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Mulheres e cidade: Políticas urbanas, mobilidade e gênero / Women and the city: Urban policies, mobility and gender

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Academic year: 2020

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Mulheres e cidade: Políticas urbanas, mobilidade e gênero

Women and the city: Urban policies, mobility and gender

DOI:10.34117/bjdv6n11-466

Recebimento dos originais: 23/10/2020 Aceitação para publicação: 23/11/2020

Alice Braune Guerra

Mestra, pela Universidade Federal do Paraná - UFPR

Endereço: Rua Frei Fabiano de Cristo, 115, Jardim das Américas - Curitiba, PR, CEP: 51810-010

E-mail:alicebraune@hotmail.com RESUMO

O artigo tem como objetivo a discussão das demandas recentes da mobilidade urbana no debate de gênero dentro das cidades. Algumas décadas atrás as mulheres viviam situações de imobilidade com deslocamento reduzido e tempo dedicado a tarefas domésticas; com o aumento das mulheres chefes de família, ampliação da participação no mercado de trabalho e outras oportunidades, as mulheres ocuparam o espaço no transporte público, ciclovias e calçadas. Porém ainda são diversos os problemas nestes deslocamentos, transformando a discussão de gênero e cidade uma questão urbana. A mobilidade urbana se apresenta como um destes itens e pretende evidenciar e comparar políticas públicas voltadas para a equidade no acesso aos modais de transporte em recortes de algumas cidades brasileiras, como São Paulo e Recife.

Palavras-chave: mulheres, mobilidade urbana, cidade, política pública. ABSTRACT

The article aims to discuss the recent demands of urban mobility in the gender debate within cities. A few decades ago, women lived in situations of immobility with reduced commuting and time devoted to domestic tasks; with the increase in the number of female heads of households, increased participation in the labor market and other opportunities, women occupied the space in public transport, cycle paths and sidewalks. However, there are still several problems with these displacements, making the discussion of gender and the city an urban issue. Urban mobility presents itself as one of these items and aims to highlight and compare public policies aimed at equity in access to modes of transport in clippings from some Brazilian cities, such as São Paulo and Recife.

Keywords: women, urban mobility, City, public policy.

1 INTRODUÇÃO

A análise da questão urbana no Brasil engloba a uma vasta possibilidade de vieses, desde sua efetiva idealização e consolidação até a formação atual de políticas voltadas a vida urbana e seus reflexos. O modelo político econômico das cidades, não exclusivamente nas metrópoles

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brasileiras, induz a produtividade do espaço, as cidades-empresa e a indução na competitividade dos lugares advindas de um ativismo econômico, conforme Ana Clara Torres Ribeiro1 (2007). Esse modelo se materializa nas políticas realizadas ao longo das décadas no país, como Lysia Bernardes2 (1986 p.83) analisou anos antes “A ação do poder público, por se realizar necessariamente sobre uma porção do território, contribui, de modo decisivo, para alterar a estruturação do espaço. ” Essa alteração na estrutura das cidades se dá pela adoção de instrumentos específicos de manifestação política no processo de urbanização.

A cidade, nestes espaços, é habitada por pessoas, cidadãos que transitam e experimentam diferentes vivencias dentro dos limites urbanos. Cidadãos são mulheres e homens dentro da mesma estrutura urbana, se deslocando em trajetos distintos e por motivações diversas, mas que ocupam o mesmo espaço por certo período de tempo, que compreende o tempo gasto nas vias públicas, dentro dos equipamentos de transporte público, nas calçadas, ciclovias e nos diferentes modais que cada cidade pode oferecer. Além dessa interação prática, a discussão deste texto busca trazer as questões de gênero quanto ao deslocamento diário especificamente das mulheres nas cidades, e a potencialização das desigualdades socioespaciais relacionadas a estes aspectos. Evidenciando também, a trajetória das políticas publicas relacionadas aos transportes e sua consequência no deslocamento das mulheres no espaço. Paula Santoro3 (2008) chama a atenção para o olhar do gênero no planejamento trabalhando as relações entre a esfera pessoal e política e os territórios público e doméstico; além da necessidade de reconhecer a diversidade cultural na elaboração de plano, partindo do pressuposto que existem diferenças e estas devem ser consideradas.

