XXVI ENCONTRO NACIONAL DO
CONPEDI BRASÍLIA – DF
DIREITO, ECONOMIA E DESENVOLVIMENTO
ECONÔMICO SUSTENTÁVEL
FREDERICO DE ANDRADE GABRICH
GIOVANI CLARK
Copyright © 2017 Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Direito Todos os direitos reservados e protegidos.
Nenhuma parte desteanal poderá ser reproduzida ou transmitida sejam quais forem os meiosempregadossem prévia autorização dos editores.
Diretoria – CONPEDI
Presidente - Prof. Dr. Raymundo Juliano Feitosa – UNICAP Vice-presidente Sul - Prof. Dr. Ingo Wolfgang Sarlet – PUC - RS
Vice-presidente Sudeste - Prof. Dr. João Marcelo de Lima Assafim – UCAM Vice-presidente Nordeste - Profa. Dra. Maria dos Remédios Fontes Silva – UFRN Vice-presidente Norte/Centro - Profa. Dra. Julia Maurmann Ximenes – IDP Secretário Executivo - Prof. Dr. Orides Mezzaroba – UFSC
Secretário Adjunto - Prof. Dr. Felipe Chiarello de Souza Pinto – Mackenzie Representante Discente – Doutoranda Vivian de Almeida Gregori Torres – USP
Conselho Fiscal:
Prof. Msc. Caio Augusto Souza Lara – ESDH
Prof. Dr. José Querino Tavares Neto – UFG/PUC PR
Profa. Dra. Samyra Haydêe Dal Farra Naspolini Sanches – UNINOVE Prof. Dr. Lucas Gonçalves da Silva – UFS (suplente)
Prof. Dr. Fernando Antonio de Carvalho Dantas – UFG (suplente)
Secretarias:
Relações Institucionais – Ministro José Barroso Filho – IDP
Prof. Dr. Liton Lanes Pilau Sobrinho – UPF
Educação Jurídica – Prof. Dr. Horácio Wanderlei Rodrigues – IMED/ABEDi
Eventos – Prof. Dr. Antônio Carlos Diniz Murta – FUMEC Prof. Dr. Jose Luiz Quadros de Magalhaes – UFMG Profa. Dra. Monica Herman Salem Caggiano – USP Prof. Dr. Valter Moura do Carmo – UNIMAR
Profa. Dra. Viviane Coêlho de Séllos Knoerr – UNICURITIBA
D597
Direito, economia e desenvolvimento econômico sustentável [Recurso eletrônico on-line] organização CONPEDI
Coordenadores: Frederico de Andrade Gabrich; Giovani Clark; Benjamin Miranda Tabak - Florianópolis:
CONPEDI, 2017.
Inclui bibliografia ISBN: 978-85-5505-441-9
Modo de acesso: www.conpedi.org.br em publicações
Tema: Desigualdade e Desenvolvimento: O papel do Direito nas Políticas Públicas
CDU: 34 ________________________________________________________________________________________________
Conselho Nacional de Pesquisa
Comunicação – Prof. Dr. Matheus Felipe de Castro – UNOESC
XXVI ENCONTRO NACIONAL DO CONPEDI BRASÍLIA – DF
DIREITO, ECONOMIA E DESENVOLVIMENTO ECONÔMICOSUSTENTÁVEL
Apresentação
Esta obra expõe a riqueza de temas que foram abordados nas apresentações ocorridas no
âmbito do Grupo de Trabalho em “Direito, Economia e Desenvolvimento Econômico
Sustentável I”, durante o XXVI Encontro Nacional do Conpedi, em Brasília - DF.
Os artigos demonstram uma preocupação por parte dos autores em aprofundar as discussões
em diversos ramos do Direito – tendo como pano de fundo o Desenvolvimento Econômico
Sustentável.
Os artigos apresentam abordagens novas – a partir da Análise Econômica do Direito – de
modo a propiciar novos insights sobre temas relevantes para o Direito. Foram tratados neste
sentido os direitos sociais, a responsabilidade extracontratual, as decisões judiciais, o
cadastro positivo, dentre outros.
Os autores também trazem reflexões sedimentadas e embasadas na doutrina tradicional. São
abordados, ainda, temas que ganham relevo e que precisam de maior discussão, como, por
exemplo, os bitcoins e a necessidade de sua regulação.
Estes artigos não exaurem a discussão sobre estes temas – que é bastante complexa. São
contribuições importantes para o aprimoramento do debate jurídico nacional e permitirão um
aprofundamento das discussões. A diversidade de temas e metodologias enriquecem o estudo
e possibilita que se possa avançar no entendimento dos mesmos.
Desejamos aos leitores uma boa leitura e reflexão!
Brasília, julho de 2017.
Prof. Dr. Giovani Clark (PUC/MG/UFMG)
Prof. Dr. Benjamin Miranda Tabak (UCB)
1 Mestrando e advogado. 1
ANÁLISE ECONÔMICA DO DIREITO: A VIABILIDADE DA CONEXÃO DAS CIÊNCIAS JURÍDICA E ECONÔMICA
ECONOMIC ANALYSIS OF LAW: THE FEASIBILITY OF THE CONNECTION BETWEEN LEGAL AND ECONOMIC SCIENCES
José Francisco Rodrigues Gontijo 1
Resumo
A Análise Econômica do Direito desenvolveu-se principalmente a partir da década de 1960
nas Universidades de Chicago e Yale, baseada no neoliberalismo, pragmatismo e realismo
jurídico. Por se tratar de uma análise interdisciplinar de fatos sociais, parte da doutrina
entende que a aplicação da Análise Econômica do Direito, por buscar promover o diálogo
entre duas ciências com metodologias completamente diferentes, encontraria obstáculos
insuperáveis. A partir de uma análise histórica de suas principais correntes, busca-se explorar
os fundamentos da Análise Econômica do Direito para concluir pela viabilidade da
aproximação das ciências jurídica e econômica.
