• Nenhum resultado encontrado

XXVI ENCONTRO NACIONAL DO CONPEDI BRASÍLIA – DF

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2019

Share "XXVI ENCONTRO NACIONAL DO CONPEDI BRASÍLIA – DF"

Copied!
24
0
0

Texto

(1)

XXVI ENCONTRO NACIONAL DO

CONPEDI BRASÍLIA – DF

DIREITO AGRÁRIO E AGROAMBIENTAL

(2)

Copyright © 2017 Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Direito

Todos os direitos reservados e protegidos.

Nenhuma parte desteanal poderá ser reproduzida ou transmitida sejam quais forem os meiosempregados sem prévia autorização dos editores.

Diretoria – CONPEDI

Presidente - Prof. Dr. Raymundo Juliano Feitosa – UNICAP Vice-presidente Sul - Prof. Dr. Ingo Wolfgang Sarlet – PUC - RS

Vice-presidente Sudeste - Prof. Dr. João Marcelo de Lima Assafim – UCAM Vice-presidente Nordeste - Profa. Dra. Maria dos Remédios Fontes Silva – UFRN Vice-presidente Norte/Centro - Profa. Dra. Julia Maurmann Ximenes – IDP Secretário Executivo - Prof. Dr. Orides Mezzaroba – UFSC

Secretário Adjunto - Prof. Dr. Felipe Chiarello de Souza Pinto – Mackenzie

Representante Discente –Doutoranda Vivian de Almeida Gregori Torres – USP

Conselho Fiscal:

Prof. Msc. Caio Augusto Souza Lara – ESDH

Prof. Dr. José Querino Tavares Neto – UFG/PUC PR

Profa. Dra. Samyra Haydêe Dal Farra Naspolini Sanches – UNINOVE Prof. Dr. Lucas Gonçalves da Silva – UFS (suplente)

Prof. Dr. Fernando Antonio de Carvalho Dantas – UFG (suplente)

Secretarias:

Relações Institucionais – Ministro José Barroso Filho – IDP

Prof. Dr. Liton Lanes Pilau Sobrinho – UPF

Educação Jurídica – Prof. Dr. Horácio Wanderlei Rodrigues – IMED/ABEDi

Eventos – Prof. Dr. Antônio Carlos Diniz Murta – FUMEC Prof. Dr. Jose Luiz Quadros de Magalhaes – UFMG Profa. Dra. Monica Herman Salem Caggiano – USP Prof. Dr. Valter Moura do Carmo – UNIMAR

Profa. Dra. Viviane Coêlho de Séllos Knoerr – UNICURITIBA

D597

Direito agrário e agroambiental [Recurso eletrônico on-line] organização CONPEDI

Coordenadores: Nivaldo Dos Santos; Valmir César Pozzetti -Florianópolis: CONPEDI, 2017.

Inclui bibliografia ISBN: 978-85-5505-405-1

Modo de acesso: www.conpedi.org.br em publicações

Tema: Desigualdade e Desenvolvimento: O papel do Direito nas Políticas Públicas

CDU: 34 ________________________________________________________________________________________________

Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Direito

Florianópolis – Santa Catarina – Brasil www.conpedi.org.br

Comunicação – Prof. Dr. Matheus Felipe de Castro – UNOESC

(3)

XXVI ENCONTRO NACIONAL DO CONPEDI BRASÍLIA – DF

DIREITO AGRÁRIO E AGROAMBIENTAL

Apresentação

A edição do XXVI ENCONTRO NACIONAL DO CONPEDI, ocorrida em Brasília/DF, em julho de 2017 consolida o Direito Agrário e Agroambiental como áreas de ampla produção acadêmica em programas os mais diversos, em todos os quadrantes do país.

O grande interesse demonstrado pelos pesquisadores em estudar temas dessas áreas encontrou, nas sessões do Grupo de Trabalho realizadas no evento, uma enorme receptividade e oportunidade de discussão.

A obra que ora apresentamos reúne os artigos selecionados, pelo sistema de dupla revisão cega, por avaliadores ad hoc, para apresentação no evento.

Diversamente do ocorrido em edições anteriores, na atual obra constatamos uma diversidade temática tal, incapaz de propiciar um bloco de interesse específico dos pesquisadores, senão que estamos ampliando, cada vez mais, o alcance do Direito Agrário nos temas discutidos.

Apresentamos, assim, os trabalhos desta edição.

O trabalho intitulado “A (IN) CONSTITUCIONALIDADE DO FUNRURAL E SUAS CONSEQUENCIAS PARA OS PRODUTORES RURAIS: UMA ANÁLISE POLITICA E JURIDICA DA DECISÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL”, de autoria de Thiago Henrique Costa Silva e Maria Izabel de Melo Oliveira dos Santos, aborda dados historiais e a partir daí, procura oferecer suporte teórico apto a demonstrar a necessidade de um olhar mais cuidadoso ao crescente número de idosos no país e a necessidade de se identificar um custeio previdenciário ao homem do campo, que lhe assegure existência digna, concluindo, dessa forma, que a contribuição ao FUNRURAL é constitucional.

(4)

movimento social camponês de Trombas e Formoso, indagando se o mesmo representou uma violência institucionalizada ou apenas uma prática de defesa social para a manutenção da ordem. Apresenta, portanto, um contexto histórico da gênese e desenvolvimento desta Republica Campesina.

O papel das unidades de conservação fica evidenciado no trabalho intitulado “AS RESERVAS PARTICULARES DO PATRIMÔNIO NATURAL E A NECESSIDADE DA INSTITUIÇÃO DE ÁREAS PRIVADAS AMBIENTALMENTE PROTEGIDAS NOS IMÓVEIS RURAIS DO SUL DO ESTADO DE GOIÁS”, de André Luiz Duarte Pimentel, que analisa a necessidade da instituição voluntária da Reserva Particular do Patrimônio Natural nas propriedades agrárias situadas no Sul do Estado de Goiás, onde tais reservas inexistem. Destacada a importância da criação volitiva dessas reservas como mecanismo para o cumprimento e efetividade da função socioambiental da terra e também para a preservação do bioma Cerrado.

Romulo Cesar Barbosa Marques e Luciana Ramos Jordão brindam seus leitores com um trabalho intitulado “ASSISTÊNCIA TÉCNICA E EXTENSÃO RURAL NO ESTADO DE GOIÁS: DESENVOLVIMENTO AGROAMBIENTAL COMO FORMA DE SUPERAÇÃO DA QUESTÃO AGRÁRI” no qual analisam a assistência técnica e extensão rural no estado de Goiás, sob o prisma do desenvolvimento agroambiental e a superação da questão agrária; para isso fazem um escorço histórico da criação de órgãos de assistência e fomento, discutindo as novas políticas de fomento rural e as necessidades do pequeno produtor contemporâneo.

