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OS SABERES DOCENTES E O PROFESSOR DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL Frederico Dourado Rodrigues Morais 1

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Academic year: 2021

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Frederico Dourado Rodrigues Morais1 Revista Direcional Educador, Edição 86 - mar/12 O atual cenário da sociedade contemporânea requer uma Educação Profissional diferente capaz de atender as demandas do mundo do trabalho e exigências da sociedade. Conseqüentemente, o professor dessa modalidade de ensino sofre novas exigências para atuar com os seus alunos. Agora além de promover os conhecimentos referentes às profissões que vai desenvolver junto com os seus alunos, ele precisa se ater às questões pedagógicas, sociais, culturais e políticas inseridas no contexto da escola, desta forma alerta Perrenoud2 “a tarefa dos professores encontra-se globalmente alterada”.

Porém, quando analisada a história da educação brasileira, percebe-se certo descaso com a formação de professores para a Educação Profissional. Um quadro de descontinuismo e inconsistência têm caracterizado as políticas públicas e as concepções teóricas no tocante a formação destes. Além do mais as próprias legislações3 atestam o foco nos conteúdos e na experiência profissional da área técnica de origem desses professores (medicina, engenharia, informática, etc.). Em muitos casos minimizam a importância dos saberes pedagógicos e desconsidera a necessidade de uma preparação, ou de um saber, especifico para o exercício da docência. Como se os saberes adquiridos no exercício profissional bastassem para assegurar um bom desempenho docente.

A especificidade dos contextos em que se educa adquire cada vez mais importância: a capacidade de se adequar a eles metodologicamente, a visão de um ensino não tão técnico, como transmissão de um conhecimento acabado formal, e sim como um conhecimento em construção e não imutável, que analisa a educação como um compromisso político prenhe de valores éticos e morais (...).4

E neste contexto, independente, do amplo universo que engloba a Educação Profissional no Brasil5, tirando-se as diferentes exigências legais para o exercício da docência em cada um dos respectivos níveis (formação inicial, ensino médio técnico ou ensino superior), estas mudanças a atingem uniformemente.

1 Pedagogo, Mestre em Educação (FE/UFG). www.depoisdaaula.com

2 PERRENOUD, Philippe. Práticas Pedagógicas, profissão docente e formação: perspectivas sociológicas.

Lisboa: Editora Dom Quixote, 1993. p. 140

3

Ver Decreto CNE/CP nº 3/2002 (art. 12 e 13) e Parecer CNE/CEB nº 37/2002

4

IMBERNÓN, Francisco. Formação docente profissional: fomar-se para a mudança e a incerteza. 6. ed. São Paulo: Cortez, 2006. (Coleção Questões de nossa época, v. 77). p.13

5

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O professor que atua nesta modalidade de ensino vive sob uma crença, abastecido pelo senso comum e muitas vezes pelos próprios documentos legais6, de hipervalorizar os conhecimentos e a experiência profissional provenientes da área original. Assim, por exemplo, para ser professor de lógica de programação basta ser um analista de sistemas, para lecionar ergonomia basta ser um médico do trabalho, para assumir o ensino de Modelagem de Roupas basta ser um Estilista e assim por diante.

Esta concepção se fortalece ainda mais no conceito que o domínio dos conhecimentos técnicos da profissão sejam suficientes para permitir que um indivíduo diplomado assuma a docência de determinada disciplina e/ou curso na Educação Profissional. Em suma para o exercício da docência na Educação Profissional o foco é na competência científica, desprovida de qualquer especificidade pedagógica.

Portanto, é preciso repensar a formação deste docente, indo além do repasse dos saberes específicos.

[...] o futuro profissional da educação necessita ter uma formação que vá além do domínio dos conteúdos específicos de sua área de conhecimento, pois ele precisa também da formação político-pedagógica e epistemológica

do conhecimento.7

Diferente de outras atividades humanas, o ensino possui peculiaridades e estas exigem por si uma devida preparação e cuidado. A ação educativa, por exemplo, não se faz sem uma plena colaboração dos vários atores envolvidos no processo, em especial professores e alunos. Ensinar exige mais do que um professor ser um conhecedor profundo do conteúdo que será ensinado, requer também para ter êxito “uma certa participação dos alunos e, de algum modo, seu consentimento.”8

.