Palavras-chave: Análise econômica do direito, Interdisciplinaridade, Neoliberalismo, Pragmatismo, Realismo jurídico
Abstract/Resumen/Résumé
Economic Analysis of Law stated its development in the 1960s, at the Universities of
Chicago and Yale, based on neoliberalism, pragmatism, and legal realism. Being an
interdisciplinary analysis of social facts, part of the legal doctrine understands that Economic
Analysis of Law’s application, while seeking to promote the dialogue between two sciences
based on completely different methodologies, would face insurmountable obstacles. From an
historical analysis of its main currents of thoughts, we sought to explore the theoretical
foundation of Economic Analysis of Law, to conclude that the connection between legal and
economic sciences is feasible.
Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Economic analysis of law, Interdisciplinary, Neoliberalism, Pragmatism, Legal realism
1 Introdução
A Análise Econômica do Direito, também conhecida como Direito e Economia (em
inglês, Economic Analysis of Law ou Law and Economics), visa a identificar os efeitos
decorrentes da edição de uma lei e de sua aplicação pelos juízes, bem como se tais efeitos são
socialmente desejáveis.
Por se tratar de uma análise interdisciplinar de fatos sociais, parte da doutrina
entende que a Análise Econômica do Direito, por ser um diálogo entre duas ciências com
metodologias completamente diferentes, encontraria obstáculos insuperáveis para sua
aplicação.
Não obstante opiniões contrárias à Análise Econômica do Direito, para uma
compreensão do fenômeno jurídico e para que os supostos critérios de justiça sejam
operacionalizáveis, não bastam justificativas teóricas para aferição de adequação abstrata
entre meios e fins, mas, sim, uma avaliação mais acurada das consequências de uma decisão
jurídica ou de uma atitude de algum agente econômico.
Dessa forma, há uma evidente contribuição do diálogo entre as ciências do Direito e
da Economia não apenas para a compreensão de fatos sociais atuais, mas também para a
propositura de soluções sob uma ótica até então pouco explorada no Brasil, em especial
porque, sendo o Direito e a Economia ciências sociais aplicadas, não podem se desconectar ou
ignorar a realidade.
O presente estudo tem por objetivo explorar os fundamentos da Análise Econômica
do Direito, traçando uma análise histórica evolutiva de suas principais correntes, para concluir
não só pela viabilidade da conexão entre as duas ciências em questão, como também pela sua
extrema importância.
2 Análise Econômica do Direito
As diferenças entre as ciências do Direito e da Economia são diversas, embora ambas
tratem de questões aplicáveis à sociedade, com o objetivo de eliminar conflitos e trazer
estabilidade para as relações sociais.
A respeito do antagonismo entre as duas ciências, Bruno Salama ensina que:
empírica; enquanto o Direito aspira ser justo, a Economia aspira ser científica; enquanto a crítica econômica se dá pelo custo, a crítica jurídica se dá pela legalidade. (2008, p. 5)
Não obstante as metodologias científicas do Direito e da Economia sejam
completamente diferentes, o que, a princípio, poderia indicar a impossibilidade de
comunicação entre elas para aprimorar um sistema, a aplicação da Economia, especialmente
da microeconomia, em questões jurídicas e legais é não apenas desejável, mas indispensável,
o que demonstra que duas ciências aparentemente sem ligações, quando conjugadas,
possibilitam a melhor compreensão de problemas jurídicos, direcionando os operadores do
Direito para a melhor solução possível, após compreensão detalhada das diversas opções
existentes dentro de um determinado contexto real.
Sobre a relação entre as ciências Direito e Economia, Cássio Cavalli, citando Mario
Júlio de Almeida Costa, lembra que:
direito e a economia constituem, assim, dois ângulos de encarar a mesma realidade, duas disciplinas complementares, não obstante as peculiaridades do escopo e da técnica de cada uma delas. Tanto a ciência econômica como a ciência jurídica têm por objecto comportamentos humanos e relações sociais: a economia, preocupando-se directamente com os fenómenos económicos em si mesmos, aponta para a solução que conduza ao máximo de utilidade; a ciência jurídica, contemplando esses fenómenos económicos através dos direitos e obrigações que o seu desenvolvimento implica, procura a solução mais justa. De um equilibrado entrelace de ambas perspectivas é que há de resultar em cada caso a disciplina conveniente aos interesses individuais e colectivos. As duas técnicas apontadas nunca devem, portanto, desconhecer-se. (2013, p. 17)
Com os primeiros registros de seu estudo datados da década de 1930 - embora o
desenvolvimento dos estudos tenha se dado nos anos 60 -, especialmente nas Universidades
de Chicago e Yale, e tendo como principais nomes Ronald Coase, Richard Posner, Guido
Calabresi e Henry Manne (SZTAJN, 2005), a Análise Econômica do Direito tem suas raízes
no neoliberalismo de Milton Friedman e Friedrich Hayek, bem como no pragmatismo e no
realismo jurídico.
Para a corrente neoliberal, o próprio mercado, seguindo as regras que lhe são
imanentes, conseguiria desenvolver uma autorregulamentação, sendo desnecessária a
intervenção estatal do Estado na economia, salvo para garantir o seu livre funcionamento e
corrigir falhas de mercado, inibindo excessos e condutas lesivas aos consumidores. Ainda de
acordo com a mesma corrente, os benefícios sociais são mais facilmente obtidos inexistindo
uma estrutura organizada por um Estado intervencionista para regular e ditar os rumos do
A visão pragmática, corrente filosófica surgida e desenvolvida nos Estados Unidos,
pretende o direcionamento de pensamentos para questões práticas, ou seja, a concentração de
esforços deve ser dedicada à resolução de problemas realmente existentes no cotidiano,
orientados para os resultados, em vez de imaginar as possíveis soluções para casos hipotéticos
e imaginários cuja ocorrência jamais foi verificada na vida real.
