• Nenhum resultado encontrado

A representação feminina na publicidade brasileira: linha do tempo 1

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2022

Share "A representação feminina na publicidade brasileira: linha do tempo 1"

Copied!
15
0
0

Texto

(1)

A representação feminina na publicidade brasileira: linha do tempo

1

Larissa Rodrigues NATALINO

2

Wagner ARCIONI

3

Universidade Federal de Juiz de Fora, MG Centro Universitário do Leste de Minas Gerais, MG

Resumo

Esta pesquisa teve como principal objetivo investigar se as mudanças de paradigmas sociais femininos refletem na maneira como o discurso publicitário é proferido e na imagem representada da mulher. Para a compreensão desta relação entre a mulher e a publicidade, foram selecionados momentos marcantes para a história da mulher brasileira e investigadas peças publicitárias destes períodos, proporcionando um entendimento de como o contexto histórico feminino foi representado na prática publicitária. Através da revisão histórica que resultou em uma linha do tempo da presença da mulher na publicidade, constatou-se que o perfil feminino representado ao longo da história, vem seguindo uma dualidade que inferioriza a mulher, de um lado a imagem de “rainha do lar”, mãe e esposa a do outro a objetificação do seu corpo apresentado como um objeto de deleite masculino. Porém, conclui-se que a tendência do femvertising de 2014, que busca do empoderamento feminino para persuadir, aponta para uma possível mudança nas marcas que levando em consideração a pressão pública, têm buscado cada vez mais produzir propagandas levando em consideração os aspectos éticos e morais.

Palavras-chave: História da Publicidade; Mulheres; Brasil; Linha do tempo.

1. Extra! Extra! A publicidade chegou ao Brasil!

Os anúncios se iniciaram no Brasil em 1808, com a fundação do jornal Gazeta do Rio de Janeiro, que surgiu com a transferência da corte portuguesa ao Brasil. Ramos e Marcondes (1995, p.15-16) apontam que, a presença feminina nos primeiros anúncios brasileiros, se

1 Trabalho apresentado no GT História da Publicidade e da Comunicação Institucional integrante do VI Encontro Regional Sudeste de História da Mídia.

2 Mestranda do Curso de Comunicação da Universidade Federal de Juiz de Fora. Bolsista CAPES, integrante do grupo de pesquisa cadastrado no CNPQ Laboratório de Mídia Digital, email: larissa.rodriguesnatalino@gmail.com

3 Orientador do trabalho. Professor no Centro Universitário do Leste de Minas Gerais (UNILESTE-MG). Mestre em Administração pela Faculdade de Economia e Administração (FEAD). e-mail: warcioni@gmail.com

(2)

constituía na procura e oferta de empregadas domésticas, e também na venda, aluguel de escravas, e anúncios de fugitivas, que contavam com a enumeração das suas características físicas.

Enquanto os primeiros anúncios surgiam, a situação da população feminina no Brasil continuava muito precária. De acordo com Del Priore (2007, p.408), as mulheres do século XIX eram “excluídas de uma efetiva participação na sociedade”, não tinham acesso ou possibilidades de ocuparem espaços e exercerem cargos que os homens exerciam. Elas

“(...) ficavam trancadas, fechadas dentro de casas ou sobrados, mocambos e senzalas, construídos por pais, maridos, senhores” e segundo a autora, até mesmo na arte as mulheres eram representadas de acordo com o interesse e com a visão masculina.

2. A “Rainha do Lar” e a eclosão das revistas (1889 a 1930)

Após a Proclamação da República (1889) e nos primeiros anos do século XX, de acordo com Del Priore (2007, p. 448), a educação feminina começa a ser implementada. Os cursos voltados para as mulheres, ainda eram ligados à função materna e a outras características tidas como femininas. Nesta mesma época, foram criadas as revistas no Brasil, que encontrariam nas mulheres o seu público-alvo.

A revista A Cigarra (1914-1954), por exemplo, foi uma revista voltada principalmente ao público feminino que alcançou muito sucesso no Brasil e em outros países, principalmente na Argentina. É possível perceber na revista como a imagem da mulher na publicidade era estritamente e unicamente ligada à feminilidade e aos afazeres domésticos, não correspondendo à realidade das mulheres brasileiras daquela época, que já estavam entrando no mercado de trabalho ocupando-se de diversas atividades como:

lavagem de roupas, feitura de pequenos artesanatos, limpeza de casas, serviços como costureiras autônomas ou operárias em oficinas de costura (SALVETTI, 2011, p.114).

