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Feminismo segundo Chrysanthème no livro Famílias...¹

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Academic year: 2021

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Feminismo segundo Chrysanthème no livro Famílias...¹

Universidade do Estado do Rio de Janeiro/ UERJ Luciana M.da C. Vieira²i

vieira394@hotmail.com Maria de Lourdes da Silva³

lullua2@yahoo.com.br

Resumo

Este presente trabalho tem como proposta reacender as principais ideias e pensamentos da instrigante escritora Cecília Moncorvo Bandeira de Melo Rebelo de Vasconcelos (1870-1948), pseudônimo de Mme. Chrysanthème, um nome que foi banido dos registros canônicos, mas de prestígio em seu tempo. Ela escreveu num período onde a mulher era minoria no mundo das letras e, como poucas, sobreviveu do seu trabalho. Escrevia dizendo retratar o cotidiano da sociedade, são estes registros feitos em seu livro famílias de 1933, feito em sua maturidade e com ousadia, que pretendemos fazer dialogar com Julio Afranio Peixoto na perspectiva da educação de mulheres e, as representações femininas dentro de uma sociedade patriarcal, numa cidade em ebulição. A jovem Capital Federal do Rio de Janeiro passava por um momento de transformação, onde um conjunto de medidas e diligências seguia com a proposta de domesticar e modelar os habitantes e seus modos e eliminar seus vícios. São muitas e contraditórias as representações sobre a mulher hoje, mais desde quando é assim?

Palavras-chaves: Minoria, Literatura, Educação feminina, Movimentos Feministas e Sociais, Chrysanthème.

Introdução

“As palavras do outro introduzidas na nossa fala são revestidas inevitavelmente de algo novo, da nossa compreensão e da nossa avaliação, isto é, tornam-se bi vocais.” (BAKHTIN) “Tudo se pode escravizar no mundo, menos o pensamento.”

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(Júlia Lopes de Almeida)

Existe uma vasta gama de literatura que investiga a representação da mulher. Como se deu e foi ampliado seu campo de pertencimento para além do espaço privado/doméstico, para o espaço público.

Pretende-se aqui investigar a representação da mulher na obra da Madame Chrysanthème, em seu livro romance Famílias (1933), onde essas representações polarizam os comportamentos, costumes, valores, que capturar as expressões das práticas femininas na sociedade de então, seus investimentos pessoais de enfrentamentos e os seus meios de sustentação, as lutas de legitimação através de reivindicações.

Fatores de submissão social e algumas idealizações sobre a mulher ainda são perceptíveis na sociedade, embora sejam considerados como ultrapassados no contexto social brasileiro do século XXI, algumas marcas resistem e persistem. O movimento feminista e as representações de mulheres buscam ressignificar e redimensionar o papel e o posicionamento da mulher em nossa sociedade.

De acordo com Norbert Elias “... é preciso ser capaz de traçar um quadro claro das opressões sociais que agem sobre o indivíduo” (1995:18) . É diante deste quadro de pressão social sobre a mulher que se faz importante investigar e observar a construção silenciosa das práticas sociais na identidade da mulher.

No século XX, quando o movimento feminista chegou e ganhou força no Brasil, trazendo um novo ideal, apontando um novo comportamento, foi um momento crucial de decisão para as mulheres em optar sobre o rumo a seguir.

1 - Contexto e biografia de Mme. Chrysanthème

Chrysanthéme é o pseudônimo da escritora, jornalista, cronista e contista de prestígio Cecília Moncorvo Bandeira de Melo Rebelo de Vasconcelos, nasceu e faleceu na cidade do Rio de janeiro (1870-1948), escreveu nas melhores e conceituadas editoras do país, iniciou na imprensa em 1907 e permaneceu até 1943, na literatura data de 1912 o início do seu livro “Contos para a Criança”. Dentro da pesquisa feita para catalogar seus livros, encontramos dois livros sem data de publicação, dentre estes livros, apenas um temos o conhecimento de ter sido reeditado por cinco vezes, sendo “Contos Azuis”, de acordo com a informação do jornal Gazeta de Notícias de 1944.

