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Armindo dos Santos de Sousa Teodósio

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“DESVENDANDO O TERCEIRO SETOR:

TRABALHO E GESTÃO EM

ORGANIZAÇÕES NÃO-GOVERNAMENTAIS”

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Armindo dos Santos de Sousa Teodósio

Professor da PUC/MG

Graziele Andrade Resende

Administradora pela PUC/MG

Artigo publicado no livro:

MOREIRA NETO, A. C. & NABUCO, M. R. (orgs.) Relações de Trabalho Contemporâneas. Belo Horizonte: Instituto de Relações do Trabalho da (IRT) Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, 1999, das páginas 287-302.

Resumo

O artigo analisa e compara a organização do processo de trabalho e as políticas de gestão de três organizações do Terceiro Setor voltadas à intervenção em problemas da infância. Procura-se discutir a construção dessas ações gerenciais, destacando a peculiaridade e complexidade que assumem no contexto do Terceiro Setor. A análise procura levantar os dilemas e desafios gerenciais enfrentados por essas organizações e as respostas até agora encontradas, sobretudo no que diz respeito à organização do trabalho voluntário. Por fim, faz-se uma reflexão sobre a difusão entre organizações faz-sem fins lucrativos de modelos de gestão do trabalho originados no Primeiro e Segundo Setores e a possibilidade de contribuição do Terceiro Setor para o avanço do conhecimento gerencial e a renovação da gestão nas organizações contemporâneas.

1 Versão anterior deste trabalho foi apresentada no XII Congresso Latino-Americano de Estratégia da Sociedade

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I – Introdução

As discussões recentes nas Ciências Sociais, tanto na esfera acadêmica quanto no âmbito das políticas sociais concretas, têm relegado lugar de destaque ao chamado Terceiro Setor. Multiplicam-se as publicações, seminários e debates cujo foco é discutir a relevância, as especificidades e a natureza das organizações que atuam nesse campo.

No campo de estudos do processo de trabalho esse debate assume centralidade, ao introduzir reflexões sobre as características de gestão dessas organizações, sobretudo no que diz respeito à ausência de objetivos de lucro privado e incorporação de mão-de-obra voluntária em suas ações.

No entanto, vários autores constatam que o grau de informação e conhecimento sistematizado sobre o Terceiro Setor, sobretudo no caso brasileiro, ainda é insipiente. Nesse cenário, a pesquisa sobre as práticas e o pensamento gerencial desenvolvidos em organizações que atuam no Terceiro Setor assume grande relevância. (IOSCHPE,1997)

Sendo assim, o presente trabalho procura discutir as estratégias gerenciais adotadas por três organizações do Terceiro Setor voltadas para intervenção em problemas sociais e econômicos ligados à infância, que têm como área de atuação a Região Metropolitana de Belo Horizonte/MG. As reflexões concentram-se no modelo gerencial dessas organizações, com destaque para as estratégias voltadas para a gestão de mão-de-obra voluntária.

II - Terceiro Setor: heterogeneidade e urgência de uma tipologia

Uma das características do Terceiro Setor é sua extrema heterogeneidade, o que se repercute na ausência de consenso quanto à abrangência de seu conceito e às terminologias adotadas para se referir às organizações que o compõem (COSTA JÚNIOR, 1998).

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sociais e econômicos devem ser resolvidos a partir da lógica do mercado, ou melhor, do encontro e da ação dos diversos atores no espaço das trocas econômicas, cabendo ao Estado uma regulação mínima dessa esfera.

Cabe notar que, dentro da idéia de Terceiro Setor, encontram-se tanto organizações formalizadas juridicamente quanto informais, com uma gestão estruturada e profissionalizada quanto não-estruturada e pouco-profissionalizada, de grande porte quanto de médio e pequeno portes, de caráter supra-nacional ou multinacional quanto local (CARVALHO, 1997; FERNANDES, 1994), com fontes de financiamento atreladas ao Estado e/ou grandes empresas quanto sem fontes regulares de financiamento de suas atividades, entre outras diferenciações (COSTA JÚNIOR, 1998).