Já o trabalho “CORUMBÁ DE GOIÁS: UMA HISTÓRIA DE LUTA NO CAMPO”, de Natasha Gomes Moreira Abreu e Nivaldo Dos Santos, discute, sob a ótica dos conflitos coletivos agrários, o direito de posse e proteção jurídica da propriedade da terra e a condição de atendimento da função social. O estudo é desenvolvido a partir de revisão sobre as teorias da posse, e a sua repersonalização e, ao final, é debatida a função social nas ações de reintegrações de posse através do estudo de caso do processo de Reintegração de Posse da Fazenda Santa Mônica em Corumbá de Goiás, e no final, analisa de forma crítica, a decisão judicial exarada.

(5)

entre homem, terra e território, gerando riscos na proteção do patrimônio cultural e nas reivindicações de terra, por nacionais.

Já o trabalho intitulado “DIREITO HUMANO À ALIMENTAÇÃO ADEQUADA COMO VERTENTE DO DIREITO AGRÁRIO: A (IN) EFICÁCIA DO SISTEMA NACIONAL DE SEGURANÇA ALIMENTAR E NUTRICIONAL NA CONCRETIZAÇÃO DO DIREITO À ALIMENTAÇÃO DAS PESSOAS CUSTODIADAS”, de José Augusto Magni Dunck, discute a importância do direito agrário e a eficácia do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN) em formular políticas públicas de desenvolvimento para concretizar o direito humano, à alimentação adequada, às pessoas privadas de liberdade e redução da desigualdade social. Com apoio em relatório oficial e realiza diagnóstico sobre a alimentação dos presos e a eficácia do SISAN. A partir de categorias de Foucault faz debate sobre a influência do racismo institucional como variável que legitima a ausência de concretização do direito humano à alimentação adequada a essa parte da sociedade.

Já o estudo jurisprudencial intitulado “EXTERNALIDADES NEGATIVAS DECORRENTES DO USO DE AGROTÓXICOS E A INSEGURANÇA ALIMENTAR: UMA ANÁLISE DA ATUAÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL”, de Camila Santiago Ribeiro e Eduardo Gonçalves Rocha, analisa a atuação do Supremo Tribunal Federal frente aos efeitos negativos gerados pela ampla utilização de agrotóxicos na produção agrícola, que vem distribuindo ônus para toda a sociedade e contribuindo para o aumento da insegurança alimentar. As externalidades negativas que têm origem no agronegócio vão além dos limites econômicos e demográficos da atividade e fazem toda a sociedade suportar os custos sanitários, ambientais e sociais desse modelo de produção agrícola. Uma análise das decisões da corte constitucional demonstra como essa questão vem sendo enfrentada judicialmente.

Os autores Ricardo Araujo Dib Taxi e Liandro Moreira Da Cunha Faro, trazem reflexões sobre o tema “JUDICIALIZAÇÃO DA QUESTÃO AGRÁRIA E COMUNIDADES TRADICIONAIS QUILOMBOLAS: O JUDICIÁRIO QUANDO DA ANÁLISE DOS CONFLITOS TERRITORIAIS”, onde destacam o papel do judiciário nos conflitos que envolvem direitos territoriais das comunidades tradicionais, observando a tendência do poder judiciário brasileiro em julgar demandas desta natureza, através de uma estrutura institucional que provoca violência aos grupos étnicos e seus direitos territoriais.

(6)

explora os conflitos agrários no Estado do Pará, cuja politica governamental é tendenciosa, privilegiando a classe economicamente mais forte em detrimento dos pequenos proprietários, populações tradicionais e propriedade coletiva, destacando que, não obstante a CPI da Grilagem instituída no âmbito do congresso Nacional, o cancelamento de matrícula de registro de imóveis no estado do Pará não ocorreu de forma efetiva, prejudicando as populações fragilizadas, originários proprietários da terra.

Já o trabalho de autoria de Ramon De Souza Oliveira, intitulado “O CIRCUITO ESPACIAL DA PRODUÇÃO DO CAFÉ A PARTIR DO MUNICÍPIO DE PATROCÍNIO/MINAS GERAIS” traz contribuições sobre a evolução da cafeicultura em Patrocínio, no estado de Minas Gerais (MG), discutindo a produção de “cafés finos”, modernização da agricultura, a agricultura científica globalizada.

O trabalho intitulado “CONFLITO COLOMBIANO NO SÉCULO XX: A PERSPECTIVA DAS LUTAS POR TERRAS E TERRITÓRIOS COMO DIREITO À TERRA E PAZ”, de autoria de Luís Felipe Perdigão De Castro e Miquelly Barbosa da Silva, aborda a luta pela terra, o conflito colombiano no século XX, em especial a dinâmica da legislação rural dentro dos processos de concentração e exclusão no campo. Parte-se, inicialmente, de um breve panorama histórico para, na sequência, debater as significações das lutas por terras e territórios, como busca por direitos e identidades sociais. O pano de fundo é a luta por terra como elemento transversal das violências contra comunidades camponesas, indígenas e afro-colombianas. O objetivo é discutir as contradições e rupturas que permeiam as disputas e legislações agrárias da Colômbia.

Na produção intitulada “CONFLITO DE NORMAS NO ART. 4º DA LEI nº 12.651/2012, CRITÉRIO HIERÁRQUICO E A TEORIA DO MAL MENOR”, de autoria de João Da Cruz Gonçalves Neto e Lais Machado Papalardo de Moraes Carneiro, os autores analisam o art. 4º da Lei nº 12.651/2012 e o consideram carecedor de precisão legislativa, o que pode causar problemas na interpretação normativa e, com isso, graves conflitos agroambientais. A partir do conceito de Área de Preservação Permanente e da importância de sua manutenção, entendeu-se que a discricionariedade relativa à extensão da área a ser preservada pode significar perda do direito pleno de propriedade ou ataque ao meio ambiente preservado. Estuda-se o caso de antinomia aparente de normas ambientais, a qual pode ser solucionada pelo critério hierárquico e pela aplicação da Teoria do Mal Menor.

