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A fria austeridade das regras fiscais resiste ao calor das urnas? Oportunismo fiscal e contabilidade criativa nos estados brasileiros

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Academic year: 2021

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(1)UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS DOUTORADO EM CIÊNCIA POLÍTICA. A FRIA AUSTERIDADE DAS REGRAS FISCAIS RESISTE AO CALOR DAS URNAS? Oportunismo fiscal e contabilidade criativa nos estados brasileiros. SAULO SANTOS DE SOUZA. RECIFE/2008.

(2) SAULO SANTOS DE SOUZA. A FRIA AUSTERIDADE DAS REGRAS FISCAIS RESISTE AO CALOR DAS URNAS? Oportunismo fiscal e contabilidade criativa nos estados brasileiros. Tese apresentada por Saulo Santos de Souza ao Programa de Pós-graduação em Ciência Política da UFPE, para a obtenção do grau de Doutor.. ORIENTADOR: PROF. DR. MARCUS ANDRÉ MELO. RECIFE/2008.

(3) BANCA EXAMINADORA. Prof. Dr. Marcus André Melo Presidente. Prof. Dr. Ernani R. Carvalho Neto 1º Examinador interno. Prof. Dr. Enivaldo Carvalho da Rocha 2º Examinador interno. Prof. Dra. Celina M. Souza Motta 1ª Examinadora externa. Prof. Dra. Cátia Wanderley Lubambo 2ª Examinadora externa. Prof. Dr. Bernardo P. Machado Mueller. Prof. Dr. Marcelo de Almeida Medeiros. Suplente externo. Suplente interno. Recife, 30 de junho de 2008.

(4) SOUZA, Saulo Santos A fria austeridade das regras fiscais resiste ao calor das urnas? Oportunismo fiscal e contabilidade criativa nos estados brasileiros. Tese de Doutorado – Universidade Federal de Pernambuco. 1. Regras fiscais 3. Oportunismo fiscal. 2. Ciclos políticos 4. Contabilidade criativa. JEL: E62, H11, H72, H77. I. UFPE - Centro de Filosofia e Ciências Humanas. Programa de Pós-Graduação em Ciência Política..

(5) Soli Deo Gloria. 5.

(6) AGRADECIMENTOS. A vida passa enquanto se faz uma tese de doutorado, ela não espera até que se conclua. Muitas coisas aconteceram na minha vida nesse período, algumas delas possivelmente nem percebi, absorvido que estava pelos desafios da grande jornada. Percebi, todavia, que pessoas me ajudavam indicando direções, dedicando tempo substancial, estendendo a mão amiga, ofertando palavras de ânimo, pedindo a Deus por mim. São doravante meus credores numa impagável dívida de gratidão. Sou grato, em primeiro lugar, ao meu orientador, Prof. Marcus André Melo, não apenas por me indicar o caminho tecnicamente mais seguro, quando eu, confuso, vacilava nas intricadas veredas da produção científica, mas também por compartilhar tantos conhecimentos e tanta experiência. Ajudou-me a estruturar as idéias e livrou-me de ciladas na construção do argumento. Mais ainda, valorizou o meu trabalho, acreditou em mim. Os frutos de tudo isso para a minha vida acadêmica não tardaram a aparecer. Marcus não tem sido meu orientador somente, tem sido mentor e amigo. Amigo também tem sido o Prof. Enivaldo Rocha, ímpar nas virtudes da paciência, simplicidade e solicitude. Sua destreza na estatística foi crucial para a porção quantitativa do meu trabalho. A ele meus sinceros agradecimentos. Assinalo, no ensejo, que a tese restou deveras privilegiada pelos fecundos comentários dos examinadores perante quem defendi o argumento: Celina Souza, Kátia Lubambo, Ernani Carvalho e o próprio Enivaldo. Extendo o reconhecimento aos pareceristas anônimos e debatedores nos congressos que participei. Alguns tive o prazer de conhecer, de outros sequer o nome sei, mas todos têm meu apreço pelas críticas de grande valor a fragmentos iniciais deste trabalho.. 6.

(7) A caminhada até aqui teria sido mais difícil não fora o ambiente salutar que encontrei entre os colegas, professores e funcionários da secretaria da Pós-graduação em Ciência Política da UFPE. Especial referência aos meus colegas de turma Alysson, Clóvis, Erinaldo, Kelly e Marcelo (Rato), pelo companheirismo e mútuo encorajamento, e aos professores do Programa, a quem muito devo por tudo que conquistei durante meus anos de mestrado e doutorado. Sou grato também aos meus pais, Paulo Lima (in memorian) e Hilda, por terem nutrido o meu caráter com exemplos de integridade e amor cristão. Aos meus irmãos, Daniel e Yêda, pelo afeto e pela torcida de sempre. Aos meus sogros, cunhados e cunhadas, aos demais familiares e amigos e aos irmãos presbiterianos, pela rica convivência e porque sei que se lembraram de mim nas suas orações. Aos companheiros da SEFAZ/PE, em especial a Neves, por suprir minhas ausências com boa vontade e extrema competência. A minha mulher Gardênia e ao meu filho Vinícius, minhas preciosidades, a quem dedico integralmente esta tese. A Gardênia por caminhar comigo, por me amar e me compreender. Sem nunca reclamar, suportou minhas longas horas de reclusão dedicadas à feitura deste trabalho. Depositária perpétua do meu amor, Gardênia é tudo que não consigo ser. Ao meu filho Vinícius, pelo privilégio de ser seu pai. O sorriso de Vinícius sempre restaurou minhas forças e me deu vontade de vencer. Minha mulher e meu filho são a verdadeira prioridade da minha vida. Por causa deles jamais pensei em desistir. E a Deus, pois sempre esteve comigo, manifestando amor, perdão e graça.. 7.

(8) RESUMO. Por que as regras fiscais não impedem o oportunismo fiscal dos governantes na proximidade das eleições? O presente trabalho analisa o desempenho fiscal dos estados brasileiros nos anos de eleição para o cargo de governador posteriormente à adoção da Lei de Responsabilidade Fiscal. A hipótese é que a disputa eleitoral continua a afetar negativamente o comportamento fiscal dos estados. Os teste econométricos indicaram que a oscilação do resultado primário agregado foi mais evidente em 2006 do que em 2002, embora tenha havido forte influência de variáveis políticas em todo o período, particularmente nos indicadores fiscais alternativos. Além disso, informações relacionadas à gestão fiscal de uma amostra representativa de estados revelaram instâncias reiteradas de falta de transparência e a conseqüente manipulação de dados fiscais no intuito de escapar às restrições previstas na LRF, principalmente no último ano de governo. Em geral, este recurso à contabilidade criativa favoreceu, por um lado, o aparente cumprimento das regras de equilíbrio fiscal e, por outro, a majoração e eventual transferência de déficits financeiros para os governos sucessores. Com base nesses elementos, o trabalho conclui que: 1) Não há evidências estatísticas de ciclos político-orçamentários no comportamento fiscal agregado dos estados brasileiros no período inicial de vigência da LRF; e 2) O oportunismo fiscal dos estados assumiu a forma de contabilidade criativa nas eleições de 2002 e 2006. As conclusões confirmam as proposições teóricas de que os determinantes políticos do gasto público e a ausência de transparência fiscal e mecanismos efetivos de enforcement das regras favorecem a prática de manipulação fiscal oportunista no período eleitoral.. Palavras-chave: Regras fiscais, ciclos políticos, oportunismo fiscal, contabilidade criativa.. 8.

