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AS POLÍTICAS PARA FORMAÇÃO DE LEITORES NO ENSINO DE HUMANIDADES. Palavras-chave: leitura; formação de leitores; políticas públicas.

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930 AS POLÍTICAS PARA FORMAÇÃO DE LEITORES NO ENSINO DE

HUMANIDADES

Sheila Oliveira Lima1 Resumo: Dentre as políticas públicas atuais para o enisno de humanidades, destacam-se, no campo da linguagem, os programas voltados para formação de leitores. A partir da análise dos programas nacionais PNBE, PNLL e PNLD Literário e dos estaduais do Paraná PEE-PR e PELLL-PR, observamos que as políticas atuais centram o foco das ações para formação de leitores na distribuição de materiais de leitura e composição de acervos de bibliotecas, mostrando certa nebulosidade no que concerne à importância de mediadores de leitura. Outro fator relevante identificado na investigação refere-se à problemática realização de tais programas, comumente atravessados pela inconstância dos editais de compra e distribuição de materiais ou pela imprecisa caracterização das ações a serem implementadas.

Palavras-chave: leitura; formação de leitores; políticas públicas.

Iniciamos a apresentação pronunciada na mesa “Políticas Públicas Atuais no Ensino de Humanidades”, procurando justificar a relevância das políticas públicas para a formação de leitores no âmbito do ensino das Ciências Humanas.

De saída, a leitura, em seu sentido mais amplo, é habilidade primordial para o acesso a qualquer ciência. No caso das Ciências Humanas, quanto mais vasta e mais profunda a capacidade de leitura – de textos escritos, não escritos, situações, sistemas, realidades etc. – mais habilitado estará o sujeito a compreender a complexidade do que temos por hábito chamar de cultura e que envolve, diretamente, as produções humanas em amplo espectro – artísticas, políticas, éticas, científicas etc.

Tomando por base alguns estudiosos da leitura (Jouve, Rouxel, Petit, Manguel, Andruetto, entre outros), há que se considerar que ela é atividade privilegiada para o conhecimento do outro, esteja ele ao meu lado, do outro lado do mundo ou dentro de mim. Dispor-se a ler, necessariamente, carrega em seu bojo a inclinação ao conhecimento, à expansão dos limites da própria compreensão de mundo. As Ciências Humanas leem o mundo e, em certa medida, potencializam a sua transformação, porque ampliam a capacidade de compreensão de e sobre quem o integra.

Por outro lado, além dessa vinculação um tanto óbvia entre leitura, leitores e Ciências Humanas, há que se recuperar o discurso enfático e consistente de Candido em 1988: a leitura é um direito humano. Garantir o direito à leitura, sobretudo do texto literário, é assegurar a

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931 chance de formar cidadãos mais sensíveis, mais solidários, porque mais conscientes das experiências alheias, mais conhecedores da característica contradição do humano e da vida.

A formação de leitores, nesse sentido, é parte fundamental para o ensino das Ciências Humanas, na medida em que, como bem enfatizou Barthes em sua aula inaugural no Collège de France, na literatura vivenciamos aquilo que nas Ciências Humanas somos conduzidos a refletir. Como compreender Hannah Arendt sem passar por “Na colônia Penal”, de Kafka? Como ler “Momento num café”, de Manuel Bandeira, sem compreender Schopenhauer? E como viver o mundo sem interagir com essas duas experiências: a literária e a das Ciências Humanas? Como pensar a formação de cidadãos sem transitar por essas duas experiências discursivas, estéticas e éticas?

Dito isto, podemos então abordar o tema das políticas públicas para a formação de leitores. Em nosso país, nos diversos níveis – federal, estadual e municipal – temos registrados diversos documentos que focalizam a formação de leitores como campo relevante de investimento. Essas políticas, em geral, estão vinculadas aos ministérios e secretarias da cultura e da educação.