A compra e venda de escravos e anúncios de imóveis nos jornais, cedeu espaço aos

anúncios de revistas, da indústria farmacêutica e de produtos importados e locais. Estes

anúncios em revistas, segundo Ramos e Marcondes (1995, p.22 e 24) deram início ao

negócio de propaganda no país. Além da representação feminina já apresentada ligada à

feminilidade e afazeres domésticos, é possível perceber a erotização da mulher em diversos

(3)

anúncios já no início do século XX. Como nas publicidades do Guaraná Espumante, que traziam uma índia seminua para anunciar o e também nas peças dos produtos Pasta Russa (1917) que visavam aumentar o tamanho e a “beleza dos seios da mulher” (Figuras 1 e 2).

Figuras 2 e 3 – Anúncios com a figura feminina erotizada

Fonte: Propagandas Históricas, 2013.

A indústria farmacêutica brasileira crescia, quando a partir de 1920, marcas internacionais chegaram com muita força no Brasil, e elegeram as mulheres como seu grande público-alvo pois “(...) à ‘Rainha do Lar’ cabiam as decisões dos gastos diários (...).

Prover a casa ainda era tarefa masculina, todavia, na hora de decidir por produtos e marcas, a mulher dava a palavra final” (BUENO, 2008, p.62).

Além das diferenças claras de papeis exercidos por homens e mulheres, elas eram comumente tidas como um sexo inferior. Segundo Salvetti (2011, p.164), existiram estudos no final do século XIX e início do século XX, que apontavam limitações “(...) nas mulheres quanto à capacidade de operações mentais e cognitivas e ao poder de ambição, quando comparados o seu ao crânio masculino.” Elas eram julgadas, com aparo cientifico como indivíduos naturalmente com distúrbios emocionais, e por isso, existiam tantos anúncios que prometiam ajudar a solucionar seus problemas “mentais” e “hormonais”. De acordo com a autora (2011, p.164) “As mulheres foram as candidatas preferenciais ao uso de analgésicos da Bayer para solucionar dores e cansaço mental, que levavam a

‘descomposturas emocionais’.”

Outro produto comumente anunciado às mulheres eram os remédios ginecológicos

que prometiam acabar com as dores e sintomas provenientes do período menstrual. O

(4)

remédio A Saúde da Mulher, lançou um almanaque totalmente voltado ao público feminino, que surgiu a partir do lançamento do medicamento ginecológico.

Pode-se perceber como a beleza e a estética feminina eram muito exploradas na publicidade dos anos 20. Ramos e Marcondes (1995, p.31) destacam que marcas como a Odol apostavam no apelo cosmético nas revistas, deixando de lado o aspecto farmacêutico de seus produtos. É possível notar nos textos publicitários deste período, uma abordagem mais lúdica que busca persuadir as mulheres atribuindo valores à aparência, status, beleza e moda.

Figuras 15 – Anúncio do sabonete para o couro cabeludo Aristolino

Fonte: Propagandas Históricas, 2015.

A influência europeia, principalmente francesa, acarretou numa mudança dos papeis sociais atribuídos aos homens e mulheres de classe média e alta brasileira, nos anos 20.

Com a entrada da mulher no mercado de trabalho, seu papel como consumidora foi elevado como aponta Bueno (2008, p.63): “De olho nessas consumidoras em potencial, a propaganda explorava o modelo da mulher esportiva, liberada, que fumava e dirigia, cultivando um estereótipo que, não por acaso, surgiu nessa época: o da melindrosa”

Além de sua valorização como consumidoras, a mulher também começou a ser

representada na publicidade de acordo com as funções profissionais que exerciam. As

professoras, por exemplo, foram amplamente utilizadas pelos anúncios (Figura 18) como

influenciadoras de opinião. Suas recomendações, além de apresentarem uma confiança a

nível maternal, também davam um aval quase que cientifico aos produtos, “quanto aos seus

(5)

benefícios para o desenvolvimento físico e o aprendizado escolar de crianças.”