2 DESENVOLVIMENTO

A relação do estado e a criação de políticas urbanas começa na sua conceituação, Nico Poulantzas4 (2000, p.147) considera o estado como “a condensação material de uma relação de forças entre classes e frações de classes”. Poulantzas (2000) afirma ainda que o estado e suas formas traduzem a política das classes dominantes não de modo mecânico, mas de forma que condensa a luta de classes no seu desenvolvimento; e que o estabelecimento das políticas de estado é considerado como resultante das contradições de classe de sua própria estrutura. Nas táticas do campo estratégico, Poulantzas (2000) fala sobre a política coordenada de ações

1 Ana Clara Torres Ribeiro, socióloga, doutora pelo departamento de sociologia da USP (1988) e foi professora

do IPPUR/UFRJ até 2011.

2 Lysia Bernardes, geógrafa, atuou na pesquisa, no ensino da geografia e na coordenação de trabalhos em

instituições de planejamento urbano e regional.

3 Arquiteta, doutora pela FAU/USP e professora na mesma instituição.

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explicitas e conflituais, ao invés de visar a racionalização de um projeto global coerente. Uma das relações do estado no espaço é a integração das políticas públicas aos processos econômicos sociais que atuam sobre certos territórios, Bernardes (1986) e sua expressão de organização social advém deste processo. As políticas aplicadas no meio urbano têm implicações sociais modificadas pelo tempo, pelos atores sociais e por seu próprio dinamismo.

Dentro do entendimento de cidade global, Sassen5 (2000) afirma que as mulheres emergem como personagens principais sobretudo onde existem fluxos demográficos significativos, e a autora frisa a participação das mulheres negras e migrantes neste processo. Mesmo que o conceito de cidade global não se aplique na maior parte das cidades brasileiras, alguns números comprovam esta tendência. Em pesquisa realizada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA em 20106, mostra que entre 1995 e 2009 a proporção de mulheres chefes de família aumentou em 10%, proporção que chegou a 32,5% em 2009; essa pesquisa indica que considerando todas as composições familiares o número de lares brasileiros chefiados por mulheres chega a 21,7 milhões. Outrora, a reduzida participação das mulheres nos deslocamentos urbanos era justificada pela baixa participação no mercado de trabalho, Vasconcelos (2001), estes dados trazem a tona a elevação dos números dos deslocamentos realizados por mulheres por conta das atividades de trabalho, partindo do pressuposto que a renda obtida pelas mulheres na pesquisa mencionada é obtida através de atividades fora de seus domicílios. É importante frisar que apesar do aumento de mulheres chefiando suas famílias, não se anula reivindicação da equiparação salarial, contestação de décadas das mulheres que vem a tona neste momento onde a participação feminina no mercado de trabalho cresce.

Vasconcelos (2001) conceitua o efeito prático da mobilidade na circulação da cidade como “a apropriação real do sistema de circulação é caracterizada por diferenças enormes entre as pessoas, classes e grupos sociais, que sempre revelam contrastes sociais e políticos” (VASCONCELLOS, 2001, p. 85). Os contrastes sociopolíticos podem ser verificados nas políticas urbanas voltadas para a mobilidade, e por isso pretende-se analisar as ações efetivas realizadas em âmbito municipal, estadual e nacional de forma a compreender quais as políticas em vigor efetivamente contribuem para a equidade na mobilidade, se valendo se que as condições não são igualitárias para homens e mulheres em seus deslocamentos. Além de verificar quais as diretrizes nacionais e internacionais quanto a essa diferenciação de gênero nas políticas urbanas, através da analise de documentos oficiais de instituições e trabalhos

5 Women in global city. Explotation and empowerment. Disponível em

https://www.kas.de/upload/dokumente/megacities/megacities1/referententexte/city-exploitation.htm. Acesso em 05/02/2019

6 Disponível em: http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=6055.

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acadêmicos com temas correlatos que apresentam discussões sobre a implantação dessas políticas.