Para a mesa do XII Sepech, foram abordados cinco documentos, em nível federal e estadual, os quais regem (ou deveriam) as ações relativas à formação de leitores no Brasil. A partir da leitura e comparação entre os documentos, realizamos uma reflexão a respeito dos compromissos efetivos que são veiculados em tais registros bem como procuramos identificar – nas entrelinhas – as brechas que tornam o processo de investimento em formação de leitores um tanto ilusório, dada a realidade que vivemos.

Os cinco documentos analisados são: Plano Nacional de Biblioteca na Escola (1997), Plano Nacional do Livro e da Leitura (2014), Plano Estadual de Educação do Paraná (2015-2025), Plano Estadual do Livro, Leitura e Literatura do Paraná (2013) e PNLD Literário (2018).

Realizamos as análises procurando encontrar entre os documentos uma articulação que possa resultar em uma ação conjunta entre as instâncias governamentais na política para formação de leitores. Ao lado disso, também fizemos uma leitura crítica dos documentos, evidenciando as eventuais brechas que resultam em inação de seus proponentes no campo da formação de leitores.

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932 1. Do PNBE ao PNLD Literário: a desconstrução do PNLL

O PNBE, Programa Nacional de Biblioteca Escolar, esteve em vigência entre os anos de 1997 e 2016, quando, em 2018, deu lugar ao Programa Nacional do Livro e do Material Didático em sua versão PNLD – Literário.

O PNBE, caracterizado pela distribuição de materiais de leitura para as bibliotecas escolares de todo o território nacional, ao longo de sua vigência, padeceu, sobretudo nos últimos anos, de um problema: a descontinuidade dos seus editais de compra e distribuição de livros, tendo sido em 2015 a última chamada voltada para Ensino Médio e anos finais do Ensino Fundamental e, em 2014, para a Educação Infantil, EJA (Educação de Jovens e Adultos) e anos iniciais do Ensino Fundamental. Sendo assim, neste momento (2018), as escolas não têm recebido materiais de leitura há 3 ou 4 anos, a depender do segmento. Esse fato possibilita, por exemplo, que um estudante que ingressou no Ensino Médio em 2016 não tenha acesso a nenhum livro novo ao longo de todo o seu percurso pela escola. No caso da Educação Infantil, por exemplo, as crianças que ingressaram em 2016 não tiveram acesso a publicações mais recentes da literatura infantil durante todo o período em que estiveram matriculadas nesse segmento. Vale ressaltar, porém, que, no caso da Educação Infantil, a presença de obras recém-editadas é fundamental por uma questão de ordem prática: as crianças estão aprendendo a manipular o objeto livro. Essa aprendizagem desgasta, naturalmente, o material. A distribuição de livros novos nesse segmento deveria, portanto, ser anual, se se tem como intenção que o livro realmente vá para as mãos dos alunos.

Vemos, portanto, que o modo como a política pública de distribuição de livros se realizava até 2016 já era muito precária, em face das necessidades pedagógicas e mesmo das demandas do nosso país no que se refere à expansão das condições de letramento das crianças e jovens.

É possível notar, entretanto, que o PNBE apresentava razões para a descontinuidade dos editais de compra e distribuição de acervos, na medida em que buscava operar em três frentes: obras literárias, periódicos e obras para composição de acervo pedagógico direcionado ao professor. O último edital lançado pelo PNBE foi voltado para os periódicos, no ano de 2016. O último edital para obras de apoio pedagógico ao professor foi lançado no ano de 2013.

Observa-se, em contrapartida, que, para além da tentativa de abraçar diversas frentes, há também certa inconstância nas ações. No ano de 2015, por exemplo, foi lançado o edital do

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933 PNBE Indígena, frente não prevista pelo programa e que, a despeito de sua relevância, acabou ampliando ainda mais o intervalo entre os editais das frentes já programadas pelo PNBE.

Vale ressaltar, ainda, que o PNBE configurava-se tão somente enquanto uma política pública de distribuição de materiais, centrando sua compreensão a respeito da formação do leitor na garantia do acesso aos materiais para leitura, o que representa um equívoco, na medida em que a simples distribuição às bibliotecas escolares não assegura o acesso dos estudantes aos livros.