Tanto na imprensa quanto na literatura ela já possuia uma certa idade, na qual podemos dizer uma maturidade, quando começou a escrever.

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Atuante no mercado editorial, era famosa pela sua pena ferina e por sua ironia, falava da mulher num lugar de pertencimento masculino, com sua aguerrida pena provocou diversas reações da crítica pela sua tentativa de romper com os preconceitos da sociedade.

Cecília carregava o sobrenome paterno, porém eram os passos e os ideais de sua mãe, a escritora Carmem Dolores (1852-1910), que seguia. Alcançou fama e prestígio em sua época, mas o discurso escolhido para expressar suas inquietações sobre os espaços proibidos a mulher e as políticas socioeconômicas e culturais, fizeram a escritora não circular nos registros literários nacional. Não é de se estranhar o motivo do porquê ela não configurar nos registros canônicos, seus livros vão de contra o que a sociedade/Estado desejava formar/construir.

Chrysanthème foi casada com o Bacharel Horácio Rebelo de Vasconcelos, e tiveram um filho – Henrique Rebelo de Vasconcelos.

A escolha de dialogar com a escritora Cecília Moncorvo, se dá pelo fato de tentar entender o motivo dela não circular no circuito literário, porque suas obras não foram reeditadas, porque não são restauradas, o porquê do seu apagamento no cenário nacional. Ora, uma vez que suas obras não são restauradas e reeditadas é uma voz que desejam silenciar sem deixar rastros de seus registros.

Em suas poucas obras disponíveis em algumas instituições, podemos encontrar uma narrativa sobre a mulher e a retratação do cotidiano, como seus anseios, suas dificuldades, seus conflitos amorosos e pessoais, os seus contextos sociais, suas críticas, entre outros.

Mme.Chrysanthème sempre abordava temas em evidência e também os esquecidos como: miséria, pobreza, feiura, beleza, seca, educação, infância, desemprego, transformações urbanas e sociais entre outros.

A educação feminina e a conquista do espaço público via trabalho é um dos temas que mais a desafiava, e se dedicava, não era apenas um trabalho, mais sim, um serviço que sustentasse a mulher, que a sua educação fosse também uma conquista intelectual. Para isto ela acreditava que a profissão que mais se adequava à mulher era o professorado, por vir embutido com o dom naturalizado à mulher de educadora e cuidadora.

Como quase toda mulher, Cecília sofreu pressões sociais, calúnias e boicotes, sobre ela paira insinuações sobre um suposto romance com Alcindo Guanabara (1865-1928), devido à sua personalidade forte sofreu represália de suas obras por livreiros, de acordo com a informação do jornal Diário de Notícias de 1935.

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Para sobreviver neste mundo das letras na imprensa, ela passa a dissimular nos jornais, seu estilo é identificável e sua linguagem persuasiva.

Nossa escritora era observadora, examinava minuciosamente a sociedade e seus costumes, e retratava em seus escritos, expondo sua indignação e sua visão sobre o que ela acreditava como verdade.

No ano anterior a publicação do seu livro Famílias, as mulheres conquistaram o direito ao voto, conquista essa adquirida através do movimento feminista, que dava voz as reivindicações das mulheres.

Segundo Santos, “...os movimentos sociais não residem na recusa da política, mas, ao contrário, no alargamento da política para além do marco liberal da distinção entre Estado e Sociedade Civil.”(1994:226).

Dentro do conceito acima, que os movimentos feministas da década de 1930, lutavam para ter acesso ao espaço público, o reconhecimento e a importância da mulher no cenário político-socioeconômico cultural, na busca de sua cidadania, direito a diferença, a sexualidade, colocando em discussão o que é melhor para a mulher.

Getúlio Vargas governa o país num regime provisório (1930 a 1934), após a revolução de 30, por Decreto Lei, numa ditadura informal.