(SALVETTI, 2011, P.162).

A influência europeia dos anos 20 ao Brasil, também foi refletida na moda feminina da burguesia, trazendo mudanças aos apertados espartilhos, que de acordo com Del Priore (2000, p.65), começou “a ser substituído pelo ‘corpinho’. Se os primeiros salientavam os seios como pomos redondos, o corpinho deixava-os mais livres e achatados.”

A industrialização começou a chegar ao Brasil após o fim da Primeira Guerra Mundial (1918). No primeiro momento suas inovações refletiram apenas à parte mais rica da população, porém, ela trouxe mudanças na divisão sexual do trabalho, e as mulheres começaram a ocupar um maior espaço nesse mercado.

Esse progresso feminino, no entanto, precisa ser tomado com cautela, uma vez que havia certos limites para a aspiração feminina, as ofertas disponíveis, em geral, estavam próximas daquilo que se considerava uma extensão das atribuições das mulheres: professora, enfermeira, datilógrafa, secretária (PINTO, 1999)

Outros frutos da industrialização foram as primeiras transmissões regulares das emissoras de rádio no Brasil, ainda na década de 20, porém foi a partir de 1930 que elas começaram a ganhar muita popularidade no país.

3. As mulheres nas ondas do rádio (1930 à 1950)

Nos primeiros anos de transmissão do rádio, seu público era formado pelas elites brasileiras, já que o acesso ao aparelho era limitado a elas, e ainda não havia a presença da publicidade. Esta surgiu mais tarde, com o patrocínio de programas. Após a revolução de 1932, e com o movimento Modernista, houve uma grande valorização da indústria e da cultura brasileira de forma geral, o que ocasionou uma evolução mais rápida da publicidade no país (RAMOS E MARCONDES, 1995, p.37), inclusive a radiofônica, dando início à criação de spots

4

, programas associados às marcas e aos jingles

5

. As mulheres sempre foram um grande público para a indústria radiofônica, uma vez que ainda passavam muito tempo em suas casas desenvolvendo o trabalho doméstico.

4 Publicidades de rádio.

5 Publicidades de rádio em formato de música.

(6)

Nos anos 30, os ideais feministas começaram a ganhar força no Brasil. É possível perceber sua influência na figura da mulher retratada na publicidade desta década. A independência feminina passou a ser mais representada na publicidade, porém, a imagem da mulher continuava estritamente ligada aos filhos, marido e atividades domésticas.

A indústria farmacêutica continuou anunciando para elas, pois, como apontado anteriormente, cabia às mulheres a decisão de compras de remédios para a sua família. É possível perceber no comercial radiofônico da Auris-Sedina, um remédio para dor de ouvido, como a construção do texto publicitário se dirige diretamente às mães: “

Se a criança acordou / Dorme, dorme filhinha / Tudo calmo ficou / Mamãe tem Aurissedina” (Antônio Maria, anos 50).6

Este tipo de comercial era comum na rádio nos anos 50, dado o grande número de ouvintes mulheres. A presença das mulheres na rádio, segundo Veloso (2005, p.53), pode ser destacada pelas cantoras de novelas e musicais. Porém, como aponta a autora “(...) O grande sucesso das cantoras contrastava com a fraca presença das mulheres na operacionalização, na locução e em cargos de chefia das emissoras.”, indo de encontro ao modelo machista hierárquico presente nas diversas indústrias brasileiras no mesmo período. O estilo das músicas das cantoras de novelas foi amplamente utilizado nos comerciais de rádio. E cantoras como Ângela Maria e Carmem Miranda, foram garotas propagandas para marcas de diversos produtos, tanto na rádio como em anúncios impressos.

A indústria radiofônica, só foi perder sua força com a chegada da televisão nos anos 50. Mesmo assim ela manteve sua posição hegemônica até a Copa do Mundo de Futebol de 1958, em que houve uma maior popularização dos aparelhos de televisão.