- Diretrizes e políticas de gênero na mobilidade urbana.

Este tópico tem com o objetivo evidenciar e comparar as discussões contidas em diversas publicações que relacionam gênero e mobilidade urbana, tratando de contextos internacionais e de diversas experiencias brasileiras, busca-se fazer um comparativo na verificação de políticas urbanas e sua relação com a mobilidade urbana das mulheres.

No contexto macroeconômico, Bila Sorj (2016) traz a discussão das diretrizes apontadas pelo relatório da Organização das Nações Unidas - ONU que traz como título Progress of the

World’s Women 2015-2016. Transforming Economies, Realizing Rights. A autora traz a

discussão num momento de aumento da vulnerabilidade das minorias num contexto de crise econômica e políticas de austeridade, e cita que o documento foi escrito com o parâmetro da “igualdade substantiva” que ela conceitua como “a presença de barreiras estruturais e normas discriminatórias de gênero que reproduzem desigualdades e que precisam ser entendidas e removidas” (SORJ, 2016 p.617). O documento aborda questões trabalhistas, de moradia e debate amplamente as transformações da sociedade quanto a participação das mulheres, porém no tema da mobilidade urbana a autora cita a ausência de discussão dos problemas. Citando o aumento das manchas urbanas, periferização e a concentração populacional em megacidades, Sorj (2016) alerta que o deslocamento de mulheres nas periferias e nos percursos domicílios-trabalho podem ser penalizados. Apesar dessa abordagem sobre a mobilidade, a autora exalta o documento como um marco importante na implementação das políticas de gênero e cita a continuidade dos textos da ONU e o avanço nas discussões.

Outra análise de trabalho acadêmico foi da dissertação de Camila Massola Sumi (2018), que avalia de forma ampla as políticas urbanas de gênero na cidade de São Paulo, no período de 1990 a 2015. A autora discute o direito a cidade nos conceitos de Levebvre (1968) e Harvey (2012) aplicado ao viés das minorias no contexto urbano e nos grupos de pouca representação política, com amplo destaque para a discussão das mulheres e cidade, no recorte de São Paulo. Em um trabalho de analise documental, Sumi (2018) traz as principais políticas urbanas nos tópicos mobilidade, habitação, participação e espaço público; e equipamentos, serviços e segurança.

Na discussão que contempla a mobilidade, a autora cita cinco políticas específicas que incluem a discussão de gênero na cidade de São Paulo, importante ressaltar que todas essas

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reivindicações estão concentradas entre 2014 e 20177, demonstrando um crescimento recente nas ações. Dentre as cinco ações, três são atribuídas ao poder público e as outras duas a atuação dos coletivos e sociedade civil. A primeira delas em 2014, a criação do vagão rosa, com espaço exclusivo para mulheres nas linhas de metrô e Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) de São Paulo8; que foi vetada pela justiça estadual, sem que qualquer outra política fosse considerada. Em 2015 a autora cita a criação da campanha “Você não está sozinha.