Na década de 1930 a educação feminina foi um dos principais pilares para a emancipação feminina e intelectual da mulher. No período de 1931 a 1934 várias leis e decretos foram promulgados em favor do trabalhador/operário, entre eles a regulamentação do trabalho para as mulheres e para os menores, e o direito a votar. Em 1932 a classe operária passa ser protegida por um Governo tido como forte, autoritário e paternalista, vale ressaltar que a população operária não tinha voz participativa no âmbito político.

O Rio de Janeiro com ar de modernidade, onde o mundanismo e a futilidade se misturam com a moda e festas, mas as transformações urbanas é o cenário e a cidade eleita por Chrysanthème para tecer sua trama romancista Famílias. Ela vê a cidade do Rio de Janeiro sendo um lugar de libertinagem através de sua personagem Mercedes que registra no fim do livro como uma observação de uma cidade em decadência, como poderemos conferir a seguir:

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“O Rio de Janeiro tenta civiliza-se, mas o sensualismo joga-o continuamente no chão, fazendo-o andar de quatro pés. Hoje, que analyso claramente a existência vazia dessa sociedade, em que a arte é sempre exhibir-se, mesmo sem nenhum talento e em que a apparencia luxuosa ou o cynismo contam como aristocracia ou gênio [..].”(pg169).

Figura 1

Cecília Moncorvo não se considerava feminista, mas provocava e enaltecia a mulher. Sua visão e compreensão de feminista era limitado, o papel de mulher e boa mãe de família pertencia ao seu espaço de registro. Sua história traz marcas fortes que podem tê-la tornado uma mulher ríspida, sendo sentenciada ao silêncio e ao anonimato, num período em que a sociedade se modernizava sobre o lema de Ordem e Progresso.

É através do seu discurso que procuro a construção de suas heroínas e o seu reflexo, como base na fala de Bakhtin ([1979]; 2003:348):

A vida é dialógica por natureza. Viver significa participar do diálogo: interrogar, ouvir, responder, concordar, (...). Nesse diálogo o homem participa inteiro e com toda a vida: com os olhos, os lábios, as mãos, a alma, o espirito, todo o corpo, os atos.

Aplica-se totalmente na palavra, e essa palavra entra no tecido dialógico da vida humana, no simpósio universal

Diante deste prisma, eu buscarei o diálogo da Chrysanthème e seus personagens, considerando que todo o discurso gera a possibilidade de continuidade e descontinuidade, de uma teoria, de uma ideia e de um pensamento, de uma moralidade. Retornando ao passado através da literatura para entender a concepção da imagem da mulher, sua educação e as questões sociais que a cercam.

2 – Condição de Mulher e Educação

O século XX era um período de ebulição, de grandes transformações na sociedade, construção de novos modelos de comportamentos, e a implantação de modelos pedagógicos politicamente apetecidos.

Para que houvessem as mudanças desejadas, necessitariam de mudar alguns parâmetros, dentre eles educar as mulheres, para que através delas as modificações ocorressem com mais rapidez, e com valores morais, éticos e religiosos. Refletindo assim em um “bem” para a nação.

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Nessa onda de educação feminina, levantaram-se correntes no mundo das letras de escritores que usaram de seus espaços de pertencimentos para falar do seu tratado pedagógico a favor ou não da emancipação feminina, seja nos moldes conservadores ou para além do espaço privado/doméstico.

As mulheres pertenciam a uma classe excludente, sem voz, sem direitos políticos, enfim sem cidadania. A construção de sua identidade se dá com o movimento de educar as mulheres.

Neste ponto recorro ao pensamento do escritor Julio Afranio Peixoto (1876-1947), para contrapor com a escritora Chrysanthème no pensar a mulher na sociedade.

Afranio era um homem público, médico, professor, literário, habilidoso e um “bem necessário” à sociedade por escrever o que interessava à nação, circulava em vários grupos e era hábil no convívio social.

Ele via na educação feminina uma associação entre homem e mulher que traria benefícios ao lar, aos filhos e ao futuro do país. Reafirmando o posicionamento da mulher em sua função dita como natural de cuidar, zelar e procriar, uma vez desempenhado com afinco, atendia à proposta de eugenia instaurado no país.

