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Diarreia aguda em crianças e adolescentes

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Academic year: 2021

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Diarreia aguda em crianças e adolescentes

INTRODUÇÃO

Diarreia é uma afecção caracterizada pela perda excessiva de água e eletrólitos através das fezes, resultando em aumento do volume e frequência das evacuações e diminuição da consistência das fezes, por mais de 3 episódios ao dia. Pela sua duração, pode ser classificada em:

 Aguda - diarreia com duração menor que 14 dias.  Persistente – diarreia com duração superior a 14 dias  Crônica – diarreia com duração superior 29 dias

A disenteria é a diarreia acompanhada da presença de sangue e/ou muco nas fezes. Epidemiologia

A diarreia aguda é uma das principais causas de mortalidade nos países em desenvolvimento, especialmente em crianças menores de seis meses. A morbimortalidade da diarreia está relacionada à desnutrição e desidratação respectivamente. Por ser uma doença autolimitada e de tratamento relativamente simples, a correta identificação, aporte hídrico necessário e manutenção da dieta são medidas que evitam a morte e a desnutrição.

No mundo, a disseminação do uso da terapia de reidratação oral, o incentivo ao aleitamento materno, melhores práticas de nutrição, adequação do saneamento básico e da higiene e ampliação da cobertura vacinal para sarampo, diminuíram o perfil da morbimortalidade nas últimas décadas, principalmente nos países em desenvolvimento (relatório da OMS, 2002) (Tabela 1).

Tabela 1: Mortalidade por diarreia em < 5 anos de idade no mundo

1979 4,5 milhões /ano

2002 1,6milhões/ano

2004 1,5milhões/ano

No Brasil, o número de mortes de crianças menores de um ano de idade por diarreia diminuiu consideravelmente nos últimos 35 anos, de 32.704/1000 NV em 1980 para 1.761/1000 NV, em 2015 (cerca de 95%). Com esta redução, o problema passou a ser a sétima causa de mortalidade infantil em 2017.

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Classificação

Podemos classificar as diarreias de acordo com a patogênese e etiologia: A. Patogênese:

1. Osmótica: por adesão à mucosa, causa lesão dos enterócitos da superfície, com redução da produção das dissacaridases (lactase) e retenção de líquidos dentro do lúmen intestinal devido à presença de solutos (açúcares) osmoticamente ativos não absorvidos, que carreiam a água para dentro da alça intestinal e são metabolizados pela via anaeróbica resultando na produção de radicais ácidos (por ex: Rotavírus).

2. Secretora: a liberação de enterotoxina bloqueia o transporte ativo de água e eletrólitos do enterócito ocasionando o aumento da sua secreção intestinal, principalmente de ânions cloreto e bicarbonato (por ex: E.coli enterotoxigênica).

3. Invasora: a lesão da célula epitelial do intestino impede a absorção de nutrientes. Nesta situação pode haver também um componente secretor, uma vez que a mucosa invadida produz substancias (bradicinina e histamina) que estimulam a secreção de eletrólitos para o lúmen intestinal. Pode ocorrer invasão da mucosa causando diarreia com muco, pus e sangue nas fezes (por ex. Salmonella, Shiguella) ou invasão da lâmina própria com disseminação hematogênica e sintomas sistêmicos (por ex: E.coli enteroinvasora, Salmonella).

B. Etiologia:

1. Viral: Rotavirus, Adenovirus, Astrovirus, Calicivirus, Norwalk vírus Adenovirus entérico sorotipos40 e41, Picornavirus. Atualmente, nos países onde a vacina do rotavírus faz parte do calendário vacinal, o norovirus assume importância como o principal agente causador de diarreia, com vômitos frequentes e intensos.

2. Bacteriana: E. coli, principalmente enteropatogênica clássica (EPEC), Salmonella sp, Shiguella sp, Yersinia sp, Clostridium difficile, Aeromonas, Vibrio cholerae, Campylobacter jejuni.

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OBJETIVO

 Orientar avaliação diagnóstica de diarreia aguda e seu diagnóstico diferencial.  Orientar reposição hidroeletrolítica de acordo om grau de desidratação presente.

