaboração de novas Regras, permitindo facilitar a aplicação do que se estabelece no Código, é urgente e importante.
Mas não podem ser Regras apenas feitas pelo INPI, pois é elementar que a Industria e os Mandatários participem na sua elaboração e aprovação.