Talvez, em contrapartida à condução de um programa que acredita que o acesso ao material seria ação eficaz na formação de leitores, surge, em 2014 a edição revisada do Plano Nacional do Livro e da Leitura, cuja primeira edição foi publicada em 2011. O documento apresenta, entre seus objetivos principais, o combate ao caráter assistemático dos programas vigentes (como era o caso do PNBE). Para realizá-lo, orienta sua ação em quatro eixos: 1. Democratização do acesso ao livro; 2. Formação de mediadores para o incentivo à leitura; 3.Valorização institucional da leitura e o incremento de seu valor simbólico; 4. Desenvolvimento da economia do livro como estímulo à produção intelectual e ao desenvolvimento da economia nacional. (p. 3, grifos nossos).

Destacamos, aqui, os eixos de número 2 – Formação de mediadores para o incentivo à leitura – e 3 – Valorização da leitura e o incremento de seu valor simbólico –, na medida em que se trata de efetiva diferença em relação a programas cujo foco é a distribuição de materiais. Nesse sentido, nota-se um avanço significativo na concepção de leitura e de letramento do programa, uma vez que os eixos em destaque revelam uma noção clara de que a cultura leitora se faz por meio de práticas de leitura e de ações que possam ressignificar o objeto livro e o próprio ato de ler.

O documento elenca, ainda, um conjunto de princípios norteadores, dentre os quais destacamos a Construção de Sentidos e a Literatura. O primeiro apresenta uma concepção bastante expandida de leitura: “A leitura configura um ato criativo de construção de sentidos, realizado pelos leitores a partir de um texto criado por outro(s) sujeito(s).”(BRASIL: 2014, p.16-17), ultrapassando a noção mais mecanicista, restrita à tarefa de decodificação, para a qual bastariam as ações centradas na alfabetização. A segunda, ampliando tal conceito, aponta a literatura como uma das principais fontes de sensibilização e conhecimento, ao afirmar:

Entre as muitas possibilidades de textos que podem ser adotados no trabalho com a leitura, a literatura merece atenção especial no contexto do Plano, dada a enorme contribuição que pode trazer para uma formação vertical do leitor, consideradas suas três funções essenciais, como tão bem as caracterizou Antônio Cândido: a) a capacidade que a literatura tem de

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934 atender à nossa imensa necessidade de ficção e fantasia; b) sua natureza essencialmente formativa, que afeta o consciente e o inconsciente dos leitores de maneira bastante complexa e dialética, como a própria vida, em oposição ao caráter pedagógico e doutrinador de outros textos; c) seu potencial de oferecer ao leitor um conhecimento profundo do mundo, tal como faz, por outro caminho, a ciência. (BRASIL: 2014, p.18)

Na esteira da valorização da literatura e da construção de sentidos enquanto princpípios fundamentais para a formação do leitor, o documento apresenta como um dos principais eixos o Fomento à Leitura e à Formação de Mediadores, sendo o primeiro item a “Formação de Mediadores de Leitura”, cujas sugestões de ação figuram como:

Programas de capacitação de educadores, bibliotecários e outros mediadores de leitura. Projetos especiais com universidades e centros de formação de professores. Cursos de formação de educadores com estratégia de fomento à leitura e de estudantes que se preparam para o magistério em literatura infanto-juvenil. Ampla utilização dos meios de educação a distância para formação de promotres de leitura em escolas, bibliotecas e comunidades. (BRASIL: 2014, p. 29)

Por se tratar, entretanto, de um documento gerado no âmbito do Minc e não do MEC, o PNLL não foca suas ações nas bibliotecas escolares, muito embora cite algumas possibilidades de trabalho em parceria entre as instâncias da cultura e da educação.