 Orientar terapêutica dietética e adjuvante para melhor controle clínico do quadro agudo. APLICABILIDADE

População Alvo: Crianças de 3 meses a 18 anos com diarreia com duração ≤ 14 dias. População excluída: diarreia com duração > 14 dias ou crianças imunossuprimidas. DIRETRIZ

O quadro clínico de desidratação pode ser leve, com discreta repercussão sistêmica, até formas graves de desidratação. A história clínica e o exame físico são o principal recurso para o diagnóstico da gastroenterite aguda (RECOMENDAÇÃO C).

Os sintomas são febre, vômitos, tenesmo, flatulência, dor abdominal, distensão abdominal, tosse, coriza, anorexia, ocorrência de eliminações durante o sono, dejeções pós-alimentares, fezes explosivas.

Deve-se avaliar as características, frequência e quantidade de perdas (fezes ou vômitos) e se há sintomas associados de alerta tais com febre, presença de sangue/muco ou comprometimento de estado geral, indícios epidemiológicos e condições clinicas pregressas.

No exame físico o principal enfoque é avaliar a presença e o grau de desidratação: tempo de enchimento capilar, turgor pastoso da pele e ausência de lágrimas são as melhores evidências de desidratação (RECOMENDAÇÃO B).

Embora o gold-standard permaneça a variação real de peso entre o período antes e após o inicio do quadro clinico (RECOMENDAÇÃO B), deve–se também avaliar temperatura, pressão arterial, frequências cardíaca e respiratória.

A classificação clínica (Tabela 2) entre desidratação leve, moderada ou grave, embora imprecisa, torna-se uma ferramenta importante para inicio do tratamento (RECOMENDAÇÃO B).

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Tabela 2: Classificação da desidratação

Sem Desidratação Alguma desidratação Desidratação Grave Estado geral Irritada, com sede,

consolável Muito agitada, não dorme, muito sedenta Deprimida, comatosa, aceita pouco ou nada de líquidos

Mucosa oral Seca, lábios vermelhos,

língua saburrosa Muito seca Cianose

Olhos Normais Fundos Muito encovados

Lágrimas Presentes Reduzidas Ausentes

Fontanela Normal Pouco deprimida Muito deprimida

Pele Elasticidade normal,

pele quente e seca Extremidades frias e elasticidade diminuída Fria, marmórea, turgor pastoso Pulsos periféricos Normais Finos e taquicárdicos Muito finos /ausentes Tempo de

enchimento capilar Normal Até 2s > 2s

Débito urinário Normal Diminuído Anúrico

Déficit estimado Lactentes: 25-50ml/kg Crianças maiores: 30 ml/kg Lactentes: 50-100ml/kg Crianças maiores: 60 ml/kg Lactentes > 100 ml/kg Crianças maiores: 90 ml/kg Perda de peso Lactentes: 2,5-5%

Crianças maiores: 3%

Lactentes: 5-10% Crianças maiores: 6%

Lactentes >10% Crianças maiores: 9%

Cálculo de Déficit de Perdas:

Déficit Fluídico (L) = peso hidratado pré doença (kg) – peso desidratado (kg)

Grau de desidratação (%) = (peso hidratado pré doença – peso desidratado)/ peso hidratado pré doença X 100

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A desidratação é a complicação mais grave e frequente, mas também podem ocorrer distúrbios hidroeletrolíticos e ácido básicos, hipoglicemia, choque hipovolêmico e insuficiência renal aguda.

Diagnóstico

O diagnóstico de diarreia e desidratação baseia-se na anamnese e no exame físico.

Testes para pesquisa específica de patógenos como rotavírus, protozoários ou coprocultura não são recomendados de rotina (RECOMENDAÇÃO C), exceto em casos especiais com evolução grave, comprometimento do estado geral, necessidade de internação, imunodeprimidos ou em surtos em berçários e creches.

Marcadores fecais como a calprotectina e lactoferrina não devem ser utilizados para diferenciar entre etiologia viral e bacteriana.

A dosagem de bicarbonato e eletrólitos (sódio e potássio) está indicada nas crianças com desidratação grave ou com suspeita de alteração eletrolítica.

A realização de glicemia capilar está indicada para os casos onde houver suspeita de hipoglicemia.