O ponto de convergência entre as várias organizações que comporiam o Terceiro Setor parece ser a ausência do lucro como finalidade central em sua orientação gerencial e objetivação de benefícios para toda a comunidade ou grupos populacionais específicos, seja por localização geográfica e/ou convergência de interesses de natureza ideológica, religiosa, racial, de opção sexual, dentre outros.

Sendo assim, para fins deste trabalho assume-se como Terceiro Setor, organizações que se caracterizam pela não-lucratividade como finalidade e constróem estratégias centradas na busca de melhorias para a comunidade como um todo ou para grupos específicos da população. Isso quer dizer que considera-se integrantes do Terceiro Setor, em orientação semelhante à discutida por COSTA JÚNIOR (1998), organizações que vão desde fundações, com estruturas formais rígidas, e uma relação de proximidade com o Estado e grandes empresas a movimentos sociais pouco estruturados, englobando grupos religiosos e associações de moradores.

III – Trabalho Voluntário: um caminho entre os descaminhos do Mundo do Trabalho?

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vêm colocando em xeque a capacidade dessas economias de promoverem a inclusão social de grande parcela da população economicamente ativa.

No cerne da discussão sobre eliminação de postos de trabalho, qualificação para o trabalho e geração de renda tanto pelo setor privado quanto pelo Estado, algumas reflexões têm se voltado para o espaço público não-estatal. A capacidade de articulação da sociedade civil é vista como instância capaz de se contrapor ao movimento de contração produtiva operado nos outros dois setores, minimizando seus impactos sobre a esfera do trabalho, não só pela capacidade de intervenção no jogo político, mas sobretudo pela organização e implementação de ações concretas no âmbito público não-estatal. (CARCANHOLO et al, 1997).

Tais ações, ao mesmo tempo em que procurariam minimizar os impactos dos processos de exclusão social, estariam permitindo o desenvolvimento de novas formas de sociabilidade, contrapondo-se à uma dinâmica social estritamente guiada pela racionalidade econômica capitalista (DOWBOR, 1998).

Por outro lado, discussões recentes têm destacado a capacidade de ações públicas não-governamentais criarem oportunidades de reinserção em atividades profissionais – mesmo que não remuneradas - de muitos trabalhadores excluídos da dinâmica produtiva no setor privado e público estatal (MARCOVITHC, 1997).

Para WYSOCHI (1991), entre os excluídos passíveis de ser incorporados nas atividades públicas não-estatais encontram-se não só aqueles que não foram capazes de desenvolver novas qualificações profissionais, mas também grupos que têm sido alvo de discriminações raciais, de gênero e mesmo quanto a doenças, como por exemplo, os portadores do vírus HIV.

Novos trabalhadores estariam sendo cada vez mais requisitados pelo chamado Terceiro Setor, dado ao rápido crescimento dessa área2 e sua carência de mão-de-obra profissionalizada,

especialmente no que diz respeito aos processos de gestão (McCARTHY, 1997; DRUCKER, 1995; BRADNER, 1993).

2 A expansão do Terceiro Setor é fenômeno que se verifica em várias economias capitalistas ocidentais. Segundo

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Além disso, o Terceiro Setor estaria se constituindo em um espaço de requalificação profissional relevante, na medida em que as atividades comunitárias permitiriam e exigiriam do trabalhador o desenvolvimento de habilidades relevantes para o trabalho nos setores privado e público estatal, tais como capacidade de trabalhar em grupo, lidar com a diversidade, flexibilizar instrumentos de trabalho, cumprir metas com baixo aporte de recursos, entre outras (DRUKER, 1992; SILVER, 1998).