(7)

identifica como se constrói a noção de desenvolvimento rural e se existe uma questão estrutural que interliga a pobreza e a concentração de terras no meio rural. Apresenta uma crítica às políticas públicas com enfoque setorial, por não darem a devida atenção à obtenção, pelos indivíduos, do conjunto de capacidades e funcionamentos ligados às condições mínimas para uma vida digna. Por isso, argumenta que as políticas públicas devem ser pensadas e planejadas de maneira integrada, de modo a buscar essa ampliação das capacidades humanas.

Os autores Ana Luisa Santos Rocha e José Heder Benatti, no trabalho intitulado “POLÍTICA NACIONAL DE REFORMA AGRÁRIA E SEUS DIFERENTES INSTRUMENTOS FUNDIÁRIOS”, discutem os diferentes instrumentos que compõem o rol de projetos da Reforma Agrária no Brasil, tendo como base a Norma de Execução INCRA nº 69/2008 e os projetos estaduais no Estado do Pará, demonstrando um aumento gradativo nas categorias fundiárias e os sujeitos abrangidos nessa política pública.

No trabalho intitulado “PRINCÍPIOS E CLÁUSULAS GERAIS: A QUESTÃO DA FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE” a autora Bárbara Tuanni Veloso da Silva faz uma análise teórica sobre a função social da terra, e conclui que o direito a ela deve ser aplicado e interpretado de forma plural, evidenciando o papel do juiz, e de diferentes teorias sobre a hermenêutica, deixando claro a importância da “terra” para as comunidades indígenas, demonstrando que para eles há um valor muito maior que o cultural e econômico: um valor vital.

Finalizando, o autor Olímpio de Moraes Rocha, no trabalho “PROJETOS DE REFORMA AGRÁRIA VIA DESAPROPRIAÇÃO SOCIAL E EXPLORAÇÃO MINERAL: DIÁLOGOS JURÍDICOS POSSÍVEIS” faz uma análise sobre o desenvolvimento econômico, à luz da atividade minerária, destacando os riscos e perigos que a atividade acarreta, demonstrando o perigo da dicotomia entre os objetivos fundamentais da República: o desenvolvimento nacional e a redução das desigualdades sociais, destacando o importante papel da atividade agrária para a manutenção do meio ambiente saudável e com qualidade de vida.

(8)

Desejamos, pois, excelente leitura a todos.

Prof. Dr. Nivaldo dos Santos

(9)

1 Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Direito Agrário da Universidade Federal de Goiás 1

DIREITO À TERRA E A AQUISIÇÃO DE TERRAS POR ESTRANGEIROS RIGHT TO THE EARTH AND THE ACQUISITION OF LANDS BY FOREIGNERS

Isabella Andrade Ferreira Xavier 1 Vilma de Fátima Machado

Resumo

O objetivo deste artigo é demonstrar o quanto as restrições impostas pela lei 5.709/71 na aquisição de terras por estrangeiros são importantes para a soberania e segurança nacional. Além do mais, o afrouxamento dessas restrições podem ocasionar a perda da identidade na relação homem – terra – território, risco na proteção do patrimônio cultural e dificuldade no acesso ou reivindicações por terra.

Palavras-chave: Espaço, Lugar, Território, Terra, Aquisição de terras

Abstract/Resumen/Résumé

The objective of this article is to demonstrate how the restrictions imposed by law 5,709 / 71 on the acquisition of land by foreigners are important for sovereignty and national security. Moreover, the loosening of these restrictions may lead to the loss of identity in the man - land - territory relationship, risk in the protection of cultural heritage and difficulty in access or land claims.

Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Espace, Local, Territory, Land, Acquisition of land 1

(10)

INTRODUÇÃO

Um estudo realizado pelo Banco Mundial em 2010 apontou as razões para o aumento da demanda de aquisição de terras. Outro ponto significativo enfrentado na pesquisa foi quem são os atuais demandantes. A procura por alimentos, ração, celulose associada com o aumento populacional e a demanda por matérias- primas para biocombustíveis são apontadas como principais fatores que ocasionam uma recente corrida mundial por terras. Governos preocupados com a demanda interna e sua incapacidade de produzir alimentos, empresas financeiras que encontram vantagens financeiras na aquisição de terras e empresas do setor agroindustrial procurando expandir seus negócios são os principais demandantes. (BANCO, 2010, p. 3-7)

Ideias amparadas pela bandeira da atração de investimentos para o país, uma forte oferta de produtos publicitários acerca do sucesso do modelo agrícola monocultor e latifundiário para economia, bem como a demanda mundial por terras, tem ascendido o debate sobre as restrições impostas quanto à aquisição de terras por estrangeiros no país.

Quando o assunto é acesso à terra, é fundamental reconhecer que ainda vigora uma certa frouxidão na legislação brasileira no que diz respeito à aquisição de terras, pois as restrições podem não ter efeitos práticos, especialmente pela falta de fiscalização. Além do que, uma possível revogação da lei 5.709/71 e a utilização de terras brasileiras no contexto internacional poderão ocasionar consequências de diversas naturezas

Amparados pelo método bibliográfico, investigamos na primeira parte do artigo o conceito de terras e território como possível instrumento de luta e resistência. Na segunda parte, socorridos pelos ensinamentos do geógrafo Milton Santos (2006), refletimos sobre a problemática desterritorialização. Em seguida, a partir do texto constitucional e da literatura de Juliana Santilli (2009), evidenciamos que o patrimônio cultural brasileiro, nas formas materiais e imateriais, ainda que pouca conhecida, já encontra proteção em nosso ordenamento.

Em seguida ressaltamos o contexto das legislações de restrição à aquisição de terras por estrangeiros e a recente mudança de postura da Advocacia Geral da União. Dessa forma, levantamos as seguintes questões: Qual seria a consequência da abertura da fronteira brasileira à aquisição de terras por estrangeiros? Temos instrumentos jurídicos aptos a

(11)

proteger nosso patrimônio? O fator identitário com a terra pode ser um dos caminhos perseguidos?

1 ESPAÇO, LUGAR, TERRA E TERRITÓRIO

1.1 TERRA É TERRITÓRIO

A noção de território está presente mais notadamente na literatura geográfica e durante muito tempo esteve atrelado quase exclusivamente à concepção de território como lugar de poder legal do Estado. Mais recentemente, esse conceito está associado ora como compreensão do termo espaço, ora como sinônimo de terra.

O Decreto n 6.040/2007 define povos e comunidades tradicionais e territórios tradicionais , no seu art. 3º, como sendo

I -grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como tais, que possuem formas próprias de organização social, que ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição.