Estamos unidas contra o abuso sexual” veiculada nos transportes públicos da cidade, a

campanha visava fortalecer a rede de denuncias nos casos de assedio dentro dos veículos e composições e penalizar os assediadores. A criação da Lei 16.490 de 15 de julho de 2016 deu autonomia as mulheres e idosos usuários de ônibus urbanos, que poderiam solicitar o desembarque em qualquer lugar do percurso, não necessariamente nos pontos de desembarque, entre 22hrs e 5 da manhã. Sumi (2018) afirma que ações como estas já haviam sido implantadas em cidades como Mogi das Cruzes (SP), Cascavel (PR), Nova Friburgo (RJ) e no distrito federal, entre outras, desde 2014. Por fim, a campanha Meu corpo não é público também em 2016, que trouxe à tona a realidade de assédios das mulheres nos transportes e incentivava as denúncias a polícia militar e guarda municipal afim de que estes casos fossem judicializados. A Figura 01 abaixo mostra o cartaz afixado em ônibus de Campo Grande – MS que mostra a dimensão da campanha iniciada em São Paulo, por conta dos frequentes assédios.

Figura 01: Cartaz no ônibus da campanha meu corpo não é público, Campo Grande-MS.

Fonte:https://www.jd1noticias.com/geral/campanha-alerta-sobre-abuso-sexual-no-transporte-coletivo/39043/. Acesso em 05/02/2019

7 Apesar do título do trabalho apresentar a analise de 1990-2015 os gráficos apresentados consideram ações até

2017.

8 A proposta do vagão exclusivo para mulheres é uma prática implantada em diversas cidades brasileiras, com

destaque para o Rio de Janeiro onde o MetroRio e a SuperVia (Empresa de trens urbanos) foram obrigados por lei de março de 2006 a disponibilizar vagões exclusivo para mulheres. Essa lei foi reformulada 2017 com a inserção de multa caso homens desrespeitem o espaço

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Com o objetivo de comparar trajetórias de políticas públicas e analisar os avanços do planejamento urbano com o foco em gênero, Ágar Camila Mendes Saraiva (2017) relaciona aplicações de políticas públicas nas cidades de Viena, capital austríaca e Santo Andre, na região metropolitana de São Paulo. Saraiva (2017) inicia a discussão trazendo dados da ONU-Habitat que aponta a crescente atenção desde os anos 1980 para o espaço urbano sob a perspectiva de gênero, incluindo parques, ruas e o transporte público. A autora apresenta inicialmente a política aplicada em Viena já realizada a duas décadas, pautada pelo departamento das mulheres local, é baseada em estatísticas das mulheres de determinadas regiões e bairros e suas atividades e foca nas intervenções espaciais. Saraiva (2017) mostra que o plano buscou dar qualidade aos deslocamentos a pé (principal meio de deslocamento das mulheres do local) como a ampliação e qualificação de calçadas, e também a facilitação do acesso aos meios de transporte público, que configuravam na segunda opção mais utilizada pelas mulheres daquela região. Estas ações combinadas com demais políticas inseridas pelo programa otimizavam a rotinas das mulheres e da família de modo geral facilitando o trabalho familiar.

Ainda na análise de Saraiva (2017) a cidade de Santo André iniciou em 1992 ampla política pública de equiparação de gênero, esta foi iniciada em quatro comunidades vulneráveis da cidade e posteriormente ampliada. Nomeado de Santo André Mais Igual o programa buscou iniciativas de independência e fortalecimento econômico e social das mulheres destas regiões, porém não apresentou ações relacionadas a mobilidade nas etapas apresentadas verificadas.

Mais uma vez no contexto da região metropolitana de São Paulo, a análise sobre mulheres ciclistas é feita por Harkot, Lemos e Santoro (2018) relacionando os padrões de uso ligadas a questões culturais e também políticas recentes. Segundos as autoras, as mulheres ciclistas da cidade de São Paulo correspondem a apenas 12% do total. Na exposição de dados as autoras citam que as mulheres entrevistadas responderam pedalar a menos tempo que os homens, considerando os aspetos metodológicos utilizados por elas; e apontam como causa provável a política cicloviaria implantada na cidade entre 2013 e 2016. Harkot, Lemos e Santoro (2018) apontam que