(9) ABSTRACT. Why don’t fiscal rules avert incumbent’s fiscal opportunism in election years? This work examines the fiscal performance of the Brazilian states in years of gubernatorial elections following the introduction of the Fiscal Responsibility Law. Our hypothesis is that elections continue to negatively affect states’ fiscal behaviour. Our econometric tests indicate that the cyclical variation in the average primary balance was more evident in 2006 than in 2002, authough we found political variables to exert a strong influence over the whole period, particularly on alternative fiscal performance indicators. Moreover, an analysis of the fiscal management reports of a significant sample of states disclosed many cases of a lack of transparency and manipulations of fiscal data as a means to circumvent the FRL-imposed budget constraints. We show that these effects were stronger in the last year of a governor’s term in office. In general, these cases of creative accounting enabled politicians to simulate full compliance with the fiscal rules, on one hand, and to increase election-year financial deficits that were eventually conveyed to their successors, on the other. Accordingly, we conclude that: 1) There is no strong statistical evidence of political budget cycles in the aggregate fiscal behaviour of the states in the years following the introduction of the Fiscal Responsibility Law; and 2) The states’ fiscal opportunism took place by means of creative accounting in the state elections of 2002 and 2006. Our conclusions confirm the theoretical assumptions that the political determinants of public spending coupled with a lack of both fiscal transparency and effective enforcement mechanisms of fiscal rules can lead to opportunist fiscal manipulations at times of election.. Keywords: Fiscal rules, political budget cycles, fiscal opportunism, creative accounting.. 9.

(10) LISTA DE SIGLAS. BACEN: Banco Central do Brasil BID: Banco Interamericano de Desenvolvimento DEM: Democratas FMI: Fundo Monetário Internacional FRL: Fiscal Responsibility Law FUNDEF: Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental IPEA: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada IUPERJ: Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro LCF: Lei de Crimes Fiscais LDO: Lei de Diretrizes Orçamentárias LOA: Lei Orçamentária LRF: Lei de Responsabilidade Fiscal OECD: Organization for Economic Cooperation and Development PDT: Partido Democrático Trabalhista PFL: Partido da Frente Liberal PIB: Produto Interno Bruto PMDB: Partido do Movimento Democrático Brasileiro PMN: Partido da Mobilização Nacional PP: Partido Progressista PPA: Plano Plurianual PPS: Partido Popular Socialista PSB: Partido Socialista Brasileiro PSDB: Partido da Social Democracia Brasileira PT: Partido dos Trabalhadores RCL: Receita Corrente Líquida STN: Secretaria do Tesouro Nacional SUS: Sistema único de Saúde TCE: Tribunal de Contas Estadual TSE: Tribunal Superior Eleitoral. 10.

(11) ÌNDICE DE GRÁFICOS, QUADROS E TABELAS. Quadro 1.1: Regras, sanções e exceções - Países da OECD................................................23 Quadro 1.2: Regras, sanções e exceções - Países da América Latina..................................26 Gráfico 1.1: Média do resultado primário dos estados em % RCL......................................41 Tabela 1.1: Resultado primário por estado..........................................................................42 Quadro 2.1: Sinopse de trabalhos empíricos recentes........................................................ 81 Quadro 3.1: Especificação das variáveis.............................................................................88 Quadro 3.2: Tábua operacional dos indicadores políticos e orçamentários........................89 Tabela 3.1: Modelos auto-regressivos para Y = Resultado primário...................................92 Tabela 3.2: Modelos logísticos para Y= Déficit primário....................................................99 Tabela 3.3: Freqüência de estados deficitários...................................................................101 Tabela 3.4: Média dos indicadores fiscais versus PIB per capita (1994 e 1998)...............105 Tabela 3.5: Média dos indicadores fiscais versus PIB per capita (2002 e 2006)...............106 Gráfico 3.1: Evolução de itens de despesa em % RCL......................................................108 Tabela 3.6: Gastos com investimentos do setor público....................................................109 Gráfico 3.2: Despesas com encargos da dívida em % RCL...............................................113 Gráfico 3.3: Resultado nominal dos estados em % RCL...................................................116 Tabela 3.7: Resultado primário versus resultado financeiro..............................................119 Tabela 3.8: Modelos auto-regressivos para Y = Indicadores alternativos.........................121 Gráfico 5.1: Superávit primário da União em % PIB........................................................192 Tabela 5.1: Restos a pagar (RP) da União e dos Estados (R$ milhões)............................194 Gráfico 5.2: Gastos municipais com investimentos em % receita.....................................198. 11.

(12) SUMÁRIO. Capítulo I 1. A temática das regras de equilíbrio fiscal no Brasil 1.1 O tema e o problema...................................................................................................15 1.2 Delimitação e objetivos...............................................................................................18 1.3 As regras fiscais na atualidade....................................................................................22 1.4 Antecedentes da LRF: mudanças institucionais no Brasil...........................................30 1.5 Lei de Responsabilidade Fiscal: características e primeiros impactos......................36. Capítulo II 2. Aproximação teórica e a agenda empírica 2.1 Os determinantes políticos do gasto público: o que diz a literatura..........................44 2.1.1 A ideologia do partido no poder...........................................................................45 2.1.2 O alinhamento político intergovernamental.........................................................46 2.1.3 A competição política e eleitoral...........................................................................48 2.1.4 A fragmentação partidária do legislativo.............................................................49 2.1.5 A força da coalizão governista..............................................................................51 2.1.6 A expectativa de reeleição.....................................................................................53 2.2 A importância das instituições....................................................................................54 2.3 Regras fiscais e comportamento fiscal........................................................................59 2.4 Ciclos eleitorais e oportunismo fiscal.........................................................................64 2.5 O estado do campo......................................................................................................67 2.5.1 A literatura empírica internacional.......................................................................67 2.5.2 A literatura empírica nacional...............................................................................76. 12.

(13) Capítulo III 3. A estatística do desempenho fiscal: impactos de regras e ciclos 3.1 Hipóteses e metodologia..............................................................................................84 3.2 Os determinantes do resultado primário....................................................................91 3.2.1 Estimação dos modelos de resultado primário.....................................................91 3.2.2 Estimação dos modelos de déficit primário..........................................................98 3.2.3 Notas sobre as diferenças regionais....................................................................103 3.3 Indicadores alternativos de desempenho fiscal.........................................................107 3.3.1 O comportamento cíclico da despesa pública....................................................107 3.3.2 Resultado nominal e resultado financeiro acumulado........................................115 3.3.3 Estimação dos modelos com indicadores alternativos.......................................120 3.4 Síntese dos resultados...............................................................................................127. Capítulo IV 4. Evidências das contas públicas estaduais 4.1 Oportunismo fiscal pós-LRF: ensejos de contabilidade criativa..............................130 4.1.1 Alagoas: PSB (1999-2005); PDT (2006)............................................................131 4.1.2 Goiás: PSDB (1999-2005); PP (2006)...............................................................136 4.1.3 Mato Grosso do Sul: PT (1999-2006).................................................................139 4.1.4 Minas Gerais: PMDB (1999-2002); PSDB (2003-2006)...................................142 4.1.5 Paraíba: PMDB (1999-2002); PSDB (2003-2006)............................................146 4.1.6 Pernambuco: PMDB (1999-2005); PFL (2006).................................................151 4.1.7 Rio de Janeiro: PSB (1999-2001); PT (2002); PMDB (2003-2006)..................154 4.1.8 Rio Grande do Sul: PT (1999-2002); PMDB (2003-2006)................................158 4.1.9 São Paulo: PSDB (1999-2005); PFL (2006)......................................................162 4.2 A disciplina fiscal revisitada: recapitulação sintética..............................................167. 13.

