FRANCISCO DANIEL HOLANDA NORONHA
O FENÔMENO DA DUPLA TRIBUTAÇÃO INTERNACIONAL E AS
CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS INCIDENTES SOBRE O COMÉRCIO
EXTERIOR BRASILEIRO
O FENÔMENO DA DUPLA TRIBUTAÇÃO INTERNACIONAL E AS
CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS INCIDENTES SOBRE O COMÉRCIO
EXTERIOR BRASILEIRO
Monografia apresentada no Curso de Direito, da Universidade Federal do Ceará (UFC/CE), como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito.
Orientador: Prof. Francisco de Araújo Macêdo Filho
O FENÔMENO DA DUPLA TRIBUTAÇÃO INTERNACIONAL E AS CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS INCIDENTES SOBRE O COMÉRCIO EXTERIOR BRASILEIRO
Monografia apresentada no Curso de Direito, da Universidade Federal do Ceará (UFC/CE), como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito.
Orientador: Prof. Francisco de Araújo Macêdo Filho
Aprovada em 19 / 01 / 2007
BANCA EXAMINADORA
________________________________________________
Prof. Francisco de Araújo Macêdo Filho (Orientador)
________________________________________________ Prof. Luiz Dias Martins Filho (Orientador)
Ao corpo docente da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará, pelas valiosas lições ministradas.
Ao professo Luis Dias Martins Filho, por todos os ensinamentos e toda a dedicação despendida para a realização desse trabalho.
Ao Professor Francisco de Araújo Macêdo Filho, pelas lições necessárias à realização desse trabalho.
Ao professor Abimael Carvalho, pelo incentivo e ajuda.
“O futuro tem muitos nomes. Para os fracos, é o inatingível. Para os temerosos, o desconhecido. Para os valentes, é a oportunidade.”
Trata-se de estudo desenvolvido sobre o fenômeno da dupla tributação internacional, confrontando-se a situação das contribuições sociais incidentes sobre o comércio exterior brasileiros, em um contexto de integração econômica mundial. Para tanto, fez-se necessário estabelecer a dinâmica da bitributação, apresentando os seus princípios, as formas de atuação e os mecanismos utilizados para a sua eliminação. De posse dessas informações, buscou-se apreender a colocação das contribuições sociais brasileiras no cenário de trocas comerciais, bem como a possibilidade de aplicação dos acordos internacionais em matéria tributária nessas situações.
PALAVRAS – CHAVE: Integração Econômica; Dupla Tributação; Imposto Sobre a
This paper is about developed study on international double taxation, correlating the social contribution situation incident on Brazilian foreing commerce, in a context oh world-wide economic integration. For such a way, this requires that the dynamics of the double taxation be established, presenting its principles, the form of performance and the mechanisms used for its elimination. With the knowledge of these information, one searched to apprehend the rank of the Brazilian social contribution in the scene of exchanges commercial, as well as the possibility of applying the international taxation treaty on these situation.
INTRODUÇÃO ... 10
1. INTEGRAÇÃO ECONÔMICA INTERNACIONAL ... 14
1.1. Harmonização Tributária ... 15
1.2. A dupla tributação internacional no contexto da integração Econômica ... 17
2. PRINCÍPIOS DO DIREITO TRIBUTÁRIO INTERNACIONAL ... 21
2.1. Elemento de Conexão ... 21
2.1.1. Elemento de Conexão Material ... 22
2.1.2. Elemento de Conexão Subjetivo ... 23
2.2. Princípios aplicáveis à ao Direito Tributário Internacional ... 24
2.2.1. Princípio da Territorialidade ... 25
2.2.2. Princípio da universalidade ... 29
3. PESSOAS JURÍDICAS E O DIREITO TRIBUTÁRIO INTERNACIO- NAL ... 34
3.1. Princípio da Não-discriminação e Residência ... 36
3.2. Pessoas Jurídicas Residentes ... 39
3.2.1. Forma de atuação das pessoas jurídicas residentes no exterior e Tributação ... 40
3.3. Pessoas Jurídicas Não-residente ... 42
3.3.1. Equiparação à residência ... 43
3.3.2. Atuação mediante filial e sucursal ... 44
3.3.2.1. Estabelecimento permanente ... 45
4. O FENÔMENO DA DUPLA TRIBUTAÇÃO INTERNACIONAL ... 55
4.1. Âmbito de incidência da dupla tributação internacional ... 57
4.2. Sistema das quatro imputações ... 59
4.3. Formas de tratamento da dupla tributação ... 61
4.3.1. Medidas Unilaterais ... 62
4.3.1.1. Método da isenção ... 63
4.3.1.2. Método do crédito de Imposto ... 65
4.3.1.3. Dedução dos Impostos ... 68
4.3.2. Medidas bilaterais ... 68
4.3.2.1. Modelo ONU ... 69
4.3.2.2. Modelo da OCDE ... 70
4.3.2.2.1. Sistemática da Convenção-Modelo OCDE ... 71
4.3.2.3. Outras espécies de Convenção-Modelo ... 72
4.3.2.4. Acordos Celebrados pelo Brasil ... 72
5. AS CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS NO DIREITO BRASILEIRO E A SUA INCIDÊNCIA SOBRE O COMÉRCIO EXTERIOR ... 76
5.1. Inconstitucionalidade da cobrança do Pis e COFINS impor- tacão... 77
5.2. Ofensa ao princípio da isonomia e da não-discriminação ... 80
CONCLUSÃO ... 84
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA ... 87
Neste trabalho monográfico, buscou-se fazer uma análise do fenômeno da dupla
tributação internacional, estabelecendo os seus princípios, as suas formas de
atuação, bem como a apresentação das soluções existentes no ordenamento
tributário internacional para as problemáticas dele provenientes. Volta-se, contudo, o
foco para o tratamento dedicado aos impostos indiretos no sistema jurídico-tributário
adotado pelo Brasil, os quais incidem sobre comércio exterior.
Sob uma perspectiva de integração econômica mundial, em que as trocas
comerciais primam pela eficiência e celeridade, tornou-se viável, dessa forma, uma
aproximação cada vez maior entre os sistemas econômicos, financeiros e tributários
dos Estados Soberanos, sujeitos atuantes na dinâmica comercial internacional.
Nesse contexto, os Estados que participam ativamente do comércio
internacional, objetivando proteger seus interesses, verificaram a possibilidade de
tributação dos rendimentos decorrente dessa aceleração da economia. Ocorre que o
poder tributário não está limitado apenas ao Estado da fonte da renda ou ao Estado
beneficiário, pelo contrário ele é inerente à idéia de Soberania. Nasce assim a
tributantes – o país da fonte e o país da residência – exercem suas prerrogativas
sobre o mesmo fato tributário e o mesmo sujeito passivo,
Foram abordados, nesse ponto, elementos essenciais para a completa
compreensão do tema: os princípios norteadores do Direito Tributário Internacional;
os possíveis elementos de conexão adotados pelos diversos ordenamentos jurídicos
soberanos; as formas em que as pessoas jurídicas se posicionam no cenário
internacional.
Na elaboração desse trabalho, foi esclarecido que a bitributação internacional,
embora lícita, vez que respeita a competência tributária, deve ser reprimida, tendo
em vista que ela configura obstáculo à liberdade de circulação de fluxos, como
também se mostra verdadeiro entrave à busca incessante de lucros cada vez
maiores pelos grandes conglomerados que atuam no comércio internacional, os
quais têm seus rendimentos tributados de forma descompassada e irrazoável.