4. No ar, as garotas da propaganda (1950 a 1990)

Os anos 50 no Brasil trouxeram inúmeras inovações na área tecnológica e industrial do país, trazendo também mudanças sociais. A sociedade passa a adquirir com ainda mais veemência o hábito do consumo e as mulheres ganham uma maior preocupação com a

6 Jingle disponível em: http://www.locutor.info/audiojingles.html. Acesso em: 01 out. 2020

(7)

estética e começam a ocupar mais cargos fora de casa, enquanto o trabalho doméstico é facilitado com a chegada dos eletrodomésticos. Na publicidade da época, de acordo com Soares (2006), é possível perceber como os anúncios dos produtos refletiam, e ao mesmo tempo influenciavam esses novos hábitos das mulheres.

Esta nova forma de viver, influenciada pelo american way of life, é de acordo com Krause (2014, p.2), “baseada na aquisição de produtos e no ideal de uma família que tem na mulher dona de casa a principal força feminina chamada de ‘rainha do lar’.” A publicidade nesse período, segundo a autora (2014, p.4) apresenta as formas de utilizar esses novos produtos que chegaram ao país e suas facilidades para a família brasileira. E foi neste contexto que surgiram as primeiras transmissões da TV brasileira.

Os primeiros comerciais de TV eram feitos ao vivo e com slides de forma monótona, como aponta Ramos e Marcondes (1995, p.57), mas logo se fez necessária “A ideia de utilizar uma pessoa ao vivo para apresentar um produto” (ALBUQUERQUE e SCHWARTZ, 2013, p.01), surgindo então, as famosas garotas-propaganda. Elas eram jovens atraentes que em um primeiro momento faziam apenas parte do cenário do comercial de TV, mas que logo se tornaram as grandes anunciadoras dos produtos ofertados.

Albuquerque e Schwartz (2013, p.2) revelam que, a primeira experiência com garotas-propaganda foi realizada em 1952, com Rosa Maria. Ela apresentava uma oferta da loja de artigos femininos, Marcel Modas, e “segundo documentos da grande imprensa, o impacto foi tão significativo, que no dia seguinte, o movimento da loja aumentou.”

(ALBUQUERQUE E SCHWARTZ, 2013, p.2). Rosa Maria passou a aparecer

diariamente, no mesmo horário, apresentando diferentes ofertas com o texto “Eis aqui a

Tentação do Dia.” Assim como muitas outras garotas-propagandas que viriam depois dela,

a jovem se tornou uma celebridade de televisão. De acordo com as autoras (2013, p.6),

além de famosas, as garotas-propaganda eram as profissionais mais bem pagas da TV e o

estilo de comerciais de televisão com sua presença foram adotados fortemente por um

grande período de tempo.

(8)

Outro estilo de comerciais amplamente utilizados nos primórdios da televisão brasileira que contavam com a presença das mulheres, eram os comerciais que continham jingles. Muitas vezes eram cantados nas vozes femininas, em um estilo que já vinha sido muito usado nas propagandas da rádio, já que, no período de surgimento da televisão ela adotou diversos elementos da linguagem radiofônica. No comercial do sabonete Gessy

7

, é possível perceber este caráter lúdico do jingle que buscava persuadir as mulheres telespectadoras despertando o sentimento de admiração com as atrizes do comercial.

A publicidade na televisão começou a se profissionalizar, e o foco saiu do produto e foi para o consumidor. Nesse período, é possível apontar o abandono da das garotas propagandas em sua forma clássica, mas nos anúncios voltados às mulheres a figura feminina ainda se encontrava estritamente ligada ao lar. Já a imagem de mulher independente, era na maioria das vezes retratada em anúncios para os homens, carregada de erotização para seduzir e vender para eles.

A partir da década de 60, o movimento feminista começou a ganhar força no Brasil, trazendo mudanças nos hábitos das mulheres. Com a ditadura militar brasileira que se instala em 1964, o movimento feminista no país sofre, ganhando forças novamente na década de 70. É importante salientar que neste período a publicidade brasileira sofreu mudanças e se submeteu à censura, e passa a representar duas diferentes versões femininas:

uma ligada ao lar e outra erotizada.