A partir do pragmatismo, o realismo jurídico, com raízes nas faculdades de Direito
norte-americanas e escandinavas, enxerga o Direito de forma instrumentalista e finalista: o
Direito enquanto um meio, um instrumento, para se alcançar determinada finalidade. Ademais,
ensina Bruno Salama que o estudo das leis pelos realistas não deve se dar a partir das
previsões codificadas e positivadas, e, sim, a partir do seu funcionamento de fato.
Em suma, a Análise Econômica do Direito objetiva, conforme síntese de Richard
Posner, a aplicação de teorias e métodos empíricos da ciência econômica nas normas e
institutos jurídicos centrais do common law (direito de propriedade, direito obrigacional
contratual e responsabilidade civil extracontratual), com o objetivo de reduzir custos de
transação, eliminar externalidades e aproximar, ao máximo, o sistema econômico do cenário
perfeito que seria obtido em um mercado perfeito de livre concorrência.
Não obstante a tentativa de se restringir a Análise Econômica do Direito para as
esferas do Direito acima mencionadas, nas quais é mais fácil a percepção de interesses
comuns, tendo em vista a preponderância dos efeitos patrimoniais, a aproximação da
Economia com o Direito de Família, no qual predominam interesses subjetivos
extrapatrimoniais, Rachel Sztajn nos apresenta outra perspectiva:
As regras relativas a essa área do direito em que crianças órfãs ou cujos pais perderam sua guarda, na visão do jurista tradicional nada mais são do que esquemas de solidariedade. Mas elas podem resultar de busca por gratidão, por afeto, ou até por poder sobre outrem que são preços “pagos”. Certo que ao operador do direito assustam tais argumentos, os quais, no entanto, explicam muitas adoções. Basta compreender que, nem sempre, a palavra preço traduz a expressão monetária de um bem, que pode, igualmente, representar a relação entre as posições de quem dá e o que recebe em troca, é um do ut des, fatio ut fatias, que não envolve movimentação pecuniária. (2005, p. 82)
Tal exemplo ilustra a possibilidade e a importância da Análise Econômica do Direito
sejam os interesses e os efeitos jurídicos desejados pelos agentes patrimoniais ou
extrapatrimoniais.
um corpo teórico fundado na aplicação da Economia às normas e instituições jurídico-políticas. Na síntese de Richard Posner, o Direito e Economia compreende “a aplicação das teorias e métodos empíricos da economia para as instituições centrais do sistema jurídico. Para Nicholas Mercuro e Steven Medema trata-se da "aplicação da teoria econômica (principalmente microeconomia e conceitos básicos da economia do bem-estar) para examinar a formação, estrutura, processos e impacto econômico da legislação e dos institutos legais" (SALAMA, 2008, p. 9).
A Análise Econômica do Direito pode ser analisada segundo a ótica positiva (ou
descritiva) e normativa (ou prescritiva). A primeira tem por objetivo verificar os impactos e as
repercussões do Direito no mundo real, ou seja, a constatação de fatos. Por sua vez, a Análise
Econômica do Direito normativa estuda como o conceito de justiça se relaciona com os
conceitos econômicos de eficiência, maximização da riqueza e maximização do bem-estar.
Sobre a distinção entre as visões positivista e normativa da Análise Econômica do
Direito, Rachel Sztajn nos ensina que:
A distinção mais conhecida entre a visão positivista da Escola de Chicago, descritiva dos fenômenos em relação à Escola de Yale, conhecida como normativista ou prescritiva, está no escopo desta, consistente em propor mudanças visando ao aperfeiçoamento das normas, vale dizer, formular normas que produzam os incentivos para que as pessoas se comportem da maneira que melhor atenda aos interesses sociais. (2005, p. 82)
A seguir, abordaremos as duas correntes.
2.1 Análise Econômica do Direito Positiva
A Análise Econômica do Direito Positiva (ou Descritiva) parte do pressuposto de que
os conceitos econômicos, principalmente da microeconomia, são úteis para a análise do
Direito, bem como de que os indivíduos atuam racionalmente para maximizar seu próprio
bem-estar, norteando suas ações unicamente por conceitos econômicos.
A partir das lições de Robert Cooter, diversos autores dividem a Análise Econômica
do Direito Positiva em três vertentes, quais sejam reducionista, explicativa e preditiva.
A vertente reducionista, pouco aproveitada e tida por alguns como inaceitável, reduz
o Direito à Economia, argumentando ser possível a substituição de categorias jurídicas por
categorias econômicas.
Por sua vez, a visão explicativa sugere que a Economia é capaz de oferecer uma
decisões de maximização da riqueza e do bem-estar, otimizando a eficiência econômica em
um ambiente de escassez.
No início de seus estudos, Posner entendia que as decisões judiciais são direcionadas
mais pela segurança jurídica (certeza e previsibilidade das decisões) do que pelo objetivo de
se alcançar um direito justo e correto, conclusão essa decorrente do fato de que os juízes
seguem precedentes, não havendo, portanto, um conceito final de justiça.
Nesse sentido, Posner defende que "a decisão judicial deve perseguir a maximização
da riqueza, expressando um utilitarismo muito afeito ao espírito pragmático
norte-americano" (TELES, 2009, p. 17).