Superadas essas colocações, entrou-se na efetiva dissertação sobre o fenômeno
de dupla tributação internacional, com os principais elementos que lhe são inerentes.
Dessa forma, traçou-se um raciocino lógico, a fim de atingir as formas de eliminação
dos efeitos econômicos maléficos trazidos por tal fenômeno.
Diante do problema ocasionado pela bitributação, a comunidade internacional se
mobilizou, objetivando eliminar tal fenômeno. Nesse sentido foram criadas medidas
de cunho eminentemente unilateral, bem como medidas bilaterais, ou mesmo
multilaterais, embora esse último caso seja mais raro de se verificar.
Dentre essas medidas, cabe realçar a importância dos tratados contra a dupla
tributação. De fato, foram estabelecidas convenções internacionais com o escopo de
podem ser encontrados o modelo proposto pela Organização de Cooperação e
Desenvolvimento econômico – OCDE e a convenção da Organização das Nações
Unidas – ONU.
Esse estudo procurou sempre contextualizar suas disposições com as realidades
encontradas no sistema de tributação internacional brasileiro, apresentando os
princípios aqui vigentes, os elementos de conexão existentes no nosso
ordenamento, bem assim as soluções apresentadas pelo país para a eliminação da
dupla tributação internacional.
Nesse diapasão, ao analisar as soluções unilaterais existentes para a
problemática ocasionada pela bitributação internacional, posicionou-se acerca
daquelas adotadas pelo ordenamento jurídico brasileiro.
Verificou-se, ainda, que os tratados contra a dupla tributação assinados pelo
Brasil seguem o Modelo OCDE e, em sua grande maioria, são datados de antes de
1992, ano em que a Convenção Modelo passou por uma reformulação. Dessa
forma, esses acordos internacionais encontram-se defasados, na medida em que
foram celebrados quando de um Brasil “subdesenvolvido”, sujeitando-o a uma série
de benesses e incentivos.
Por essa razão, muitos dos países que possuem um tratado de tributação
internacional assinado com o Brasil pleiteiam a sua reformulação, a fim de
adequá-los à atual realidade brasileira, qual seja a de um país em “processo de
desenvolvimento”.
Por fim, foram abordados os objetos dos tratados em que o Brasil se encontra
como signatário, observando-se que eles possuem como objetivo primordial a
incidentes sobre os rendimentos, i.e., Imposto de Renda. No entanto, no presente
estágio de desenvolvimento interno em que o Estado Brasileiro se encontra inserido,
o fator que mais onera as trocas comerciais com outros países
(exportação/importação) não é o imposto sobre a renda, mas sim os chamados
impostos indiretos, quais sejam as diversas contribuições – PIS e COFINS – que
estão presentes no Sistema Tributário Nacional e incidem sobre os lucros,
rendimentos e faturamentos decorrentes de todo o comércio internacional.
Nesse sentido, os objetivos traçados pelos tratados contra a dupla tributação
internacional – como eliminar as barreiras à livre circulação dos fluxos e, por
conseguinte, aumentar os lucros das empresas – não são atingidos pelo Brasil, haja
vista a excessiva taxação que incide sobre o comércio exterior fomentado pelo
As trocas comerciais estabelecidas entre os Estados atuantes no cenário
internacional restaram intensificadas a partir do processo de integração econômica,
o qual consiste justamente na eliminação gradual das barreiras físicas e virtuais
comumente impostas quando tratamos de comércio entre países.
Nesse diapasão, torna-se possível verificar o aprofundamento dos vínculos entre
os Estados soberanos como decorrência da decisão política, que, fundada em um
suporte econômico e formalizada por uma construção jurídica, possibilita a
ocorrência do processo de integração em análise.
De fato, a integração dos mercados internacionais, nos moldes em que a
conhecemos hoje, é um fenômeno recente, o qual alcança as searas das relações
comerciais, monetárias, laborais e fiscais, valendo salientar que nos deteremos,
quando do desenvolvimento desta pesquisa, com maior esmero no tratamento desta
última.
Convém ressaltar, outrossim, que, embora usualmente se relacione a
aproximação dos mercados ao fim precípuo de atingir o desenvolvimento
instauração deste processo, os fins de justiça social, uma vez que a etapa da
mundialização hodiernamente enfrentada traz intrinsecamente em seu bojo o
acirramento das desigualdades sociais, regionais, nacionais e, até mesmo,
intercontinentais.
Em verdade, o fenômeno integrador origina nos países integrantes do bloco
econômico a premência de políticas econômicas e sociais específicas, a fim de
alcançar os resultados inerentes aos esforços de coordenação, que se intensifica do
desenvolvimento das políticas consideradas fundamentais para o bloco, a saber:
política social, comercial, ambiental e energética.
Nesse sentido, “as oportunidades de integração econômica que surgem devem
ser identificadas visando ao crescimento sustentável do país, à satisfação das
necessidades básicas da grande maioria do seu povo e a conseqüente redução das
desigualdades econômicas e sociais.”1
1.1. Da Harmonização Fiscal
Pressuposto lógico do fenômeno da integração econômica internacional, a
harmonização fiscal é decorrência da política tributária adotada pelos países que se
lançam a uma economia de mercado, exercendo influência sobre inúmeros fatores,
tais quais a rentabilidade das empresas, localização e orientação dos investimentos,
bem assim as condições de concorrência e a liberdade de circulação dos bens e dos
serviços.
De fato, a harmonização tributária tem caráter primordial dentro do processo em
estudo, guardando como característica essencial a eliminação das barreiras e dos
fatores de discriminação2 fiscal, permitindo, dessa forma, maior liberdade de
circulação dos bens e dos serviços dentro no contexto do comércio exterior.
Mencione-se, por oportuno, que esse processo dispõe de mecanismos hábeis a
possibilitar o desenvolvimento das economias em mercado.
As políticas tributárias tendentes a implementar a harmonização fiscal
compreendem três formas distintas a saber: uniformização ou unificação;
compatibilização; e instrumentação. Acerca dessas formas, discorreu com maestria
o Prof. Luiz Dias Martins Filho:
“Uniformização – como um dos mecanismos de que se pode valer, a harmonização tributária significa uniformizar a tributação em todos seus aspectos essenciais, igualar as cargas tributárias que recaem sobre uma mesma matéria tributável, vale dizer igualar as legislações de um determinado tributo, tanto nos aspectos estruturais, quanto nos técnico-formais e quantitativos. (...)”
“Compatibilização – por esse meio, se trata de adequar a estrutura dos tributos para que estes permitam a aplicação de mecanismos compensatórios capazes de neutralizar os efeitos que poderão advir de uma disparidade nas cargas tributárias. Esse mecanismo é menos rígido que o anterior ao operar apenas sobre os aspectos técnico-formais, sem afetar os níveis de tributação, que poderão persistir na forma mais apta para responder às orientações ditadas pelos objetivos nacionais. (...)”
“Instrumentação – consiste em instrumentar determinada estratégia de integração. Diferentemente dos mecanismos comentados anteriormente, mediante os quais se pretende evitar os efeitos diferenciais que poderiam emergir de disparidades no nível da carga tributária, é que a instrumentação se dispõe intencionalmente a estabelecer desigualdades – desigualdades que podem ter por fim compensar algum desequilíbrio estrutural entre os países da região, induzindo, por exemplo, uma alocação geográfica de recursos conforme as prioridades regionais com aquela finalidade. (...)”