Diagnóstico Diferencial

Várias doenças podem ter a apresentação inical sugestiva de gastoenterite aguda. É o que ocorre, por exemplo, na apendicite, quando crianças menores de cinco anos de idade podem não apresentar febre nas primeiras 24 horas da doença e apresentar diarreia como primeiro sintoma, retardando a suspeição diagnóstica e o tratamento adequado, favorecendo a evolução de complicações, principalmente perfuração e sepse.

Outra patologia frequente no pronto atendimento é a estreptococcia que, eventualmente, pode ter como apresentação inicial febre associada a sintomas gastrointestinais.

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Tratamento

O manejo terapêutico tem por objetivo evitar a desidratação e o choque hipovolêmico, corrigir distúrbios hidroeletrolíticos e ácido básicos e de glicose

Reposição volêmica:

Podemos dividir a reposição volêmica de acordo com o grau de desidratação: Sem desidratação (perda < 5% do peso ou < 50 ml/kg):

Oferecer soluções de reidratação oral (SRO) conforme mostra as tabelas 3 e 4. Outros líquidos também podem ser orientados para reposição das perdas como: água, água de côco, chá e suco natural sem adição de açúcar. Os refrigerantes não devem ser recomendados.

A oferta de líquidos varia de acordo com a idade:

- menores de 1 ano: oferecer 50 a 100mL de líquidos a cada perda - crianças entre 1 a 10 anos: oferecer 100 a 200mL de líquidos - maiores de 10 anos oferecer a quantidade que aceitar

Nas crianças com dificuldade de ingesta de líquidos via oral (VO), seja por vômitos ou recusa da aceitação VO, considerar hidratação endovenosa para prevenção da desidratação até o controle dos vômitos e adequação da ingesta via oral.

Tabela 3: Soluções prontas para Reidratação oral

Pedialyte 90® Pedialyte 45® Pedialyte 60®

Na – 90 mEq/L Na – 45 mEq/L Na – 60 mEq/L Cl – 80 mEq/L Cl – 35 mEq/L Cl – 50 mEq/L K – 20 mEq/l K – 20 mEq/L K – 20 mEq/L Citrato – 30 mEq/L Citrato – 30 mEq/L Citrato – 30 mEq/L Glicose – 111 mMol/L Glicose – 126 mMol/L Glicose – 60 mMol/L

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Tabela 4: Pó para preparo de Soluções de Reidratação oral

Rehidrat 90® Reidramax® Rehidrat 50 ®

Na – 90 mEq/L Na – 90 mEq/L Na – 50 mEq/L Cl – 80 mEq/L Cl – 80 mEq/L Cl – 50 mEq/L K – 20 mEq/l K – 20 mEq/L K – 20 mEq/L Citrato – 30 mEq/L Citrato – 30 mEq/L Citrato – 20 mEq/L Glicose – 111 mMol/L Glicose – 111 mMol/L Glicose - 134 mMol/L

Desidratação leve a moderada (perda entre 5 a 10% ou entre 50 a 100 ml/kg):

A terapia de reidratação oral (TRO) é o tratamento de escolha para iniciar a oferta de líquidos e deve ser feita com a administração da SRO no volume de 50 a 100 ml/kg em 2 a 4 horas até a recuperação dos sinais de hidratação. A cada 2 horas avaliar o índice de retenção, que deve ser igual ou superior a 20%, para indicar a continuidade e o sucesso da TRO.

Cálculo de índice de retenção (%) = (Peso atual – Peso inicial) x 100 / volume ingerido de SRO As soluções utilizadas devem ser hipoosmolares, com quantidade de sódio entre 50 e 60 mEql/L.

A composição dos sais de reidratação da OMS foram reformulados em 2002 para diminuir a osmolaridade da solução (245 mOsm/L), com 75mEq/L de sódio, 65mEq/L de cloreto, 20mEq/L de potássio, 10mEq/L de citrato e 75mMol/L de glicose. Entretanto, no nosso sistema de saúde, ainda dispomos da composição de maior osmolaridade (311 mOsm/L), com 90mEq/L de sódio, 80mEq/L de cloreto, 20mEq/L de potássio, 10mEq/L de citrato e 111 mMol/L de glicose. Nestes casos, para diminuir o risco da hipernatremia e os efeitos da maior osmolaridade, pode-se acrescentar água na proporção de uma parte de água para cada duas partes da solução, principalmente, para as crianças menores de 6 meses que estão em aleitamento misto ou que já sofreram desmame. Para as crianças que estiverem em aleitamento materno exclusivo, este não deve ser suspenso.