(14) Capítulo V 5. As eleições importam, os ciclos persistem 5.1 Responsabilidade fiscal versus criatividade contábil...............................................171 5.2 A LRF em tempos de eleição: limites e lacunas .......................................................176 5.3 A política da política fiscal: o velho jogo de interesses............................................183 5.4 Manipulação fiscal oportunista nas múltiplas faixas de poder................................191 5.5 Mudanças na retórica da austeridade fiscal.............................................................200. Conclusões e últimas considerações...................................................................................209 Referências bibliográficas...................................................................................................217. 14.

(15) Capítulo I. A temática das regras de equilíbrio fiscal no Brasil. Este capítulo introdutório apresenta os objetivos do trabalho e os situa dentro da problemática das regras fiscais e dos ciclos políticos do orçamento público. Ademais, delineia-se um breve panorama das regras fiscais na atualidade, contextualizando a experiência brasileira de instituição da Lei Complementar 101, de 04 de maio de 2000, comumente denominada Lei de Responsabilidade Fiscal, seus traços característicos e efeitos esperados no desempenho fiscal dos estados brasileiros.. 1.1 O tema e o problema. Por que o oportunismo fiscal dos governantes persiste não obstante o rigor das regras de equilíbrio fiscal? A pergunta está longe de ser trivial, uma vez que opiniões se dividem na literatura a respeito do problema da efetividade das regras imbuídas do propósito de promover comportamento fiscal responsável. Enquanto alguns autores dizem que as regras são suficientes para garantir o equilíbrio intertemporal das contas públicas (Inman, 1996; Kopits, 2004), outros sustentam que o que vale mesmo são as interações estratégicas e o compromisso político de redimir o equilíbrio orçamentário (Alesina &. 15.

(16) Perotti, 1994; Schik, 2004). A questão adquire particular relevância quando se contempla a tendência expansionista do orçamento público no período eleitoral. Diversos países desenvolvidos e em desenvolvimento, unitários ou federados, (e.g., Alemanha, Argentina, Brasil, Colômbia, Espanha, dentre outros) têm acatado regras fiscais como forma de levar abaixo o déficit fiscal e, com isso, assegurar a estabilidade macroeconômica no país. No caso específico do Brasil, é instituída em 04 de maio de 2000 a Lei Complementar (LC) nº 101, mais conhecida como Lei de Responsabilidade Fiscal, que ratifica verdadeira ruma de normas adotadas previamente sob o lema do equilíbrio das contas públicas em todos os níveis de governo (Souza, 2003). Dado que a regra é primogênita ao exigir dos entes governamentais que perseguissem metas para a geração de superávits primários, o presente trabalho analisa a postura fiscal prevalecente nos estados brasileiros nos anos posteriores ao seu instituto, ao mesmo tempo em que recorre a explicações de natureza política e institucional para mudanças no grau de disciplina fiscal dos governantes no período eleitoral. A questão da estabilização fiscal vem sendo acompanhada de perto pela literatura nacional (Bevilaqua, 2000; Cossio, 2001; Botelho, 2002; Souza, 2003; Alston et al., 2005; etc.) e internacional (Inman, 1996; Wildasin, 1997; Shah, 1999; Von Hagen, 2006; etc.). Na pletora de aspectos abordados destacam-se os riscos potenciais da ausência de restrições de gastos nos processos de descentralização fiscal, dados os altos níveis de discricionariedade concedidos aos governos subnacionais. Tal situação é problemática para as políticas de estabilização fiscal do governo central em razão de promover o comportamento fiscal expansionista dos entes inferiores. Em face disso, atenta-se para a necessidade de se instituírem controles sobre o crescimento imoderado do gasto público nas diversas escalas de governo. Regras que imponham limites ao nível do déficit, da 16.

(17) dívida e do endividamento, inclusive regras específicas que induzam a estratégias de geração de superávits, conjugadas a instrumentos de accountability e requisitos de transparência das contas públicas, são apontadas como mecanismos que levam a um melhor desempenho fiscal. A partir de então, o papel das regras fiscais tem atraído a atenção de círculos políticos e acadêmicos preeminentes. Entretanto, a literatura também ensina que um dos maiores problemas para a estabilização fiscal consiste na complexidade de se garantir prudência fiscal por parte dos governantes em anos eleitorais (Rogoff & Sibert, 1986; Alesina & Tabellini, 1990). Autores dessa escola teórica têm se ocupado dos ciclos políticos no orçamento e os modelos desenvolvidos buscam explicar o impacto das eleições nas políticas fiscais dos governos. Um dos argumentos básicos é que a proximidade das eleições influencia o padrão e extensão dos gastos públicos, visando a saciar os fitos eleitorais dos governantes. Ademais, a literatura acerca do tema tem chamado atenção para os custos e benefícios políticos do ajuste fiscal, já que a redução dos gastos governamentais pode redundar numa maior (ou menor) probabilidade de reeleição, ou de eleição de aliados políticos. O foco desses estudos é, de certa forma, o oportunismo fiscal dos governos, cujas conseqüências mais comuns são o endividamento e o déficit fiscal. Seguindo tal raciocínio, nosso atual esforço de pesquisa pressupõe que interesses político-partidários continuam a fustigar a disciplina fiscal dos governos, não obstante a existência de regras de equilíbrio fiscal. Argumentamos também que os impactos fiscais das variáveis políticas se apresentam com maior contundência em anos eleitorais e préeleitorais, haja vista a possibilidade de manipulação oportunista das finanças públicas de forma a maximizar votos. A manipulação se dá, altercamos, mediante o incremento dos gastos ou mudanças na sua composição, privilegiando itens orçamentários de grande 17.

(18) visibilidade eleitoral ou que melhor satisfaçam as preferências do eleitorado. Para o teste do argumento, investigamos, em primeiro lugar, o potencial explicativo dos convencionais determinantes políticos do gasto público, além da influência de variáveis orçamentárias e institucionais, nomeadamente a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) e a Lei de Crimes Fiscais (LCF), no desempenho fiscal dos estados brasileiros, com tento para o ano eleitoral. Em segundo lugar, devotamos atenção analítica às finanças públicas de uma amostra representativa de estados, seus registros contábeis e pareceres de auditoria, bem como ao depoimento dos atores políticos responsáveis pelas contas estaduais no último ano de mandato e no ano imediatamente posterior. No Brasil, o circuito acadêmico de economia política é falto de estudos empíricos que conjuguem os temas das regras fiscais e do oportunismo fiscal dos governantes na fase posterior à introdução da Lei de Responsabilidade Fiscal. O presente trabalho propõe-se a avançar neste campo.. 1.2 Delimitação e objetivos Não há dúvidas de que a política de equilíbrio fiscal ministrada pelo governo federal brasileiro desde meados dos anos 90 vai obter sensível êxito junto aos governos estaduais, se compararmos os resultados fiscais atuais com os de então. Ao se tomar como baliza o instituto da LRF, vê-se que a média de superávit primário no setênio a ela anterior é negativa (-4,52 por cento da receita corrente dos estados), ao passo que é positiva na etapa seguinte (4,12 por cento). Por outro lado, observa-se que após uma melhora do indicador no ano eleitoral de 2002, há nova queda durante as eleições de 2006. Logo, o grau de 18.