Importante ressaltar também que a harmonização em apreço não almeja tão
somente a quebra das barreiras e o entrave à discriminação fiscal, mas também a
adequação da tributação direta e, principalmente, da tributação indireta às
exigências do comércio internacional.
2 A não-discriminação tributária é princípio basilar do direito tributário internacional constante nas
Focalizando a realidade brasileira, a exemplo da tributação indireta temos as
contribuições sociais – PIS e COFINS –, as quais não seguem os cânones da
tributação sobre a renda, como a não-cumulatividade ou seletividade, fato este
responsável por comprometer a competitividade dos produtos nacionais no mercado
internacional.
Busca-se, dessa forma, simplificar a ordem tributária, a fim de se evitar a
pluralidade de incidência nas trocas comerciais internacionais, reduzindo o número
de espécies tributárias, garantindo a exploração razoável de suas três bases, quais
sejam consumo, renda e propriedade.
1.2. A dupla tributação internacional no contexto da integração econômica
Adam Smith, no clássico “A Riqueza das Nações”, preconizava que o capital
excedente originado nos países mais abastados deveria ser injetado nos países
periféricos que apresentassem alternativa rentável de aplicação. Com efeito, a idéia
consistiria em investir o capital o qual não restou absorvido pelo mercado dos países
ricos. Convém ressaltar que a impossibilidade de absorção do capital representa o
reflexo de uma economia cujas oportunidades restaram exaustivamente exploradas
a ponto de o mercado revelar-se saturado.
Nesse sentido expõe o citado autor:
“Logo, devem transbordar 800 mil libras, já que essa soma excede o que pode ser empregado na circulação do país. Porém, ainda que não seja possível empregar essa soma no país, é valiosa demais para que se possa deixá-la ociosa. Por conseguinte, será enviada ao exterior, para aí procurar o emprego rentável que não conseguiu encontrar no próprio país3.”
E ainda:
“À medida que crescem os capitais de qualquer país, necessariamente diminuem os lucros que é possível obter com seu emprego. Torna-se cada
vez mais difícil encontrar, dentro do país, um meio lucrativo de empregar qualquer novo capital4.”
Como se pode facilmente vislumbrar, embora datem do século XVIII, as
passagens supra transcritas dispõem de salutar importância na atualidade,
considerando-se a semelhança entre as situações narradas e o processo de
mundialização vivido nos moldes da teoria neoliberal. Dessa forma, os Estados
desenvolvidos, na constante busca por aferir a maior rentabilidade possível, têm
deslocado seus capitais excedentes sob a forma de investimentos nos países
subdesenvolvidos e emergentes. Não se pode olvidar de colacionar o que dispõe
Eros Roberto Grau em sua obra “A ordem Econômica naConstituição de 1988”:
“O capitalismo, inicialmente ordenado no interesse de cada Estado, vai à busca de uma ordenação internacional – a ordem econômica internacional – que enseja aos Estados desenvolvidos recolher nos subdesenvolvidos as parcelas de mais-valia já não coletáveis internamente de modo intenso5.”
Associado à idéia sustentada por Smith, David Ricardo, em 1817, desenvolveu a
teoria das vantagens comparativas, a qual representa prenúncio de regulação das
trocas econômicas internacionais, sugerindo a construção de um modelo de
comércio internacional que pudesse favorecer a todos os países figurantes do
mercado exterior. Assim, o autor idealizou um sistema com total liberdade de
comércio, onde inevitavelmente cada país geraria aquilo que pudesse produzir
melhor, ou seja, mercadorias que representassem o menor custo de
desenvolvimento e maior eficiência possíveis, exportando-se o excedente de
produção e importando-se as demais mercadorias de que a população necessitasse.
Segundo a análise do autor, com a implantação do sistema de total
livre-comércio, haveria um número muito maior de mercadorias à disposição para
satisfação das demandas, o que ocasionaria o favorecimento das classes
capitalistas de todos os países participantes do “mercado comum”, pois, se cada
país produzisse aquilo que lhe fosse mais vantajoso, menores seriam os custos de
produção e os salários de subsistência dos trabalhadores; por conseqüência,
observar-se-ia o crescimento exponencial dos lucros.
Há que se mencionar que o modelo prelecionado por Smith e Ricardo culminou
no moderno processo de integração das economias de mercados, no qual se
observa uma quebra das barreiras físicas e virtuais, bem como a aproximação dos
sistemas tributários, o que vem favorecendo as trocas comerciais.
Nesse contexto, aperfeiçoa-se o complexo fenômeno da integração econômica,
o qual, associado com o crescimento do comércio internacional, gerou novas
possibilidades de tributação. Com efeito, diante do iminente recrudescimento da
arrecadação tributária gerada pelo comércio exterior, os Estados encontraram novos
meios de exercitar suas soberanias fiscais.
Nesse diapasão, surgiu no cenário internacional a problemática da múltipla
tributação, a qual se faz presente na hipótese de, em uma mesma situação, para um
mesmo fato gerador, corresponde mais de uma competência tributária, fenômeno
esse hodiernamente conhecido como dupla tributação internacional.
Embora constitua a dupla tributação corolário lógico da integração de mercados,
seus efeitos de ordem econômica e financeira devem ser evitados, tendo em vista
que a sede arrecadatória dos fiscos nacionais entra em conflito com os interesses de
liberdade de fluxo de mercadorias e serviços e de desenvolvimento das atividades
econômicas de cada país.
Deve-se ter em mente que, a despeito de o fenômeno acima apresentado não
assegurar uma maior lucratividade nas trocas comerciais. Dessa feita, importante
destacar o movimento de aproximação dos sistemas fiscais internacionais, que teve
como marco de existência a União Européia, e culminou na elaboração da
Convenção-Modelo da OCDE, principal instrumento para a elaboração de tratados
em matérias tributária, tendentes a sanar os malefícios trazidos à tona pela
excessiva onerosidade fiscal.
O fenômeno da dupla tributação internacional pressupõe uma série de
desdobramentos teóricos e práticos, os quais serão devidamente analisados nos
2.1. Elemento de Conexão
A tributação das rendas provenientes do comércio internacional está fundada,
basicamente, na escolha de determinadas situações fáticas que justifiquem a
incidência da norma tributária. Essas situações são conhecidas, na seara do Direito
Internacional, como elementos de conexão.
Para Xavier, elemento de conexão é:
“o elemento de previsão normativa que, determinando a ‘localização’ de uma situação da vida num certo ordenamento tributário, tendo como efeito determinar o âmbito de aplicação das leis desse ordenamento a essa mesma situação”.6
Os elementos de conexão correspondem a uma ligação, um vínculo entre o fato
da vida que surge perante a sociedade e o ordenamento jurídico aplicável a essa
situação. Em verdade, o elemento de ligação vai configurar, em uma situação
escolhida pela norma tributária, a possibilidade de incidência do tributo sobre os
rendimentos auferidos pelas pessoas, sejam elas físicas ou jurídicas, no que
concerne a sua atuação no mercado internacional de capitais.
No âmbito do Direito Tributário Internacional, os critérios de conexão de maior
relevância para o estudo do tema da dupla tributação internacional dividem-se em
duas categorias principais: I) os subjetivos, os quais estão relacionados com a
pessoa do contribuinte, cujo exemplo maior é a residência, o domicílio e a
nacionalidade7; II) os materiais, que, a contrario sensu, dizem respeito ao fato
jurídico tributável que, no caso em estudo, correspondem à fonte efetiva dos
rendimentos.