II - os espaços necessários a reprodução cultural, social e econômica dos povos e comunidades tradicionais, sejam eles utilizados de forma permanente ou temporária, observado, no que diz respeito aos povos indígenas e quilombolas, respectivamente, o que dispõem os arts. 231 da Constituição e 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias e demais regulamentações”

O elemento central dessa definições, é portanto, a autodefinição ou o autoreconhecimento como um grupo socialmente diferenciado e com uma identidade comum. A autodefinição, nesse caso, no sentido de assumir uma identidade social, nos levando a concluir que a luta por terra e por território é busca por uma identidade.

Essas reflexões enfatizam uma determinada concepção de território (e de terra). Se, no direito, território é elemento formador do Estado (povo, território e nação), por outro lado, aqui a preocupação central nos territórios é a apropriação, uso e construção (real e simbólica) do espaço e do lugar pelas populações que o habitam, portanto, o espaço como produtor de relações, de identidade e de tradição. Ou seja, as populações tradicionais têm direito ao território porque este é entendido como local de vida e preservação da identidade, sendo que, a princípio, o critério não passa pela produção ou finalidade produtiva da terra (como uma redução ou simplificação da função social).

(12)

O Inciso II, do art. 185 da Constituição Federal é um exemplo normativo ée entrave no acesso à terra, pois consolidou uma noção restrita de função social, resumida à sua dimensão econômica. O único critério utilizado para a desapropriação, tanto pelo Poder

Executivo como pelo Judiciário, é a avaliação econômica do “uso racional” das terras como sendo ou não produtiva.

Sauer (2010, p. 75) procura combater a noção de terra como simples meio de produção, e acrescenta que tal redução é fruto, por exemplo, da redação dada pelo texto

constitucional à “terra produtiva”, como mecanismo para bloquear avanços na reforma

agrária. Destaca-se ainda, que para esse autor o conceito de território é lugar de vida.

Dessa forma, a distinção de terra e território tem proporcionado a seguinte problemática: enquanto a terra for vista apenas como meio de produção, a luta por terras (acesso) estará enfraquecida, pois, a partir disso criou-se uma diferença de compreensão conceitual entre as lutas sociais por terra (a exemplo da reforma agrária) e a reivindicações dos direitos territoriais, como os das comunidades tradicionais. Em outros termos, a luta pela terra é vinculada a uma luta por acesso aos meios de produção, de cunho trabalhista, enquanto a luta por território (lugar de identidade, auto reconhecimento, ocupação histórica) é vista como resistência dos povos tradicionais. Possivelmente, umas das consequências desse problema conceitual estão nas constantes critícas ofertadas aos programas governamentais em prol da reforma agrária.

Para melhor elucidar a questão, Sauer (2003, p. 20-21) argumenta que os assentamentos não são ilhas (lugar- espaço físico), mas sim territórios social e politicamente demarcados Nesse espaço físico, uma parcela do território rural é transformado em espaço econômico, político e social. São lugares de sociabilidade e identidade. Assim, se compararmos as noções de acampamento e assentamento, temos uma diferença significativa: a terra. Para àquele, enquanto desejo e para o último, enquanto acesso. Dessa forma, o aceso à terra se dá por processo de luta e construção simbólica, elevando o conceito de terra a lugar de vida. Terra, portanto, é vida, meio de produção e reprodução social.

Dessa forma, enquanto não for afastada a noção de terra, implícita em nosso ordenamento jurídico, como sendo mero meio de produção, as reivindicações dos agricultores familiares sofrerão dificuldades no acesso a terra. O lugar – terra- é necessário para que as comunidades tradicionais estabeleçam seu território e mantenham suas tradições, bem como, para que os agricultores familiares construam suas tradições e identidades, sendo portanto, terra e território, lugar identitário e agregador.

(13)

1.1 A NATUREZA DO ESPAÇO DE MILTON SANTOS

No livro “A natureza do Espaço: Técnica e Tempo. Razão e Emoção” de Milton

Santos (2006, p.14), o objeto de estudo do é a busca pela noção de espaço, tais como a paisagem, a configuração territorial, a divisão territorial do trabalho, o espaço produzido ou produtivo, dentre outros, propondo debates e problemas como o da região e do lugar.

Para este autor, a história do meio geográfico é divida em três etapas: o meio natural, regrado por uma harmonia socioespacial; meio técnico, cuja principal característica é o domínio do natural e a emergência do espaço mecanizado, chegando a artificialização do espaço; e por último o meio técnico cientifico e informacional, cujo traço marcante é a interação entre ciência e técnica, consequentemente a tecnização da paisagem, onde os espaços correspondem aos interesses dos atores hegemônicos da economia global. Inclusive, o papel desta economia global na transformação da produção e do espaço torna-se

fundamental, tendo por consequência “o aprofundamento das especializações produtivas, tendentes a convocar, outra vez, mais circulação.” (SANTOS, 2006, p.161)

Quando as grandes empresas, em destaque as multinacionais, atingem um alto arcabouço tecnológico e informacional, elas se espalham por vários países, mais precisamente os do hemisfério sul, impondo-lhes uma nova condição de vida, uma espécie de capitalismo sem fronteiras. Assim, os espaços nacionais se transformam em espaços nacionais de economia internacional. Tal processo é chamado de desterritorialização. (SANTOS, 2006, p. 163)

A questão da desterritorialização vem sido debatida pelo Direito em diferentes aspectos. A apropriação do controle do mercado pelas empresas que dispõem das tecnologias de ponta, bem como todo um trabalho publicitário leva as pessoas a consumirem tais produtos em detrimento dos produtos locais. Dessa forma, a desterritorialização tem por consequência a desindustrialização e a diminuição da soberania.

Os lugares se distinguiriam pela diferente capacidade de oferecer rentabilidade aos investimento. Essa rentabilidade é maior ou menor, em virtude de condições locais de ordem técnica (equipamentos, infra-estrutura, acessibilidade) e organizacional (leis locais, impostos, relações trabalhistas, tradição laboral). (SANTOS, 2006, p. 166)

Em tese, as consequências dessa dominação do espaço nacional por uma economia internacional colabora para muitas reflexões, objetos desse artigo: a questão da soberania nacional, a valorização do local, a forma de relação com a terra, bem como a questão a

(14)

segurança alimentar tão perseguida como dependente de algumas poucas corporações que detém posição privilegiada nas relações sociais de poder.