(19) disciplina fiscal dos governantes não se mantém inalterado por ocasião do período eleitoral. Pressupõe-se com isso que os incentivos para a submissão dos entes federados aos rigores impostos pela regra não são absolutamente óbvios, devido à difusão de interesses políticos e eleitorais. Com base nesta evidência e nas teorias já conhecidas sobre os efeitos das regras fiscais e dos ciclos eleitorais, o nosso trabalho busca resposta à seguinte questão:. Questão: Por quê o período eleitoral continua a afetar o comportamento fiscal dos governantes não obstante o rigor das regras fiscais?. Em face disso, desenvolvemos nosso argumento tendo em pauta o seguinte objetivo empírico:. Objetivo: Verificar de que forma se procede o oportunismo fiscal dos estados brasileiros na vigência da Lei de Responsabilidade Fiscal.. Para se investigar por que os ciclos oportunistas não são banidos das finanças estaduais com a adoção da LRF, importa antes de tudo considerar os custos políticos do efetivo cumprimento da regra. Desde as discussões que envolvem a sua concepção,1 o principal intento da regra fiscal é impor controles mais rígidos sobre o gasto dos governos subnacionais, tais como a definição de percentual máximo de despesas em relação às receitas, ou a restrição do gasto com pessoal. Além disso, e com arrimo na Lei de Crimes Fiscais, entram em voga penalidades judiciais para os governantes apanhados em conduta 1. Detalhes sobre as discussões que antecederam a aprovação da LRF na Câmara de Deputados e no Senado Federal são relatados na tese de doutoramento de Leite, C. K. (2005). “O processo de ordenamento fiscal no Brasil na década de 1990 e a Lei de Responsabilidade Fiscal”. USP.. 19.

(20) fiscal deletéria. É claro que anteriormente à LRF há controles federais sobre as finanças subnacionais, só que de natureza mais moderada, na forma de normas esparsas a respeito do padrão das despesas ou sobre o nível do endividamento público. A Lei, por seu turno, torna obrigatória a inclusão de metas para a obtenção de superávits primários nas próprias leis orçamentárias dos estados. Quanto maior a meta de superávit primário, maior deve ser o corte nos gastos públicos ou mais ousada a arrecadação de tributos. Ou seja, os estados devem restringir o orçamento de maneira a sobrar numerário para quitar débitos com a União e com o mercado financeiro ou, o que é menos comum, aumentar suas receitas com a cobrança de impostos. Na prática, gerar superávits elevados significa abdicar de parcelas de recursos para investir em programas governamentais, o que, via de regra, não é do interesse dos governantes eleitos, principalmente quando o arrocho fiscal inviabiliza o gasto em obras públicas de grande impacto eleitoral. Torna-se mister, portanto, ter em consideração não somente o potencial das regras que governam o ofício fiscal da Federação, mas inquirir se fatores político-partidários continuam a dar livre curso ao oportunismo fiscal dos governantes nas cercanias do sufrágio. Isto em vista, nosso trabalho se lança à estimação dos efeitos do oportunismo político no desempenho fiscal dos estados. A literatura internacional faz uso de vários indicadores para mensurar o desempenho fiscal, tais como o equilíbrio orçamentário (Wibbels, 2005), o superávit fiscal (Shi & Svensson, 2000) e o balanço primário (Amorim Neto & Borsani, 2004). No Brasil, o mais comum tem sido o resultado primário (Simpson, 2000; Cossio, 2001; Nakaguma & Bender, 2005; Gama Neto, 2007), que nada mais é do que um parâmetro para verificar se os níveis de gastos orçamentários dos entes federativos são compatíveis com suas arrecadações, ou seja, se as receitas não-financeiras são capazes 20.

(21) de suportar as despesas não-financeiras. Na ocorrência de superávit primário, subentendese, portanto, que o ente haja pago todas as despesas correntes e resta saldo para a quitação dos compromissos oriundos de operações financeiras, tais como juros e amortizações da dívida. É por esta razão que o resultado primário é o usual indicador na mensuração do grau de cumprimento das metas fiscais, embora não seja o único que revele o desempenho fiscal dos governos. O foco do trabalho é os estados, de forma que as facetas do comportamento fiscal e dos incentivos eleitorais nos outros níveis de governo não são visitadas, exceto marginal e complementarmente. A razão é o fato de grande parte das pesquisas recentes sobre os impactos da estabilização fiscal já haver abordado o nível federal e os municípios, ao passo que ainda pouco se sabe a respeito dos ecos variados das regras fiscais nos estados, mormente no período eleitoral. Por outro lado, as regras fiscais intergovernamentais e as regras do sistema eleitoral no Brasil são as mesmas para todos os estados, o que torna a comparação interestadual viável e passível de conclusões significativas. Por fim, a análise se concentra no período de vigência da LRF, uma vez que extensa literatura já vai explorar os fatores que levaram o governo federal a implementar reformas a serviço da estabilização fiscal no Brasil. A presente abordagem dos ciclos políticos orçamentários procura suprir a lacuna de trabalhos sobre o comportamento fiscal oportunista dos governos estaduais brasileiros após a introdução da LRF como coluna de disciplina fiscal. Espera-se, portanto, contribuir para a compreensão do papel que cabe à política estadual nos processos reformadores do ambiente fiscal no Brasil, dado que o jogo de interesses entre os níveis de governo continua a afetar os cenários político e fiscal dos entes federativos.. 21.

(22) 1.3 As regras fiscais na atualidade As regras instituídas com o fim maior de regular o comportamento fiscal dos governos se diversificam bastante em termos de formato e padrões de implementação. Muitas das regras hoje existentes podem ser definidas como restrições permanentes sobre indicadores de performance, tais quais o resultado fiscal e a dívida pública. Destinam-se, pelo menos inicialmente, a reverter a escalada da dívida, a restaurar a sustentabilidade fiscal ou a melhorar a credibilidade das políticas macroeconômicas. A natureza, força e vida útil das regras diferem de país para país. Entretanto, em praticamente todos os casos o objetivo tem sido restringir a discricionariedade dos atores estratégicos nas tomadas de decisões fiscais. A base legal das regras fiscais também varia consideravelmente nos países desenvolvidos ou em desenvolvimento. Em geral, as regras penetram por veículo infraconstitucional ou vêm inseridas na própria lei maior. Excepcionalmente se resumem a diretrizes administrativas aplicáveis à política fiscal em vigor. Se há predisposição de as regras afetarem mais de um país, é comum que sejam objeto de tratados internacionais, como o de Maastricht, na União Européia. Na maioria dos casos são introduzidas em decorrência de crises fiscais intensas, todavia são também adotadas para reduzir a vulnerabilidade dos governos a novas crises. Logo, tudo depende do contexto de inserção das regras e de sua finalidade. Os Quadros 1.1 e 1.2 resumem respectivamente algumas das regras acatadas nos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OECD) e nos países latino-americanos.. 22.

(23) Quadro 1.1: Regras, sanções e exceções - Países da OECD Alemanha. Pacto de Estabilidade Interna (2002) Regra: Obrigatoriedade de orçamento equilibrado para o governo federal, estados e municípios. Sanções: Não há sanções explícitas. Exceção: O déficit é permitido para financiar investimentos.. Áustria. Pacto de Estabilidade Interna (2000) Regra: Fixação de piso mínimo para o resultado fiscal em todos os níveis de governo (varia de 0 a 0,75 do PIB). Sanções: Multas (em torno de 8 por cento do piso) para os governos que ficarem abaixo do piso. Exceção: As multas não são aplicáveis no caso de grave retração econômica.. Bélgica. Tratados Intergovernamentais (1996 a 2002) Regras: Fixação de limites para o déficit de todos os níveis de governo. Sanções: Restrições à realização de empréstimos pelos governos subnacionais. Exceções: Não há exceções expressas.. Canadá. Plano de Refinanciamento de Dívidas (1998) Regra: Política de equilíbrio fiscal ou superávit no nível federal e na maioria das províncias. Sanções: Redução de salários para os administradores públicos, realização de eleições forçadas para cargos nos governos deficitários, entre outras, de acordo com a própria legislação das províncias. Exceção: Os déficits são permitidos na condição de utilização de reservas de contingência.. Espanha. Pacto de Estabilidade Fiscal (2003) Regra: Obrigatoriedade de equilíbrio fiscal ou superávit em todos os níveis de governo, com restrição de gastos. Sanções: Não há sanções explícitas. Exceção: Os déficits são permitidos em situações excepcionais e temporárias, mediante apresentação de plano de re-equilíbrio das finanças ao Parlamento.. EUA. Budget Enforcement Act (1990 a 2002) Regra: Fixação de limites de médio prazo para gastos discricionários. Sanções: Suspensão de fundos federais equivalentes aos valores excedentes.. 23.