“Se o lar não é feliz a culpa é das mulheres.

Das mulheres não educadas, não educadas para esposas e para mães, para o lar [...] A mulher educada é como a mulher forte das Escrituras.

Se baseando em preceitos bíblicos, escritos antes de Cristo para uma civilização oriental, ele pensa a submissão como uma missão naturalizada à mulher. Ainda nas escrituras se unifica a mulher de provérbios com outras passagens bíblicas depois de Cristo, hoje podemos encontrar um ponto de equilíbrio entre mulher e homem, como parceiros, companheiros, etc. Mas não é a proposta aqui discutir preceitos religiosos, porque o condicionamento da mulher e sua posição vai para além da norma doutrinária religiosa.

Enquanto Afranio está comprometido com a permanência da alocação da mulher nos espaços dito como naturais às mulheres, Chrysanthème vem na contra mão deste posicionamento, como “um mal necessário” por escrever o que a sociedade não deseja ouvir e admitir, ela dá voz a vários tipos de mulheres, provocando na sociedade patriarcal um desconforto quanto aos os espaços ditos como específicos e tradicionais à figura feminina.

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Cecilia não teve em seus livros apresentação de qualquer escritor (a) na contra-capa; de onde estava, falava dos guetos, das periferias, dos grandes salões, e apresentava o cotidiano e os tipos de mulheres e homens existentes na sociedade.

Podemos observar na figura abaixo o seu pensamento sobre os homens.

Figura 2

Com a conquista do voto e do espaço de trabalho, a mulher ganha fôlego e força para sua emancipação intelectual e educacional para além do âmbito doméstico. Mas continuava a luta pela igualdade de salários, um fato que se dá até os momentos atuais. Com o passar do tempo, as mulheres conquistaram, avançaram e acumularam funções. A violência contra a mulher hoje ganhou notoriedade, porém não foi radicalizada, vem de homens, como nossa autora na figura acima relata, dotado de um egoísmo e falsa superioridade, e muitas das vezes, de homens eleitos para compartilhar uma história e trajetória. Esquecem que por elas são gerados.

Como a educação e a escrita são atos políticos, no início do século XX podemos observar métodos pedagógicos em livros com manuais de boa conduta, jornais como manuais de vestimentas, ferramentas de modelagem comportamental, exemplos de mulheres donas do lar, dóceis, educadoras, piedosas, responsáveis pela ordem da casa e da família, mulheres que deram certo na profissão e não abandonaram seu papel de mulher, a exaltação dos valores morais, éticos e culturais núcleos centrais de uma sociedade civilizada e católica.

A preocupação da sociedade daquela época era como registra Rago (2013), por acreditar que o trabalho feminino fora do lar destruiria a família, pois seus filhos seriam criados soltos e sem vigilância constante das mães, ocasionando um afrouxamento e uma debilitação da “raça”.

As mulheres abandonariam o seus papeis de mães delicadas e esposas carinhosas, além de abrirem mão do matrimônio e da maternidade, uma vez que optassem por serem de classe trabalhadora.

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Se a herança escrita do passado é examinada principalmente do ponto de vista do que estamos acostumados a chamar “importância literária”, então a maior parte deles não tem valor. Mas se analisamos os modos de comportamento que (...) cada sociedade esperou de seus membros, tentando condicioná-los a eles, se desejamos observar mudanças de hábitos, regras e tabus sociais, então essas instruções sobre comportamento correto, embora talvez sem valor como literatura, adquirem especial importância (...). Mostram-nos com exatidão o que estamos procurando- isto é, o padrão de hábitos e comportamentos a que a sociedade, em uma dada época, procurou acostumar o indivíduo. Esses poemas e tratados são em si mesmos instrumentos diretos de ‘condicionamento’ ou de ‘modelação’, de adaptação do indivíduo a esses modos de comportamento que a estrutura e situação da sociedade onde vivem tornam necessários. (Norbert Elias)

3 – Livro Famílias... (romance)

A escritora Mme. Chrysanthème escreve este romance em sua maturidade aos 63 anos, num estilo naturalista, numa época que os autores já estão escrevendo em outros estilos. Qual a intenção da autora na trama que ela deseja nos revelar?