Destaque-se, ainda, que o documento, no capítulo “Estrutura para Implementação” compromete o Ministério da Educação com a tarefa de “dar continuidade às diversas políticas e ações que vem implementando nos últimos anos em diferentes frentes (...) por meio de instituições e programas como o Inep (...) PNBE (Programa Nacional de Biblioteca Escolar)” (BRASIL: 2014, p. 35-36). Nesse sentido, a criação do PNLD Literário em substituição ao PNBE, descumpre o PNLL, reinstaurando, assim, os problemas que o Plano buscava combater, ou seja: a descontinuidade dos programas e a falta de articulação entre eles.

O PNLD Literário, porém, além de assegurar a distribuição de obras para composição dos acervos das bibliotecas escolares, apresenta uma novidade: a proposta de distribuição de dois livros de literatura por aluno, escolhidos pelo professor, para serem utilizados ao longo do ano, em atividades dirigidas. Essa ação pareceria excelente, desde que conjugada com a manutenção da distribuição periódica de livros e outros materiais às bibliotecas escolares vigente no PNBE. O programa, em certa medida, vai nessa direção, já que, além da escolha das duas obras por aluno, faz parte do edital a escolha de livros para comporem as bibliotecas escolares, conforme é possível observar no quadro a seguir:

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935 Quadro 1: Número de obras por segmento no Edital PNLD – Literário 2018.

Categoria 1 a 4 Acervos para sala de aula

1 - Creche I - 0 a 1 ano e 6 meses 20 obras

2 - Creche II - 1 ano e 7 meses a 3 anos e 11 meses 20 obras

3 - Pré-escola - 4 anos a 5 anos 11 meses 25 obras

4 - Anos Iniciais EF- 1º ao 3º ano 35 obras

Categoria 5 e 6 Acervos para biblioteca

5 - Anos Iniciais EF - 4º e 5º anos 50 obras2

6 - Ensino Médio - 1ª a 3ª séries 50 obras3

Categoria 5 e 6 Livros do Aluno

5 - Anos Iniciais EF - 4º e 5º anos 2 obras por aluno

6 - Ensino Médio - 1ª a 3ª séries 2 obras por aluno

Fonte: Guia Digital PNLD Literário 2018.

Ocorre, entretanto, que observa-se uma diminuição significativa na quantidade de obras destinadas aos acervos dos segmentos escolhidos, no edital do PNLD Literário 2018, se comparado aos editais de distribuição de obras literárias do PNBE 2014 e 2015:

Quadro 2: Comparação das quantidades de obras distribuídas nos vários segmentos escolares

Categoria PNBE 2014 PNBE 2015 PNLD Literário

2018

Creches 50 obras 20 obras

Creches com Pré-escola 50 obras 25 obras

Anos Iniciais EF 100 obras 135 obras

EJA 100 obras

Anos Finais do Ensino Fundamental

195 obras

Ensino Médio 195 obras 150 obras

Fonte produzida pela pesquisadora a partir dos Editais PNBE 2014, PNBE 2015 e PNLD Literário 2018

A partir de tal quadro, cumpre questionar: o envio de duas obras por aluno além das obras que comporão o acervo da biblioteca escolar justifica a diminuição das quantidades enviadas? E, ainda, por que a opção pela supressão dos anos finais do Ensino Fundamental como foco do envio de materiais neste ano de 2018?

2 No caso do Ensino Fundamental, trata-se de 50 obras por série, perfazendo, assim, o total de 100 obras. 3 No caso do Ensino Médio, trata-se de 50 obras por série, perfazendo, assim, o total de 150 obras.

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936 Sobre a primeira questão, ponderamos que a nova ação de distribuição de títulos aos alunos não deveria afetar o encaminhamento das obras do acervo da biblioteca. É evidente que, apesar de todos os alertas que os professores farão aos alunos sobre a necessidade de manter os volumes em bom estado, nada garante que isso vá ocorrer de fato. As obras distribuídas para trabalho em sala de aula serão manipuladas mais intensamente, poderão sofrer avarias mais facilmente, devido ao fato de habitarem espaços externos à escola. Pensar no aproveitamento desses volumes para comporem o acervo da biblioteca após terem sido “apropriados” pelos alunos, parece-nos um tanto ilusório. Ou, pior que isso, talvez esse esquema apenas facilite o impedimento do acesso aos livros, diante de possíveis tentativas de preservação do material por bibliotecários, professores, diretores etc. O que, aliás, seria absolutamente compreensível, uma vez que a histórica descontinuidade dos programas não oferece garantias de distribuições frequentes e periódicas.