1.2 A PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO CULTURAL

O artigo 216 da Constituição Federal cuidou de separar os bens de natureza material (plantas cultivadas, por exemplo) e imaterial (saberes agrícolas) do patrimônio cultural brasileiro. A forma eleita pelo texto constitucional para a proteção desses institutos foram o tombamento, o registro e o inventário, conforme preceitua parágrafo primeiro do referido artigo.

São eles dotados de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira tais como: (I) as formas de expressão;(II) os modos de criar, fazer e viver; (III) as criações científicas, artísticas e tecnológicas; (IV)as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais; (V) - os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico.

Os bens imateriais [...] incluem os conhecimentos, inovações e práticas agrícolas, detidos pelos agricultores tradicionais e locais, que vão desde as formas de cultivo (queima e pousio, plantios consorciados etc.) até o controle biológico de pragas e doenças e o melhoramento de variedades locais. Tais conhecimentos tradicionais e locais, associados à grobiodiversidade, fazem parte do patrimônio cultural brasileiro e devem ser objeto de ações e políticas de salvaguarda e fomento. (SANTILLI, 2009, p. 289)

Nos anos 2000, o presidente Fernando Henrique Cardoso instituiu o registro de bens culturais de natureza imaterial, criando os livros de registro de saberes, celebrações, formas de expressão e lugares através do decreto nº 3.551, de 4 de agosto de 2000, quais sejam:

I - Livro de Registro dos Saberes, onde serão inscritos conhecimentos e modos de fazer enraizados no cotidiano das comunidades;

II - Livro de Registro das Celebrações, onde serão inscritos rituais e festas que marcam a vivência coletiva do trabalho, da religiosidade, do entretenimento e de outras práticas da vida social;

III - Livro de Registro das Formas de Expressão, onde serão inscritas manifestações literárias, musicais, plásticas, cênicas e lúdicas;

IV - Livro de Registro dos Lugares, onde serão inscritos mercados, feiras, santuários, praças e demais espaços onde se concentram e reproduzem práticas culturais coletivas. (§ 1º do art. 1º do Decreto 3.551/2000)

(15)

Santilli (2009, p. 291) sustenta ainda a relação entre alimentação e cultura, de forma que O Iphan já efetuou, por exemplo, o registro do modo de produção artesanal do queijo de Minas (das regiões do Serro e das serras da Canastra e do Salitre) como patrimônio imaterial brasileiro.

Quanto às paisagens culturais, em conformidade com o § 1º do art. 216 da Constituição Federal que determina que o poder público, com a colaboração da comunidade, promoverá a proteção do patrimônio cultural brasileiro, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN emitiu a Portaria nº 127 de 30.04.2007.

Dessa forma, a proteção Paisagem Cultural é o mais novo instrumento de preservação do patrimônio cultural brasileiro, lançado em 2009 pelo Iphan, fruto da Portaria Iphan nº 127/2009.

Segundo esse documento, “paisagem cultural brasileira” é uma porção peculiar do território nacional, representativa do processo de interação do homem com o meio natural, à qual a vida e a ciência humana imprimiram marcas ou atribuíram valores.

São exemplos da Paisagem Cultural as relações entre o sertanejo e a caatinga, o candango e o cerrado, o boiadeiro e o pantanal, o gaúcho e os pampas, o pescador e os contextos navais tradicionais, o seringueiro e a floresta amazônica, por exemplo. Como estes, outros tantos personagens e lugares formam o painel das riquezas culturais brasileiras, destacando a relação exemplar entre homem e natureza.( Brasil, 2009, p. 13)

Dessa forma, existe no nosso ordenamento jurídico proteção específica para as paisagens culturais, para os bens imateriais (formas de saber, fazer e criar, como músicas, contos, lendas, danças, receitas culinárias e materiais, a exemplo das plantas cultivadas. Contudo, tais proteções têm sido ameaçadas por um movimento mundial de disputa por terras, especialmente, nos países tropicais, detentores de ampla cartela de recursos naturais e leis afrouxadas.

2 A AQUISIÇÃO DE TERRAS POR ESTRANGEIROS NO BRASIL

2.1 CONTEXTO

Apesar de não ser um fenômeno recente, o debate acerca da aquisição de terras por estrangeiros ganhou novo destaque a partir da crise cambial 2008, com a chamada

“agroinflação”, caracterizada pelo aumento de preços agrícolas. Esse aumento de preços

(16)

interfere profundamente no debate acerca da segurança alimentar, já que diminui a capacidade de renda das famílias, aumento da pobreza e falta de acesso aos alimentos.

O que contribuiu para essa elevação de preços foram a busca pela produção de biocombustíveis, exploração petroleira, mineração, mudanças climáticas adversos à produção e os baixos estoques de alimentos no mundo. Soma-se a isso, o crescimento da população mundial foi significativo, atingindo um contingente de 7 bilhões de habitantes no final de 2011. (HAGE; PEIXOTO; FILHO, 2012, p. 9)

A imprensa tem divulgado o interesse das empresas estrangeiras por terras brasileiras ligadas a produção, principalmente de biocombustíveis. Para Delgado (2013, p. 65) a partir dos anos 2000 há uma característica peculiar na economia brasileira. A demanda externa é vetor de expansão para os seguintes setores: economia do agronegócio, mineração, exploração petroleira e a hidroeletricidade, cuja a principal característica é o monopólio de recursos naturais, revelando, portanto, o interesse internacional na captura de vantagens nos países detentores dessas reservas e recursos, como o caso do Brasil.

Debates como a soberania nacional, limites sobre a faixa de fronteira, a biopirataria na Região Amazônica, especulação imobiliária e aumento do fluxo da compra de propriedades rurais por estrangeiros levaram a Advocacia Geral da União (AGU) a definir, em 2010, nova interpretação da legislação até então vigente, no intuito de limitar o acesso de estrangeiros à propriedade fundiária nacional. Dentre os argumentos que sustentaram essa mudança de interpretação estão:

a) expansão da fronteira agrícola com o avanço do cultivo em áreas de proteção ambiental e em unidades de conservação; b) valorização desarrazoada do preço da terra e incidência da especulação imobiliária gerando aumento do custo do processo desapropriação voltada para a reforma agrária, bem como a redução do estoque de terras disponíveis para esse fim; c) crescimento da venda ilegal de terras públicas; d) utilização de recursos oriundos da lavagem de dinheiro, do tráfico de drogas e da prostituição na aquisição dessas terras; e) aumento da grilagem de terras; f) proliferação de "laranjas" na aquisição dessas terras; g) incremento dos números referentes à biopirataria na região amazônica; h) ampliação, sem a devida regulação, da produção de etanol e biodiesel; i) aquisição de terras em faixa de fronteira pondo em risco a segurança nacional” (item 7 do

Parecer CGU/AGU nº 01/2008-RVJ, aprovado pelo Parecer AGU LA-01/2010).

