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QUEM ENSINA QUEM? PROCESSOS DE FORMAÇÃO COMPARTILHADA

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Academic year: 2022

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QUEM ENSINA QUEM? PROCESSOS DE FORMAÇÃO COMPARTILHADA

Márcia Marin Vianna – Cap/UERJ Patrícia Braun – Cap/UERJ

Não há docência sem discência, as duas se explicam e seus sujeitos, apesar das diferenças que os conotam, não se reduzem à condição de objeto, um do outro.

Quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender (Freire, 1996, p.25).

Os debates sobre o fazer pedagógico diante das demandas atuais na escola têm sido constantes, tanto no ambiente da pesquisa quanto no espaço onde este fazer acontece – a escola.

Os processos de ensino e aprendizagem são focos de estudos, na medida em que questões sobre como tornar o ensino eficaz para todos os alunos se tornam frequentes.

Práticas docentes ocorrem no locus escolar e em situações do cotidiano, no confronto/diálogo entre conceitos teóricos e ações concretas. Para que processos de inclusão ocorram na escola básica é necessário, também, que novas práticas sejam formuladas e vivenciadas em contextos reais.

Neste cenário, lidar com formação de professores, num tempo em que a inclusão escolar é um princípio educacional, requer novas formas de pensar a prática pedagógica, de modo a garantir educação para todos.

De nossas vivências na educação básica, com o ingresso cada vez mais “comum” de alunos que apresentam necessidades específicas, vemos que a escola passa por (re)significações.

No bojo de pensar a escola por outras perspectivas, estão inseridos, também, os alunos com necessidades educacionais especiais.

O termo necessidades educacionais especiais abarca variadas situações, como as indicadas pelo MEC/SEESP (1994, p. 13-16), ou seja, o alunado com necessidades educacionais especiais é aquele que, nos termos da Política Nacional de Educação Especial, apresenta características de: deficiência auditiva – perda total ou parcial, congênita ou adquirida, da capacidade de compreender a fala através do ouvido; deficiência visual – redução ou perda total da capacidade de ver, manifestando-se como cegueira ou visão reduzida; deficiência física – variedade de condições não sensoriais que afetam o indivíduo em termos de mobilidade, coordenação motora geral ou da fala, como decorrência de lesões neurológicas, neuromusculares e ortopédicas, ou ainda, de más formações congênitas ou adquiridas;

deficiência mental – caracteriza-se por um funcionamento intelectual geral significativamente abaixo da média; deficiência múltipla – associação no mesmo indivíduo, de duas ou mais

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capacidade adaptativa; condutas típicas – manifestações de comportamento típicas de portadores de síndromes e quadros psicológicos, neurológicos ou psiquiátricos que ocasionam atrasos no desenvolvimento e prejuízos no relacionamento social, em grau que requeira atendimento educacional especializado; altas habilidades – notável desempenho e elevada potencialidade em qualquer dos seguintes aspectos isolados ou combinados: capacidade intelectual geral, aptidão acadêmica específica, pensamento criativo ou produtivo, capacidade de liderança, talento especial para artes, capacidade psicomotora.

No dia a dia, temos ainda, demandas específicas de ensino e de aprendizagem que ocorrem também em torno de alunos que apresentam, por exemplo, dificuldades de leitura, de compreensão, de atenção, de comportamento. Assim, o que percebemos é que a escola de hoje vivencia um momento de reflexão em busca de repostas educativas que possam proporcionar ensino de qualidade.

Tratamos, então, aqui neste texto, de alunos com necessidades específicas de aprendizagem como aqueles que destoam da maioria de sua turma e que pelas vias de ensino, que são desenvolvidas e apresentadas a eles, não avançam significativamente em suas aprendizagens, exigindo ações educativas diferenciadas. São estudantes com direito de acesso e permanência no sistema regular de ensino, conforme prevê a Constituição Federal Brasileira de 1988 – interpretando permanência como a possibilidade de efetiva aprendizagem, ou seja, como o cumprimento do papel da escola, que é ensinar.

A partir de tal demanda, pensar a formação inicial e continuada de docentes para uma educação inclusiva requer estratégias de formação que cumpram um papel de analisar a prática e promover diálogos com base em perspectivas teóricas estudadas.

A escola e seu cotidiano são, então, no nosso entender, o espaço e o tempo adequados para formar. Proporcionar aos docentes, em formação inicial, a possibilidade de refletir sobre a prática, com suas rotinas e seus sujeitos é uma necessidade real e não uma complementação curricular, como um “preceito a ser cumprido”.