É categorizado como estilo romance por retratar o cotidiano, pois ela coloca em discurso os problemas e os valores do cotidiano em sociedade.Romance urbano por dar espaço, não apenas a uma classe aristocrata, mas também a figuras comuns da sociedade.

A figura abaixo é o Jornal Diario de Notícias 10/05/1933, que na coluna Livros Novos faz uma crítica sobre a autora e o seu livro “Familias...” – Mme. Chrysanthème. Renascença editora. Rio. 1933

Segue a nota:

Dentre as mulheres que escrevem prosa no Brasil, poucas possuem o brilho dessa escriptora cujo último livro “Famílias” vem de ser dado à estampa. Mme. Chrysanthème, é, pelo seu estylo ágil e terso, pela sua facilidade de fabulação, uma das nossas melhoras prosadoras. “Famílias” traça o perfil da moça moderna e pinta o meio social presente em tintas vivas. A sociedade actual. Com todas as suas misérias, com todos os seus vícios, está, dentro desse livro, com toda a sua força de realidade. Livro vivo, sem exagero, exacto em todos os sentidos, “Famílias” pelo seu entrecho e pela forma em que são descripto todo o seu episódio está fadado a pleno é merecido sucesso.

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Os mistérios e o comportamento da mulher sempre despertam curiosidades, pós possuem uma visão do mundo interessante, Chrysanthéme escreve inaltecendo a mulher, tanto as qualidades quantos os defeitos, e nas entre linhas mostra como era a sua visão geral da sociedade.

[...] em todo enunciado, contanto que examinemos com apuro, levando em conta as condições concretas da comunicação verbal, descobriremos as palavras do outro ocultas e semi-ocultas, e com graus diferentes de alteridade. (Bakhtin)

Segundo Castro (2009:112), os sujeitos dialogam por modos de reações e respostas avaliativas através do mecanismo de reflexão e refração ideológica da sociedade. Dentro deste parâmetro tentaremos compreender nesta literatura a fábula da ficção para o real. Este romance traz um conflito familiar entre mãe e filha, é ousado a trama, onde a viúva Noêmia de 40 anos e sua jovem filha Maria Alice duelam pela companhia de um homem, Luis Fellipe.

Que feminismo é esse que a autora deseja falar?

A jovem Maria Alice era uma jovem, menor de idade, que trama e arquiteta, e acaba seduzindo o amante de sua mãe, que se vê obrigado a contrair matrimônio com a jovem. Chrysanthème descreve Maria Alice como uma moça moderna, que trabalhava, mas este não era seu objetivo de vida, como podemos conferir a seguir:

...affirmando-se feminista, campeã fervorosa da superioridade da mulher e dos Seus direitos civis, confessava na intimidade do aposento de Nathalina, o seu anceio de encontrar um marido rico ou um ‘coronel’ generoso, que a libertasse de todas essas ideias desprestigiadoras da mulher, bem mulher.” (pp.24).

Para a personagem Maria Alice não teria problema algum investir no companheiro da mãe, sendo esta velha. Logo ele a trocaria por outra, que fosse ela a eleita, assim estaria tudo em família. Segue em seu pensamento, porque o dever das mães é deixar hoje o lugar de vanguarda às filhas e nunca se atravessarem no caminho das mesmas, (pp:14). Chrysanthème não tem receio de expor o que vê, toca em todos assuntos e pontos, por mais abomináveis que sejam; no enredo da trama abrange os burburinhos dos salões de belezas, a fragilidade feminina que se entrega ao amor com sinceridade, a relação com o corpo sendo jovem e velho, a liberdade, a sensualidade, o divórcio, o poder instituído e a cultura da infância.