Na impossibilidade de realizar TRO, considerar a hidratação por via nasogástrica à hidratação endovenosa (EV). Deve ser infundido de 30 a 50 ml/kg de SRO em 3 a 6 horas. Constituem contra indicações para hidratação via nasogástrica:

 Íleo paralítico com distensão abdominal  Alteração hemodinâmica

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 Alteração do sensório  Alteração respiratória

Para crianças com dificuldade de ingesta de líquidos via oral ou na resistência dos pais para a hidratação por via nasogástrica, a hidratação EV pode ser indicada com solução isotônica (soro fisiológico) no volume 20 ml/kg em 20 minutos até restabelecimento dos sinais de hidratação.

Após a melhora dos sinais de desidratação, a dieta deve ser reintroduzida e a reposição das perdas mantida através da oferte de 10 ml/kg de SRO após cada episódio de diarréia ou vômitos (RECOMENDAÇÃO A).

Desidratação grave (perda > 10% ou > 100 ml/kg)

A hidratação endovenosa está indicada com o objetivo de restabelecer, rapidamente, a perfusão dos órgãos vitais, recuperar o nível de consciência e o débito urinário, normalizar o tempo de enchimento capilar e a pressão arterial. Deve ser iniciada com solução isotônica (soro fisiológico) 20 ml/kg em 20 minutos até melhora dos sinais da desidratação e do choque. Para o recém nascido e a criança cardiopata, infundir o volume de 10 ml/kg em 20 minutos com reavaliação frequente para o surgimento de sinais de congestão cardíaca (estertores pulmonares e rebaixamento de fígado) ao término de cada expansão.

Uma vez a criança hidratada, iniciar a manutenção com soro isotônico (Na 13-15 mEq/100 kcal) seguindo a regra de Holliday Segar para a necessidade hídrica, conforme mostra a tabela 5. Oferecer SRO às perdas e observar o paciente por pelo menos 6 horas. Caso a criança não apresente condições de ingerir líquidos, a reposição pode ser feita por via endovenosa. Para as perdas diarreicas leves a moderadas pode-se repor soro fisiológico no volume de 30-60 ml/kg/dia. Nas diarreias mais intensas, este volume pode chegar até 100 ml/kg. Dependendo das perdas de potássio e da aceitação via oral, este pode ter sua oferta aumentada para 5 ou 7,5 mEq/kg/dia, desde que a função renal esteja preservada.

A fase de reposição deverá correr em conjunto com a fase de manutenção, ao longo de 24 horas, devendo sempre o paciente ser reavaliado clinicamente para observar se a sua hidratação está sendo adequada.

Tabela 5: Regra Holliday - Segar

Peso Necessidades hídricas Até 10 kg 100 ml/kg

10-20 kg 1000 ml +50 ml/kg acima de 10 kg > 20 kg 1500 ml +20 ml/kg acima de 20 kg

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Necessidades eletrólitos e glicose a cada 100 kcal

Na-13-15 mEq K- 2,5 mEq Glicose 4- 8g

Distúrbios ácido básicos e hidroeletrolíticos

Não raramente, a desidratação grave vem acompanhada de distúrbios ácido básicos (acidose metabólica) e hidroeletrolíticos (sódio e potássio). A correção destes distúrbios deve ser criteriosa para não acarretar riscos maiores relacionados à sua correção intempestiva.

Acidose metabólica

A acidose metabólica não deve ser corrigida de rotina. A hidratação endovenosa é suficiente para restabelecer a perfusão tecidual, aumentar a oferta de oxigênio aos tecidos e diminuir o metabolismo anaeróbio e melhorar a acidose. A sua correção está indicada quando o pH for menor que 7,1 através da administração de 0,5 a 1 mEq/Kg de bicarbonato de sódio, cuidando para manter uma adequada ventilação.