No que diz respeito ao elemento residência, este se consubstancia na ligação
entre o sujeito sobre o qual deverá incidir o ônus de cumprir com as obrigações
tributárias e a circunscrição territorial em que as leis tributárias estão em vigor. Já a
fonte corresponde ao vinculo existente entre o ordenamento jurídico tributário
pertinente e o local de produção dos rendimentos.
2.1.1. Elemento de conexão material
No cerne do Direito Tributário, o elemento de conexão material de maior
relevância corresponde ao local da fonte efetiva de produção dos rendimentos. Esse
elemento de conexão possui, assim, uma ligação direta com o fato jurídico a ser
tributado, na medida em que se verifica a localidade de produção dos rendimentos,
para então incidir a norma tributária que é pertinente.
Esse elemento autoriza a tributação nos limites do território em que a lei possui
eficácia e aplicabilidade, alcançando apenas as fontes de rendimento que se
originarem dentro dessa circunscrição territorial. Daí a necessidade de se identificar
7 O elemento de conexão nacionalidade só possui relevância para o Direito Tributário Internacional no
de forma precisa a região em que ocorreu a produção efetiva da renda8, a fim de que
se possa autorizar a incidência da legislação tributária que a ela está relacionada,
onerando o rendimento com a devida carga impositiva.
Faz-se necessário, assim, ressaltar que o Código Tributário Nacional, em seu
art. 146, inciso III, descreve o fato gerador do Imposto de Renda como sendo “a
aquisição da disponibilidade econômica e jurídica de renda, assim entendido o
produto do capital do trabalho ou da combinação de ambos”. Nesse sentido, tal
dispositivo de lei vem relacionando a fonte dos rendimentos com a utilização que é
feita do capital. Cabe acrescentar, ainda, que o mencionado artigo adota o conceito
econômico da fonte dos rendimentos, tendo em vista que privilegia a produção de
capital.
2.1.2. Elemento de conexão subjetivo
O elemento de ligação em foco tem como função primordial a identificação do
sujeito passivo da obrigação jurídica tributária, objetivando estabelecer um vínculo
entre este e o fato gerador, dando margem, dessa forma, à efetivação da tributação.
Exterioriza-se nos institutos da residência, do domicílio e da nacionalidade.
Em verdade, a nacionalidade tem pouca aplicação prática como critério de
conexão entre as pessoas que estão sujeitas à imputação tributária pelos
ordenamentos internacionais. Com relação ao domicílio e à residência, seus
conceitos se confundem nos sistemas jurídico-tributários dos diversos países que
compõem a comunidade internacional, correspondendo a institutos jurídicos distintos
em muitos dos casos. Dessa forma, convencionou-se no sentido de adotar o
8No entendimento de Heleno Tôrres, a fonte efetiva da renda “será o lugar onde se consumar e se
elemento de conexão residência como aplicável a todas as situações que lhe são
pertinentes9.
A residência, como um elemento puramente de Direito Internacional, é
compreendida em face de dois critérios, um de ordem objetiva e, outro, subjetiva. O
primeiro deles compreende a presença física da pessoa em uma determinada
localidade (corpus). No critério subjetivo, busca-se a intenção de o sujeito residir no
país em que se encontra (animus). Como se observa, a permanência de uma
pessoa no país, somada com a intenção de ali manter sua residência, gera encargos
tributários, decorrente do elemento de conexão que se formou entre ela e o
ordenamento jurídico do Estado.
2.2. Princípios aplicáveis ao Direito Tributário Internacional
O problema da bitributação internacional tem como causa a aplicação desses
dois elementos de conexão (fonte e residência) no campo da tributação dos
rendimentos pelos Estados atores da dinâmica do comércio exterior. Nesse sentido,
tanto a identidade de conceitos – o que ocorre no caso de dois países considerarem
a mesma pessoa como residente (hipótese de dupla residência), gerando uma
imputação cumulativa sobre ela – como a diversidade de elementos – situação em
que um país adota o critério residência, enquanto o outro utiliza o critério fonte
efetiva da renda – dão ensejo à dupla tributação internacional.
Os elementos de conexão fonte e residência possuem reflexo direto nas políticas
a serem adotadas para a eliminação da dupla tributação internacional, sendo estes
conceitos essenciais para a elaboração de tratados tendentes a evitar, ou mesmo
91. For the purpose of this Convention, the term “resident of a Contracting State” means any person
eliminar a tributação plúrima. No entanto, apenas a presença desses dois elementos
não corresponde à real extensão do poder de tributar dos Estados Soberanos, no
que diz respeito ao seu alcance espacial, vez que, na prática, ele pode alcançar
rendas produzidas fora de seu âmbito de atuação, bem como tributar pessoas que,
embora sejam consideradas como não residentes, aufiram rendas dentro do âmbito
territorial do país.
Corroborando com este entendimento que atribui uma aplicabilidade muito maior
àquela dada pelos simples elementos de conexão fonte e residência, é possível se
verificar a ocorrência dos princípios inerentes ao Direito Tributário Internacional,
quais sejam o Princípio da Territorialidade e o Princípio da Universalidade. De fato,
os elementos de ligação citados estão ligados de forma umbilical a estes princípios,
na medida em que os residentes de um país são tributados por seus rendimentos,
quer sejam eles oriundos de uma fonte interna, quer sejam de uma fonte externa10
(Princípio da Universalidade). De modo diverso, os sujeitos tidos como
não-residentes só são tributados pelos rendimentos que tenham como origem uma fonte
dentro do território nacional (Princípio da Territorialidade). A adoção desses
princípios está a critério das políticas fiscais aplicadas por cada soberania estatal,
sendo possível, inclusive, a adoção dos dois princípios, os quais irão incidir sobre
situações diversas.
2.2.1. Princípio da Territorialidade
O Princípio da Territorialidade, também conhecido pela expressão inglesa
Source Income Taxation, adota o critério de conexão material, qual seja a fonte
efetiva do rendimento. De fato, esse princípio estabelece que todas as situações
10 É possível encontrar países em que, na tributação dos residentes, há a exclusão dos rendimentos
jurídicas que dão origem ao auferimento, ou mesmo produção, de rendimento dentro
do território nacional de um Estado, ensejam o surgimento da obrigação de arcar
com o ônus tributário.
Nos ensinamentos de Xavier, o princípio da territorialidade corresponde a uma
obrigação tributária limitada, na medida em que este princípio autoriza a incidência
de imposto somente sobre os rendimentos que têm origem em fontes localizadas no
território do ente tributante.
A tributação das rendas que foram produzidas no âmbito do território nacional
possui uma ligação direta com a idéia de soberania nacional, na medida em que
todos os fatos que tenham incidência dentro do território do país são devidamente
regulados por seu sistema jurídico. Nesse tocante, o Estado possui competência
geral e exclusiva sobre todos os fatos da vida que têm origem e se concretizam no
seu âmbito territorial.