No entanto, vários questionamentos se colocam, principalmente quando constata-se a relativa insipiência dos estudos sobre o Terceiro Setor (IOCHPE, 1997) e a heterogeneidade dessa área de atividade, quer seja de acordo com a trajetória histórica de cada nação (GASKIN & SMITH, 1995), quer seja pela natureza do próprio setor, manifestada em vários aspectos tais como forma e finalidade das intervenções sociais, tamanho e abrangência das organizações, grau de sistematização dos processos gerenciais, acesso a recursos e condições de trabalho, entre outros.

Além disso, a visão do Terceiro Setor como alternativa para a incorporação e/ou reincorporação de profissionais em economias periféricas, como a brasileira, exige uma reflexão mais profunda das práticas concretas de gestão desenvolvidas pelas organizações desse setor e seus impactos efetivos na realidade sócio-produtiva nacional.

IV – Gestão do Trabalho no Terceiro Setor: natureza e especificidades

O campo da Gestão é considerado um dos espaços centrais para o avanço das organizações do Terceiro Setor. Vários autores apontam a necessidade de profissionalização dos indivíduos que atuam nessa área, sobretudo aqueles que desempenham papéis gerenciais. Através de gestores com sólida formação e domínio de técnicas administrativas, as práticas e políticas organizacionais no Terceiro Setor se tornariam mais sistematizadas, articuladas e voltadas ao cumprimento dos objetivos propostos pelas instituições sociais.

Nesse movimento, o primeiro e, principalmente o segundo setor, ou seja, a iniciativa privada, seriam espaços geradores de tecnologias gerenciais a serem incorporadas pelos gestores do

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Terceiro Setor. Isso se daria não só pela alocação de ex-executivos privados nessa área, mas também pela ação de consultores e pela incorporação de modelos gerenciais de órgãos e empresas financiadoras e/ou controladoras das organizações do Terceiro Setor.

No entanto, a transposição de técnicas gerenciais oriundas da esfera privada não se dá de uma maneira linear e absoluta, esbarrando nas especificidades da gestão social, característica das organizações do Terceiro Setor. Ferramentas administrativas privadas carregam em si conceitos e pressupostos que, em alguns casos, podem trazer distorções quanto à natureza da gestão demandada na esfera social. (MINTZBERG, 1996)

Para TENÓRIO (1997), os termos cliente e usuário, bastante difundidos e enfatizados por metodologiais gerenciais como a qualidade total, não se adequam às organizações não-governamentais, visto que não incorporam o conceito de cidadania à formulação, implementação e avaliação de políticas sociais. Para o autor, o conceito mais apropriado remete-se à idéia de cidadão-beneficiário.

MINTZBERG (1996), por sua vez, indica que os parâmetros prevalescentes na gestão social giram em torno da noção de bem público e cidadania, fazendo com que os critérios de rentabilidade operacional do setor privado (geralmente baseados em alta utilização do serviço e número elevado de atendimentos) dêem lugar a critérios que levem em consideração fundamentalmente a metodologia aplicada para a intervenção nos problemas sociais.

Essa metodologia, segundo KLIKSBERG (1997), deve se balizar no cenário imposto à gestão social na América Latina, cujos maiores desafios concentram-se na consolidação da democracia, na transparência e no controle social da gestão. Sendo assim, cabe ao gestor do Terceiro Setor não apenas desenvolver uma profunda visão dos mecanismos de mercado, mas sobretudo conciliar visão política, social e constitucional.

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NOGUEIRA (1998), por sua vez, destaca que a fragmentação da sociedade civil só pode ser superada através de uma gestão social marcada pela combatividade, perseverança e pela indignação. Esses seriam os ingredientes básicos para o desenvolvimento de “empreendedores” no Terceiro Setor. Para o autor, faz-se necessário destacar os limites do gerencialismo privado e burocrático-estatal, sobretudo quanto à sua dominação pelas lógicas contábil e quantitativa.