Em 1972, ocorre a primeira transmissão em cores da TV brasileira, o que abre ainda mais possibilidades para os comerciais que se tornam mais criativos, passam a explorar temas tidos como tabu e apelam para as emoções dos consumidores para persuadi-los. A autora (1995, p.44) destaca os comerciais de absorvente higiênicos que passam “a ser apresentados de forma mais atraente sem os eufemismos usados anteriormente.” O que é possível perceber no comercial do novo modelo do absorvente Modess

8

, que mostra uma

7 Comercial Sabonete Gessy dos anos 50 disponível em:

<https://www.youtube.com/watch?v=xzuqsGQ3djs>. Acesso em: 01 out. 2020.

8 Comercial disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=Lu1NGJvrlSQ

(9)

mulher com roupas típicas dos anos 70, pilotando uma moto e tem o seguinte texto:

Modess mudou, porque as mulheres mudaram.

Apesar das mudanças nas vidas das mulheres, nos comerciais de televisão das décadas de 70 e 80 elas ainda eram majoritariamente representadas apenas na dualidade apresentada previamente:

(...) de um lado a solteira, bela e jovem, que era mostrada de forma erotizada, servindo de objeto de desejo sexual. Serviam, também, de modelo de beleza para outras mulheres e de isca na propaganda de produtos dirigidos ao público masculino. Por outro lado, a mulher adulta, casada, mais recatada, séria, era a mãe, a dona de casa. Este tipo servia para os anúncios de produtos das categorias de limpeza, alimentação e de serviços domésticos (LIMA, 2008, p.24-25).

Em 1978, surgiu o CONAR – Conselho de Autorregulamentação Publicitária, o que obrigou os anunciantes desenvolverem uma publicidade mais responsável, uma vez que o conselho passou a ser acionado frequentemente, rendendo punições as propagandas que feriam os preceitos da ética publicitária. Nesse período, a mulher ocupava cada vez mais espaço na sociedade, exercendo diversas tarefas, dentro e fora de casa.

A partir dessa posição social da mulher como consumidora, a publicidade começa a abordar a imagem feminina além da dona de casa, mãe e a mulher objeto. A figura feminina na publicidade também passa a ter mais diversidade racial, de idade, física e elas são representadas exercendo as diversas funções, papeis sociais e profissões que realmente realizam na sociedade, como estudante, profissional, amiga e jovem, aparecendo em publicidades de diversos produtos e para diversos públicos.

Apesar de a mulher ter ganhado um novo espaço na publicidade, a partir da década de 80, diversas campanhas publicitárias continuaram a explorar a sexualidade e sensualidade feminina para vender.

A nudez ou semi-nudez feminina, passou a ser amplamente utilizada para a venda

de diversos produtos ao mesmo tempo que a publicidade também adotou um caráter mais

cinematográfico com temas sensíveis sendo abordados, como o primeiro beijo e a compra

(10)

do primeiro sutiã, presente no cormecial Primeiro Soutien (1998)

9

, apontado como um dos cases de maior sucesso internacional da publicidade Brasileira.

Os anos 90 trouxeram mudanças sociais para as mulheres, impulsionadas a partir da Constituição de 1988. Com o amparo da lei, agora mulher ocupava um local de maior igualdade com o homem. O sucesso na vida profissional das mulheres se tornou um grande motivo de sua preocupação e ao mesmo tempo também, a procura pelo corpo perfeito dentro do padrão de beleza vigente na sociedade, e amplamente valorizado pela publicidade, se tornou um dos maiores marcos na personalidade da mulher da década de 90 (SOARES, 2006, p.29).

Além da cobrança estética, a publicidade voltada para a mulher nos anos 90, também passou a dar mais atenção à saúde feminina. Campanhas contra o câncer de mama se iniciaram nessa década e também o uso do preservativo foi incentivado. Logo esta década, seja a partir da criação e reforço de padrões de beleza por meio da publicidade, ou pela valorização da saúde da mulher, de uma forma ou de outra, trouxe grande mudanças para a vida das mulheres.

5. Era digital: as novas mulheres e os novos caminhos para a publicidade (1990 a 2017)

A era virtual da publicidade, tal qual se encontra hoje, teve seu início na década de 1990, mas se solidificou a partir de 2000. Para Ramos e Marcondes (1995, p.151), as maiores tendências dessE período publicitário, são a segmentação e o lançamento de novos produtos.