No auge da sua maturidade e experiências adquiridas e vividas, a autora não abre mão de relatar o que lhe aflige e lhe cerca, “ver a nova geração moderna se despir a cada dia

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de preconceitos e das leis de modéstia e de decência que até então, tinham limitados, entregar-se a uma liberdade de actos e pensamentos que as famílias não consentiam em combater.” (pp:54).

Como já registramos aqui, a escritora não se considerava uma feminista, mas lutava pela mulher, dentro de um modelo que ela acreditava, de uma liberdade dentre as escolhas feitas, e se estas escolhas envolvessem o lar e a família, a figura da boa mãe desabrochava. Era admirável, pois refletia em sua matriz referencial materna, que batalhou, lutou e venceu em uma sociedade patriarcal dentre todas as pressões sociais sofridas.

Na trama secundária deste romance encontra-se a personagem Mercedes de Albuquerque, uma escritora que se sustenta e vive sozinha, que influencia a transformação de Noêmia através da leituras de bons livros: “sua inteligência, graças ao contato de Mercedes e a leitura de algumas obras interessantes e simples, se ia afinando e desenvolvendo.” (pp:164). Mercedes transparece ser a própria escritora Chrysanthème.

4 - Feminismo

Feminismo possui uma ideologia que propõe ampliação dos direitos civis e políticos, entres outros, a mulher. É um assunto amplo e complexo que não se esgota. O movimento feminista e o feminismo podem ser considerados sinônimos quando conceituamos o feminismo como um movimento político que luta pelo fim da dominação de um gênero sobre outro, questiona o papel da mulher na sociedade e procura promover a igualdade entre os sexos. O feminismo tem e sempre teve por objetivo a construção de uma sociedade igualitária, em que as diferenças entre os gêneros não signifiquem necessariamente desigualdades entre os gêneros.

Podemos acompanhar a luta das mulheres entre séculos, que lutam para se representar, pelos seus direitos, sua cidadania, para diminuir e radicalizar a violência, preconceitos e sua desvalorização.

Os movimentos feministas lutam por uma inclusão, aceitação, reconhecimento político-cultura e socioeconômico da mulher em suas diversas fragmentações e diversificações dos grupos de pessoas que almejam ressignificar os ideais clássicos de liberdade e igualdade.

Chrysanthème coloca suas personagens mulheres em vários espaços e situações, mas sua heroína é a mulher que configura o papel de boa mãe.

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Podemos observar uma citação do livro Famílias... na página 54 na qual uma das personagens fala [...] o feminismo, inventado nessa hora para as damas, sem deveres, cobria muita ousadia, muita licença, muito abuso e até muito crime. Enquanto que o modernismo, para os homens moços a permitir-lhes a entrada nesse mundo suspeito de gigolôs, de cafetinização das damas sentimentais ou das donzelas liberadas de laços e convenções familiares, a vidas de exhibições, de conquistas, e do triumpho mundano, enfim, alcançados a força de excentricidades, de malícias, e até de vícios, interessantes a seus olhos, e aos de seus émulos, as famílias se iam dissolvendo e rompendo os seus anneis legendários.

Essa é Chrysanthème, uma escritora intrigante, instigante, que através da ficção, usa para encobrir sob o véu da trama, a verdade moral.

Na realidade o que percebemos é um falso esteriótipo de que a mulher para ser feminista tenha que “abrir mão” de seu status feminino e que mulheres que possuam características essencialmente feministas ou que demostrem em seus tipos de vestimentas, atitudes exacerbadamente de femininices, não possam trazer em seus discursos ou produção escrita a essência dos movimentos feministas e por isso serem consideradas como tal.

No Brasil, a sociedade urbana vivenciou a expansão da indústria têxtil, muito marcante na fase intitulada Belle Époque através principalmente das revistas femininas que tiveram grande aceitação ao trazer publicadas fotos e artigos sobre roupas, conselhos de beleza e comportamento que apesar de estar quase em sua maioria de acordo com as normas de valores daquela época traziam já de algum modo atitudes de independência e consciência política e social em contraponto as imagens da mulher impressas nos meios de comunicação de massa vinculadas à mulher-objeto e não à mulher-sujeito de direitos.