(24) Exceção: Os excessos nos gastos eram permitidos na hipótese de aprovação de apropriações de emergência. Polônia. Lei de Finanças Públicas (Act on Public Finances) (1999) Regra: Observância do limite constitucional de 60 por cento do PIB para a dívida pública geral. Sanções: Restrições ao déficit fiscal do governo geral , tão logo a dívida total ultrapasse 50 por cento do PIB. Exceções: Não há exceções expressas.. Suíça. Regra de Contenção de Dívidas (2001) Regra: Fixação de teto para os gastos governamentais equivalente ao total das receitas ajustadas ao ciclo econômico. Sanções: Não há sanções explícitas, mas os desvios devem ser corrigidos num prazo de três anos. Exceções: Circunstâncias excepcionais definidas como tal por maioria absoluta das duas câmaras do Parlamento.. União. Tratado de Maastricht (1992) e Pacto de Estabilidade e Crescimento (1997). Européia. Regra: Limites de 0,03 do PIB para o déficit e 0,60 para a dívida. Sanções: Depósitos não-remunerados de 0,2 por cento do déficit, além de outras sanções financeiras. Exceções: Circunstâncias excepcionais, particularmente a queda de mais de 2 por cento da atividade econômica.. Obs: Apenas os países com múltiplos níveis de governo. Entre parênteses o ano inicial ou período de vigência. Fonte: OECD Economic Outlook, 2002.. Uma observação meritória em relação às regras dos países da OECD é que geralmente não prevêem cláusulas de escape em duas situações: ou 1) não há sanções previstas para o descumprimento das regras ou 2) as regras são adotadas para vigorar por um período definido. Isto sugere que, para fazerem face às circunstâncias inesperadas e, com isso, perdurarem por mais tempo, as regras precisam admitir certo grau de flexibilização. Os Estados Unidos fornecem um exemplo paradigmático: os limites para o déficit arbitrados em 1985 pelo Gramm-Rudman Act vão ser amplamente desobedecidos e 24.

(25) posteriormente flexibilizados. Em seu lugar é instituído o Budget Enforcement Act, em 1990, que fixa limites ao gasto discricionário. Ambas as regras houveram sido projetadas para vigorar por um período de cinco anos, sem prorrogação. A diferença entre esta última regra e a anterior é que seus limites poderiam ser desconsiderados em situações de emergência. Com a superveniência de superávits orçamentários, os limites vão se tornar desnecessários, sendo por fim suspensos mediante uma série de apropriações2 emergenciais. Exemplos de reavaliação do papel nas regras são vistos também na União Européia. O Tratado de Maastricht e o Stability and Growth Pact de 1997 fixam o limite do déficit em 3 por cento do PIB e o da dívida em 60 por cento, pressupondo uma tendência de crescimento de 3 por cento do PIB e uma inflação prevista para 2 por cento. Os países que excedessem o limite de déficit poderiam ser dispensados de sanções financeiras nos casos previstos nas cláusulas de escape. Mesmo assim, não se consegue obstar a deterioração do equilíbrio fiscal em alguns países membros. Uma das razões é que as projeções iniciais de crescimento vão ser superestimadas. Ou seja, não se previra que o aumento da arrecadação gerado nas fases de incremento econômico seria temporário, tornando-se posteriormente insuficiente para dar conta do crescimento das demandas do setor público. Com isso, surge a partir de 2001 uma predisposição dos países participantes em substituir o Pacto de Estabilidade e Crescimento por uma regra ajustável aos ciclos econômicos.3 O Quadro 1.1 também mostra que, para além do Tratado de Maastricht e do Pacto de Estabilidade e Crescimento, alguns países da Comunidade Européia deixam aos cuidados das regras. 2. Appropriations ou, no vernáculo, aplicações de verbas reservadas a determinadas atividades. No caso dos EUA, o Congresso delega ao Executivo o uso de recursos não previstos no orçamento. 3 A fonte das informações é o relatório da OECD “Fiscal Sustainability: the Contribution of Fiscal Rules”. OECD Economic Outlook, nº 72. 117-136. December, 2002.. 25.

(26) fiscais reduzir o déficit ou limitar a dívida dos diversos níveis de governo. Contudo, algumas dessas regras vão ser também substituídas ou revogadas, tão logo o equilíbrio fiscal foi alcançado. No Quadro 1.2 se percebe que na América Latina as regras também variam perceptivelmente em termos de formato e abrangência.. Quadro 1.2: Regras, sanções e exceções - Países da América Latina Argentina. Lei de Solvência Fiscal (2000) Regra: Obrigatoriedade de resultado fiscal equilibrado para o governo central, com adoção de limites numéricos para o déficit e despesas não-financeiras (a maioria das províncias adotou regra semelhante através de pactos com o governo federal). Sanção: Perda de credibilidade no mercado de crédito. Exceções: Em situações emergenciais, utilização do Fundo Fiscal Anticíclico.. Chile. Diretrizes de política fiscal (2000) Regra: Resultado fiscal equilibrado para o governo central, com piso obrigatório para o superávit (1 por cento do PIB). Sanção: Perda de credibilidade no mercado de crédito. Exceções: Em situações emergenciais, utilização de fundos de contingência; possibilidade de compensação de déficits em anos subseqüentes.. Colômbia. Lei 357 (1997) e Lei 617 (2000) Regras: Resultado fiscal equilibrado para os governos subnacionais; observância de limites para o pagamento de juros; limitação de gastos em geral. Sanções: Penalidades judiciais e financeiras. Exceções: São excluídas dos limites as despesas com investimentos; os déficits não são penalizados na hipótese de adoção de programas de resgate fiscal num prazo de dois anos.. Equador. Lei de Responsabilidade, Estabilização e Transparência Fiscal (2003) Regras: Resultado fiscal equilibrado para o governo central, excluindo-se as receitas de petróleo; o incremento anual do gasto primário não deve exceder a 3,5 por cento; a redução anual do déficit deve ser de 0,2 por cento do PIB.. 26.

(27) Sanções: Penalidades judiciais. Exceções: Em situações emergenciais, utilização de fundos de contingência. México. Sistema de Controle da Dívida (2000) Regra: Restrição ao endividamento dos governos subnacionais, mediante sinalização do risco. Sanção: Perda de credibilidade no mercado de crédito. Exceções: Não há obrigatoriedade para a redução do déficit, mas há fortes incentivos do governo federal neste sentido.. Peru. Lei de Prudência e Transparência Fiscal (2000) Regras: Obrigatoriedade de resultado fiscal equilibrado para o governo central; o déficit do setor público não deve exceder 1 por cento do PIB; limites para despesas não-financeiras. Sanções: Penalidades judiciais. Exceções: No caso de emergência nacional ou crise internacional, o limite do déficit passa a ser 2 por cento do PIB; utilização de fundos de contingência.. Entre parênteses o ano inicial ou período de vigência. Fontes: Kopits (2004) e Webb (2004).. Há regras que incidem exclusivamente sobre o resultado fiscal do nível nacional (Argentina, Chile e Peru) ou apenas sobre as finanças dos governos subnacionais (México), enquanto outras se aplicam a todos os níveis de governo (Colômbia). Algumas erigem limites numéricos para o déficit (Argentina, Equador e Peru) ou percentual mínimo para o superávit (Chile). As sanções variam de eventuais perdas de reputação no mercado de crédito (Argentina, Chile e México) a sanções judiciais ou financeiras (Colômbia, Equador e Peru). Dois casos merecem ressalvas: a Argentina, pela iniciativa própria da maioria das províncias em adotar regras de equilíbrio fiscal (o que a literatura chama de bottom-up, em contraste com o padrão top-down dos demais países), e o México, pelo fato de não recorrer a regras fiscais propriamente ditas, mas a um sistema de incentivos para os entes subnacionais que cooperarem com as políticas nacionais de ajuste fiscal. Vê-se, a rigor, que. 27.