Com a popularização da Internet, a sociedade é marcada pela modernidade líquida (BAUMAN, 2001), onde nada é imutável e tudo é facilmente dissolvido. Bauman (2008, p.20) também aponta uma transformação dos consumidores em mercadorias, e segundo ele, esta é a característica mais proeminente da sociedade de consumidores que nos encontramos hoje. De acordo com a relação apontada por Bauman, pode-se destacar as campanhas de bebidas alcoólicas que passaram a utilizar frequentemente do corpo

9 Comercial disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=2Cxt_qi4aiw. Acesso: 14 out 2020.

(11)

feminino como objeto de venda a partir dos anos 2000. A imagem erotizada da mulher se tornou uma mercadoria na venda de diversos produtos, principalmente de cervejas.

Figura 37 – Campanha Invenções da Skol: “Pelada” de 2006

Fonte: Adforum, 2006

A posição objetificada e de inferioridade em que as mulheres são colocadas nos comerciais de cerveja, se contrastam do perfil feminino dos anos 2000. As mulheres, que já estavam inseridas no mercado de trabalho e contavam com o amparo de leis específicas como a Lei Maria da Penha

10

, encontraram uma diminuição de diferenças sociais entre elas e os homens, com muitos direitos assegurados, seus desafios passaram a ser administrar a dupla jornada de trabalho.

Essa nova vida feminina em que a mulher mais do que nunca é pressionada a não só a cuidar da casa e da família, mas também a ser bem sucedida no mercado de trabalho, é muitas vezes retratada na publicidade que busca facilitar todos seus “afazares”. É possível perceber a valorização da dupla jornada de trabalho feminina em diversas campanhas publicitárias, principalmente nas propagandas de produtos de limpeza.

Figura 38 – Post no Twitter do produto de limpeza Mr. Músculo (2015)

10 Lei Maria da Penha - Lei 11340/06 | Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006 que cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher.

(12)

Fonte: Revista Forum, 2015

Percebe-se que a questão de gênero, inclusive sobre a maneira que a mulher vem sendo representada na publicidade, tem ganhado destaque nas redes sociais digitais. Com essas discussões em pauta e com a consciência de que as mulheres são um grande público que são responsáveis pelas decisões de compra dentro dos núcleos familiares, a publicidade passou por algumas mudanças quanto a representação feminina.

Tal mudança de posicionamento pode ser percebida em uma nova modalidade publicitária, o Femvertising. Este termo que ganhou força em 2014, é definido pelo SheKnows Media’s iBlog Magazine (2014) em tradução livre, como a “publicidade que utiliza de talento pro-feminino, mensagens e imagens para empoderar mulheres e garotas”.

De acordo com Becker-Herby (2016, p.6), as campanhas publicitárias com essas

mensagens positivas e de empoderamento para o público feminino, começaram com a

campanha americana da Dove Real Beauty em 1994, que ganhou diversas outras peças e

influenciou campanhas publicitárias a seguirem o mesmo caminho de representação e

valorização dos diferentes tipos de mulheres. No Brasil, o comercial de televisão “Verão

sem vergonha”, de 2005, abriu ainda mais o posicionamento da marca ao mercado do país,

como aponta Oliveira e Silva (2014, p.7), a música que valorizava as diferentes belezas dos

corpos das mulheres brasileiras e as atrizes “(...) que utilizavam seus trajes de banho sem

medo de mostrar hipotéticos ‘defeitos’ corporais”, era algo muito diferente da representação

feminina em comerciais do mesmo gênero na época, porém deu início a uma tendência que

(13)

pode ser facilmente percebida até hoje: modelos com diferentes tipos de beleza que se aproximem mais das consumidoras.

Segundo o Portal Exame (2014), o comercial, “é o vídeo publicitário mais assistido da história do YouTube, e já supera 164 milhões de acessos” no canal da Dove dos Estados Unidos, além de que acumula milhões de visualizações nas versões legendadas em outras línguas. O filme foi “vencedor do prêmio principal do Festival de Cannes 2013, o Grand Prix. E também tem conceito e criação totalmente brasileiros.” (PORTAL EXAME, 2014).