Um dos maiores desafios da construção da gestão no Terceiro Setor, segundo SERVA (1997) parece ser a relação entre racionalidade instrumental e substantiva. Atreladas a organismos financiadores de suas atividades, as organizações do Terceiro Setor, conforme atesta TENÓRIO (1997), muitas vezes se deparam com lógicas de eficácia econômico-financeira para avaliação de suas atividades, ao passo que seus modelos gerenciais são guiados no cotidiano por critérios mais substantivos, ligados à promoção social de suas ações.

Nesse sentido, a gestão de organizações do Terceiro Setor assume grande complexidade. O completo desatrelamento em relação aos parâmetros de avaliação pode comprometer a sustentabilidade das intervenções junto aos problemas sociais, enquanto que a desconsideração da esfera substantiva da organização pode levar a uma dissonância entre corpo voluntário e corpo gerencial. O difícil equilíbrio entre esses pólos requer do gestor social habilidades especiais.

Para HUDSON (1999), o gerente ou executivo principal no Terceiro Setor deve conciliar conhecimentos financeiros e de marketing com habilidades interpessoais e de articulação política, sendo “enérgico quando decisões importantes precisam ser tomadas e delicado quando se requer compaixão e sensibilidade” (p. 208-209). Seu trabalho seria caracterizado pela construção de relacionamentos com diferentes atores sociais, que iriam desde voluntários até órgãos financiadores, passando pela mídia, Governo e beneficiários.

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A superação dos desafios gerenciais do Terceiro Setor, segundo TENÓRIO (1997), constitui-se em um aprendizado contínuo, no qual constitui-seus gestores deconstitui-senvolvem percepções sobre novos modelos gerenciais, incorporando-os às peculiaridades de suas organizações. Entre os resultados esperados desse aprendizado destacam-se: ação por meio de redes; identificação de áreas de atuação e cidadãos-beneficiários, criação de mecanismos de controle consistentes com a natureza das atividades desenvolvidas; e alcance de visibilidade perante a sociedade.

Cabe destacar que a assimilação de tecnologias gerenciais se processa através da interação cotidiana entre diferentes atores organizacionais, que não operam sob uma racionalidade imutável e/ou homogênea (VELTZ & ZARIFIAN, 1993), desenvolvendo diferentes percepções, posicionamentos e ações sobre os novos modelos de gestão propostos. Um modelo gerencial, longe de ser um produto ou objeto pronto a ser usado, é fruto da articulação entre dimensões técnicas, psicossociais e econômicas.

Nesse construto social sempre inacabado, a transposição de práticas tradicionais em direção a novas propostas de gerenciamento se opera segundo uma tensão permanente entre as lógicas da organização - manutenção de um estado - e da inovação - mudança desse estado - (ALTER, 1993).

Sendo assim, torna-se fundamental pesquisar a construção de modelos gerenciais a partir do ponto de vista e do discurso daqueles que se voltam à sua elaboração e difusão em organizações do Terceiro Setor.

V – Estratégia Metodológica

A pesquisa se constitui em um estudo comparativo entre três organizações do Terceiro Setor voltadas para intervenção em problemas sociais e econômicos ligados à infância. O objeto de estudo da pesquisa gira em torno das práticas gerenciais adotadas por essas instituições, com destaque para aquelas voltadas para seus Recursos Humanos voluntários.

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organizações. A análise dos dados, seguindo orientação semelhante à estratégia da coleta de informações, privilegiou a análise qualitativa do fenômeno social estudado.

VI – Organizações pesquisadas e seus gestores

Todas as organizações pesquisadas trabalham no setor de prestação de serviços para a pessoas com características (ou necessidades) especiais e podem ser consideradas organizações de pequeno porte, caso considere-se a metodologia classificatória tradicionalmente aplicada ao setor privado.

Duas das organizações pesquisadas adotam como estratégia de inclusão social e afetivo-psicológica dos portadores de características especiais a inserção das próprias crianças e adolescentes assistidos em processos produtivos, como por exemplo, de brinquedos pedagógicos. A terceira delas desenvolve programas didático-pedagógicos voltados a portadores de características especiais e concentra seus esforços sobretudo na qualificação profissional de docentes e agentes de apoio, que atuarão nesses processos.