Hipernatremia (Na > 150mEql/L)

Ocorre entre 1 a 4% dos casos. Crianças menores de 6 meses de idade podem apresentar pele com turgor pastoso, sintomas neurológicos, convulsões, coma, hiperreflexia e sonolência. Muitas vezes, o grau de desidratação pode ser subestimado pela falta dos sinais típicos de desidratação. Nestes casos, indicar a infusão mais lenta da solução isotônica na velocidade de 10 ml/kg em 20 minutos, cuidando para que a queda do sódio seja de 0,5 mEq/L/hora.

Hiponatremia (Na < 130 mEq/L)

A hiponatremia deverá ser corrigida somente se causar sintomas graves como convulsões, coma ou letargia. Nesses casos administrar NaCl a 3% na velocidade de 1 a 2 ml/Kg/hora em 2 a 3 horas, podendo chegar até 4 a 5 ml/Kg/hora. Cada 1 ml/kg da solução hipertônica a 3% eleva o sódio sérico em 1 mEq/L.

Hipercalemia (K > 5,5 mEq/L)

Na diarreia, geralmente o potássio sérico pode estar aumentado, mas o corporal total baixo. Desta forma, na desidratação grave, a hipercalemia pode refletir insuficiência renal aguda ou como resultado da acidose metabólica pela desidratação.

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Para níveis séricos de potássio acima de 6,5 mEq/L realizar ECG e, se alterado, administrar bicarbonato de sódio 1 a 2 mEq/Kg em 30 minutos e gluconato de cálcio a 10% (para estabilizar a membrana cardíaca) na dose 1 ml/kg, sempre com monitorização contínua do ECG.

Hipocalemia (K <3,5 mEq/L)

Para as hipocalemias graves (K <2,5 mEq/L) sintomáticas com alteração do ECG e sintomas de fraqueza muscular, está indicada a correção de potássio na velocidade de 0,5 mEq/Kg/hora, em uma concentração não superior a 40 mEq/L.

Alimentação

O aleitamento materno deve ser mantido durante a TRO, e as crianças em aleitamento artificial não necessitam de troca de fórmulas lácteas durante o quadro da diarreia (RECOMENDAÇÃO B).

A nutrição baseia-se em oferecer suporte calórico, utilizando alimentos com fácil digestibilidade e absorção, aumentando o número de refeições diárias para compensar as perdas. Não há qualquer restrição alimentar às gorduras. A dieta deve ser iniciada o mais precoce possível após melhora da desidratação (RECOMENDAÇÃO A).

Dietas restritivas (BRAT- banana, arroz, maçã e torradas) podem ser oferecidas somente como parte complementar da dieta habitual da criança (RECOMENDAÇÃO C), pois as dietas regulares se mostram mais efetivas na redução da duração da diarreia (RECOMENDAÇÃO A).

A maioria dos pacientes com diarreia não desenvolve intolerância a lactose, e sua restrição só é recomendada em pacientes com intolerância persistente e documentada (RECOMENDAÇÃO B) e nas crianças que forem internadas.

Em pacientes com vômitos, a dieta e o soro oral devem ser oferecidos frequentemente em pequenas quantidades (RECOMENDAÇÃO A).

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Suplemento de zinco

A suplementação do zinco não deve ser realizada de rotina, restringindo-se para quando houver o déficit documentado. Nestes casos, a dose será de 10mg para crianças menores de 6 meses e 20mg para os maiores desta idade, mantendo-se por 10 a 14 dias.

Probióticos

Seu uso pode ser considerado como tratamento adjuvante, juntamente com os sais de reidratação oral. SRO, diminuindo a intensidade e a duração dos sintomas da diarreia. As cepas consideradas eficazes para o tratamento coadjuvante são o Lactobacillus rhamnosus GG e o Sacaromyces boulardii. No Brasil dispomos de apresentações em pó ou em cápsulas do Sacaromyces boulardii. A dose administrada pode variar de 250 a 750 mg/dia por 5 a 7 dias.

Antieméticos

O uso da ondansetrona diminui a necessidade de hidratação EV. O seu uso pode ser feito tanto por via oral quanto por via endovenosa. Cuidado especial deve ser tomado na sua administração, nas crianças com QT longo ou em uso de medicações que possam potencializar este efeito ou nas diarreia com distúrbios eletrolíticos (hipocalemia ou hipomagnesemia).