Após inúmeras críticas oferecidas pela Critical Legal Studies, a visão explicativa
reconheceu que as ações individuais não são tomadas analisando-se exclusivamente o custo
benefício econômico de determinadas opções, tendo outros valores como guia, de forma que o
Direito não seria resultado somente de aspectos econômicos, estando inserido em um contexto
histórico e cultural daquela época, naquele lugar, do qual é inseparável (path dependence).
Conforme ensina Cássio Cavalli, a teoria do path dependence - ou a dependência da
trajetória - procura "identificar qual a influência que o passado exerce na compreensão atual
do fenômeno da empresa" (2013, p. 21). Ou, ainda, o mesmo autor, com base nas lições de
Oona Hathaway, explica que a teoria do path dependence fornece descrições e explicações
sobre como a evolução e a compreensão atual de um determinado fenômeno está intimamente
relacionada a fatos pretéritos.
Dessa forma, reconheceu-se que a Economia pode ser utilizada para explicar parte
dos comportamentos individuais, elucidando o Direito apenas parcialmente, sendo
imprescindível a concatenação da Economia com diversos outros ramos do conhecimento,
como a Filosofia, a Sociologia, a Psicologia e a Antropologia, dentre outros, para que seja
oferecida uma explicação mais ampla e profunda do Direito.
Já a visão preditiva da Análise Econômica do Direito Positiva procura utilizar a
Economia como uma ciência que, aplicada ao Direito, consegue prever os efeitos nos
comportamentos dos indivíduos a partir da edição de normas legais.
As consequências dos fenômenos jurídicos deixam de ser tratados como periféricos e
passam a ser o foco do estudo. Para Cooter, citado no artigo Crédito e Confiança: a influência
das normas sociais nas relações de crédito de autoria de Edgar Gastón Jacobs Flores Filho e
A teoria imperativa da lei define uma lei como uma obrigação apoiada por uma sanção. A análise econômica desfrutou de grande sucesso analisando uma sanção legal como se fosse um preço de mercado. Vista como um preço, o ator enxerga uma sanção como um constrangimento externo. Alternativamente, o ator pode ver uma obrigação como um valor interno. Quando muitas pessoas em uma comunidade interiorizarem uma obrigação, ela se torna uma norma social. (...)
Um sistema de normas sociais, tipicamente, tem equilíbrios múltiplos. A lei pode criar um ponto de foco expressando valores. Um ponto de foco pode inclinar o sistema para um equilíbrio novo. O processo de mudar o equilíbrio pode criar ou destruir uma norma social sem mudar os valores individuais. Criar pontos de foco é o primeiro uso expressivo da lei.
Além disso, a lei pode mudar os valores individuais de pessoas racionais. Interiorizar uma norma social é um compromisso moral que prende uma penalidade psicológica a um ato proibido. Uma pessoa racional interioriza uma norma com o compromisso de determinar uma vantagem relativa entre as preferências originais e as preferências mudadas. (2009, p. 7-8)
A Análise Econômica do Direito parte de duas questões básicas a respeito de normas
legais, a partir das quais se desenvolve, quais sejam:
1. Quais são os efeitos nos comportamentos dos atores relevantes provocados pela
edição de leis?
2. Tais efeitos são socialmente desejáveis?
As respostas para as questões acima são buscadas partindo do pressuposto de que os
atores (indivíduos e empresas) se comportam olhando para a frente - visão prospectiva - e de
maneira racional, servindo o quadro econômico do bem-estar como avaliação para responder
à segunda pergunta. (KAPLOW e SHAVELL, 1999)
Partindo de tais questionamentos e sendo possível prever, quando da edição de uma
lei, quais as prováveis consequências das normas no comportamento humano, a legislação
passa a modelar o comportamento humano criando pontos de foco e mudando valores
individuais.
2.1.1 Escassez, Maximização Racional, Equilíbrio, Incentivos e Eficiência
Buscando explicações racionais para a existência de institutos jurídicos, e.g., direito
de propriedade, os economistas da Escola Institucionalista conjugavam o contexto histórico e
social com o próprio desenvolvimento do instituto, para, assim, justificar fatos e fenômenos
Por se concentrar em relatos dos fatos e se afastar de bases teóricas para suas
explicações, a Escola Institucionalista perdeu forças, cedendo espaço para a Teoria
Neo-Institucionalista.
Conforme ensina Bruno Salama, a Teoria Neo-Institucionalista oferece três pilares
para o desenvolvimento da Análise Econômica do Direito:
(a) o reconhecimento de que a Economia não tem existência independente ou dada, ou seja, de que a história importa, pois cria contextos culturais, sociais, políticos, jurídicos etc. que tornam custosas, e às vezes inviáveis, mudanças radicais (o que se convencionou chamar de "dependência da trajetória", tradução de "path dependence"); (b) o reconhecimento de que a compreensão do Direito pressupõe uma análise evolucionista e centrada na diversidade e complexidade dos processos de mudança e ajuste (daí a importância da abertura para todas outras disciplinas além da Economia, mas também a utilidade da Teoria da Escolha Racional e da Teoria dos Jogos para estudar a complexidade dos processos de ação e decisão coletiva); e (c) a preocupação com a compreensão do mundo tal qual ele se apresenta, o que conduz ao estudo das práticas efetivamente observadas e do Direito tal qual de fato aplicado (enfatizando a racionalidade limitada, a incerteza e os custos de transação). (2008, p. 15)
Cinco conceitos econômicos são fundamentais para a melhor compreensão do tema:
escassez, maximização racional, equilíbrio, incentivos e eficiência.
Tais conceitos estão interligados e se complementam: a escassez diz respeito à
vivência do ser humano em um ambiente cujos recursos naturais são escassos para satisfação
de todos os desejos individuais. A maximização racional diz respeito ao comportamento do
indivíduo que realiza sua escolha para alcançar seus interesses pessoais, maximizando o seu
bem-estar a partir do dispêndio de menores esforços (custos) para alcançar os maiores
benefícios.