“ciclistas parecem se sentir mais seguras em relação à segurança pública e à segurança nos deslocamentos do que as não ciclistas, algo que pode estar intimamente relacionado à violência de gênero nas ruas e no transporte público, à qual as ciclistas, ao se deslocarem com bicicleta, portanto em velocidade superior à do pedestre, não estão tão expostas.” (HARKOT; LEMOS; SANTORO, 2018 p.61)

A reflexão das autoras traz uma nova possibilidade frente a comparação com outras possibilidades de deslocamento, e o incentivo no uso da bicicleta como forma de aumentar a segurança no deslocamento das mulheres, no caso da cidade de São Paulo. E evidenciar as

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políticas cicloviarias como forma de aumento na utilização, principalmente para mulheres. As autoras alertam, pois, que esse argumento não pode ser reduzido a essa análise específica, visto que são muitos os aspectos sociais, econômicos que permeiam a relação da mulher com a cidade na escolha de seu meio de deslocamento, apenas formula a hipótese com base os dados levantados pela pesquisa em questão.

Trazendo a contribuição sul-americana ao tema, de modo pontual, Martiñez; Santibañez (2015) evidenciam a mobilidade feminina em Santiago no Chile. Os autores discutem temas semelhantes como o aumento dos limites das cidades e a dificuldades de locomoção por transporte público, falam também do incentivo massivo ao uso do automóvel particular que só é possível para os extratos socioeconômicos mais altos. Uma peculiaridade na narrativa da realidade chilena é a grande quantidade de caminhantes mulheres, que por conta disso tem seu espaço de deslocamento limitado. Para Martiñez; Santibañez (2015) o alto número de caminhantes se dá por questões de renda e alcance dos transportes públicos e nessa discussão a questão da mobilidade urbana se mescla a segurança pública como forma de garantir um deslocamento seguro para estas mulheres. Os autores não citam neste trabalho políticas chilenas que equiparem o acesso a circulação no contexto de Santiago do Chile, as políticas discutidas são relativas a insegurança e a ausência de estruturação devida nos trajetos nesta cidade.

De forma antagônica, o trabalho de Maria Amanda Martinez Elvir (2017) traz a discussão com relação a mobilidade das mulheres da comunidade do Coque, no Recife. Considerada uma das comunidades mais pobres e violentas da cidade a pesquisadora buscou os relatos em formato oral que foram dispostos ao longo do trabalho. Antes da exposição das entrevistas, Elvir (2017) contrapõe a discussão de que a mulher está restrita ao ambiente doméstico, pois cita as mulheres negras, indígenas e periféricas como economicamente ativas e como usuárias do transporte público da cidade pela necessidade de buscar emprego e renda. Amanda traz para a discussão da mobilidade uma comunidade que não possui o serviço de transporte público, sendo necessário se deslocar no mínimo um quilometro para ter acesso a algumas linhas de ônibus urbano. E cita também o fato da comunidade não ser incluída dos trajetos dos transportes individuais privados, os taxis, que não acessam a comunidade por questões relativas a falta de segurança. Restando para as mulheres deste local os trajetos a pé e de bicicleta. Os relatos contidos na dissertação trazem a discussão de temas com medo, assedio, insegurança, gravidez e maternidade sob a ótica da mobilidade das mulheres dentro e fora dos limites da comunidade. Essa perspectiva abrange 23,2% da população do Recife, que é considerada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE como habitantes de aglomerados subnormais. O

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trabalho de Elvir (2017) traz com elemento indispensável para a discussão da elaboração das políticas públicas na mobilidade o âmbito de abrangência destas; quais as parcelar populacionais as políticas podem abranger e quais as classes sociais são privilegiadas com estas políticas urbanas.

É importante ressaltar que na análise de alguns trabalhos que discutem documentos de política urbana não foram mencionados a questão da mobilidade urbana. Como é o caso do trabalho de Santoro (2008) que traz uma importante discussão de gênero para a equiparação de direitos e cita prioritariamente questões como moradia e participação na gestão, que sem dúvida são correlatas e complementares as demais políticas.