Assim estabelece Bassaneze:
“A soberania é o reflexo necessário de um Estado autônomo. Aliás, a palavra autonomia, como toda a palavra grega sobre abstratos, é plena de significados. ‘Nomos’, é norma, previsão institutiva de um ‘ser’ jurídico ou de atitude comportamental. Quem institui norma-para-si ou para outros é superior, movimenta vontade e força, daí os termos autônomos e heterônomos. Não por acaso, Kelsen se refere a deveres autônomos e heterônomos, dependendo ou não da autonomia das vontades, a criar deveres. Estado autônomo é aquele que não reconhece nem admite poder acima do seu subordinando-o. O seu poder procede de si mesmo. Ele não reconhece nenhum outro a imperar sobre sua área de sua atuação, a não ser que ‘soberanamente’, por vontade própria, não coacta, assim o deseje11.”
Sob o aspecto da soberania fiscal, deve haver uma limitação das normas
tributárias no que concerne à circunscrição territorial, sendo defeso aos Estados
exercer a sua competência tributária além da demarcação de suas fronteiras12. É
inegável, dessa forma, a plena competência que possuem os Estados de tributar as
rendas que nele foram produzidas, haja vista a conexão existente entre a fonte do
rendimento (elemento objetivo) e o ordenamento jurídico incidente no caso concreto.
É mister, nesse momento, a conceituação e a demarcação do que seria território
nacional, tendo em vista a necessidade premente de limitar a atuação normativa
sobre os fatos relacionados ao auferimento e à produção de renda. O critério de
demarcação espacial não é uniforme entre os diversos Estados Soberanos, sendo
fixado por cada sistema normativo correspondente. Dessa feita, a limitação territorial
é um aspecto eminentemente jurídico, constituindo a base geográfica do poder.
Afora os pontos controversos que existem acerca de seus limites, o território
compreende o seu domínio terrestre, bem como o espaço aéreo, marítimo (mar
territorial e plataforma continental) e o subsolo13.
Sob um ângulo tributário, o espaço aéreo e o território marítimo possuem alguma
influência sobre o campo tributário, na medida em que a União pode exercer sua
competência legislativa sobre fatos que tenham ocorrido na esfera do mar territorial,
plataforma continental e zona econômica exclusiva14.
O principio da territorialidade pode ser, outrossim, entendido sob dois ângulos
principais, quais sejam a territorialidade em sentido material e territorialidade em
sentido formal. A primeira representa o âmbito de incidência da regra-matriz da
norma tributária, que pode atingir fatos e sujeitos passivos que se encontram na
12
“A lei tributária vigora no território do ente político que a edita; o território é o limite espacial da
soberania, no caso do Estado nacional, e da autonomia, no caso dos Estados-membros, Distrito Federal e Municípios”. (AMARO. 2006, p 194).
13 O art. 20 da Constituição Federal determina:
“Art. 20. São bens da União:
V – os recursos naturais da plataforma continental e da zona econômica exclusiva; VI –o mar territorial;”
esfera extraterritorial, inclusive. Já em sentido formal, determina que a legislação
tributária só poderá incidir sobre elementos que estão nos limites da ordem jurídica a
que pertencem.
O princípio em análise tem sua maior aplicação na idéia contida na figura dos
não-residentes, tendo em vista que estes sujeitos só podem ser tributados sobre os
rendimentos que forem auferidos, ou pelos quais sejam beneficiários, dentro da área
de incidência da regra matriz. Assim, nenhuma renda em que sua fonte de produção
se localiza no exterior é alcançada pelo ordenamento nacional, i.e., as rendas que
tenham se originado em outro espaço territorial ficam em um campo de
não-incidência. Isso se dá também em decorrência da soberania nacional, uma vez que
não é admitido a um determinado país localizar rendimentos que foram produzidos
em outro Estado por um de seus residentes.
No Brasil, o princípio da territorialidade deixou de ser aplicado, no que concerne
às pessoas jurídicas, com o advento da Lei nº. 9.249/1995, que estatui as normas
pertinentes ao imposto de renda, consagrando, por conseguinte, o princípio da
universalidade como regra geral a ser aplicada no ordenamento jurídico nacional15.
Entretanto, o regime de territorialidade continua sendo aplicado para os sujeitos
não-residentes em território brasileiro, sendo tributados apenas pelos rendimentos que
produzirem ou que tenham sido beneficiados no âmbito do território nacional, ficando
os ganhos de capitais, cuja fonte se encontre no exterior, no campo da
não-incidência.
Esta é uma das causas principais da dupla tributação internacional, porquanto o
não-residente é, de fato, residente em outro Estado, que pode exercer a sua
15 O art. 25 da Lei nº. 9.249/95 estatui:
competência tributária, adotando o critério de conexão pessoal, para alcançar todos
os rendimentos auferidos ou produzidos por seu residente, independente de ser ele
proveniente de uma fonte interna ou externa. Daí a importância de convenções
internacionais, objetivando reduzir o ônus tributário que recai sobre as pessoas
atuantes no comércio exterior.
2.2.2. Princípio da universalidade
No atual estágio de desenvolvimento da economia internacional, em que as
trocas comerciais entre os países se tornaram mais freqüentes e a circulação dos
rendimentos aumentou de forma exponencial, percebeu-se a necessidade de os
Estados Soberanos localizarem as rendas decorrentes do comercio exterior, a fim de
serem tributadas em sua base territorial. Surge, assim, o princípio da universalidade
(world-wide-income) que se utiliza de um critério de conexão subjetivo para alcançar
as rendas produzidas por seus residentes, quer elas tenham se originado no interior
de seu espaço territorial, quer tenham sido elas produzidas alhures. Dessa maneira,
o elemento residência justifica a tributação dos rendimentos, independentemente da
localização de sua fonte.
Originalmente, o princípio da universalidade possui uma incidência maior entre
os países desenvolvidos, que estão diante de um mercado internacional aquecido,
porquanto estes figuram como exportadores de capitais, o que faz nascer a
premência de tributação de seus residentes sobre os lucros que obtiverem em
investimentos feitos no exterior.
O sistema determinado pelo princípio da renda mundial estabelece uma
para que todos os rendimentos – tanto de fonte interna, como de fonte externa –
auferidos pelos sujeitos residentes sejam tributados16.
Como se observa, é irrelevante, para que seja autorizada a tributação, o local de
produção ou de pagamento dos rendimentos, sob a óptica desse princípio, bastando
apenas que se verifique o elemento o qual vincule a pessoa que está ligada com a
produção da renda com o sistema jurídico tributante, no caso, a residência.
Doutrinariamente, a tributação dos rendimentos estrangeiros é justificada por
algumas razões básicas, a saber: I) o malferimento do princípio da igualdade, na
medida em que os países exportadores de capitais observaram os seus residentes,
que auferem renda apenas no âmbito interno, serem mais gravosamente tratados,
em comparação com aqueles que se lançaram no comércio exterior e, muitas vezes,
procuram paraísos fiscais para o desenvolvimento de seus investimentos; II) o
combate à evasão fiscal, motivada pelas inúmeras isenções e benefícios ofertados
pelos países que importam capital; III) a não tributação da fonte estrangeira
implicaria uma grande perda de capital; IV) a necessidade de efetivação dos
princípios da capacidade contributiva e da progressividade incidentes no imposto
sobre a renda.
Nesse entendimento, o Imposto de Renda tem como característica principal a
observância do princípio da capacidade contributiva, que busca a preservação do
contribuinte contra tributação de carga excessiva, como também tende a evitar a
perda de arrecadação pelo Estado detentor do poder de tributar. Na tentativa de dar
maior aplicabilidade à capacidade contributiva, verifica-se a expressão do princípio
da progressividade, na medida em que este determina que a alíquota incidente
sobre riquezas maiores deve, de igual modo, ser maior.