Os benefícios alcançados e que são, em tese, ponderados pelos indivíduos quando da
decisão de qual atitude tomar são os chamados benefícios marginais, assim entendidos
aqueles benefícios que serão acrescidos àqueles atualmente obtidos em decorrência de um
comportamento X.
Vale dizer: se uma empresa adota um comportamento X, a um custo Z, que lhe gera
um benefício Y, ela somente alterará o seu comportamento atual caso o acréscimo do custo
(ex: Z+1) lhe proporcione um benefício que seja superior a Y+1, de forma que o benefício
marginal seja compreendido como o valor que excede ao +1 que é acrescido ao presente
Sobre o princípio do marginalismo, ao tratar das vantagens que uma empresa poderia
obter caso expandisse suas atividades até concentrar todo o mercado, Ronald Coase explica
que:
a firm will tend to expand until the costs of organising an extra transaction within the firm become equal to the costs of carrying out the same transaction by means of an exchange on the open market or the costs of organising in another firm. (COASE, 1937, p. 395)
Ocorre que, para saber exatamente em quais custos e benefícios marginais a empresa
incorrerá para alterar o seu comportamento e, assim, alcançar mais lucros, seria necessário o
acesso a uma quantidade infindável de informações, as quais deveriam ser meticulosamente
analisadas e estudas no campo teórico para prever, racionalmente, qual a melhor aplicação e
quais as prováveis consequências que decorreriam daquele ato.
Considerando as limitações humana e do conhecimento científico, é impossível se
atingir um cálculo racionalmente perfeito, de modo que, atualmente, o paradigma da
hiperracionalidade está sendo substituída pela noção um tanto quanto mais flexível da
racionalidade limitada, passando o indivíduo a ser visto como "intencionalmente racional",
tendo em vista que a situação até então vista e pensada como matemática sofre influências de
fatores externos e imprevisíveis. (TELES, 2009)
Bruno Salama cita um exemplo fornecido por David Friedman que ilustra o
comportamento racional do indivíduo e também da ignorância racional:
imagine uma pessoa que esteja ponderando a respeito de duas decisões que deve tomar: que carro comprar, e em qual político votar. Nos dois casos, a pessoa pode melhorar sua decisão (ou seja, tornar mais provável que a decisão atinja seus interesses) investindo seu tempo e esforço no estudo das alternativas disponíveis. No caso do carro, a sua decisão determina com certeza que carro comprar. Já no caso do voto em político, a decisão sobre em qual candidato votar altera em apenas 1/10.000.000 a probabilidade de que o candidato a receber seu voto ganhe [(ou seja, a probabilidade de que seu voto seja decisivo na eleição de determinado político é baixíssima)]. Se o candidato for eleito mesmo sem receber o voto dessa pessoa, essa pessoa estaria perdendo seu tempo. Se o candidato não for eleito mesmo com o voto dessa pessoa, essa pessoa também estaria perdendo seu tempo. Assim, essa pessoa irá racionalmente investir muito mais tempo na escolha de que carro comprar [do que na decisão de em quem votar], porque esse é um investimento muito mais proveitoso do seu tempo. Por isso, é comum que os votos sejam caracterizados por uma ignorância racional; é racional manter-se ignorante quando a obtenção da informação custa mais do que seu benefício. (2008, p. 18-19)
Mais adiante, Bruno Salama mostra que, embora cada pessoa individualmente
comportar racionalmente, de forma que, ao se aplicar a Teoria dos Preços (da Ciência da
Economia) ao sistema jurídico para prever a conduta dos agentes, não é necessária a
realização de uma análise a respeito da mudança de cada indivíduo em decorrência de uma
alteração na legislação.
Por exemplo, se duas partes celebram um contrato, presume-se que o pactuado será
cumprido. Todavia, caso uma das partes incorra em mora, não adimplindo sua obrigação
conforme acordado, a parte inocente poderá acionar o Poder Judiciário para que o conflito
seja dirimido.
Se o Poder Judiciário fosse eficiente e fizesse a parte infratora cumprir a palavra
dada, o custo de agir contrariamente ao pactuado aumentaria, de forma que a procura por tal
conduta cairia.
Para se verificar a precisão da veracidade da previsão a que se chega a partir da
aplicação da Teoria dos Preços no caso acima, não é necessário verificar como cada
contratante se comporta individualmente para saber se eles seguem a racionalidade, bastando
seja realizado um estudo global para verificar se haverá diminuição do número de ações
ajuizadas requerendo o cumprimento contratual forçado após a edição de uma alteração na
legislação que torne mais rápida e eficaz a execução de garantias contratuais.
Já o equilíbrio, terceiro conceito abordado, é o comportamento que se verifica
quando, simultaneamente, atores relevantes estão atuando no sentido de maximizarem seus
interesses.
Por sua vez, incentivos podem ser entendidos como os tradeoffs (custos e benefícios
das possíveis escolhas) que norteiam as condutas humanas. De acordo com a Teoria dos
Preços, caso o preço de um aumente, a procura pelos consumidores irá declinar; por outro
lado, caso o preço caia, os consumidores irão demandar mais por aquele produto. Pensando
pelo lado do produtor, havendo declínio do preço pago pelo mercado por um determinado
bem, haverá decréscimo da produção; havendo aumento do preço, os produtores aumentarão a
oferta.
Coase, citando Arthur Salter, pondera que "em toda a extensão das atividades e das
necessidades humanas, a oferta se ajusta à demanda e a produção ao consumo, por um
processo automático, elástico e sensível" (COASE, 1937, p. 387, tradução livre), tendo em
vista que o sistema econômico funciona sozinho, sem a necessidade de um controle central.