Drogas antisecretivas

O racecadotril pode ser considerado no tratamento da diarreia. Estudos mostraram diminuição da necessidade de hidratação EV e do tempo da diarreia em até dois dias. É contra indicado para menores de 3 meses de idade e a dose preconizada é de 1,5 mg/kg/dia dividido em três tomadas até o término da diarréia. No nosso meio é encontrada na forma de sachês (pó) com 10 mg ou 30 mg.

Antibioticoterapia

Como a diarreia é um processo infeccioso autolimitado, raramente é indicado o uso de antibióticos. A exceção dos casos de cólera, pacientes imunossuprimidos, evolução para sepse ou na presença de disenteria prolongada e debilitante. O uso indiscriminado de antibióticos pode determinar alteração da flora intestinal determinando evolução para diarreia prolongada ou colite pseudomembranosa (RECOMENDAÇÃO C).

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O antibiótico deve ser recomendado quando houver suspeita clínica ou confirmação diagnóstica através da coprocultura positiva. O antibiótico diminui o tempo da doença, da febre e da excreção da bactéria, o que diminui a sua infectividade.

A azitromicina é o antibiótico de escolha para o início do tratamento devido ao aumento da resistência bacteriana à ampicilina e à associação do sulfametoxazol/ trimetropin. No entanto, se houver comprovação da sensibilidade da bactéria a estes antibióticos, eles continuam sendo a droga de escolha.

A OMS recomenda o tratamento com ciprofloxacino ou ceftriaxone.

Salmonella

O antibiótico não deve ser indicado para crianças saudáveis com diarreia por Salmonella, pois não se mostrou eficiente em reduzir os sintomas e prevenir as complicações, além de estar associado com o prolongamento da excreção fecal da bactéria.

Os antibióticos estão indicados para as crianças de alto risco como: RN, menores de 3 meses de idade e nas crianças com doença de base (imunodeficiência, asplenia anatômica ou funcional, terapia imunossupressora, doença inflamatória intestinal ou acloridria). A sua administração reduz o risco de bacteremia e de infecção extraintestinal.

Campylobacter jejunii

O antibiótico diminui os sintomas, principalmente, quando iniciado nos primeiros três dias da doença. Deve ser recomendado para crianças institucionalizadas ou que frequentam creche com sintomas de disenteria. O objetivo é reduzir o risco da transmissão.

A droga inicial a ser administrada é a azitormina, porém, a escolha do antibiótico deve estar baseada no padrão de resistência antimicrobiana local.

Escherichia coli

O antibiótico deve ser recomendado para a E. coli enterotoxigênica (ETEC). Não deve ser administrado de rotina para a E.coli enterohemorrágica (produtora de Shiga toxina – STEC) pelo risco, apesar de controverso, de precipitar a síndorme hemolítica urêmica.

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É agente da diarreia induzida por antibiótico ou de diarreia em crianças imunocomprometidas ou com doença inflamatória intestinal. As cepas hipervirulentas podem causar sintomas graves e devem ser tratadas com metronidazol (30 mg/kg/dia). Para cepas resistentes, administrar vancomicina via oral. No casos leves de diarreia induzida por antibiótico, a suspensão deste é suficiente para o tratamento.

Vibrio cholerae

O antibiótico deve ser indicado para reduzir a excreção do Vibrio cholerae e diminuir a duração da diarreia.

Parasitas

Não há necessidade de tratamento nas crianças assintomáticas e saudáveis. Nos casos de giardíase com sintomas graves, o tratamento pode ser considerado com metronidazol, albendazol, nitazoxanide ou tinidazol. Para infecções por Cryptosporidium, o tratamento está indicado para as crianças imunodeprimidas com nitazoxanide. A colite decorrente da amebíase deve ser tratada com metronidazol.

A tabela 6 indica o esquema antimicrobiano indicado para a diarreia de acordo com o agente etiológico.