(28) apenas dois países latino-americanos conceberam regras do tipo Fiscal Responsibility Law (FRL) com abrangência subnacional: Brasil e Colômbia. Por outro lado, a maioria das regras instituídas na América latina admite certo grau de flexibilidade, a exemplo dos países desenvolvidos. O princípio da flexibilização é de uma maneira geral inserido também por via de cláusulas de escape, com critérios de acionamento na ocorrência de abalos macroeconômicos exógenos, ou da sua iminência. São exemplos de tal providência os fundos de contingência, destinados à acumulação de reservas no auge da atividade econômica, para delas se ceifar em períodos de crise, e as apropriações de emergência, que nada mais são do que gastos apenas autorizados em circunstâncias excepcionais. Outra cláusula de escape comum nos dois grupos de países é a chamada “regra de ouro”, pela qual os governos se comprometem a manter apenas o equilíbrio orçamentário corrente, o que gera a possibilidade de gastos com investimentos em obras infraestruturais. Ademais, alguns países têm o cuidado de tecer critérios de convergência. Na Argentina, por exemplo, opta-se por um programa de ajuste inicial de médio prazo, com a divulgação antecipada de metas para diversos indicadores fiscais (equilíbrio geral, equilíbrio corrente, etc). O programa explicita medidas aplicáveis a desvios em relação às metas na desdita de crises fiscais e distúrbios macroeconômicos. Qualquer que seja o caso, o objetivo da flexibilidade é acomodar o resultado fiscal a choques externos ou flutuações cíclicas na atividade econômica. Conquanto se torne quase impossível especificar de antemão todas as contingências passíveis de vir à tona, a experiência internacional instiga a utilização de regras facilmente ajustáveis aos ciclos da economia, por oferecem maior efetividade no sustento da solidez fiscal, face à ação de circunstâncias inesperadas ou de fatores inerentes à própria situação política, econômica ou 28.

(29) social do país. Neste trabalho, alinhamo-nos às correntes da literatura (Braun & Tommasi, 2004; Schick, 2004; von Hagen, 2006; Eslava, 2006; Rutkowiski, 2007; etc) que vêem os determinantes políticos do gasto público como fatores altamente influentes na efetividade das regras, qualquer que seja o seu grau de flexibilidade. Aporta nesta breve exposição da experiência internacional que é possível se conseguir disciplina fiscal quando há claros incentivos ao vero cumprimento das regras, como é o caso dos países que aspiram ao ingresso na União Européia. É por isso que o critério da flexibilidade é especialmente relevante para o formato das regras fiscais que atuam sobre os governos subnacionais, dada a prontidão necessária ao tratamento de assolações macroeconômicas inesperadas ou eventuais distanciamentos de procederes fiscais mais disciplinados. No caso do Tratado de Maastricht, por exemplo, as cláusulas de escape e exceções à regra nada mais são do que apetrechos de adequação às especificidades inerentes ao ambiente político-institucional de cada país, em determinado tempo. Isto porque as regras que forem úteis durante a fase inicial de ajuste podem deixar de ser suficientes num momento posterior. Em função disto, vários países europeus adotam regras para vigorar apenas por um período pré-determinado, ou decidem abolir as regras outrora acolhidas com ânimo definitivo. Fica evidente que os motivos da adoção de regras de diferente natureza, por um lado, e da sua eventual revogação, por outro, podem surgir de uma miríade de fatores internos. Exemplo recente de FRL de vida brevíssima já se tem na América Latina. A regra é adotada no Equador em 2003 sem qualquer consenso político ex ante, mas por simples exigência do FMI, que receia que um salto no nível dos gastos públicos conturbe os preços do petróleo. Passados dois anos, o discurso oposicionista contrário à restrição de gastos por imposição do Fundo ganha popularidade e a regra é praticamente derrogada por pressão de 29.

(30) grupos políticos domésticos (Acosta et al., 2007). Ou seja, é possível que mudanças significativas em contextos econômicos, políticos e sociais inerentes a cada país levem à decisão de se alterar as regras fiscais, ou de substituí-las por outros mecanismos de coordenação fiscal, o que advoga contra a idéia de que as regras são um tipo de eterna panacéia a ser empregada na cura de todos os males fiscais.. 1.4 Antecedentes da LRF: mudanças institucionais no Brasil No início da década de 90, os arranjos institucionais decorrentes da descentralização fiscal no Brasil traduzem-se numa anelada delegação, para os níveis inferiores de governo, de poder decisório em matéria financeira, cuja primazia fora até então das autoridades políticas centrais. No âmbito dos estados, pelo menos dois efeitos decorrem deste novo padrão institucional: primeiro, dada a redemocratização, as demandas sociais sobre os governos crescem em velocidade maior do que a sua capacidade de atendê-las e, segundo, a ausência de controles fiscais rigorosos fornece incentivos para os governos subnacionais elevarem seu nível de gastos com políticas distributivas e clientelistas. Governadores e prefeitos passam a fazer uso dos orçamentos como forma de honrar promessas de campanha e ganhar suporte político (Samuels, 2001). Isto porque eles sentem-se agora no mister de dar respostas diretamente ao eleitorado, o que os torna sensíveis às preferências dos eleitores, ou seja, extremamente vulneráveis à pressão dos ciclos eleitorais. Pela ótica macroeconômica, os principais problemas passam a ser o déficit e o endividamento dos estados, visto que a devolução de autoridade fiscal acarreta menor. 30.

(31) controle sobre uma importante variável da economia nacional – o gasto público – em razão da maior partilha de recursos com os governos subcentrais. Com efeito, ao receberem mais transferências federais, os governos dos estados têm incentivos para desconsiderar as conseqüências macroeconômicas das suas escolhas fiscais. Em outras palavras, os governadores passam a optar pelos benefícios imediatos e concentrados da elevação dos gastos, uma vez que os custos de tais escolhas, ainda que maiores, seriam arcados de forma difusa, em vagos termos de instabilidade macroeconômica. Na verdade, tal cenário é promovido pelos conflitos inerentes aos sistemas federativos, porquanto as esferas de governo escalonam suas preferências fiscais de maneiras incompatíveis entre si. Para as abordagens tradicionais sobre o federalismo fiscal (Buchanan, 1970; Musgrave & Musgrave, 1980), os interesses nacionais girariam em volta da estabilização monetária, do crescimento econômico e da provisão de bens públicos de alcance nacional, enquanto os estados estariam mais interessados em obter autonomia política e fiscal, discricionariedade de gastos e produção de políticas públicas distributivas e locais. Na visão de Alston et al. (2006), as conexões eleitorais do Presidente da República o impelem ao atendimento de demandas de alcance nacional, como a redução da inflação e aumento do nível de emprego, o que depende do equilíbrio fiscal agregado, enquanto os governadores, que respondem perante um eleitorado mais reduzido, buscam sobrevivência política mediante gastos maciços em investimentos infraestruturais localizados, o que reprime os esforços federais de estabilização fiscal. Além disso, como lembra Gama Neto (2007), a incerteza gerada pela volatilidade parlamentar nas assembléias legislativas concorre para a desventura fiscal dos estados. “A falta de apoio político-partidário construído nas eleições induzia os governadores de estado a adotarem políticas expansivas de gastos como forma de construção de apoio político” 31.