3 CONCLUSÕES

A questão urbana que envolve a igualdade de gêneros dentro do contexto das cidades brasileiras ainda é recente e complexa. Décadas atrás a questão não era sequer considerada, estando as mulheres atribuídas a tarefas domésticas e fora do espaço público, que era especialmente designado aos homens. Com a reorganização do mercado de trabalho, a inserção da mulher e o crescente protagonismo feminino na chefia dos lares, essa dinâmica está em processo de mudança.

Mulheres estão se deslocando cada vez mais por motivações relacionadas ao trabalho e diversas outras atividades que as desprendem de ambientes doméstico. E a mobilidade feminina é um tema muito recente nas discussões acadêmicas e nas políticas públicas, como pudemos verificar nas bibliografias utilizadas neste trabalho. Mulheres tendem a caminhar mais e utilizar mais o transporte público; no sentido oposto das políticas urbanas implementadas que valorizam largamente o uso do automóvel particular, conforme aponta Villaça (2001):

“Se o Estado privilegia o transporte individual construindo vias expressas, está privilegiando as condições de deslocamento dos proprietários dos automóveis. De maneira geral, as camadas populares são mais prisioneiras do espaço do que as camadas de mais alta renda, pois a mobilidade dessas camadas é bem maior.” (VILLAÇA 2001, p. 181).

Uma observação importante traz a maior parte dos exemplos sobre a cidade de São Paulo, em analises de diferentes modais no viés do acesso feminino, Harkot, Lemos e Santoro (2018) com o crescimento no uso de bicicletas pelo público feminino, Saraiva (2017) com o exemplo da cidade de Santo André como política de equidade de gênero e Sumi (2018) especificando políticas de mobilidade e gênero aplicadas na cidade de São Paulo entre 1990 - 2015. Nos três podemos ver que políticas que promoveram a igualdade no acesso ou que aumentaram as

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condições para que mulheres pudessem se deslocar em segurança são extremamente recentes, todas na última década, neste caso começando exatamente em 20139.

A análise de Martiñez; Santibañez (2015) traz a realidade chilena semelhante a brasileira, com predomínio de mulheres caminhantes e a questão da segurança pública de forma muito marcada no texto, que não abordou as políticas públicas neste tema em Santiago do Chile. Em contraponto aos demais temas, Maria Elvir (2017) trouxe a discussão das mulheres negras, periféricas e faveladas da comunidade do Coque no Recife; região que não é contemplada com transporte público e tampouco serviço de automóvel particular. Toda a população precisa se deslocar a pé ou de bicicleta para acessar os limites da comunidade em busca de opções de transporte.

Nessa discussão, baseada na narrativa das autoras expostas, podemos identificar situações adversas. A cidade de São Paulo traz algumas ações legais que dão segurança a mulheres na utilização dos transportes públicos, a atuação dos coletivos de mulheres também se mostra importante na discussão com o poder público. A política cicloviaria implantada na cidade, alvo de muitas críticas e investigações, trouxe muitas mulheres ao deslocamento por bicicleta e aumentou o número de ciclistas do sexo feminino, que ainda é baixo. Ações que foram realizadas na principal cidade do Brasil, mas que ainda estão distantes da maioria da realidade brasileira, em contraponto com a comunidade de Recife que sequer é servida por linhas de transporte público, motivada por questões de segurança pública. A discussão da aplicação de políticas de mobilidade urbana com o recorte de gênero ainda está limitada as principais cidades brasileiras e especificamente a alguns bairros e modais. O avanço é importante, mas não inclui todas as mulheres, até por se tratar de um tema recente, há espaço para discussões mais profundas sobre politicas efetivas e contundentes que tragam mais segurança e opções para o deslocamento das mulheres nas cidades.

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Imagem

Figura 01: Cartaz no ônibus da campanha meu corpo não é público, Campo Grande-MS.

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