É imprescindível, dessa feita, que se contabilizem todos os rendimentos
auferidos pelo residente, independente da localização da sua fonte, a fim de se
determinar a alíquota correta a ser aplicada. Esse procedimento é importante para
evitar uma tributação desigual entre os residentes que se beneficiam de rendas
externas e os residentes que só possuem fontes de rendimentos internos, os quais
seriam mais severamente tributados, haja vista que aqueles seriam beneficiados por
alíquotas reduzidas, que não guardam relação com a realidade dos fatos.
Ademais, o princípio do world-wide-income representa uma forma eficaz de
combate a políticas de planejamento tributário que têm como objetivo primordial a
prática de condutas elisivas, ou mesmo evasivas, fato que acarreta uma enorme
fuga de capitais do país exportador para países de tributação reduzida. Ademais, ele
representa uma forma eficaz de combate a paraísos fiscais, que se encontram à
margem do atual estágio de desenvolvimento econômico internacional.
No entanto, a adoção do princípio da universalidade está diretamente
relacionada com a maior incidência do problema da dupla tributação internacional,
vez que o concurso de pretensões entre os Estados Soberanos se torna mais
freqüente com a utilização do critério residência. De fato, a conceituação de uma
pessoa como residente depende da legislação interna de cada país, o que pode
levar o mesmo sujeito a ser considerado como residente em dois ou mais Estados
(dupla residência). Dessa forma, na falta de um tratado contra a bitributação
internacional, ambos os Estados podem exercer de forma livre e ilimitada suas
pretensões impositivas sobre a pessoa por eles tida como residente, incidindo o
tributo em cima de seu rendimento mundial.
Em face de uma Convenção contra a bitributação, é inadmitido que ocorra a
critérios que devem observados, a fim de se determinar qual a base residencial que
deverá prevalecer para efeito de uma imputação tributária. Com isso, nasce o
princípio da unidade de residência, ou seja, a residência fiscalmente relevante é una,
e excludente das demais que, porventura, existam em outros Estados, passando a
pessoa a ser considerada, nestes, como não-residente. Cabe ressaltar, entretanto,
que tal exclusão abrange apenas os efeitos fiscais, permanecendo ainda a
residência para o exercício dos demais direitos civis e políticos.
Nesse entendimento, a determinação da residência fiscalmente relevante usa
um critério de conexão subsidiário17, ou seja, a norma elege duas ou mais situações
que serão aplicadas de forma subsidiária umas às outras. Assim, a pessoa física
será considerada residente: I) no local de sua habitação permanente; II) possuindo
mais de uma habitação permanente, na região que constituir o centro de suas
relações pessoais e econômicas; III) na hipótese de falha das situações anteriores
(não possuir habitação permanente, ou não puder se determinar o país centro de
seus interesses), será residente na localidade onde tenha uma permanência
habitual; IV) ainda, se permanecer habitualmente em mais de um país, ou em
nenhum, sua residência se confundirá com o Estado de sua nacionalidade.
Com relação às pessoas jurídicas, estas serão consideradas residentes no local
onde se encontre a sua direção efetiva18, qual seja a região onde são praticados os
principais atos de gestão da empresa de uma forma geral.
Como já apontado, o Brasil passou a usar o princípio da universalidade, regendo
a tributação sobre a renda, com o advento da lei 9.249/95, que permite o alcance de
17 2. Where by reason of provisions of paragraph 1 an individual is a resident of both Contracting
States, then his status shall be determined as follows: (Modelo OCDE, art. 4º, § 2º).
18 3. Where by reason of provisions of paragraph 1 a person other than an individual is a resident of
todos os rendimentos que tenham sido produzidos, ou deles foram beneficiadas as
pessoas jurídicas residentes no Brasil. Faz-se necessário observar ainda a figura do
sujeito que possui uma residência por equiparação, ou seja, pessoas jurídicas
não-residentes que, por força de lei, têm tratamento jurídico semelhante ao estabelecido
Em meio ao cenário de um mundo globalizado, em que o fluxo de capitais entre
os Estados adquire volumes incomensuráveis e as trocas comerciais tornam-se cada
vez mais aceleradas, a atuação dos grandes grupos econômicos não fica restrita ao
âmbito nacional; pelo contrário, ela também assume proporções mundiais. Surge,
nesse sentido, a necessidade de adequação da crescente expansão comercial das
empresas às políticas adotadas pelos países integrantes dos grupos econômicos
internacionais, tanto no que concerne aos incentivos à livre circulação de bens e
riquezas, como às medidas fiscais por eles adotadas.
No tocante ao Direito Tributário Internacional, questão de grande relevância é a
determinação da nacionalidade e da residência das pessoas jurídicas que têm como
âmbito de atuação o comércio exterior. A importância desses conceitos está na sua
íntima relação com a competência fiscal dos Estados, para alcançarem as rendas
que lhes são próprias. Nesse aspecto, a nacionalidade de uma pessoa jurídica é
estabelecida pela lei da respectiva constituição. No direito brasileiro, a nacionalidade
que, em seu art. 1119, estipula um duplo requisito para a determinação da
nacionalidade: ser organizada sob a égide da legislação brasileira e ter seu centro
administrativo no território brasileiro.
A residência, a seu turno, consubstancia-se em um dos principais elementos de
conexão do Direito Convencional, dando origem às diversas obrigações tributárias.
Tal conceito, como visto, há de ser compreendido como sendo a sede da empresa.
Deve-se observar que a residência se diferencia da nacionalidade das pessoas
jurídicas, tendo em vista que esta última é entendida sob dois aspectos – devendo
ter sido constituída conforme a legislação brasileira pertinente e possuir sua sede
administrativa em território nacional. Dessa forma, uma sociedade que possui
residência no Brasil pode possuir a nacionalidade de outro Estado, bastando, para
tanto, que tenha se organizado consoante legislação alienígena e, no entanto,
possua o centro de seus negócios nos limites territoriais brasileiro.
As obrigações tributárias possuem desdobramentos diversos, a depender da
residência e da nacionalidade das sociedades atuantes no cenário internacional.
Com efeito, as empresas consideradas como nacionais estão sujeitas ao regime de
tributação estabelecido pelo elemento de conexão subjetivo, no que concerne ao
seu domicílio; já com relação às sociedades estrangeiras, estas podem ser
imputadas como residentes (propriamente ditos ou por força de equiparação), bem
como não-residentes, a depender de sua forma de atuação.
Voltando o foco ao sistema adotado pelo ordenamento brasileiro, as empresas
de nacionalidade estrangeira podem atuar das seguintes formas: I) realizar negócios
de forma isolada, sem constituir vínculo permanente com o Brasil; II) desenvolver
19 Decreto 2.627/40, art. 11 “São nacionais as sociedades organizadas na conformidade da lei
atividades com o intermédio de estabelecimentos permanentes; III) atuar por meio
de uma sociedade de nacionalidade brasileira, através de controladas e coligadas;
IV) requerer uma autorização para funcionar20. Verificada a forma de atuação das
empresas nos limites territoriais, pode a lei tributária incidir sobre os fatos previstos
na sua hipótese de incidência, alcançando os rendimentos que tenham origem no
território brasileiro, bem como aqueles que foram produzidos alhures, dependendo
das circunstâncias que deram suporte à imputação.