Outra mudança muito clara na publicidade voltada às mulheres pode ser percebida nas campanhas publicitárias de produtos de beleza. De acordo com Garrini (2011, p. 35) “A padronização social feminina tornou-se o ideal de beleza, de perfeição e de corpo ultramedido (...).”, essa padronização na publicidade vem mudando lentamente, dando lugar à valorização de diferentes tipos de beleza femininas e ao discurso publicitário que passa a ofertar os produtos como forma de valorizar aquilo que a mulher já tem, utilizando do chamado empoderamento feminino. A diversidade feminina racial, física, de idade e até mesmo sexual, vem sido representada e valorizada cada vez mais nas publicidades de produtos de beleza.

6. Considerações Finais

É inegável que existe uma relação simbiótica entre publicidade e sociedade. Porém, através da revisão histórica da publicidade brasileira e das mudanças ocorridas quanto à condição da mulher, foi possível perceber que nem sempre existe uma representação real nas campanhas publicitárias dos papeis femininos exercidos na sociedade.

Pode-se observar que durante muito tempo, em diversos veículos de comunicação,

como nos jornais, revistas, rádio e televisão, existiram duas representações femininas muito

usuais: a imagem da “rainha do lar” ligada à família, com a exaltação de valores femininos

tradicionais e que muitas vezes é utilizada na publicidade voltada às mulheres, e a imagem

da mulher erotizada, em que o corpo feminino é objetificado, reduzido apenas à aparência

física pressionando os padrões de beleza às mulheres e também buscando seduzir o público

masculino para a persuasão.

(14)

Mesmo com as conquistas e mudanças sociais para as mulheres, esses dois perfis femininos continuaram a ser utilizados quase que exclusivamente. Fica claro que dada à influência da publicidade à sociedade, tais perfis podem criar e fortalecer preconceitos que inferiorizam as mulheres e as reduzem a apenas alguns papeis e tarefas que elas podem exercer.

No entanto, com a valorização das discussões acerca as questões de gênero, especialmente nas mídias sociais surgiu à tendência do femvertising, a publicidade que utiliza do empoderamento feminino na construção de sua mensagem. Ao observar as campanhas publicitárias que se apoiam no femversting, é possível perceber algumas mudanças significativas na publicidade quanto à imagem da mulher. Portanto, acredita-se que o femvertising continue sendo utilizado e ganhe ainda mais força no futuro da publicidade que, ao se referir às mulheres, possivelmente adotará cada vez mais um discurso de valorização de sua diversidade, de idade, racial, física e sexual, distanciando-se cada vez mais da representação depreciativa às mulheres. Entretanto, em luz a revisão histórica da presença da mulher na publicidade, compreende-se o desafio e a complexidade para as mudanças de posicionamento das marcas e da publicidade em geral, quanto à representação feminina.

REFERÊNCIAS

ALBUQUERQUE, Maria Elisa Vercesi de; SCHWARTZ, Rosana. Garotas propagandas:

mulheres na propaganda de tv nas décadas de 1950 e 60. São Paulo, 2013. Disponível em:

<http://rosanaschwartz.com.br/site/node/27> Acesso: 26 abr 2020.

BAUMAN, Zygmunt, Vida para consumo: a transformação das pessoas em mercadorias.

Tradução: Carlos Alberto Medeiros. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2008.

BAUMAN, Zygmunt. Modernidade Líquida. Rio de janeiro: Jorge Zahar, 2001.

Becker-Herby, Elisa. The Rise of Femvertising: Authentically Reaching Female Consumers. 2016.

Disponível em: < https://bit.ly/3m3XyqN> Acesso em: 15 mai. 2020.

BUENO, Eduardo. Vendendo Saúde – A história da propaganda de medicamentos no Brasil.

Brasília: ANVISA, 2008. Disponível em:

<http://www.anvisa.gov.br/propaganda/vendendo_saude.pdf.> Acesso em: 11 fev 2020.

(15)

DEL PRIORE, Mary. História das Mulheres no Brasil. 9. ed. – São Paulo: Contexto, 2007.

GARRINI, Selma Peleias Felerico. Percepção e mudança no comportamento de consumo feminino relacionados à beleza e ao culto do corpo no século XXI. 2011. Disponível em:

<http://www2.espm.br/sites/default/files/pagina/projeto_diagramado_selma.pdf> Acesso em: 23 mar 2020.