Também duas das organizações pesquisadas encontram-se em atividade há mais de cinco anos, mas não possuem sede própria. Todas utilizam tanto mão-de-obra remunerada quanto voluntária, sendo que apenas uma delas recebe auxílio financeiro de órgãos públicos. As demais se sustentam basicamente de doações dos próprios fundadores e/ou trabalhadores voluntários.

O perfil predominante da mão-de-obra voluntária nas três organizações pesquisadas apresenta a seguinte caracterização:

Quadro 1-Perfil predominante da mão-de-obra voluntária nas organizações pesquisadas

Faixa Etária Sexo Escolaridade Formação Profissional

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Fonte: Dados coletados pela pesquisa.

Quanto ao perfil dos gestores entrevistados, todos possuem experiência no Terceiro Setor, atuando há mais de cinco anos de atuação na área. A maioria possui formação superior e mostra-se sensibilizada sobre a importância da Administração e das técnicas gerenciais, sobretudo nas organizações do Terceiro Setor. No entanto, apenas um dos entrevistados possui formação específica na área gerencial (graduação em Administração de Empresas).

Todos eles exercem funções de administração dentro das organizações, apesar de acumularem outros cargos que não o de administrador em si. A maioria é trabalhador voluntário e todos se dizem fortemente motivados nas funções que exercem. Além disso, afirmam se sentir sintonizados com as tendências de transformação das sociedades contemporâneas, marcadas principalmente pela crise social e a emergência do Terceiro Setor.

VII – Construindo a Gestão do Trabalho no Terceiro Setor

As organizações pesquisadas demonstram delineamento claro de seus objetivos e metas centrais. Segundo os entrevistados, suas diretorias centram seus esforços de atuação na busca sistemática desses objetivos e têm alcançado resultados extremamente satisfatórios, apesar da restrição de recursos físicos e financeiros, que marca o cotidiano dessas organizações.

Segundo os entrevistados, os maiores problemas enfrentados pela gestão dessas organizações relacionam-se ao provimento de recursos financeiros, à legalização dessas instituições, à obtenção de sede própria, ao cenário macroeconômico e ao gerenciamento de mão-de-obra voluntária.

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Outro desafio que se impõe à gestão é a obtenção de atestados e certidões que regularizem o funcionamento da organização. Tal documentação só é fornecida após dois anos de funcionamento e o processo é moroso e de difícil consecução. Enquanto não se regularizam, as organizações não podem receber doações de órgãos públicos, o que compromete ainda mais a capacidade de sobrevivência financeira e operacional.

Além disso, os gestores apontam que cenário macroeconômico, marcado pela crise e atingindo indistintamente todos os setores da economia, traz importantes desdobramentos para as organizações do Terceiro Setor. A turbulência no mercado dificulta a arrecadação de recursos, inviabilizando a consecução de objetivos de longo-prazo. Dessa forma, os entrevistados acreditam que a crise coloca como demanda imperativa a reestruturação organizacional e o desenvolvimento de novos parâmetros e bases para negociação entre instituições.

A necessidade de voluntários também é um grande desafio para essas organizações que, quando conseguem número adequado de mão-de-obra, têm de arcar com treinamento e estruturar suas atividades conforme a disponibilidade horários do grupo voluntário, além de não disporem de mecanismos eficientes de controle de seus Recursos Humanos, frente a problemas como absenteísmo, falta de pontualidade, etc.

Entre outros problemas mencionados pelos entrevistados encontram-se também a falta de capacidade operacional e gerencial (querer fazer e não ter condições técnicas para tal); a necessidade de adequação a parâmetros de avaliação determinados por instituições financiadores e fiscalizadoras; a falta de apoio governamental; e o rápido crescimento e transformação do Terceiro Setor.