Ademais, esses elementos são de suma importância para a definição de políticas
internacionais de combate e tratamento da dupla tributação internacional,
estabelecendo as condutas que devem ser observadas e limitando o poder de
tributar dos Estados sobre certas hipóteses contratualmente previstas.
3.1. Princípio da não-discriminação e residência
Ponto importante para o Direito Tributário Internacional consiste na proteção ao
princípio da não-discriminação. Tal princípio está intimamente relacionado com o
conceito de nacionalidade, na medida em que estabelece que os nacionais de um
outro Estado Contratante não podem ter tratamento fiscal diferenciado em um outro
Estado, quando estiverem em uma situação equivalente21.
O princípio da não-discriminação está recepcionado e positivado pelo
ordenamento jurídico brasileiro como limite objetivo à competência tributária.
Consiste, em verdade, ao impedimento de que o nacional de um outro Estado
receba tratamento diferenciado, mais gravoso, sem que se possa verificar justo
motivo para tanto. Com efeito, esse princípio serve de direcionamento à tributação
brasileira do comércio internacional, recebendo o merecido destaque e importância
nos art. 3º, IV22, 145, § 1º23 e 150, II24 da Constituição Federal de 1988, bem assim
no art. 2º25 da Lei 4.131/1962.
Como se observa, tal princípio tem o seu ponto de apoio no conceito de
nacionalidade. De fato, esse critério impõe ao Estado o dever de instituir e aplicar as
normas de uma forma igualitária entre seus nacionais e os de outro Estado. Deve,
pois, a não-discriminação ser utilizada como um mecanismo de interpretação da
legislação fiscal internacional e nacional aplicáveis aos estrangeiros, porquanto ele
se apresenta como verdadeiro princípio do Direito Tributário Internacional, adstrito
de sua previsão em tratados que versam sobre o fenômeno da dupla tributação26.
Nesse diapasão, o princípio da não discriminação identifica-se como um limite a
ser observado pelo Estado tributante, o qual deve abster-se de exercer sua
competência sobre certos fatos jurídicos, a fim de conceder o tratamento igualitário
ao estrangeiro dele beneficiado. Por essa razão, esse princípio deve ser entendido
em harmonia com o princípio da reciprocidade, na medida em que os tratados
internacionais devem ter por base a mútua correspondência de interesses e de
tratamento.
22 Art. 3º. Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: IV
– promover o bem estar de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
23 Art. 145 (...) § 1º Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados
segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado a administração tributária, especialmente para garantir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais nos termos da lei, o patrimônio os rendimentos e as atividades econômicas dos contribuintes.
24 Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos
Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: II – instituir tratamento desigual entre os contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer discriminação em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos.
25 Art. 2º. Ao contribuinte estrangeiro que investir no País, será dispensado tratamento jurídico
idêntico ao concedido ao capital nacional em igualdade de condições, sendo vedado quaisquer discriminações não previstas na presente lei.
Cabe acrescentar que o princípio em comento é corolário do princípio de
igualdade, no entanto, com este não se confunde. As diferenças entre esses dois
princípios de Direito Tributário são explicadas por Okuma:
“Vale diferenciar o princípio da não discriminação e o princípio da isonomia em matéria tributária: uma, o princípio da não-discriminação impede a utilização da nacionalidade como um critério discrimen enquanto o princípio da isonomia do art. 150, II, impede a adoção de qualquer critério que não se coadune com a capacidade contributiva ou com os objetivos sociais mencionados por Tipke; duas, o princípio da isonomia do art. 150, II da Constituição Federal afasta tanto a concessão de privilégios quanto a imposição de gravames, àqueles que estão em uma mesma situação jurídica e o princípio da discriminação não impede a concessão de privilégios aos estrangeiros”27.
Com efeito, o princípio da não-discriminação possui direta relação com a
igualdade, na medida em que é proibido apenas tratamento diferenciado o qual
esteja fundado no critério da nacionalidade. Nada impede, contudo, que a residência
possa ser utilizada com um elemento diferenciador entre as pessoas que atuam no
cenário internacional, como de fato ocorre. Tal entendimento está baseado na
interpretação feita ao art. 24 do modelo OCDE, o qual acrescenta a expressão “nas
mesmas circunstâncias”28 para guiar a aplicação do já mencionado princípio. Nesse
contexto, pessoas de nacionalidade diversas possuem a garantia de um tratamento
igualitário nos moldes traçados pelo Direito Comunitário; no entanto, aquelas
enquadradas como não-residentes pelo Estado contratante estão em situações
diferentes e, por isso, recebem um tratamento tributário adequado à sua
qualificação.
Observa-se, assim, que o princípio da não-discriminação não impede que as
pessoas tidas como residentes ou como não-residentes tenham um tratamento
27 OKUMA. 2003, p. 270..
28 1. Nationals of a Contracting States hall not be subjected in other Contracting State to any taxation
diferenciado. Sendo admitida, inclusive, a retenção na fonte nos casos de
não-residência, com o objetivo de resguardar os interesses do ente tributante.
3.2. Pessoas jurídicas residentes
A tributação das rendas das pessoas jurídicas consideradas residentes no
território nacional não acarreta maiores complicações. De fato, ela está diretamente
relacionada com o exercício da Soberania Tributária, qual seja, o alcance de todos
os fatos que tenham ocorrido em seu âmbito de incidência, quer tais fatos tenham
uma caráter eminentemente objetivo-espacial, quer estejam diretamente
relacionados com a pessoa dos residentes.
A tributação deve estar baseada no vínculo existente entre o sujeito e o
ordenamento, respeitando os limites espaciais do território. A falta de uma dessas
conexões – material ou subjetiva – impede a incidência da norma tributária.
É a efetiva aplicação do Princípio da Territorialidade, o qual estabelece que
todos os rendimentos, cuja fonte de produção esteja localizada alhures, não geram
nenhuma obrigação tributária no Estado de residência das pessoas que os
produziam ou que deles se beneficiaram. Nesse tocante, a tributação das pessoas
jurídicas residente pode estar restrita aos rendimentos que tenham sido produzidos
dentro das fronteiras do território nacional.
De modo diverso, pode-se observar a utilização de um critério subjetivo para a
tributação das rendas das pessoas jurídicas, fato que ocorre diante do Princípio da
Universalidade, para o qual é irrelevante a localização da fonte produtora dos
rendimentos. Nesse caso, o contribuinte, residente do país tributante, responde por
toda renda produzida, sem importar o lugar da produção.
“No pólo oposto ao princípio da territorialidade, situa-se o princípio da universalidade (ou do “world-wide-income"), segundo o qual toda a renda da pessoa jurídica deve ser tributada no país de domicílio, incluindo a renda externa, seja esta decorrente de atividade funcional ou jurídica, seja esta obtida através de filiais ou subsidiárias29...”
No Brasil, o regime da universalidade é a regra30 para a tributação de seus
residentes desde a edição da Lei 9.249/1995. O art. 25 dessa Lei autoriza o alcance
de todos os rendimentos, observando-se a ocorrência da conexão pessoal,
independente do seu local de produção. No entanto, a aplicação desse novo regime
não acarretou o afastamento por completo do princípio da territorialidade, cuja
incidência ficou restrita aos sujeitos definidos como não-residentes.
Observas-se, ainda, que a alteração do regime a ser aplicado sobre a tributação
das rendas das pessoas jurídicas residentes veio em atenção à norma
constitucional, prevista no art. 153, § 2º, II, que estabelece que o imposto sobre a
renda “será informado pelos princípios da generalidade, universalidade e da
progressividade, na forma da lei”.