No tocante à supressão dos anos finais do Ensino Fundamental no Edital PNLD Literário 2018, parece-nos absolutamente inconsistente, na medida em que o segmento representa um gargalo na formação de leitores. Pesquisas recentes (Zamariam, 2018; Cardoso, 2017, Lima, 2017) apontam que os anos finais do Ensino Fundamental representam um período em que o trabalho com a literatura é quase nulo, fixando-se principalmente nas parcas e muitas vezes inócuas propostas veiculadas nos livros didáticos de língua portuguesa.

À diminuição significativa do número de obras que comporão os acervos das bibliotecas escolares dos segmentos escolhidos, somam-se algumas outras peculiaridades das ações implementadas pelo PNLD Literário 2018, conforme citamos a seguir:

1. As escolas dos segmentos contemplados pelo edital podem se recusar a receber o acervo, bastando, para isso, no momento do preenchimento dos cadastros na plataforma específica, clicar na opção “Não desejo receber livros” (Guia Digital PNLD Literário 2018). Entretanto, caso a escola faça essa opção, ainda assim, receberá um acervo de livros em conformidade com o número de obras relativo ao segmento de que faz parte. Esse acervo será composto por obras remanescentes, não escolhidas pelas demais escolas.

Ao final, portanto, não há a opção de não receber livros. As escolas são obrigadas a receber o acervo, já que ele será entregue a despeito da opção feita pela escola de não recebê-los. Impõe-se a questão: por que dar uma opção que, ao final, não será respeitada? Mas o que causa mais estranhamento é a incoerência do edital com o PNLL no que diz respeito ao Eixo de número 3: Valorização da leitura e o incremento de seu valor simbólico. Isto é, quando o edital permite à escola optar por não receber livros e, ainda pior, permite que não se envolva no trabalho de escolha dos livros a serem recebidos – atividade que instiga a relação dos

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937 vários setores da escola no processo de formação de leitores –, vemos uma clara desvalorização do valor simbólico do livro, da leitura e da formação de leitores.

2. Inclusão de escolas confessionais, comunitárias e filantrópicas como destinatárias dos acervos de obras literárias. Vale dizer que todas essas categorias se enquadram no setor privado da educação. Algumas das escolas que fazem parte desse grupo, sem dúvida, não necessitam desse apoio do governo, sobretudo no que se refere à distribuição de dois livros por aluno.

3. O caráter transitório do programa, expresso no Edital no item:

2.2. O PNLD 2018 Literário tem caráter transitório, possibilitando o processo de inscrição e avaliação de obras literárias para estudantes da educação infantil, dos anos iniciais do ensino fundamental e do ensino médio no ano vigente. 2.2.1 Novos processos de inscrição e avaliação de obras literárias para educação infantil, para anos iniciais do ensino fundamental e para o ensino médio poderão ser previstas nos próximos editais do PNLD, de forma a atender as respectivas etapas de ensino com obras literárias e obras didáticas, conjuntamente. (BRASIL : 2018, p.1)

O excerto evidencia a manutenção da natureza precária desse tipo de programa, como dito antes, marcado pela inconstância. De saída, o documento informa que se trata de um edital de “caráter transitório”, pois novos editais “poderão – e não deverão – ser” previstos, desobrigando o MEC e o governo de uma possível crítica baseada nas descontinuidades do programa.