As restrições da disciplina de aquisição de imóveis agrários por estrangeiros visam à defesa da integridade do território nacional, à soberania e à proteção econômica-social do acesso à terra, e, ainda, como meio de coibir a força do capital externo.

(17)

2.2 LEGISLAÇÃO NORTEADORA DA MATÉRIA

A Lei 4.504, de 30 de novembro de 1964, conhecida como o Estatuto da Terra, é a base do regime jurídico do imóvel rural, mas não tratou diretamente do assunto. Permitiu

apenas que estrangeiros “radicados” no país pudessem participar dos programas de reforma

agrária e colonização.

A Lei no 5.709, de 7 de outubro de 1971, que “regula a aquisição de imóvel rural

por estrangeiro residente no País ou pessoa jurídica estrangeira autorizada a funcionar no

Brasil, e dá outras providências”, prevê diversas restrições à compra de terras nacionais –

tanto públicas quanto privadas – por estrangeiros, sejam estes pessoas físicas ou jurídicas. A Lei 6.634, de 2 de maio de 1979, que dispõe sobre a faixa de fronteira e Decreto 85.064, de 26 de agosto de 1980, representam a base do regime jurídico da aquisição de imóvel rural localizado em faixa de fronteira.

Finalmente a matéria vem regulada pela Constituição Federal de 1988 no Título VII – Da Ordem Econômica e Financeira, no Capítulo III – Da Política Agrícola e Fundiária e da Reforma Agrária, em seu artigo 190 segundo o qual “a lei regulará e limitará a aquisição

ou o arrendamento de propriedade rural por pessoa física ou jurídica estrangeira e estabelecerá

os casos que dependerão de autorização do Congresso Nacional.”

Ademais, há outras normas que cuidam do assunto, notadamente o Artigo 23 da Lei no 8.629, de 25 de fevereiro de 1993, o qual estende aquelas restrições às operações de arrendamento de imóvel rural.

2.3 A PROBLEMÁTICA DO § 1º DO ART. 1º DA LEI 5.709/1971

Pela análise do texto da Lei 5.709/1971, se vê inicialmente que ela impõe restrições à aquisição de imóvel rural às pessoas físicas estrangerias residentes no Brasil, às pessoas jurídicas estrangeiras autorizadas a funcionar no Brasil e também às pessoas jurídicas brasileiras cuja maioria do capital social pertença à pessoa física ou jurídica estrangeira que resida ou tenha sede no exterior (art.1º e § 1º).Portanto, esses são os sujeitos a quem a lei é aplicada.

A controvérsia se deu no momento da entrada em vigor da Constituição de 88, que previa, no texto do art. 171, antes deste ser revogado pela Emenda Constitucional nº 6, a distinção entre empresa brasileira e empresa brasileira de capital nacional. Dessa forma,

(18)

surgia a seguinte questão: pessoas jurídicas brasileiras, nas quais estrangeiros detêm a maioria do capital social e não residem ou têm sede no Brasil estariam sujeitas as essas restrições?

Eis o texto integral do Artigo 171 da CF

São consideradas:

I – empresa brasileira a constituída sob as leis brasileiras e que tenha sua sede e administração no País;

II – empresa brasileira de capital nacional aquela cujo controle efetivo esteja em caráter permanente sob a titularidade direta ou indireta de pessoas físicas domiciliadas e residentes no País ou de entidades de direito público interno, entendendo-se por controle efetivo da empresa a titularidade da maioria de seu capital votante e o exercício, de fato e de direito, do poder decisório para gerir suas atividades.

§ 1º A lei poderá, em relação à empresa brasileira de capital nacional: I – conceder proteção e benefícios especiais temporários para desenvolver atividades consideradas estratégicas para a defesa nacional ou imprescindíveis ao desenvolvimento do País;

II – estabelecer, sempre que considerar um setor imprescindível ao desenvolvimento tecnológico nacional, entre outras condições e requisitos: a) a exigência de que o controle referido no inciso II do caput se estenda às atividades tecnológicas da empresa, assim entendido o exercício, de fato e de direito, do poder decisório para desenvolver ou absorver tecnologia;

b) percentuais de participação, no capital, de pessoas físicas domiciliadas e residentes no País ou entidades de direito público interno § 2º Na aquisição de bens e serviços, o Poder Público dará tratamento preferencial, nos termos da lei, à empresa brasileira de capital nacional.

Para o referido artigo para uma empresa ser considerada brasileira, bastava que ela fosse constituída de acordo com a legislação brasileira e que possuísse sede e administração em território nacional. Já a empresa brasileira de capital nacional, além destes requisitos, deveria estar permanentemente sob o controle de pessoas físicas domiciliadas ou pessoas jurídicas sediadas no Brasil.

Assim, notório que não teria sido recepcionada pela nova ordem constitucional o disposto no artigo 1º, parágrafo 1º, da Lei 5.709/71. A consequência prática desse entendimento foi o de que as pessoas jurídicas brasileiras, ainda que tivessem controle acionário de estrangeiros residentes no exterior, não poderiam sofrer as limitações dessa lei (esse, aliás, foi o entendimento da AGU, em seu parecer de 7/6/1994 – Parecer AGU GQ-22/1994). (MORAES, 2015, p. 5)

Ao ser provocada sobre o tema, a Advocacia Geral da União (AGU) foi ediaou o parecer GQ-22 em 1994, concluindo que o § parágrafo 1º do Artigo 1º da Lei no 5.709, de 1971, conflitava com o conceito exarado no inciso I do Artigo 171 da CF e não teria sido, portando, recepcionado. Dessa forma, não seria possível admitir as restrições da Lei 5.709/71 às empresas constituídas sob as leis brasileiras que possuíssem sede e administração em

(19)

território nacional. Nesse contexto, bastava criar uma pessoa jurídica sob as leis brasileiras, sediada e administrada no Brasil, controlada por estrangeiros, que não haveria restrição na legislação.