3.2.1. Forma de atuação das pessoas jurídicas residentes no exterior e tributação
As pessoas jurídicas residente no Brasil podem apresentar uma atuação direta
ou indireta no exterior. O primeiro caso é disciplinado pelo § 1º.31, do art. 25 da
norma legal acima mencionada. Por esse dispositivo, infere-se que serão tributadas
os rendimentos e ganhos de capital, referentes a atividades desenvolvidas no
29 XAVIER. 2000, p. 342.
30 Antes do advento da Lei 9.249/95, houve outras tentativas para aplicar o regime da universalidade,
como o Decreto-lei 2.397/87 e o Decreto-lei. 2.413/88.
31 Art. 25. Os lucros, rendimentos e ganhos de capital auferidos no exterior serão computados na
determinação do lucro real das pessoas jurídicas correspondente ao balanço levantado em 31 de dezembro de cada ano.
§ 1º Os rendimentos e ganhos de capital auferidos no exterior serão computados na apuração do lucro líquido das pessoas jurídicas com observância do seguinte:
I – os rendimentos e ganhos de capital serão revertidos em Reais de acordo com a taxa de câmbio, para venda na data em que forem contabilizados no Brasil;
exterior pelas sociedades domiciliadas em território brasileiro, decorrente de sua
atividade funcional ou mesmo aplicação financeira, juros ou royalties. Esses
rendimentos ou ganhos de capital devem ser devidamente contabilizados no Brasil,
fixando o momento de sua disponibilidade, para fins de tributação.
No que concerne à atuação indireta, esta corresponde à tributação da atividade
realizada por pessoas jurídicas residente, mediante a interposição de uma outra
sociedade regularmente constituída, a legislação estabelece duas situações distinta,
relativa à I) tributação dos lucros provenientes da atuação no exterior através de
filiais sucursais ou agências (Lei 9.249, art. 25, § 2º32) e à; II) tributação dos lucro
obtidos mediante controladas e coligadas no exterior (Lei 9.249, art. 25, § 3º33).
Pela leitura dos dispositivos legais acima mencionados, a apuração dos lucros
obtidos mediante filiais, sucursais, controladas e coligadas no exterior será
computada no lucro real das pessoas jurídica residentes em território brasileiro. Para
tanto, o Brasil adotou o método analítico, considerando os lucros auferidos por tais
entidades de forma individualizada. É o que estipula o art. 1634 da Lei 9.430,
imprimindo uma verdadeira regra antielisiva, criada para “inibir a utilização de
empresas-base constituídas em países com tributação favorecida com a finalidade
exclusiva de gerar despesas para as demais empresas do grupo35”.
32 Art. 25, da Lei 9.249/95, § 2º: Os lucros auferidos por filiais, sucursais ou controladas, no exterior,
de pessoas jurídicas domiciliadas no Brasil, serão computadas para apuração do lucro real com observância do seguinte:
33 Art. 25, da Lei 9.249/95, § 3º: Os lucros auferidos no exterior por coligadas de pessoas jurídicas
domiciliadas no Brasil serão computados na apuração do lucro real com observância do seguinte:
34 Art. 16, da Lei 9.430/. Sem prejuízo no disposto no art. 26, 27, 28 da Lei 9.249, de 26 de dezembro
de 1995, os lucro auferidos por filial, sucursal, controlada e coligada, no exterior, serão: I – considerados de forma individualizada por filial, sucursal, controlada e coligada;
II – arbitrados, os lucros das filiais, sucursais, controladas e coligadas, quando não for possível a determinação de seus resultados, com observância das normas aplicadas às pessoas jurídicas domiciliadas no Brasil e computados no lucro real.
Por esse mesmo dispositivo, verifica-se que, diante a impossibilidade de
determinação dos resultados das filiais, sucursais, controladas e coligadas, estes
serão arbitrados pela regra aplicáveis às pessoas jurídicas domiciliadas no Brasil e
computados para a determinação do lucro real. De modo contrário, a definição da
base de cálculo do tributo a ser pagos pelas sociedades aqui residentes terá por
base todos os rendimentos de fonte estrangeira, os quais serão somados às rendas
que foram anteriormente arbitradas.
Ademais, as filiais e sucursais de empresas residente no Brasil deverão manter
uma contabilidade separada, independente da contabilidade da matriz, com o
escopo de determinar a totalidade dos lucros que foram apurados. Todavia, a
existência de uma contabilidade separada não implica uma quebra ao princípio da
unidade da pessoa jurídica, tendo em vista que a manutenção de uma contabilidade
própria possui a função específica de determinar os lucros obtidos pelas filiais e
sucursais, para a apuração do lucro real.
3.3. Pessoas jurídicas não-residentes
Como já salientado, a Lei 9.249/95 não excluiu por completo o princípio da
territorialidade do ordenamento jurídico brasileiro. De fato ele continua a ser
aplicado, mas de forma mitigada, tendo seus efeitos restritos às hipóteses de
tributação dos não-residentes.
Essa é a característica principal da imputação dos sujeitos que não possuem
residência no Brasil: só os rendimentos que tenham como origem o território
brasileiro estão sujeitos à tributação. De modo contrário, as rendas cuja fonte de
produção esteja localizada no exterior ficam em um campo de não incidência da
norma tributária, tendo em vista a completa ausência de elemento de conexão com a
Nesse contexto, o regime da territorialidade pode ser entendido sob dois
aspectos, um negativo e outro positivo. O primeiro corresponde, justamente, à
impossibilidade de incidência da do imposto brasileiro sobre rendas que tenham se
originado de uma fonte estrangeira. Já, com relação ao viés positivo, este alberga a
possibilidade de tributação dos rendimentos produzidos dentro dos limites do
território brasileiro.
Para apuração do imposto a ser pago pela pessoa jurídica não-residente,
adota-se o método do tratamento isolado36, sujeitando-se a uma retenção exclusiva na
fonte37 dos rendimentos brutos provenientes de fontes nacionais.
Pelo tratamento isolado, os rendimentos que foram auferidos pelas pessoas
jurídicas não residente são considerados isoladamente, a fim de que seja submetido,
a cada um, um tratamento individual e específico. Nesse sentido, sobre tais
rendimentos incide o imposto, retido na fonte.
3.3.1. Equiparação à residência
A atuação das pessoas jurídicas estrangeiras em outros Estados, que não
aquele de sua residência, pode ocorrer de dois modos distintos, apresentando
conseqüências tributárias igualmente diversas, quais sejam: I) limitando-se a
atuações isoladas, as quais estão sujeitas à retenção na fonte, como explicado no
tópico anterior ou; II) desenvolvendo uma atividade cuja especificidade exija a
instalação de uma base fixa em território estrangeiro.
36
“La tributación de los no residentes sin establecimiento permanente, tanto en el caso de personas físicas como jurídicas, se caracteriza por que el hecho imponible consiste en la obtención instantenea de e incrementos de patrimonio en territorio español. Al contrario de lo que sucede en la obligación personal y en la real de contribuir con establecimiento en donde el hecho imponible consiste en la obtención continuada de renda durante un periodo limitado de tiempo, en la modalidad en cuestión, le noción de periodo impositivo carece de relevancia.” (ob. cit. TOORES. 2001, p. 326).
37 Art. 685. Os rendimentos, ganhos de capital e demais proventos pagos, creditados, entregues,