Nesse sentido, em contraste com o que propõe o PNLL, o PNLD Literário 2018 reduz o trabalho antes realizado pelo PNBE, na medida em que não abarca os três eixos de composição de acervo (Literatura, Periódicos e Coleção Pedagógica) comportados pelo programa hoje extinto, além de não contemplar, sequer nas pretensões, os anos finais do Ensino Fundamental. Também, se considerarmos a informação inicial fornecida pelas tabelas, há uma sintomática redução do número de obras para a composição do acervo das bibliotecas escolares, a despeito da ampliação criada pela distribuição de obras aos alunos e pela inclusão do setor privado da educação enquanto destinatário dos materiais distribuídos. Por fim, o programa não comporta ainda o que, pelo PNLL, seria da responsabilidade do setor da educação, isto é, a formação de mediadores, afinal, o PNLD Literário ainda se baseia apenas na distribuição das obras, sem mencionar ações para o acesso do aluno a elas.

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938 2. Políticas para a formação de leitores no estado do Paraná: o PEE-PR E PELLL-PR

Conscientes da problemática que afeta atualmente as políticas públicas para formação de leitores em nível nacional, voltamos, agora, o foco para aquelas vigentes no Estado do Paraná.

Nossa análise se inicia por uma revisão do Plano Estadual de Educação do Estado do Paraná, com duração prevista de 10 anos, visto que o documento refere-se ao período de 2015 a 2025.

O PEE-PR organiza-se em duas partes, sendo a primeira composta por uma contextualização da educação no estado do Paraná, quantificando e qualificando todos os segmentos da educação básica e a educação superior no Estado. Já a segunda parte do documento, a partir do capítulo 4, apresenta 20 metas para a educação nos próximos 10 anos, além de uma proposta de avaliação e monitoramento do PEE-PR no seu período de vigência.

No que se refere à leitura e à formação de leitores, o PEE-PR não apresenta nenhuma meta específica direcionada ao tema. As propostas que tocam na questão da formação de leitores encontram-se diluídas ao longo do documento, comparecendo, como estratégias específicas nas Metas 2, 7, 9 e 16, porém com muitas inconsistências, conforme se verá a seguir, nas análises apresentadas.

Boa parte dos enunciados manifestados como estratégias consiste em proposições genéricas, conforme se observa no item 27 da Meta 7 “Fomentar a qualidade da Educação Básica em todas as etapas e modalidades, com melhoria do fluxo escolar e da aprendizagem de modo a atingir as seguintes médias estaduais para o Ideb”:

Promover ações em consonância com as diretrizes do Plano Nacional do Livro e Leitura (PNLL) e Plano Estadual do Livro, Leitura e Literatura (PELLL) para formação de leitores e formação continuada de profissionais da educação para atuarem como mediadores da leitura, de acordo com a especificidade das diferentes etapas do desenvolvimento e da aprendizagem. (PARANÁ: 2015, p. 76)

O enunciado mostra-se problemático, na medida em que trata de forma extremamente genérica a condução da política relativa à formação de leitores – “promover ações” –, desabonando-a enquanto estratégia. Pode-se dizer, ainda, que o trecho destacado figura como uma operação discursiva marcada pela nebulosidade de seu conteúdo, do que se depreende que ou não há plano/estratégia de fato para realizar tais ações, ou não se pretende mesmo realizá-la.

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939 A título de comparação, mostramos a seguir uma estratégia em que há clareza das ações a serem postas em prática, diferentemente do que ocorre no excerto antes analisado:

7.26. Articular, com os órgãos responsáveis pelas áreas da saúde e da educação, o atendimento aos estudantes da rede pública de Educação Básica por meio de ações de prevenção, promoção e atenção à saúde. (PARANÁ: 2015, p. 76)

Difrentemente do que se vê em 7.27, em 7.26, há clareza dos procedimentos demarcados para se realizar a ação de aproximação entre as áreas de saúde e educação. Nesse sentido, nota-se que, no item relativo à formação de leitores, ao menos no momento da publicação do PEE-PR, não havia ainda clareza a respeito das ações efetivas para a realização de tal política no estado do Paraná.