Mais adiante em sua obra, o próprio Coase mostra que pressupor que a alocação de
econômico, devendo ser entendido, também, que os empresários atuam na coordenação dos
recursos, a partir da organização dos fatores de produção em um microuniverso (empresa).
Aplicada ao Direito, significa que o ator deve ponderar os custos e os benefícios de
suas condutas. Exemplo: se o indivíduo entender que os benefícios auferidos em decorrência
do não pagamento de determinados tributos compensam o risco de sofrer autuação fiscal e
consequentemente do pagamento do tributo acrescido de multa e juros, ele deixará de pagar o
tributo devido.
Por fim, eficiência, em Economia, é entendida como otimização da relação entre a
maximização da riqueza e do bem-estar auferidos e a minimização dos custos sociais
suportados, de forma que um processo será considerado eficiente caso não seja possível
aumentar os benefícios sem aumentar, também, os custos.
Bruno Salama cita, como exemplo de processo eficiente, a seguinte situação
hipotética de uma companhia aérea:
Suponha que cada acidente aéreo cause, no total, custos de $100 milhões (refiro-me aqui à soma de todos os custos sociais relevantes, que englobam tanto as perdas da companhia aérea quanto das vítimas dos acidentes). A seguir, suponha que uma empresa possa investir $2 milhões em uma nova tecnologia de segurança aérea, e que essa nova tecnologia causará uma diminuição de 1% na probabilidade de ocorrência de acidentes. Será que este investimento é eficiente? A resposta é negativa. Afinal, a empresa investirá $2 milhões para evitar custos de $1 milhão (1% x $100 milhões = $1 milhão). O investimento nesta tecnologia diminui as chances de acidentes, mas torna a sociedade mais pobre. (2008, p. 23)
A eficiência ganha, ainda, dois novos contornos: a eficiência Paretiana e a eficiência
de Kaldor-Hicks.
Para Pareto, um processo será eficiente se um indivíduo puder obter um benefício,
melhorando a sua situação, sem que nenhum outro indivíduo tenha a sua situação piorada
(ótimo de Pareto), o que ocorreria pela transferência de bens por quem os valoriza menos para
quem os valoriza mais.
O ótimo de Pareto foi criticado, especialmente, pelo fato de que a concentração de
todos os recursos em um único indivíduo faria com que a realocação de qualquer recurso
colocaria este mesmo indivíduo em situação pior, em detrimento do benefício de um outro
que melhorou a sua situação.
Além disso, segundo Rachel Sztajn, “critica-se esse critério porque depende da
alocação inicial da riqueza e porque não induz as pessoas a revelarem suas preferências
Na prática, qualquer alteração legislativa se tornaria inviável sem infringir o ótimo de
Pareto, posto que, inquestionavelmente, provocam mudanças sociais que, muita das vezes,
beneficia um grande número de indivíduos sem que uma minoria seja prejudicada. Em outros
casos, por exemplo, decisões judiciais que envolvem o direito constitucional de saúde de
todos (art. 196, CF/88) são proferidas carentes de fundamentação jurídica, garantindo
caríssimos tratamentos de saúde a indivíduos custeados pelo Estado (e, em última análise,
pelo contribuinte), de modo que uma pequena minoria é beneficiada enquanto uma grande
maioria é prejudicada, não apenas pelo custeio do tratamento, mas pelo direcionamento de
recursos que poderiam ser aplicados em políticas públicas para benefício de um número maior
de pessoas.
A eficiência de Kaldor-Hicks aprimorou o ótimo de Pareto e estabeleceu o critério,
não isento de críticas, de que uma situação será eficiente se os ganhadores (beneficiados pela
mudança) puderem compensar os prejuízos suportados pelos perdedores (prejudicados pela
alteração). Perceba que não é necessário que os ganhadores compensem efetivamente os
prejuízos dos perdedores, bastando a simples existência da possibilidade potencial de assim
agirem.
Por todo o exposto a respeito da análise positiva (descritiva), entende-se que deve
haver um propósito pertinente entre os meios jurídicos e os fins normativos colocados em
questão.
Não basta, portanto, como pretendem muitos, editar e colocar em vigor uma norma
que busque atender aos interesses dos consumidores, dos trabalhadores ou, como optado pela
Constituição Federal, de toda a sociedade sem que considerados os impactos daí advindos.
Embora louvável a intenção de se proteger os consumidores, isoladamente
considerados, contra condutas de infração à ordem econômica eventualmente praticadas por
determinados grupos econômicos, deve haver uma pertinência entre os meios jurídicos
(inclusão de determinada normal legal no Código de Defesa do Consumidor) e os fins
normativos (adequada proteção do consumidor) pretendidos, sendo a verificação da existência
dessa pertinência a função da Análise Econômica do Direito Positiva.
No mesmo sentido, ao conferir direitos aos trabalhadores no intuito de valorizá-los –
tal como deve ser –, o Decreto-Lei nº 5.452/43 (Consolidação das Leis do Trabalho) e a
Constituição Federal não podem ignorar os impactos econômicos daí decorrentes, em especial
os custos financeiros, os quais serão, em última análise, transferidos à sociedade como um
práticas podem ser manifestamente contrárias ao pretendido quando da edição da norma
legal.1
Além disso, é importante se ter mente que, conforme observado por Flávio Galdino a
partir da análise da obra The Cost of Rights: Why Liberty Depends on Tax?, dos juristas
norte-americanos Cass Sunstein e Stephen Holmes, todos os direitos, para serem efetivados,
demandam algum tipo de prestação pública por parte do Estado, sendo, portanto, custosos.