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VIII – Função Gerencial no Terceiro Setor

O gerente no Terceiro Setor parece possuir um papel diferente daquele tradicionalmente observado em organizações públicas e privadas. A capacidade de captação de mão-de-obra voluntária é associada à habilidade de se construir uma gestão “harmoniosa”, ou seja, que minimize o conflito no âmbito das organizações.

No Terceiro Setor, a insatisfação com a postura e ações da organização pode levar o voluntário a se dedicar a outra causa/instituição. Já nas empresas públicas e privadas fatores como necessidade de remuneração, status e posição social, dentre outros, tornam-se barreiras para o desligamento da organização por parte do empregado, levando-o a adotar alternativas mais “amenas”, tais como mudança de cargo/área, busca de novas funções, ...

A dependência do engajamento do corpo voluntário, bem como de doações de terceiros, colocam como habilidade fundamental do gestor do Terceiro Setor a capacidade de despertar “simpatia” entre os demais atores sociais e organizacionais que o cercam. A agressividade e competitividade do gestor privado cede lugar à habilidade de despertar e manter comportamentos solidários em torno de objetivos estratégicos comuns.

Os entrevistados acreditam que a ação e reflexão gerencial sistemática é um meio fundamental para o denvolvimento das organizações do Terceiro Setor. Sendo assim, a função gerencial assume centralidade, sendo vista como de alta relevância para o alcance de objetivos e a sobrevivência organizacional.

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Em todas as organizações pesquisadas a preocupação com a imagem institucional é uma tônica. Para isso, elas se valem de instrumentos de controle sobre o seu desempenho global e avaliam com frequência o alcance de objetivos. A maioria desses instrumentos incluem entre suas atividades um contato direto, através de reuniões, com todos os interessados em avaliar os resultados alcançados (gestores, representantes de fontes de financiamento, voluntários, cidadãos-beneficiários, ....). Além disso, esses instrumentos de avaliação servem de arcabouço para decisões sobre mudanças estratégicas e operacionais definidas pela diretoria.

Quanto ao trabalho como gestores da organização, os entrevistados afirmam que dividem suas preocupações entre problemas cotidianos e assuntos estratégicos. Nesse sentido, apesar de ocuparem o mais alto escalão na organização, o trabalho desses gestores assemelha-se ao de gerentes de nível intermediário em grandes empresas, que têm que conciliar preocupações tanto de nível operacional quanto estratégico.

Nenhuma das organizações pesquisadas possui um administrador profissionalizado à sua frente. Todos os entrevistados acreditam que é importante a figura do administrador profissional, mas avaliam que a atual realidade de suas organizações impede a criação de tal cargo, principalmente por questões financeiras. Além disso, eles acreditam que podem obter no “mercado de trabalho voluntário” profissionais qualificados para exercerem essa função.

As áreas dentro da estrutura organizacional consideradas estratégicas pelos gestores foram, em ordem de importância: Captação de Recursos, Prestação de Serviços (Operacional), Serviços Gerais e Comunicação Social. Dentre elas, as que consumem maiores recursos financeiros são: Administrativa e Operacional. Na primeira incluem-se a mão-de-obra remunerada e os trabalhos de difusão da imagem institucional da organização no mercado, o que explicaria o maior consumo de recursos. Já na segunda concentram-se as atividades fim da organização.

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entrevistados, tem sido a mais empregada e a que melhores resultados alcançou, o que pode se justificar diante da característica essencialmente cooperativa e transparente que a função gerencial demanda e adquire no Terceiro Setor.

IX – Gerenciando Voluntários

Todas as organizações pesquisadas utilizam voluntários e disseram não existir conflitos entre pessoal remunerado e não-remunerado, visto que o primeiro grupo constitui pequeno percentual frente ao seu corpo voluntário.