KRAUSE, Roberta Fleck Saibro. Audiovisualidades do papel feminino nos anos 1950 sob o olhar da publicidade televisiva. COMUNICON SÃO PAULO, 2014. Disponível em:

<www.espm.br/download/Anais_Comunicon_2014/gts/.../GT10_Roberta_Krause.pdf> Acesso em:

27 abr 2020.

LIMA, Juliana Acioly. A imagem do feminino na publicidade contemporânea: estudos de casos.

Fortaleza, 2008. Monografia – Publicidade e Propaganda – Faculdade 7 de Setembro. Diponível em:

<http://www.uni7setembro.edu.br/recursos/imagens/File/publicidade/monografia/2008/mono- acyoli.pdf> Acesso em: 1 mai 2020.

OLIVEIRA, Chirles Virgínia A de; SILVA, Rodrigo Vieira da. Dove: um case de Branding, emoção e beleza. 2014. Disponível em:

<http://www.espm.br/download/Anais_Comunicon_2014/gts/gt_seis/GT06_CHIRLES_OLIVEIRA .pdf>. Acesso em: 15 mai 2020.

PINTO, Maria Inez Machado Borges. Cultura de massas e representações femininas na paulicéia dos anos 20. Rev. bras. Hist. vol.19 n.38. São Paulo, 1999.

PORTAL EXAME. Como nasceu o viral Dove Real Beleza feito por brasileiros. 2014.

Disponível em: <http://exame.abril.com.br/marketing/como-nasceu-o-viral-dove-real-beleza-feito- por-brasileiros/>. Acesso em: 15 mai 2020.

RAMOS, Ricardo; MARCONDES, Pyr; 200 Anos de Propaganda no Brasil - do Reclame ao Cyber-anúncio. Editora: Meio Mensagem, 1995. São Paulo.

SALVETTI, Xenia Miranda. Imprensa e Publicidade na São Paulo dos anos 20: quotidiano das mulheres pobres. São Paulo, 2011.

SHEKNOWS MEDIA’S IBLOG MAGAZINE. Femvertising: A new kind of Relationship between Influencers and Brands. 2014. Disponível em: <

http://www.sheknowsmedia.com/attachments/204/iBlog_Magazine-SheKnows- FemvertisingFeature.pdf> Acesso em: 15 mai 2020.

Soares, Adriana Carla. O USO DA IMAGEM FEMININA NA PUBLICIDADE: Estereótipos femininos das décadas de 50 e 90 retratados na linguagem publicitária. UNIVERSIDADE DO

VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI. Itajaí, 2006.

VELOSO, Ana Maria da Conceição. O fenômeno rádio mulher: comunicação e gênero nas ondas de radio. 2005. Disponível em: <http://repositorio.ufpe.br/handle/123456789/3474> Acesso em: 28 abr 2020.

Referências

Documentos relacionados

14 15 17 17 19 21 22 23 23 25 25 27 31 Supermercados / Mercadinhos Concessionárias de água e luz Loja de eletroeletrônicos Lojas de Vestuário Bancos /

Apesar dessas pesquisas terem contribuído para inserção no currículo dos Cursos de Formação de Educadores de Matemática disciplinas que abordam Educação Matemática, quase não

a ser estudados de modo a se perceber os mecanismos associados a este processo. Um elemento crucial da matriz do biofilme de muitos microrganismos são os

2 — No caso dos projetos a que se refere o n.º 3 do artigo anterior, podem beneficiar do presente Subsistema de Incentivos apenas os promotores referidos no número anterior

O objetivo principal do presente estudo foi avaliar o com- portamento do consumo de oxigênio e da frequência cardíaca durante uma corrida em esteira ergométrica e comparar essas

Ao término de As variedades da experiência religiosa, o filósofo tece considerações gerais sobre seu objeto de estudo: trata- se de um “campo consciente mais seu objeto sentido

AS ESPECIFICAÇÕES E INFORMAÇÕES CONTIDAS NESTE MANUAL SÃO FORNECIDAS APENAS PARA FINS INFORMATIVOS E ESTÃO SUJEITAS A ALTERAÇÃO EM QUALQUER ALTURA SEM AVISO PRÉVIO,

Vale observar também que a temperatura máxima à qual o fluxo de calor sujeita a placa no caso simulado é próxima da temperatura de ebulição, o que corrobora a escolha