Como se sabe, os recursos financeiros obtidos pelo Estado são escassos e captados,
primordialmente, via imposição de tributos aos contribuintes, devendo, portanto, ser alocados
após criteriosa análise de modo a trazer maior qualidade às escolhas públicas:
Na medida em que o Estado é indispensável ao reconhecimento e efetivação dos direitos, e considerando que o Estado somente funciona em razão das contingências de recursos econômico-financeiros captadas junto aos indivíduos singularmente considerados, chega-se à conclusão de que os direitos só existem onde há fluxo orçamentário que o permita. (GALDINO, 2005, p. 204)
A inexistência de referido fluxo orçamentário acaba por criar uma situação de vácuo
orçamentário e, em consequência, há o favorecimento de “de uma parte seleta dos indivíduos
em detrimento dos demais” (GALDINO, 2005, p. 204), o que, por certo, não é o objetivo que
se pretende ver alcançado no Estado Democrático de Direito.
Em outras palavras, para uma compreensão do fenômeno jurídico e para que os
supostos critérios de justiça sejam operacionalizáveis, não bastam justificativas teóricas para
aferição de adequação abstrata entre meios e fins, mas, sim, uma avaliação mais acurada das
consequências de uma decisão jurídica ou de alguma política pública.
2.2 Análise Econômica do Direito Normativa
A Análise Econômica do Direito Normativa (ou Prescritiva) se dedica ao estudo de
como noções de justiça se relacionam com conceitos econômicos, principalmente de
eficiência econômica e maximização de riqueza.
1
Três correntes surgem para trazer argumentos a respeito da relação existente entre
justiça e maximização de riqueza, a partir do pressuposto de que o desperdício de recursos é,
no mínimo, indesejável.
A primeira corrente, denominada fundacional, entende a maximização de riqueza
como fundação ética para o Direito e teve como defensor Posner, a partir de estudos datados
da década de 1970, segundo o qual o Direito, enquanto instrumento capaz de induzir o
comportamento de agentes, deve ser avaliado em função da maximização da riqueza, ou seja,
as regras e os institutos jurídicos devem ser sempre avaliados de acordo com a sua capacidade
de contribuir para a maximização de riquezas na sociedade. Contribuindo, as normas e os
institutos seriam consideradas justas; caso contrário, seriam injustas.
Anos depois, já na década de 1990, o próprio Posner reviu sua tese e, a partir da
visão do pragmatismo jurídico, evoluiu seu pensamento e desenvolveu a segunda corrente,
denominada pragmática, para enxergar a maximização de riquezas como um possível objetivo
a ser alcançado pelo Direito, ao contrário do pensamento anterior de que seria um critério
único - e, portanto, superior aos demais valores sociais - para avaliar questões postas ao
Direito.
Assim, ao editar ou aplicar uma lei, o operador do Direito deve identificar as
prováveis consequências de sua decisão, para que determinados valores fundamentais não
sejam atropelados por outros, devendo haver um equilíbrio na decisão a ser tomada.
A terceira corrente entende o Direito como fonte de regulação (daí o nome
regulatória) de atividades e, portanto, de concretização de políticas públicas, dentro de um
contexto do Estado do Bem-Estar.
Para Teles, Guido Calabresi é o nome central dessa corrente e a Análise Econômica
do Direito "serviria para definir a justificativa econômica da ação pública, analisar de modo
realista as instituições jurídicas e burocráticas e definir papéis úteis para os tribunais dentro
dos sistemas modernos de formulação de políticas públicas." (TELES, 2009, p. 26).
De acordo com Calabresi os sistemas jurídicos devem se preocupar, em primeiro
lugar, em ser justos, para, somente após, contribuírem para a maximização de riquezas e
redução dos custos sociais (SALAMA, 2008).
O cerne da questão é que o conceito de justiça aplicado à determinada norma ou
instituto jurídico deve ser construído considerando os custos e os benefícios que decorrem da
afastadas do contexto real no qual está inserida, de forma que o Direito possa atender às
demandas sociais de maneira eficaz.2
A principal diferença entre as Escolas de Chicago (Positivista/Descritiva) e a Escola
de Yale (Normativista/Prescritiva) seria o escopo desta “em propor mudanças visando ao
aperfeiçoamento das normas, vale dizer, formular normas que produzam os incentivos para
que as pessoas se comportem da maneira que melhor atenda aos interesses sociais”
(SZTAJN, 2005, p. 81).
3 Conclusão
Percebe-se, portanto, que não merecem prosperar os argumentos daqueles que
sustentam suas críticas à Análise Econômica do Direito nas diferenças metodológicas entre as
ciências do Direito e da Economia, se ocupando a primeira de valores morais e éticos,
enquanto a segunda se preocupa com escassez, maximização racional e eficiência.
Se, por um lado, sob a ótica econômica, os indivíduos agem racionalmente,
objetivando satisfazer ao máximo, com o menor custo, seus interesses, a partir da máxima
eficiência na alocação de recursos escassos; e, por outro lado, ao agir para satisfazer seus
interesses, os indivíduos são influenciados por incentivos externos, se conclui que o sistema
de prêmios e punições induz a certos comportamentos, sendo certo que tanto a legislação
quanto medidas judiciais coercitivas constituem agentes externos capazes de incentivar a
práticas de atos que atendam aos interesses sociais. (SZTAJN, 2005)
Não bastasse, Rachel Sztajn nos lembra que a ciência do direito é aberta,
influenciando e sendo influenciada pelas instituições sociais existentes em determinados
espaço e tempo. Sendo assim, inúmeros são os fatores – dentre eles o econômico – que
influenciam comportamentos sociais que, posteriormente, serão consagrados no ordenamento
jurídico.