A forma de captação de mão-de-obra voluntária passa sempre pela sensibilização, que se materializa através de convites e convocações, e a indicação de membros da própria organização e/ou terceiros. Em todos os três casos pesquisados observou-se um grande interesse do grupo voluntário na sobrevivência da organização, visto que desenvolveram uma vinculação profunda com suas atividades.

Os principais problemas, apontados pelos entrevistados, na utilização de mão-de-obra voluntária estão ligados à pontualidade, avaliação de desempenho, qualificação para o trabalho e disponibilidade para o exercício das funções na organização.

Observa-se nas organizações pesquisadas uma grande dificuldade de se estruturar mecanismos para controlar e regular o trabalho voluntário, sobretudo no que diz respeito à pontualidade e ao absenteísmo. O mesmo se manifesta na avaliação de desempenho. Há uma relutância em se avaliar individualmente o desempenho dos voluntários, bem como adotar estratégias gerenciais voltadas ao controle, temendo-se que o voluntariado abandone suas atividades por não aceitar esse tipo postura gerencial.

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Por fim, as organizações encontram dificuldades em estruturar uma escala de trabalho voluntário, visto que esse tipo de mão-de-obra normalmente define por si mesma seu tempo de disponibilidade para dedicação ao empreendimento social.

Em contrapartida, as organizações afirmam que a utilização de mão-de-obra voluntária é vantajosa por causa da economia de recursos com remuneração e, principalmente, pela dedicação que demonstram. No Terceiro Setor, ao que tudo indica, os gestores têm conseguido algo que as empresas privadas e públicas vêm tentando construir sem grande sucesso: a fidelidade do trabalhador à organização.

As organizações pesquisadas não possuem uma política de Recursos Humanos estruturada, mas algumas oferecem ações em áreas pontuais, com destaque para os investimentos constantes em treinamento e desenvolvimento de pessoal. Apesar das incertezas quanto à permanência da mão-de-obra voluntária, investe-se em treinamento como forma de conseguir uma relativa padronização dos trabalhos empreendidos.

Os gestores entrevistados foram unânimes em afirmar que a existência de um corpo técnico especializado é imprescindível para a organização, visto que a natureza do trabalho desenvolvido por essas organizações requer acompanhamento especializado de profissionais com formação específicas para exercê-lo. Sendo assim, até mesmo para acompanhar os trabalhos feitos pelos voluntários, exige-se a presença de um profissional capacitado para aquela função.

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X – Considerações Finais

A análise das estratégias gerenciais das organizações pesquisadas revelou que no Terceiro Setor apresentam-se novos desafios para a gestão. A falta de sistematização de vários procedimentos e políticas organizacionais se apresenta como barreira para o aperfeiçoamento da gestão no Terceiro Setor, que se aprofunda diante da dificuldade de captação regular de recursos financeiros.

No que tange à Gestão de Recursos Humanos, os desafios parecem adquirir novas conotações. O problema do engajamento da mão-de-obra no trabalho, considerado um dos grandes desafios das empresas privadas e foco de sofisticadas políticas organizacionais, parece não existir no Terceiro Setor. Por outro lado, surgem demandas diferenciadas, sobretudo no que diz respeito à preparação e qualificação do corpo voluntário para o trabalho. Além disso, o controle e a regulação sobre o trabalho exercido por voluntários apresenta-se como outro problema de difícil resolução.

A incorporação de ferramentas gerenciais oriundas sobretudo da iniciativa privada não se mostra como “panacéia” para todos os problemas organizacionais, exigindo uma adaptação à realidade do Terceiro Setor. Isso se apresenta como um ponto relevante para a reflexão no campo de conhecimento do pensamento estratégico gerencial, na medida em que coloca questionamentos sobre os impactos que trarão sobre a Gestão de Recursos Humanos no Terceiro Setor. Nesse sentido, cabe ampliar e aprofundar os estudos sobre a capacidade dessas organizações manterem as virtudes de gestão de pessoal que já apresentam e aprimorar suas políticas e estratégias gerenciais.

XI –Referências Bibliográficas

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Referências

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