Com a revogação do art. 171 pela Emenda Constitucional nº 6 de 1995 começa a suscitar nova controvérsia: se nesse caso, haveria a possibilidade de ocorrência de repristinação (vale dizer, restaurar sua existência). Em um primeiro momento, considerou-se impossível a repristinação do artigo 1º, parágrafo 1º, da Lei 5.709/71 e a consequente volta

das restrições às pessoas jurídicas brasileiras “da qual participem, a qualquer título, pessoas

estrangeiras físicas ou jurídicas que tenham a maioria do seu capital social e residam ou

tenham sede no exterior”

2.4 A EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 6 DE 1995 - PARECER GQ 181- DA AGU DE 1998

Em 1995, com a publicação da Emenda Constitucional nº 6, que revogou o art. 171 da Constituição da República, foi eliminando do texto constitucional a definição de empresa nacional.Para ser brasileira a empresa, basta que tenha se constituído sob a égide das leis brasileiras e que tenha sua sede e administração no país. Segundo o novo Parecer da AGU GQ 181, de 1998, a revogação do art. 171 da CF não tinha o condão de repristinar - tornar de novo válido e eficaz - o § 1º do art. 1º da Lei nº 5.709, de 1971.

Ou seja, na prática, continuou liberada a aquisição de terras brasileiras por estrangeiros, uma vez que a única exigência era que a empresa tenha sido constituída por leis brasileiras e que tenha sua sede e administração no país.

Como já dito, após a crise cambial de 2008 e o Relatório do Banco Mundial (2010) a

preocupação quanto a “corrida por terras” emerge novamente. A questão da soberania,

especulação imobiliária a busca por recursos naturais em países do hemisfério sul foram alguns dos fatores levaram a Advocacia Geral da União (AGU) a definir, em 2010, nova interpretação da legislação até então vigente, no intuito de limitar o acesso de estrangeiros à propriedade fundiária nacional.

2.5 O PARECER CGU/AGU Nº 01/2008-RVJ, APROVADO PELO PARECER LA01-10

(20)

O Parecer CGU/AGU nº 01/2008-RVJ, aprovado pelo parecer LA01-10 em agosto de 2010, é fruto da nova provocação feita à AGU para se manifestar sobre o tema. Sendo que dessa vez a AGU adotou entendimento oposto aos pareceres anteriores.

Afirmou o advogado da União, contrariamente ao que havia sido defendido no parecer GQ-22/94, que nunca houve incompatibilidade entre o art. 171, enquanto estava em vigor, e o §1º do art. 1º da Lei 5.709/71.

Argumentou ainda que não teria perdido vigência a norma segundo a qual a pessoa jurídica brasileira da qual participem, a qualquer título, pessoas estrangeiras físicas ou jurídicas que tenham a maioria do seu capital social e residam ou tenham sede no exterior submete-se aos ditames da referida lei, equiparando-se, desse modo, à pessoa jurídica estrangeira autorizada a aqui funcionar. (HAGE; PEIXOTO; FILHO, 2012, p. 19)

Hage, Peixoto e Filho (2012, p. 21) destacam que nas conclusões do Parecer no LA-01, de 2010, no cenário empresarial nacional, há ao menos quatro espécies de pessoas jurídicas das quais participem estrangeiros, a saber:

1) Pessoas jurídicas brasileiras, com brasileiros detendo a maioria do capital social.

2) Pessoas jurídicas brasileiras com a maioria de seu capital social detida por estrangeiros, pessoas físicas ou jurídicas, residentes ou com sede no Brasil. 3) Pessoas jurídicas brasileiras com a maioria do capital social detida por pessoas físicas estrangeiras residentes no exterior ou pessoas jurídicas estrangeiras com sede no exterior.

4) Pessoas jurídicas estrangeiras autorizadas a funcionar no Brasil.

Resumidamente, atualmente podem adquirir terras no Brasil:

a) pessoas físicas estrangeiras não residentes no país e pessoas jurídicas estrangeiras não autorizadas a funcionar no país não podem adquirir imóveis rurais no Brasil;

b) pessoas físicas estrangeiras residentes no país, pessoas jurídicas estrangeiras autorizadas a funcionar no país e pessoas jurídicas brasileiras da qual participem estrangeiros residentes (ou com sede) no exterior e que detenham a maioria do seu capital ficam sujeitas aos limites, controles e restrições da Lei 5.709/71;

c) pessoas físicas brasileiras, pessoas jurídicas brasileiras da qual brasileiros detenham a maioria ou totalidade do capital social e pessoas jurídicas brasileiras da qual participem estrangeiros residentes (ou com sede) no país não estão sujeitas aos limites, controles e restrições da Lei 5.709/71.

(21)

2.6 NOVOS DESAFIOS – OS PROJETOS DE LEI QUE TRAMITAM NO CONGRESSO NACIONAL

Diante do estreitamento das restrições impostas à aquisição de terras e dos impactos econômicos que tais restrições podem ocasionar na economia brasileira Câmara dos

Deputados criou, em outubro de 2011, “uma subcomissão especial para analisar e propor

medidas para disciplinar o processo de aquisição e a utilização de áreas rurais, no Brasil, por

pessoas físicas e jurídicas estrangeiras.” (HAGE; PEIXOTO; FILHO, 2012, p. 34)

O Projeto de Lei no 2.289, de 2007, de autoria deputado Beto Faro, que disciplina a aquisição e o arrendamento de imóvel rural, por pessoas estrangeiras, em todo o território nacional. Regulamenta a Constituição Federal de 1988. Revoga a Lei nº 5.709, de 1971.

Segundo o texto do projeto, sofrem restrição de aquisição de terras: ONG’s brasileiras ou

estrangeiras cujo maioria de seu capital social seja proveniente de fontes estrangeiras e os fundos soberanos de outros países. Contrariando o parecer CGU/AGU Nº 01/2008-RVJ, de agosto de 2010, as pessoas jurídicas brasileiras com capital social preponderantemente estrangeiros, poderiam adquirir livremente terras brasileiras.

CONCLUSÃO

As raízes históricas da formação do espaço agrário brasileiro estão assentadas na agricultura e na reprodução do poder político, exercendo suas funções de hegemonia política e social também nas esferas do poder. O direcionamento das políticas agrárias no Brasil insiste em privilegiar o agronegócio, em destaque o setor sucroalcooleiro, bovinocultor e sojicultor.

A questão da aquisição de terras por estrangeiros está intimamente ligada à formação desse espaço agrário Tal fato revela que a política agrária é resultante de um pacto estratégico da economia política. Dessa forma, não há interesse político no enfrentamento da questão.