A prática educativa é algo mais do que a expressão do oficio dos professores, é algo que não lhes pertence por inteiro, mas um traço cultural compartilhado, assim como o médico não possui o domínio de todas as suas ações para favorecer a saúde, mas compartilha com outros agentes, algumas vezes em relação de complementaridade e de colaboração, e outras, em relações de atribuições.9

O exercício da docência não pode ser tratado como algo simples, mas como uma ação complexa, que prescinde uma formação ampla, que extrapole o domínio do campo cientifico de sua área de formação e atuação, que apesar de imprescindível, não é o bastante. A docência requer do professor intencionalidade da sua ação, pleno conhecimento do seu objeto de trabalho, colaboração com outros agentes e uma

6

Um exemplo no art. 13 da Resolução CNE/CP nº 3/2002

7

GONÇALVES, Tadeu Oliver; GOLÇALVES, Terezinha Valim Oliver. Reflexões sobre uma prática docente situada: buscando novas perspectivas para a formação de professores. In: GERALDI, C. M. G.; FIORENTINI, D.; PEREIRA, E. M. de A. (orgs.). Cartografia do Trabalho Docente: professor(a) pesquisador(a). Campinas, SP: Mercado das Letras, 1998. p. 118.

8

TARDIF, Maurice; LESSARD, Claude. O trabalho docente: elementos para uma teoria da docência como

profissão de interações humanas. Petrópolis, RJ: Vozes, 2005. p. 67 9

(3)

“intervenção planejada e científica sobre o objeto com vistas à transformação da realidade social.”10

.

O exercício e o treino poderiam bastar para manter competências essenciais se a escola fosse um mundo estável. Ora, exerce-se o ofício em contextos inéditos, diante de públicos que mudam, em referência a programas repensados, supostamente baseados em novos conhecimentos, até mesmo em

novas abordagens e novos paradigmas.11

Fica claro que no processo educativo, o professor deva assumir outra atitude, forjada a partir de outro tipo de formação, que deve ser crítica, reflexiva e atenta as peculiaridades da docência. Nessa perspectiva, o docente precisa deixar de ser um transmissor de conteúdos e informações acríticas e definidas por especialistas externos, para assumir uma atitude mais ativa. Afinal, como nos mostra Libâneo12 o ensino como mera transmissão de informações, a aprendizagem entendida como acúmulo de conhecimentos não subsistem mais. E afirma ainda:

[...] que a tarefa de ensinar a pensar requer dos professores o conhecimento de estratégias de ensino e o desenvolvimento de suas próprias competências do pensar. Se o professor não dispõe de habilidades de pensamento, se não sabe “aprender a aprender”, se é incapaz de organizar e regular suas próprias atividades de aprendizagem, será impossível ajudar os alunos a

potencializarem suas capacidades cognitivas.13

É urgente o debate sobre o professor da Educação Profissional, sejam pelas exigências do mundo do trabalho e/ou as do próprio processo educativo. Ambos mudaram, evoluíram e necessitam hoje de personagens capazes de entender o momento, interagir e contribuir. O que fica claro é que o professor da Educação Profissional é um profissional da educação e que possui um conjunto de saberes inerentes à profissão docente que a justifiquem e como tal estes saberes são utilizados pelo professor no “contexto de sua profissão e da sala de aula”14

.