(32) (2007: 18). E o ajuste fiscal no nível estadual é tarefa difícil de se realizar, uma vez que há incertezas e muitos riscos associados à medida. Aplica-se o raciocínio de Melo (2005b: 98), para quem “os formuladores de políticas fiscais são tipicamente avessos ao risco. Na ausência de consenso sobre o impacto das reformas, eles preferem o statu quo à reforma”. Regras de equilíbrio fiscal até que existem, tais como limites de endividamento emitidos pelo Banco Central e regulações do Conselho Monetário Nacional e do Senado Federal. No entanto, essas regras “ou eram solenemente desrespeitadas ou suas punições não eram aplicadas” (Gama Neto, 2007: 18). Teria sido como se os políticos não temessem os ameaços de castigo, por em tempo algum se efetivarem. Os custos de tamanha indisciplina fiscal não tardam a aparecer nas finanças dos estados: ainda na primeira metade da década de 90, a insuficiência das receitas tributárias para financiar os gastos públicos é visível e os valores mensais despendidos com o funcionalismo público e com o sistema previdenciário, ao invés de fixos, são crescentes, tudo refletindo na trajetória ascendente de sua dívida pública interna e externa. Em tal contexto, a execução orçamentária dos estados é normalmente viabilizada com o auxílio de recursos extraordinários gerados pela via inflacionária, como nos casos do reajuste da folha de pessoal em percentuais inferiores à taxa da inflação e o alongamento dos prazos de pagamento de credores. Outro curso de ação preferido dos governadores vem a ser o expediente de empréstimos não saldados junto aos bancos estaduais, na forma de emissão de títulos públicos, ou “moeda podre”. Os incentivos para tal rotina são óbvios: colhem-se os benefícios das operações no curtíssimo prazo e lançam-se os seus custos para momentos futuros e incertos. São óbvios também os efeitos negativos para a estabilização da economia nacional.. 32.

(33) Em face disso, a União engaja-se em operações de socorro financeiro dos estados (os chamados bailouts). Considerando-se apenas os dois maiores bailouts do período anterior a Cardoso, as dívidas sobem dos estados para o governo central em 1989 e 1993 (Bevilaqua, 2000). As transações, além de onerarem demasiadamente o erário federal, acabam dando origem a falhas no controle do endividamento dos estados. A perspectiva de “federalização” do déficit funciona como incentivo à elevação dos gastos (Bevilaqua, 2000; Loureiro, 2001) porque os governos estaduais computam ganhos políticos ao se beneficiarem das dívidas que são posteriormente absorvidas pela União. E crescem ainda mais os fatores de pressão sobre as finanças dos estados com a implantação do Plano Real em 1994: reduzem-se substancialmente as receitas decorrentes de aplicações financeiras, até então utilizadas pelos governos estaduais para cobrir despesas de custeio. Não apenas isso: a própria política federal de elevação da taxa de juros encarrega-se de alçar o estoque da dívida subnacional a patamares excessivos, com tom ferino para o próprio equilíbrio macroeconômico nacional. A crise fiscal, que já é generalizada, se intensifica e a solução se impõe urgentemente, à semelhança do prescrito por Drazen & Grilli (1993): a própria crise antecipa a estabilização, por forçar uma solução. Contudo, os políticos dos diversos níveis estão divididos sobre a matéria e o Executivo Federal éo único ator com interesses universalistas em relação aos problemas de common pool do país, i.e., a inflação e os custos reputacionais no cenário internacional. Com isso, nos anos que se seguem ao Plano Real o Presidente Cardoso tem como prioridade impor disciplina fiscal aos entes subnacionais, como meio de dar continuidade ao processo de liberalização econômica e ampliar suas possibilidades de reeleição. O sucesso das políticas de estabilização monetária fortalece o governo federal junto à opinião pública, conferindo respaldo às suas decisões de natureza 33.

(34) fiscal. Outro fator crucial é a possibilidade de aprovação da Emenda da Reeleição, alento para os governadores e um trunfo na manga do governo federal:. “A instituição da reeleição mudou o cálculo estratégico dos governadores frente às exigências do governo federal de maior controle das relações federativas. Com a perspectiva de continuar no poder, os chefes dos executivos estaduais passaram a endogeneizar nas suas preferências amplos acordos de renegociação das dívidas e privatização de empresas públicas estaduais com o governo federal, trocando restrições institucionais a futuros gastos pelo alívio financeiro no ano eleitoral de 1998.” (Gama Neto, 2007: 24). Em razão disso e da grande vulnerabilidade fiscal dos estados, o governo federal adquire o tônus político necessário para convencer os estados a reverter o comportamento em favor do ajuste de suas contas. Em certa medida isto se aproxima das análises institucionais que apontam para a necessidade de um chefe do Executivo federal forte com capacidade institucional para anular a resistência de grupos políticos contrários às reformas (e.g., Mainwaring & Shugart, 1997; Alston et al., 2006). Tais análises creditam aos poderes constitucionais do Presidente a capacidade de impor suas preferências e implementar reformas em ambientes políticos hostis, superando, assim, os entraves do jogo político intergovernamental. A lógica por trás da força do governo central seria clara: problemas intensos de ação coletiva impediriam os governos subnacionais de formarem um bloco uniforme em prol de seus interesses, o que lhes gera perdas.. 34.

(35) De fato, a força política do presidente Cardoso fica evidente quando vários governantes subnacionais são convencidos a aceitar mudanças que certamente limitariam a autonomia fiscal de estados e municípios. Se, segundo Rezende & Afonso (2006: 143), a intercessão dos governos estaduais e municipais no Congresso gera a oportunidade de se barganhar para compensar a redução de sua autonomia financeira, ainda que os governos subnacionais não tivessem influência direta na formulação das políticas, é do entendimento de Melo (2005a: 855) que “o Executivo federal teve que conciliar suas preferências fiscais com medidas que teriam conseqüências na sua sobrevivência política, inclusive nas áreas de políticas pelas quais eles arcariam os custos políticos no caso de fracasso.” Então, conforme entende Dillinger (2002), o apoio conseguido no Congresso pelo presidente Cardoso é crucial para vencer a resistência das elites estaduais à instituição das novas regras fiscais intergovernamentais. É possível sumarizar as medidas idealizadas no primeiro mandato de Cardoso com o fim de esgotar as principais fontes geradoras de déficts subnacionais, lançando os fundamentos do ajuste fiscal dos estados: a renegociação de dívidas junto ao governo federal,4 as reformas do setor financeiro e a privatização dos bancos estaduais. O arremate é a criação do Programa de Estabilidade Macroeconômica, composto de nova sucessão de medidas que se consolidariam em 2000 com a aprovação da Lei de Responsabilidade Fiscal. À vista disso, Alston et al. (2005) consideram difícil a tarefa de isolar o efeito da LRF de outras mudanças intensas ocorridas na economia e na estrutura de poder, embora. 4. De conformidade com a Lei 9496, de 1997, o governo federal assinou acordos de negociação de dívidas com a maioria dos estados brasileiros, os quais ficaram impedidos de emitir títulos até que suas despesas anuais se tornassem menor que as receitas. Os acordos e os programas de ajuste fiscal dos governos subnacionais serviram de base para a criação da LRF e foram por ela reforçados. Em 2000, apenas os estados de Tocantins e Amapá não haviam assinado acordos de refinanciamento (Goldfajn & Guardia, 2004).. 35.