5 - Para não concluir.

O livro Famílias é uma obra que expressa uma transição da sociedade, na qual a mulher num novo cenário social buscava um novo lugar, espaço este que trazia novas ideias embutidas em outros valores e costumes, mas em sua essência estão enraizados os valores patriacais. É uma literatura questionadora e reflexiva dos costumes, comportamentos e valores, do tempo e espaço da mulher.

São tantas interrogações e indagações sobre a autora e a condição da mulher na sociedade e na educação. É notório que o trabalho da Chrysanthème é procurar desvendar este universo e suas contradições, onde a mulher está inserida num projeto político pedagógico. Concluímos que às obras literárias representaram importante função da construção do ideal de mulher que ainda hoje está em busca de respeito e pertencimento à sociedade.

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6 – Referências bibliográficas

AML, Doyle Plinio, (781528) - Fundação Casa de Rui Barbosa Biblioteca Nacional

BAKHTIN, Mikhail - Estética da criação verbal – [1979]; 2003

CASTRO, Gilberto de. Formas sintáticas de enunciação: o problema do discurso no citado círculo de Bakhtin. 2009

CHRYSANTHÈME. Familias.... 1933. acervo geral da biblioteca nacional ELEUTERIO, Maria de Lourdes. Vidas de romances. 2005. Ed. Topboocks ELIAS, Norbert. A sociedade dos indivíduos. Ed. Zahar. 1994

ELIAS, Norbert. O processor civilizador I. ed. Zahar. 2011

MAGALDI, Ana M. B. de Melo. Lições de Casa: discursos pedagógicos destinados à família no Brasil. Belo Horizonte: Argvmentum, 2007.

RAGO, Margareth. Trabalho feminino e sexualidade, pg.578 – livro História das mulheres no Brasil / Mary Del Priore (org.); Carla Bassanezi Pinsky (coord. De textos) 10. Ed., 2º reimpressão, São Paulo: Contexto, 2013.

SILVA, Maria de Lourdes. Educação, Sexo e Feminices – Representações da Mulher na produção Literária de Mme. Chrysanthème e Afranio Peixoto nas Primeiras Décadas do Século XX. Projeto de Pesquisa. Rio de Janeiro, 2013.

SILVA, Maria de Lourdes; MOREIRA, Helena Mª Alves; VIEIRA, Luciana Mª. da C. Diálogo sobre a Mulher entre Madame Chrysanthème e Afranio Peixoto na década de 1930: Conversa de surdos?. Anais do X Congresso Luso-Brasileiro de História da Educação – X COLUBHE. Pontifica Universidade Católica do Paraná – PUC-PR, Agosto-2014.

SANTOS, B.S. Pela mão de Alice: O Social e o político na pós-modernidade. Porto: Afrontamento,1994

PEIXOTO, Afranio. A educação da mulher. São Paulo: Cia editora nacional. 1936.

PINTO, Maria de Lourdes de Melo. Memória de autoria feminina nas primeiras décadas do século XX: a emergência da obra periodística de Chrysanthéme. 2007. Disponível em: http://www.letras.ufrj.br/ciencialit/trabalhos/2007/mariadelourdesdemelo_.pdf

PRIORE, Mary Del. livro História das mulheres no Brasil / Mary Del Priore (org.); Carla Bassanezi Pinsky (coord. De textos) 10. Ed., 2º reimpressão, São Paulo: Contexto, 2012 & 2013.

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VIEIRA, Luciana M. da C. Madame Chrysanthème – uma mulher forte ou uma ameaça à sociedade do seu tempo? (Projeto de monografia). Anais do VI Congresso Internacional de Pesquisa (Auto)Biográfica, na Universidade do Estado do Rio de Janeiro –UERJ, 2014.

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i 1- Este trabalho é parte do projeto de monografia em desenvolvimento no curso de Pedagogia, sob a

Orientação da professora Maria de Lourdes da Silva. 2- Graduando de Pedagogia/UERJ. Bolsista IC/PIBIC/UERJ.

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