Tabela 6 - Antibioticoterapia na Diarreia Aguda

Agente Indicação de tratamento Antibiótico de escolha Antibiótico alternativo Vibrio cholerae Caso confirmado ou

suspeito por epidemiologia de viagem recente

Azitromicina VO 10 mg/kg/dia por 3 dias ou 20 mg/kg dose única

Doxiciclina (>8anos) ou Ciprofloxacina (>17 anos) ou SMZ +TMP: 8 mg/kg/dia de TMP - 3 dias quando suscetível

Shiguella spp Caso suspeito ou confirmado

Azitromicina VO 12 mg/kg no dia 1, seguido por 6 mg/kg/dia por 4 dias

Ceftriaxone parenteral (IM ou EV) 50 mg/kg/dia por 2 a 5 dias

Se sucetibilidade conhecida SMT +TMP: 8mg/kg/dia de TMP em 2 doses – 5 dias ou Ampicilina100 mg/kg/dia ou Ácido nalidíxico 55 mg/kg/dia Ciprofloxacina: 15mg/kg em 2 doses - 3 dias

Salmonella spp

(não tifoide) Para ciranças de alto risco para diminuir bacteremia e infecção extraintestinal

Ceftriaxone 50 – 100 mg/kg/dia Azitromicina 10 mg/kg/dia Ciprofloxacina 20 - 30 mg/kg/dia

SMT +TMP: 8mg/kg/dia de TMP

Campylobacter Disenteria. Mais eficaz se iniciado nos primeiros 3 dias

Azitromicina 10 mg/kg/dia por 3 dias ou dose única 30 mg/kg/dia

Doxiciclina (>8anos) ou Ciprofloxacina (>17 anos) (quando sucetível)

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doses (máximo 2g/dia) – 10 dias em 4 doses (máximo 500mg/dia) – 10 dias E. coli produtora

de Shiga toxina Antibiótico não recomendado ______ ______

E. coli

enterotoxigênica antibiótico recomendado principalmente para viajantes

Azitromicina 10 mg/kg/dia por 3

dias Ciprofloxacina 20 - 30 mg/kg/dia SMT +TMP: 8mg/kg/dia de TMP

Fonte: adaptado de Evidence-Based Guidelines for Management of Gastroenteritis JPGN Volume 59, Number 1, July 2014

Outras orientações:

É recomendado que as internações hospitalares sejam breves, de 1 dia ou menos (RECOMENDAÇÃO C)

São critérios para alta hospitalar (RECOMENDAÇÃO C):  Quadro clínico e peso recuperados.

 Sem necessidade de reposição por via nasogástrica ou endovenosa  Aporte de líquidos por via oral igual ou superior às perdas

 Adequada orientação familiar

 Retaguarda médica ambulatorial ou por contato telefônico.

Nota: Estas recomendações resultaram da revisão crítica da literatura e de práticas atuais, e não tem a intenção de impor padrões de conduta, mas ser um instrumento na prática clínica diária. O médico, frente ao seu paciente (inclusive considerando as opiniões deste), deve fazer o julgamento a respeito da decisão de tratamento ou das prioridades de qualquer procedimento.

Nível de evidência e força de recomendação para terapêutica

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1 Revisão sistemática de ensaios clínicos randomizados (ECR).

Um ou mais ECRs controlados, de tamanho adequado e com intervalo de confiança estreito. 2 Revisão sistemática de estudos de coorte.

Estudo de coorte de boa qualidade.

ECR de baixa qualidade (pequeno, com seguimento < 80%). 3 Revisão sistemática de estudos caso-controle.

Estudos caso-controle. 4 Série de casos.

Estudos de coorte de baixa qualidade. Estudos de caso-controle de baixa qualidade.

5 Baseado na opinião de especialistas, ou em pesquisas experimentais, ou na fisiologia.

Força da recomendação

A Consiste em estudos de nível de evidência 1. Há boas evidências para apoiar a recomendação. B Consiste em estudos de nível de evidência 2 ou 3 ou extrapolado de estudos de nível de evidência

1 realizados com populações diferentes do estudo. Há evidências razoáveis para apoiar a recomendação.

C Consiste em de nível de evidência 4 ou extrapolados de estudos de nível de evidência 2 ou 3 realizados com populações diferentes do estudo. As evidências são insuficientes, contra ou a favor.

D Correspondente ao nível de evidência 5. Há evidências para descartar a recomendação.