Pesquisas sobre a formação inicial e continuada têm abordado uma série de questões sobre a construção do saber docente; saber que precisa ser articulado entre a teoria e a prática.

Nunes (2001, p. 36) ao apresentar um panorama sobre a formação de professores no Brasil enfatiza a relevância de “se identificar quais conhecimentos são desenvolvidos pelo professor ao atuar, no âmbito da cultura escolar e das condições mais adversas do seu trabalho.”

Guarnieri (1997, p. 6) que afirma que é preciso:

[...] especificar e estudar as necessárias articulações desses conhecimentos do professor tanto com a prática, quanto com os conhecimentos teóricos acadêmicos da formação básica. Tais articulações possibilitam o desenvolvimento da capacidade reflexiva, que favorece o compromisso com o ensino de qualidade e a competência para atuar.

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A construção de conhecimentos e de saberes adquiridos na prática é tão importante para os professores em formação inicial quanto para aqueles que já atuam, pois para favorecer a perspectiva de ensinar a todos, prevista pelo paradigma da educação inclusiva, novos saberes docentes precisam ser formados. E saberes da experiência são definidos por Therrien (1995, p.

6) como os que:

[...] por serem originários da prática cotidiana da profissão, sendo validados pela mesma, podem refletir tanto a dimensão da razão instrumental que implica num saber-fazer ou num saber-agir, tais como habilidades e técnicas que orientam a postura do sujeito, como a dimensão da razão interativa que permite supor, julgar, decidir, modificar e adaptar de acordo com os condicionamentos de situações complexas.

Aqui se insere a pesquisa/experiência que trazemos, a qual é um projeto em andamento, que envolve docentes e estudantes das séries iniciais do Ensino Fundamental e graduandos do curso de Pedagogia e é desenvolvido no Instituto de Aplicação Fernando Rodrigues da Silveira, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (CAp/UERJ), desde 2007.

Tem como proposta garantir um diálogo constante entre a universidade e a escola básica, com o intuito de: reconhecer necessidades educacionais específicas existentes na sala de aula, refletindo sobre a diferença, sobre limites e possibilidades; buscar, elaborar e aplicar estratégias e recursos pedagógicos, na forma de respostas educativas, para efetivar inclusões escolares.

O referencial teórico é o da reflexão sobre a prática e da prática que ensina, na perspectiva da formação docente; e quanto aos aspectos de inclusão, o suporte teórico é o da pedagogia das diferenças na sala de aula e da diferenciação no ensino.

O Projeto de Iniciação à Docência – Necessidades Especiais em Processos de Inclusão – promove a participação de estudantes universitários em práticas escolares cotidianas, como mediadores nos processos de ensino e aprendizagem de alunos que apresentam diferenças significativas em seus percursos de escolarização, e que resultam em desempenhos acadêmicos desfavoráveis.

Estão envolvidos graduandos do Curso de Pedagogia, da própria universidade, estudantes do 1º ao 5º ano do Ensino Fundamental, docentes do Departamento de Ensino Fundamental do Instituto (DEF). Atualmente, são duas bolsistas que acompanham dois alunos do 1º segmento, de anos de escolaridade diferentes; tais alunos têm necessidades diferenciadas e demarcadas, correm risco de fracassar na vida acadêmica se a escola não apresentar respostas educativas que atendam suas demandas. Há duas professoras, com formação na área de Educação Especial, do próprio Departamento, que coordenam o projeto.

A meta é favorecer a aprendizagem de todos, independentemente de classificações e de acordo com suas necessidades.

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Alunos com características específicas exigem respostas educativas e remoção de barreiras à sua efetiva aprendizagem, para uma real inclusão escolar.

Segundo Ainscow (2004, apud GLAT & BLANCO, 2007), para que sejam garantidas as bases de um processo coerente e digno ao aluno com qualquer necessidade educacional especial é preciso que a proposta de ensino considere três aspectos, os quais são apontados como: a presença, que significa o aluno “estar na escola”, isto é, substituir o isolamento do ambiente privado pela inserção do indivíduo num espaço público de socialização e aprendizagem; a participação, que depende não apenas de “estímulos” de colegas e professores, mas do oferecimento das condições necessárias para que o aluno possa participar realmente das atividades escolares; a construção de conhecimentos, função primordial da escola, sem a qual pouco adianta os outros dois itens anteriores.