Tanto os argumentos de referida autora estão corretos que, cite-se, como exemplo, o
direito básico que, fundado no reconhecimento de que as partes envolvidas numa relação de
consumo não possuem as mesmas informações, veio a ser conferido aos consumidores, pela
2
Lei n. 8.078/90, de que as cláusulas previstas em contratos consumeristas de adesão devam
conter informações adequadas e claras acerca do que está sendo contratado, sob pena,
inclusive, de nulidade.
Dessa maneira, torna-se mais que recomendável, sendo indispensável, a aproximação
entre Direito e Economia, sendo temerária conclusão em sentido diverso, em especial por se
tratarem de duas ciências sociais aplicadas que, quando conectadas, melhor contribuem para a
propositura de soluções concretas sob a ótica do pragmatismo e do realismo jurídico.
Se, como mostrado, aspectos econômicos já exercem influência no padrão de
comportamento social e, em consequência, na elaboração de leis, nada mais correto que a
Economia sirva, cada vez mais, como fundamento para a edição de leis e como fundamento
para decisões judiciais, até o momento em que a eficácia de normas e decisões judiciais esteja
condicionada à sua eficiência, ou seja, sua capacidade de gerar os melhores benefícios aos
menores custos, erros e perdas.
Referências Bibliográficas
ARAÚJO, Aloísio; FUNCHAL, Bruno. A nova lei de falências brasileira: primeiros impactos. Revista de Economia Política, vol. 29, n. 3 (115), pp. 191-212, Julho-Setembro. 2009.
ARAÚJO, Aloísio; LUNDBERG, Eduardo. A nova legislação de falências - uma avaliação econômica. PAIVA, Luiz Fernando Valente de (coord.). Direito Falimentar e a nova Lei de Falências e Recuperação de Empresas. São Paulo: Quartier Latin, 2005. p. 323-353.
CAVALLI, Cássio. Empresa, direito e economia. Rio de Janeiro: Forense, 2013.
COASE, Ronald H. The Nature of the Firm. Economica, New Series, Vol. 4, N. 16, (Nov. 1937). p. 386-405.
FERNANDES, Jean Carlos. A insolvência empresarial na fronteira do direito e da economia. Meritum - Belo Horizonte - v. 5, n. 1. p. 233-255. Janeiro-Junho, 2010.
FLORES FILHO, Edgar Gastón Jacobs e LOPES, Lucas Miotto. Crédito e Confiança: a influência das normas sociais nas relações de crédito. Latin American and Caribbean Law and Economics Association (ALACDE). Annual Papers, Berkeley Program in Law and Economics, UC Berkeley. Publicado em 27.05.2009.
FUNCHAL, Bruno e CLÓVIS, Mateus. O impacto da nova lei de falências na estrutura de capital das empresas brasileiras, 2008. Disponível em <http://www.anpec.org.br/encontro2008/artigos/200807191752040-.pdf>.
GICO Jr., Ivo. Análise econômica do direito: uma conversa sobre direito, escolhas e consequências. Universidade Católica de Brasília, 2009.
HOWDEN, David. As externalidades e as mudanças climáticas - a importância da
subjetividade na economia, 2013. Disponível em
<http://www.mises.org.br/Article.aspx?id=1736>.
KAPLOW, Louis e SHAVELL, Steven. Economic Analysis of Law. Harvard Law School, John M. Olin Center for Law, Economics and Business, Discussion Paper No. 251. 1999. Disponível em <https://ssrn.com/abstract=150860 or http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.150860>.
LISBOA, Marcos de Barros, DAMASO, Otávio Ribeiro, SANTOS, Bruno Carazza dos, COSTA, Ana Carla Abrão. A racionalidade econômica da nova lei de falências e de recuperação de empresas. PAIVA, Luiz Fernando Valente de (coord.). Direito Falimentar e a nova Lei de Falências e Recuperação de Empresas. São Paulo: Quartier Latin, 2005. p. 30-60.
LOPES, Bráulio Lisboa. Aspectos Tributários da Falência e Recuperação de Empresas. São Paulo: Quartier Latin, 2008.
MARZAGÃO, Lídia Valéra. A Recuperação Judicial. MACHADO, Rubens Approbato (coord.). Comentários à Nova Lei de Falências e Recuperação de Empresas. 2ª ed. São Paulo: Quartier Latin, 2007.
PATROCÍNIO, Daniel Moreira do. Recuperação de empresas e falência: lei e jurisprudência. 1 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2013.
PIMENTA, Eduardo Goulart e LANA, Henrique Avelino R. P. Análise econômica do direito e sua relação com o direito civil brasileiro. Rev. Fac. Direito UFMG, Belo Horizonte, n. 57, p. 85-138, jul./dez., 2010.
RODRIGUES Jr., Otávio Luiz. Coase foi um dos pais da análise econômica do direito. 2013. Disponível em <http://www.conjur.com.br/2013-set-04/direito-comparado-coase-foi-pais-analise-economica-direito>.
SALAMA, Bruno Meyerhof. O que é pesquisa em direito e economia?. Cadernos DIREITO GV, 2008, v. 5, n. 2.
SERVA, Leão. Brasileiros expõem em números na Inglaterra os vícios no Brasil. [13 de maio de 2017]. São Paulo: Folha de São Paulo. Disponível em
<http://www1.folha.uol.com.br/poder/2017/05/1883838-brasileiros-expoem-em-numeros-na-inglaterra-os-vicios-do-brasil.shtml>. Acesso em 24 mai. 2017.
SZTAJN, Rachel. Direito e Economia. Revista de direito mercantil, industrial, econômico e financeiro. São Paulo: Malheiros, out/dez 2006, n. 144, p. 221-235.
_______. Law and Economics. In: ZYLBERSZTAJN, Decio. SZTAJN, Rachel (orgs.)
_______. Teoria Jurídica da Empresa: Atividade Empresária e Mercados. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2010.