Reforçando o perfil de incerteza que parece caracterizar o documento no tocante à política para formação de leitores, surge a estratégia 7.40, na qual ainda se mantém a nebulosidade com relação à ação efetiva que se pretende realizar:

7.40 Aperfeiçoar programas de atendimento pedagógico para todas as escolas da rede estadual de ensino, com vistas à melhoria da leitura, interpretação de textos e resolução de problemas e, consequentemente, da diminuição das taxas de abandono, reprovação e aprovação por conselho de classe. (PARANÁ: 2015, P. 79)

Outro aspecto observado no plano com referência às políticas de formação de leitores reitera o que já se observa nas políticas em nível federal, ou seja, o foco quase que exclusivo na composição de acervos.

O item 12 da Meta 2 – Universalizar o Ensino Fundamental de nove anos para toda a população de seis a 14 anos e garantir que pelo menos 95% dos estudantes concluam essa etapa na idade recomendada até o último ano de vigência deste Plano –, apresenta a seguinte estratégia: “Implantar o Sistema da Rede de Bibliotecas Escolares, ampliar o acervo bibliográfico e estimular a formação de leitores por meio da pesquisa e da produção de textos.” (PARANÁ: 2015, p. 62), a qual é reforçada mais adiante, na Meta 16, relativa à formação de docentes para a educação básica, pela estratégia de número 2:

Expandir programa de composição de acervo de obras didáticas, paradidáticas, de literatura e dicionários, e programa específico de acesso a bens culturais, incluindo obras e materiais produzidos em Libras e em Braille, sem prejuízo de outros, a serem disponibilizados para profissionais da educação das redes pública e privada de Educação Básica. (PARANÁ: 2015, p. 90)

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940 Também na Meta 9, relativa ao combate à alfabetização, retoma-se a estratégia de ampliação de acervos:

9.8 Adquirir e encaminhar acervo bibliográfico, bem como garantir infraestrutura para as bibliotecas das prisões, visando ampliar o atendimento da Lei Estadual n.o 17.329/2012, que instituiu o Projeto “Remição pela Leitura” no âmbito dos estabelecimentos penais. (PARANÁ: 2015, p.80) O documento menciona em vários pontos a leitura (7 ocorrências), as bibliotecas (5 ocorrências) e os acervos (4 ocorrências). Quanto aos profissionais que vão por em funcionamento a atividade de formação de leitores, a única menção feita (7.27) apenas reproduz o que já está inscrito no documento federal, tão somente acenando para a ordem hierárquica a que submete suas nebulosas ações.

Diante de tais generalizações e também do foco quase exclusivo do Plano sobre a constituição de acervos enquanto principal ação na política para a formação de leitores, cumpre aprofundar um pouco mais o olhar sobre as propostas do Estado do Paraná nesse campo. Sendo assim, com vistas a compor um quadro mais completo e complexo da situação, analisa-se, a seguir, o Plano Estadual do Livro, Leitura e Literatura do Estado do Paraná, publicado em 2013.

O PELLL-PR é um documento que, nas 22 primeiras páginas (ou dois terços do texto), ocupa-se em apresentar uma análise do contexto da leitura no estado, fazendo considerações sempre muito positivas e otimistas, mesmo quando aponta que apenas 4,07% da população da região Sul têm acesso a bibliotecas ou quando mostra que os leitores pesquisados no estado do Paraná leram, em média, 8,53 livros por ano, número muito irrisório considerando que nesse cálculo estão incluídas as obras didáticas.

A segunda parte do documento apresenta os objetivos do Plano, os quais reiteram o que já se esboça no PNBE e, em seguida, no PNLL, isto é a formação de leitores e o estímulo à leitura. Para concretizar tais metas, organiza suas ações em 4 eixos: 1. Democratização do acesso – em que se reiteram processos de distribuição de livros e composição de bibliotecas –, 2. Fomento à leitura e à formação de mediadores, 3. Valorização da leitura e comunicação – que apresenta medidas de cunho publicitário –, e 4. Desenvolvimento da economia do livro – com ações de apoio à produção do livro.