“[...] esse saber é social por ser adquirido no contexto de uma socialização profissional, onde é incorporado, modificado, adaptado em função dos momentos e das fases de uma carreira, ao longo de uma história profissional

onde o professor aprende a ensinar fazendo seu trabalho.”15

Tardif16 vai além e revela, que os professores têm diferentes saberes, e que possuem diferentes relações com cada um desses saberes e a articulação e a constante interação entre eles formam um saber único e plural. Assim, além de compreender da

10

FRANCO, Maria Amélia Santoro Franco. Pedagogia como ciência da educação. 2. ed.rev. e ampl. São Paulo: Cortez, 2008. p.81

11

PERRENEOUD, Philippe. 10 Novas Competências para Ensinar. Porto Alegre: ARTMED, 2000, p.155-156

12 LIBÂNEO, José Carlos. Adeus Professor, Adeus professora: novas exigências educacionais e profissão docente. 9. ed. São Paulo: Cortez, 2006. (Coleção Questões de nossa época, v. 67). p.29

13

id. ibid. p.36

14

TARDIF, 2008. op. cit. p. 64

15 id. ibid. p.14 16

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peculiaridade do trabalho docente e da especificidade da sua ação, pode-se ir além e caracterizar estes saberes. Como referência, um quadro apresentado por Tardif em que identifica e classifica estes saberes docentes:

Saberes dos professores Fontes sociais de aquisição Modos de integração no trabalho docente

Saberes pessoais dos professores A família, o ambiente de vida, a

educação no sentido lato, etc.

Pela história de vida e pela socialização primária Saberes provenientes da formação

escolar anterior

A escola primária e secundária, os estudos pós-secundários não especializados, etc.

Pela formação e pela socialização pré-profissionais

Saberes provenientes da formação profissional para o magistério

Os estabelecimentos de formação de professores, os estágios, os cursos de reciclagem, etc.

Pela formação e pela socialização profissionais nas instituições de formação de professores Saberes provenientes dos

programas e livros didáticos usados no trabalho

A utilização das “ferramentas” dos professores: programas, livros didáticos, cadernos de exercícios, fichas, etc.

Pela utilização das “ferramentas” de trabalho, sua adaptação às tarefas.

Saberes provenientes de sua própria experiência na profissão, na sala de aula na escola.

A prática do ofício na escola e na sala de aula, a experiência dos pares, etc.

Pela prática do trabalho e pela socialização profissional

Quadro 1: Os saberes dos professores.17

No quadro, é visto que entre os cinco diferentes tipos de saberes docentes relacionados na Educação Profissional os saberes que são os provenientes da formação escolar e continuada são muito importantes e em muitos casos decisivos. Isso não significa desprezo aos saberes pessoais, adquiridos na família e nos ambientes pelos quais o professor passou e que como bem afirma Cunha18 dão contornos ao desempenho do professor. Nem estamos excluindo os saberes provenientes da área profissional de origem dos professores da Educação Profissional, até porque conforme traz Tardif 19 o professor ideal “deve conhecer sua matéria, sua disciplina”, para logo em seguida ressaltar sobre a importância dos saberes “relativos às ciências da educação e à pedagogia” 20

Os professores das disciplinas técnicas da Educação Profissional, antes de atuarem como professores são profissionais de diversas áreas técnicas no mercado de trabalho. São engenheiros, químicos, enfermeiros, analistas de sistemas, enfim, profissionais que, na grande maioria das vezes, não optaram pelo magistério como profissão inicial, não tendo nenhuma formação pedagógica antes de irem para a sala de

17

id. ibid. p.63

18

CUNHA,Maria Isabel da. O professor universitário na transição de paradigmas. Araraquara: JM Editora, 1998. p.53

19 TARDIF, 2008. op. cit. p. 39 20

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aula. São profissionais que geralmente não tiveram uma preparação específica para a docência.

O docente da Educação Profissional, diferente do que muitas vezes se encontra nas instituições não pode ter sua atuação limitada ao repasse da sua experiência profissional e dos conteúdos que ele adquiriu na sua formação inicial anterior à docência. Afinal, conhecer bem a matéria que se deve ensinar é apenas uma condição necessária, e unicamente não é suficiente para o trabalho do professor.21. Contudo a prática educativa supõe mais que uma assimilação enciclopédica, como ressalta Cunha22 em sua pesquisa com professores universitários, e que se encaixa bem nesta situação, existe um saber pedagógico a ser apreendido e os próprios professores reconhecem. Um saber que ultrapasse a instrumentalização, mas que permita ao professor compreender e agir melhor neste contexto dinâmico chamado escola.

21 id. ibid. p.121 22

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