Pelo compromisso social da escola em cumprir sua tarefa de ensinar, cria-se um impasse e desconforto quando há alunos na escola, matriculados, com frequência normal, que não avançam em suas aprendizagens porque alguma “diferença” os desfavorece.

Diante da urgência em responder a essa demanda e vislumbrando, ainda, o necessário e possível diálogo entre a universidade e a escola básica, este projeto de iniciação à docência estabeleceu como estratégia de atuação ter a presença de alunos bolsistas, do curso de Pedagogia, como interlocutores participantes dos processos de inclusão.

Os graduandos atuam como mediadores do conhecimento nas turmas onde os alunos que exigem respostas educativas adequadas às suas necessidades estão alocados, promovem o entendimento e o envolvimento com o que é ensinado, por meio do diálogo, variação de linguagem, momentos de ensino individualizado, refletindo junto com os docentes das turmas sobre as possíveis adaptações nos instrumentos e meios de avaliação.

A mediação intenciona dar outra qualidade às interações das crianças com o conhecimento, com seus pares e professores, há a busca de alternativas diferentes das até então vivenciadas, o que corrobora em novos comportamentos, outros entendimentos. Daí a necessidade de diálogo entre a universidade, com seus saberes teóricos, e a escola básica, com suas demandas e seus próprios saberes.

Assim, diante das ações implementadas pelo projeto aqui apresentado, o aluno graduando, profissional da educação que está se formando, vai constituindo seu perfil e fazendo suas opções teóricas. Tem a oportunidade de “ver na prática” os desafios do cotidiano, de atuar junto a sujeitos reais, em contextos também reais, de viver a experiência escolar, trocando saberes com professores em pleno exercício profissional.

Recorrendo a Nóvoa (1992a), verificamos que “a formação não se constrói por acumulação (de cursos, de conhecimentos ou de técnicas), mas sim através de um trabalho de reflexividade crítica sobre as práticas e de (re)construção permanente de uma identidade

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(p. 25). E segundo Therrien (1995), “o saber de experiência como elemento de prática docente é a expressão de um saber social próprio produzido numa práxis cotidiana” (p.411).

Estudantes de graduação que participam do projeto demonstraram como a prática precisa ser vista à luz da teoria e como os conhecimentos teóricos necessitam de adequações para aplicação cotidiana; além disso, professores experientes apontam como outro mediador em sala de aula favorece e permite a inclusão escolar de alunos que exigem respostas educativas específicas em relação às suas necessidades.

A fala de uma das alunas participantes do projeto, que cursa o 6º período de Pedagogia, revela suas aprendizagens:

Viver a experiência de estar presente no ambiente escolar, tendo acesso direto aos profissionais da educação, vem possibilitando uma interação entre teoria e prática. A Universidade fornece um ensino baseado na teoria, não nos tornando totalmente preparados para o exercício da profissão. Logo, fazer parte de um projeto que fornece o que faltava para minha formação acadêmica, e futuramente profissional, é de grande valia, não só pelo contato com a prática em si, mas por estar lidando com a inclusão, vivendo a experiência, na prática, de como devemos adaptar a instituição escolar para que possa receber alunos com necessidades específicas e fornecer a eles um ensino que os atenda, assim como atende aos demais.

Além disso, a relação de troca que existe entre mim e os alunos que acompanho é de grande significância, o que torna o trabalho prazeroso e gera compromisso e empenho para quebrar as barreiras que enfrentamos diariamente por trabalhar com a diversidade.

O cotidiano forma e os docentes agem por saberes que são experimentados, onde a experiência provoca um efeito de retorno aos saberes adquiridos antes ou fora da prática profissional. Segundo Fernandes (1997) “a prática é dinâmica, as situações concretas não são passíveis de definições acabadas e exigem uma cota de improvisação e habilidade pessoal, bem como capacidade de enfrentar situações novas, transitórias e viáveis” (p.116).

A partir dessas posições, consideramos que o saber da experiência, se dá na prática, por isso apontamos a importância em dar ênfase à prática como meio de aprendizagem.

A prática possui um papel determinante na atividade educativa, Perrenoud (1993, p.

130) coloca que “ensinar é resolver problemas, tomar decisões, agir em situação de incerteza e, muitas vezes, de emergência.” Deste modo, a prática não é uma simples concretização de receitas, modelos didáticos ou esquemas conscientes de ação. Muitos atos são inconscientes e sendo a prática dirigida pelo habitus do professor, “esquemas de pensamento e de ação que alicerçam as inúmeras microdecisões tomadas na sala de aula” (idem, p.12). Segundo Perrenoud (ibdem, p. 108-109) “o habitus é formado por rotinas, por hábitos no sentido comum da palavra, mas também por esquemas operatórios de alto nível”; e ainda, “o habitus pode-se construir não em circuito fechado, mas à medida de uma interação entre a experiência, a tomada de consciência, a discussão, o envolvimento em novas situações.”