Adaptado de: oxford centre for evidence - based medicine - levels of evidence (march 2009)

http://www.cebm.net/index.aspx?o=5653

REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS

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situação de saúde. Estudo Saúde Brasil 2008

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11. Guarino A, Ashkenazi S, Gendrel Z, Lo Vecchio A, Shamir R, Szajewska H. European Society for Pediatric Gastroenterology, Hepatology, and Nutrition/European Society for Pediatric Infectious Diseases Evidence-Based Guidelines for the Management of Acute Gastroenteritis in Children in Europe: Update 2014. JPGN 2014;59: 132–152

12. Sadovsky ADI, Brandt KG, Epifânio M, Toporovski MS, Carvalho SR, Gomes RC, Silva LR. Diarreia aguda: diagnóstico e tratamento. Departamento Científico de Gastroenterologia Sociedade Brasileira de Pediatria, 2017 (1):1-15

ELABORAÇÃO DESTE DOCUMENTO

Autora: Milena De Paulis e Anna Julia Sapienza

Núcleo de Pediatria Baseada em Evidências (à época da discussão): Eduardo Juan Troster, Adalberto Stape, Ana Claudia Brandão, Debora A Kalman, Elda Maria Stafuzza Gonçalves Pires, Marcelo L Abranczk, Tania M Russo Zamataro, Denise Katz, Maraci Rodrigues.

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GASTROENTEROCOLITE AGUDA CRIANÇAS E ADOLESCENTES ORIENTAÇÕES PÓS ALTA HOSPITALAR

Informações sobre a doença

A gastroenterocolite aguda (GECA) é caracterizada por febre, vômitos, dor abdominal e diarreia. Estes sintomas podem aparecer isoladamente ou em associação. A diarreia propriamente dita é caracterizada pelo aumento do número de evacuações e/ou alteração da consistência das fezes (líquidas ou semilíquidas).

Os vírus são a causa mais comum. A eliminação destes ocorre pelas próprias fezes, podendo durar até duas semanas. Alguns quadros virais gastrointestinais são acompanhados de quadros respiratórios, com coriza, dor de garganta e tosse.

Durante o período de doença existe o risco de desidratação devido às perdas de líquido nas fezes e vômitos e pela baixa ingestão via oral.

Sobre o tratamento

Não existe um tratamento específico para o vírus. O objetivo do tratamento é o alívio dos sintomas e a prevenção da desidratação. O alívio dos sintomas é realizado com medicamentos para combater a dor, a febre e os vômitos, conforme prescrição médica. Para prevenção da desidratação está indicada oferta frequente de líquidos por via oral.

Instruções para a casa

 Ofereça líquidas a vontade, várias vezes ao dia.  Não é necessário evitar o leite.

 Ofereça a dieta normal para a idade, de acordo com a aceitação da criança/ adolescente. Retorne com seu médico ou ao pronto atendimento se:

Seu filho apresentar sinais de desidratação como, por exemplo:  Choro sem lágrimas;

 Boca seca, com saliva espessa ou ausente;  Olhos encovados;

 Fontanela (moleira) deprimida nos bebês;

 Urina amarela escuro em pequena quantidade ou ausente nas últimas 6 horas;  Prostração, sonolência.

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RESUMO ANEXOS

DOCUMENTOS RELACIONADOS

DESCRIÇÃO RESUMIDA DA REVISÃO 00

Eduardo Juan Troster (17/09/2013 01:42:50 PM) - A diarreia aguda é uma doença autolimitada e de tratamento relativamente simples. A correta identificação, aporte hídrico necessário e manutenção da dieta são as medidas que evitam a morte e desnutrição.

EDUARDO JUAN TROSTER (14/11/2014 10:01:50 AM) - DIRETRIZ REFORMAOBJETIVO A quem se aplica a diretriz

APLICABILIDADE A quem se destina a diretriz

INTRODUÇÃO

Os subtítulos estão livres: descrever definições; diagnóstico; incidência; tratamento. Breve descrição do contexto.

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DIRETRIZ

Descrição da diretriz

REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS RESUMO

Descrição em forma de resumo para acesso em meios alternativos de conectividade como tablets ou celulares

ANEXOS

DOCUMENTOS RELACIONADOS

DESCRIÇÃO RESUMIDA DA REVISÃO

00

Referências

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