Focalizamos em nossa análise a meta de número 2, que apresenta como primeira de suas propostas a “Formação de Agentes de Leitura”, com as seguintes ações previstas:

1. Implantar programas contínuos de formação e aperfeiçoamento de educadores, bibliotecários, atendentes de bibliotecas e outros agentes da leitura;


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941 2. Estabelecer parcerias e projetos com instituições de ensino superior e centros de formação de professores para ações na área de fomento a leitura e a formação de agentes de leitura;

3. Incentivar a criação de ementas e disciplinas nos cursos de formação de professores voltadas ao incentivo à leitura e à formação de leitores;


4. Utilizar tecnologias de educação à distância para a formação de agentes de leitura e leitores;


5. Promover encontro bienal, no estado do Paraná, para troca de experiências na área de formação de agentes de leitura e de leitores.

6. Atuar na formação de agentes e de mediadores que possam agir no espaço em que vivem como voluntários da leitura, reconhecidos e recompensados nas formas sociais de valorização da cidadania (diplomas, selos, homenagens, certificados). (PARANÁ: 2013, p. 26)

A partir de tais propostas, observa-se que o documento procura valorizar o papel da mediação no processo de formação de leitores e de promoção da leitura, algo que não se observa no PNBE, no PNLD Literário ou no PEE-PR. Nesse sentido, apesar de ter sido publicado antes do PNLL-2014, o documento mostra-se em consonância com essa política pública proposta em âmbito federal. Por outro lado, considerando que o PELLL-PR foi publicado antes do PEE-PR, verifica-se a frágil articulação entre as políticas internas do estado, uma vez que este último não prevê ações nem orçamento que favoreçam a realização das políticas propostas por aquele. Ressalte-se, nesse sentido, que o PELLL-PR também não prevê contratações para a realização das 6 ações para a formação de mediadores, o que leva a concluir que sua realização, se ocorrer, dar-se-á pela sobrecarga dos já sobrecarregados funcionários da educação e da cultura do estado.

Considerações Finais

Muito embora tenhamos, tanto em nível federal quanto estadual, uma profusão de documentos que focalizam, ainda que timidamente, a formação de leitores e o estímulo à leitura, a maior parte delas ainda se baseia na distribuição de materiais como parte primordial das ações para a formação do leitor.

Nessa esteira, ainda que o PNLL e o PELLL contemplem o item da formação de mediadores em seus textos, raros são os editais publicados com chamadas para agentes de leitura. No Paraná, o último ocorreu em 2015 e contemplou apenas 3 cidades (Apucarana, Pinhais e Paranaguá) como campo para a realização de tal proposta.

Além disso, as recentes restrições de investimentos em distribuição de acervos – tanto nas quantidades quanto na diversificação dos materiais – associada a uma estranha ampliação

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942 dos beneficiários dos programas, conduz para uma limitação cada vez maior do campo de ação das políticas para a formação de leitores.

Nesse sentido, conclui-se que nossas políticas para a formação de leitores ainda se mostram muito frágeis, desde suas concepções até suas tênues realizações, o que, certamente, resulta em um contexto em que as práticas de leitura, tanto na escola quanto fora dela, quando ocorrem, se façam mais a despeito das nossas políticas do que enquanto resultado delas.

Referências

ANDRUETTO, Maria Teresa. A leitura, outra revolução. Tradução de Newton Cunha. São Paulo: Sesc, 2017.

BARTHES, Roland. Aula. Tradução de Leyla Perrone-Moisés. São Paulo: Cultrix, s/d. BRASIL. Governo Federal. Ministério da Cultura Secretaria de Políticas Culturais. Caderno do PNLL : edição atualizada e revisada em 2014. <Disponível em

http://www/cultura.gov.br/documents/10883/1171222/cadernoPNLL_2014ab.pdf/df8f8f20-d613-49aa-94f5-edebfla7a660> Acesso em 15/10/2018.

BRASIL. Governo Federal. Ministério da Educação. FNDE. Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão. Secretaria de Educação Básica. Edital 004/2012 Edital de Convocação para inscrição e seleção de obras de literatura para o Programa Nacional de Biblioteca da Escola PNBE 2014.

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Referências

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