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O autor toma por empréstimo esse conceito elaborado por Bourdieu (1980 apud PERRENOUD, 1993), que o apresenta como um conjunto de esquemas que fundamentam as ações práticas adaptadas às situações presentes, essa noção permite articular consciência e inconsciência, razão e outras motivações, decisões e rotinas, improvisação e regularidades, é uma “gramática geradora de práticas”, uma matriz de onde são multiplicadas inúmeras ações cotidianas, no caso, do professor.

Encontramos também em Caldeira (1993) considerações sobre a prática docente, “pode- se observar nas escolas práticas de naturezas distintas — o saber docente cotidiano está constituído tanto por saberes científicos como pelo saber da experiência” (p.60, tradução livre).

E “os conteúdos do conhecimento do docente se apresentam centrados mais sobre a experiência do que sobre o conceito” (p.36, tradução livre). A autora ressalta, ainda, a importância de considerar que a formação continuada é também construída no cotidiano escolar, logo, na prática, e que novas práticas se realizam através de certos saberes e novos saberes são produzidos em torno das práticas.

Os professores aprendem a ensinar na prática, logo, a prática ensina. E esse conhecimento prático, Clandinin e Connelly (1988, apud CALDEIRA, 1993) definem como

“um conjunto de convenções conscientes ou inconscientes que surgem de experiências íntima, social e tradicional e que se expressam nas ações pessoais” (p.35, tradução livre).

O estudante em formação inicial pode ser o intermediador de reflexões e de promoção de “confronto” entre a realidade e o discurso, ao contribuir, com sua experiência vivida, durante suas aulas no curso de Pedagogia. É possível, ainda, enxergar que se este diálogo for estabelecido no ambiente acadêmico de formação inicial, professores da graduação também passam a participar desse processo de formação de novas identidades, ou seja, professores formadores podem apropriar-se de práticas contextualizadas para realizar reflexões teóricas, que resultem em variadas ações, em processos de formação.

Os professores regentes, por sua vez, que têm presente em sua turma sujeitos com necessidades específicas, que perguntam(-se) “como eu posso ensinar esse aluno?”, são profissionais da era da inclusão, que não mais poderão esperar turmas “homogêneas” (se é que isso foi algum dia possível), que não mais verão como “normal” a exclusão de alguns, como se fosse uma “seleção natural”. São professores em busca de colocar em prática o discurso

“politicamente correto” da educação de qualidade para todos.

O relato de uma professora do 2º ano revela a possibilidade concreta de diálogo entre novos atores sociais presentes na sala de aula:

A presença de uma bolsista em sala de aula tem provocado em mim inúmeras e ricas reflexões. Uma delas se refere à importância de compartilhar com outros sujeitos os acontecimentos vividos na aula, no momento mesmo em que acontecem. Diferente da narrativa que se produz após o acontecimento para outras colegas da mesma série. Uma bolsista em turma está vivendo a

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discussão quase que instantaneamente. Impressões e alternativas podem ser pensadas ainda no calor do acontecido. Tenho a oportunidade de repensar o que havia inicialmente pensado, pois posso confrontar a minha análise com outras. Sou convidada pelo olhar do outro (a bolsista) a sair do lugar de onde via e analisava para me colocar em outro lugar, a ter outro ponto de vista. Outro aspecto importante desse processo é que mesmo em processo de formação inicial (são alunas da graduação), estas estudantes possuem experiências de vida que lhes permite ter sobre os alunos e sobre os processos de ensino e aprendizado, opiniões, avaliações e propostas. As bolsistas não apenas aprendem a serem melhores professoras acompanhando nossas aulas no CAp mas também nos ajudam, nos ensinam, a ser melhores docentes.

A verificação do resultado da ação na hora em que acontece, é o que Schön (1992) denomina “reflexão na ação e sobre a ação”. E, a partir de Zeichner (1993) confirmamos que

“os professores reflexivos examinam o seu ensino tanto na ação como sobre ela. Estes conceitos de reflexão na ação e sobre a ação baseiam-se num ponto de vista do saber, da teoria e da prática, muito diferentes do que tem dominado a educação” (p.21).