A estrangeirização desenfreada de terras é estratégia que promove, de um lado, a territorialização do agronegócio através da compra de terras e da implantação de infraestrutura para a produção monocultora em grande escala voltada para exportação e, por outro, a desterritorialização do campesinato, das comunidades tradicionais, ameaçando a soberania territorial, alimentar, nacional e dos povos. Além do que, tal movimento pode ocasionar a concentração (ainda maior) fundiária e o domínio e controle do capital e dos territórios.

A terra deve ser entendida como além de um meio de produção, construída e transformada através de lutas e processos sociais, tanto nas comunidades tradicionais, quanto

(22)

pelos camponeses, agricultores, ribeirinhos, extrativistas, quilombolas, povos indígenas. O fortalecimento dessa identidade sugere um debate mais justo, inclusive com a participação da opinião pública, para se chegar a uma distribuição mais justa de terras.

Ainda que a diversas proteções já estejam positivadas, o enfrentamento da questão é

um trabalho diário, uma vez que, quase sempre, nos esbarramos no projeto “maior” da

oligarquia agrária brasileira, qual seja: fazer da terra sua fonte de riqueza. A questão da aquisição de terras por estrangeiros é mais um desses enfrentamentos, onde muita coisa está um jogo. Diante do momento delicado que passa nosso momento histórico, e os ajustes econômicos que têm sido realizados nos últimos meses, sugerem a emergência do debate, haja vista que o que está em xeque é a própria identidade do nosso povo.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL. Advocacia Geral da União. Parecer nº LA 01, de 19 de agosto de 2010. Aquisição de terras por estrangeiros. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/AGU/PRC-LA01-2010.htm> Acesso em 10 mar. 2017.

______. Advocacia Geral da União. Parecer nº GQ – 181 de 17 de dezembro de 1998. Reexame do Parecer n° AGU/LA-04/94, diante da revogação do art. 171 da Constituição de 1988. Disponível em: <http://www.agu.gov.br/page/atos/detalhe/idato/8360> Acesso em 09 mar. 2017

_______. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em:< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm> Acesso em 10 mar. 2017

_______. Decreto nº 3.551, de 4 de agosto de 2000. Institui o Registro de Bens Culturais de Natureza Imaterial que constituem patrimônio cultural brasileiro, cria o Programa Nacional do Patrimônio Imaterial e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d3551.htm>. Acesso em 10 mar. 2017.

________.Decreto nº 6.040, de 7 de fevereiro de 2007. Institui a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/decreto/d6040.htm> Acesso em 10 mar. 2017.

_______. Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Cartela Paisagem cultural.

2009. Disponível

(23)

em:<http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/Livreto_paisagem_cultural.pdf> Acesso em 13 mar. 2017.

_______. Lei 4.504, de 30 de novembro de 1964. Dispõe sobre o Estatuto da Terra, e dá outras providências. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L4504.htm> Acesso em 10 mar. 2017.

_______. Lei 5.709, de 7 de outubro de 1971. Regula a Aquisição de Imóvel Rural por Estrangeiro Residente no País ou Pessoa Jurídica Estrangeira Autorizada a Funcionar no Brasil, e dá outras Providências. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5709.htm> Acesso em 10 mar. 2017.

_______. Lei no 8.629, de 25 de fevereiro de 1993. Dispõe sobre a regulamentação dos dispositivos constitucionais relativos à reforma agrária, previstos no Capítulo III, Título VII, da Constituição Federal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8629.htm> Acesso em 10 mar. 2017.

BANCO MUNDIAL. Relatório Anual de 2010 do Banco Mundial. Disponível em: < http://cebem.org/cmsfiles/publicaciones/BancoMundial_RelatorioAnual2010.pdf> Acesso em 10 mai. 2017.

HAGE, PEIXOTO e FILHO. Fábio Augusto Santana; Marcus, José Eustáquio Ribeiro Vieira. Aquisição de terras por estrangeiros no Brasil: uma avaliação jurídica e econômica. Texto para discussão. Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada - IPEA. Rio de Janeiro, 2012.

MORAES, Bernardo Bissoto Queiroz. Que estrangeiros podem adquirir imóveis rurais no Brasil? Diponível em: < http://www.conjur.com.br/2015-set-21/direito-civil-atual-estrangeiros-podem-adquirir-imoveis-rurais-brasil-parte >. Acesso em: 10. Mar. 2017

SANTILLI, Juliana. Agrobiodiversidade e direito dos agricultores. São Paulo: Peirópolis, 2009.

SANTOS, Milton. A natureza do Espaço: Técnica e Tempo, Razão e Emoção. 4º ed. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2006.

(24)

SAUER, Sérgio. A luta pela terra e a reinvenção social. XI Congresso Brasileiro de Sociologia. Universidade de Campinas. Campinas: 2003.

SAUER, Sérgio. Demanda mundial por terras: “land grabbing” ou oportunidade de negócios no Brasil? Revista de Estudos e Pesquisas sobre as Américas, vol. 4. Universidade de Brasília: 2010.

Referências

Documentos relacionados

“Pedro era um aluno que estudava muito, uma vez que tinha oportunidades e apoio dos pais.”.. A) Uma oração subordinada adjetiva e uma oração subordinada adverbial

c) carta de anuência do responsável técnico do teste psicológico aprovado no SATEPSI.. II – O material será analisado pela CCAP, que terá um prazo de 60 dias a partir

Faço saber que o Congresso Nacional aprovou, e eu, José Sarney, Presidente do Senado Federal, nos termos do parágrafo único do art.. 52 do Regimento Comum e do inciso XXVIII

Se não estiver disponível, na janela M ODULO MÃOS LIVRES não aparecerá o sensor de superfície Comando de voz, mas o sensor de superfície Ajustes.. Toque na janela M ODULO

Esses estudos mostram que o ensino tem acompanhado o modelo tradicional “cognitivo-instrumental da ciência e da técnica”, conduzido pelos docentes com adesão a essa

Nos doentes com sintomas de asma mais do que 2 vezes por mês, desper- tares noturnos devido à asma mais do que 1 vez por mês e fatores de risco para exacerbações, o tratamento deve

Parágrafo Quarto – O SINDFILANTRÓPICAS se responsabiliza pelo fiel cumprimento do seguro de cada um dos empregados a partir do primeiro dia de cada mês, para tanto, a

e) Acabou de chegar dizendo-lhe que precisava retornar ao serviço imediatamente. d) a utilização dos pronomes de segunda pessoa, que fazem um apelo direto ao leitor. Alguns