Daí a necessidade de viver a experiência de outros atores sociais em sala de aula, como professores de apoio, que atuam junto, numa relação de trabalho colaborativo.

Outro docente em sala de aula pode favorecer a compreensão das necessidades, pode estabelecer planejamentos individualizados de ensino, adequar instrumentos de avaliação, numa ação conjunta e dialogada com os docentes de referência da turma.

Se há demandas específicas para alunos que exigem: estratégias diferenciadas, mais tempo de ensino e experiência escolar, intervenções pedagógicas individualizadas, há a necessidade de mais mão de obra para atender a tais demandas. Ou seja, há a necessidade de mais profissionais envolvidos na execução de propostas de inclusão.

São estratégias e recursos alternativos que precisam ser usados no dia a dia da sala de aula, que devem ser pensados e construídos de acordo com a necessidade dos estudantes e a partir da observação cuidadosa e da interação constante que os docentes realizam em suas práticas.

É a promoção da diferenciação no ensino, tal concepção fica bem explicitada nas idéias de Perrenoud, exploradas por André (1999):

Diferenciar é dispor-se a encontrar estratégias para trabalhar com os alunos mais difíceis. Se o arranjo habitual do espaço de sala não funciona com esses alunos, se os livros e materiais didáticos não são adequados para eles, se, enfim, as atividades planejadas não os motivam, é preciso modificá-las, inventar novas formas, experimentar, assumir o risco de errar e dispor-se a corrigir. Diferenciar é, sobretudo, aceitar o desafio de que não existem respostas prontas, nem soluções únicas; é aceitar as incertezas, a flexibilidade, a abertura das pedagogias ativas que em grande parte são construídas na ação cotidiana, em um processo que envolve negociação, revisão constante e iniciativa de seus atores (p.22).

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Não se trata de favorecer uns em detrimento de outros. Diferenciar estratégias, individualizar ensino, usar recursos diversificados e variadas linguagens, flexibilizar tempo e espaços escolares, rever critérios de avaliação e promoção, são novas aprendizagens docentes, que exigem novas dinâmicas escolares.

Diferenciar é, sobretudo, aceitar o desafio de que não existem respostas prontas, nem soluções únicas; é aceitar as incertezas, a flexibilidade, a abertura das pedagogias ativas que em grande parte são construídas na ação cotidiana, em um processo que envolve negociação, revisão constante e iniciativa de seus atores (ANDRÉ, 1999, p.22).

Construir novas práticas, buscar saídas pedagógicas que favoreçam e atendam as variadas demandas de sala de aula, tanto de professores quanto de alunos, é um caminho a ser construído na reflexão sobre a ação, na dialogia e na interlocução.

Neste sentido, reforçamos que “a reflexão sobre a ação é um componente essencial do processo de aprendizagem permanente em que consiste a formação do profissional”

(ARGYRIS, 1985 apud GÓMEZ, 1992, p.105).

Refletir sobre a prática nos remete à formação docente, e Zeichner (1993) aponta que a melhoria da qualidade de ensino pode começar, também, pela reflexão da própria prática,

“reflexão também significa o reconhecimento de que o processo de aprender a ensinar se prolonga durante toda a carreira do professor” (p. 17).

Cabe ressaltar que o projeto apresentado – Necessidades Especiais em Processos de Inclusão – do CAp-UERJ tem limites que precisam ser superados, tais como: organizar um tempo comum entre os professores e demais envolvidos no processo de inclusão (bolsistas, coordenadoras do projeto) – falta tempo na escola; favorecer maior interação com as famílias, envolvendo além dos professores regentes das turmas, os alunos bolsistas e coordenadores do projeto; viabilizar espaço físico (uma pequena sala) para momentos de individualização no ensino ou em situações de avaliação – falta espaço físico na escola; buscar uma via de maior comunicação com professores das graduações, para efetivar trocas e ver-se cumprir a tarefa social da universidade pública.

Concluímos, assim, que para qualquer processo de inclusão ter sucesso é preciso que passe pela reflexão dos professores, reflexão sobre suas práticas de exclusão, de desconhecimento, de estagnação diante do diferente, de experiências de sucesso, de novos caminhos experimentados. Reflexão que só se dá no âmbito do coletivo, na troca com outros, que requer espaço de diálogo.

A formação de novos saberes docentes, numa perspectiva de um trabalho colaborativo, é condição para que ocorram efetivos processos de inclusão escolar, e isto pode ter maior garantia a partir do diálogo entre a universidade e a escola básica.

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Referências

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