(36) reconheçam que a regra forçou grandes mudanças nos ritos procedimentais da execução orçamentária no Brasil. E na arena política fica flagrante que o governo federal conseguira alterar a estratégia dominante dos atores subnacionais diante gasto e do endividamento. Nada assegurava, porém, que as novas regras seriam auto-suficientes, dado que “a reforma dos sistemas tributários e fiscais depende da capacidade dos atores em assumir compromissos críveis, no sentido de absterem-se de comportamentos oportunistas” (Melo, 2005b: 101). Assim, em que pese a moldura institucional da LRF e regras afins passar a guarnecer os contornos da agenda fiscal da Federação, restava saber se obstaria ela o oportunismo fiscal dos governantes aquando de assumirem compromissos eleitorais.. 1.5 Lei de Responsabilidade Fiscal: características e primeiros impactos No segundo mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso é introduzida no federalismo fiscal brasileiro a Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar 101, de 04 de maio de 2000), com o objetivo supremo de promover o equilíbrio intertemporal das contas públicas nos diferentes níveis de governo. A exemplo da pioneira congênere neozelandesa (Fiscal Responsibility Act, de 1994), a LRF é inicialmente concebida com fins de combate à inflação. A regra assemelha-se também ao sistema da União Européia (Tratado de Maastricht e Pacto de Estabilidade e Crescimento) não apenas em termos da adoção de limites numéricos ao déficit, mas também por destinar-se a superar problemas de externalidades negativas na economia nacional geradas pelo gasto excessivo de diferentes estados e vedar potenciais bailouts dos governos fiscalmente displicentes. 36.

(37) A LRF brasileira procura observar também a chamada “regra de ouro” como forma de amenizar o congestionamento de demandas de investimento público. Outra analogia com as regras fiscais da OECD e da América Latina está na existência de cláusulas de escape, mais precisamente na utilização de reservas de contingência na ocorrência de eventos fiscais imprevistos.5 Um critério objetivo para o discernimento de grave crise fiscal é a retração da economia na ordem de um ponto percentual ou mais nos últimos trimestres. Ainda assim, fica sujeita à discricionariedade dos parlamentares brasileiros a interpretação de eventos e seu possível enquadramento na categoria de calamidade nacional para que sejam invocadas as cláusulas de escape que lhes reserva a regra. O conteúdo substantivo da Lei traz reforço a medidas anteriores e introduz normas adicionais de equilíbrio orçamentário. As principais são a obrigatoriedade da correspondência entre despesas e receitas para o ano em curso e os dois anos subseqüentes, a vedação de se contraírem empréstimos pelos governos junto às instituições financeiras das quais forem acionistas principais e a proibição de se concederem benefícios fiscais no orçamento, exceto quando se indique sua fonte de financiamento para os dois anos seguintes. Quanto ao aumento de gastos de caráter continuado, o prudente conselho para os ordenadores de despesa é cuidar para que o acréscimo pretendido seja compatível com as leis orçamentárias e planos plurianuais e não comprometa as metas fiscais, caso contrário as despesas serão julgadas não-autorizadas, irregulares e lesivas ao patrimônio público, com responsabilização administrativa e criminal. A LRF tem formato bastante detalhado em termos de conteúdo, especificando não apenas a natureza das políticas fiscais a serem adotadas pelos governos, mas também os procedimentos operacionais necessários à garantia de seu cumprimento, além de padrões de 5. Anexo de Riscos Fiscais (Art. 4o, parágrafo 3o, da LRF).. 37.

(38) transparência e penalidades financeiras. Cada nível de governo recebe um limite uniforme para a razão dívida-receita, o que implica num ajuste fiscal a ser executado num período determinado de exercícios financeiros. A LRF impõe limites adicionais ao gasto com pessoal, com o fito de conter o crescimento deste que é um dos principais componentes da despesa pública brasileira. Os entes federativos ficam obrigados a incluir na sua Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) um anexo de metas de resultado primário para o exercício corrente e para os dois subseqüentes. A LDO, que precede a elaboração do orçamento para cada exercício financeiro, deve agora trazer um demonstrativo comparando a meta firmada e o resultado obtido e descrevendo os fatores determinantes de eventuais desvios com respeito ao balanço originalmente esperado. Para a fixação da meta é levado em consideração o montante necessário à recondução do endividamento público aos limites assentados por Resolução do Senado Federal. No final das contas, a evolução do resultado primário deve mensurar o ritmo de adesão dos estados e municípios às ordenanças federais acerca do ajuste fiscal que, ao menos nos anos iniciais de vigência da regra, traduzem as metas de superávit fiscal acordadas com o FMI. Uma importante inovação da LRF é erigir tetos para abrigar as dívidas dos estados, fixados como proporção da Receita Corrente Líquida. Os excessos em relação ao teto devem ser eliminados no prazo de um ano, caso contrário haverá interrupção no fluxo das transferências voluntárias federais,6 além da negação de garantias de crédito para os governos faltosos. O Senado Federal tem prerrogativa para alterar os tetos na eventualidade 6. Conforme o Art. 25 da LRF, “entende-se por transferência voluntária a entrega de recursos correntes ou de capital a outro ente da Federação, a título de cooperação, auxílio ou assistência financeira, que não decorra de determinação constitucional, legal ou os destinados ao Sistema Único de Saúde.” E no parágrafo 3º do mesmo capítulo: “Para fins das sanções de suspensão de transferências voluntárias constantes desta Lei Complementar, excetuam-se aquelas relativas a ações de educação, saúde e assistência social.”. 38.

(39) de séria instabilidade econômica ou mudança drástica na política monetária nacional. A redução do déficit também é ordenada por etapas, com a fixação de metas anuais que obrigam a todos os níveis de governo. O peso maior, todavia, viria a se sentir nos estados e municípios, já que ficam também impedidos de receber socorro financeiro federal mediante financiamentos de déficits (bailouts). Os efeitos dos ciclos eleitorais nas cifras públicas são bem lembrados na LRF (Art. 42), na medida em que só devem ser autorizadas despesas de final de mandato quando se apontarem recursos suficientes para tanto. Mais especificamente, nos últimos oito meses de governo nenhum administrador público deve contrair obrigação de despesa que não tenha condições de pagar até o expirar do seu mandato. É permitido ao governante deixar “restos a pagar” para o sucessor, contanto que as disponibilidades em caixa sejam suficientes para quitá-los. Aumentos salariais e contratação de pessoal ficam também proibidos nos últimos meses do cargo eletivo. As vedações objetivam impedir que governantes não reeleitos inviabilizem a gestão dos sucessores, transferindo-lhes despesas que dificilmente conseguiriam suportar. Outra providência da LRF é interditar operações creditícias por antecipação da receita orçamentária (ARO) no último ano do governo (Art. 38), para não gerarem aumento de dívida. Um notável evento relacionado ao enforcement da LRF é a introdução da Lei de Crimes Fiscais – Lei Federal 10.028, de 19 de outubro de 2000. Eis que agora entra no jogo fiscal intergovernamental um novo ator institucional: o Poder Judiciário (Alston et al., 2005: 40). Por penhor do efetivo cumprimento das regras fiscais, a LCF institui multas, perda de cargo público, inelegibilidade e até prisão. A reboque, e como renovado aceno de poder do governo federal, são acrescentadas ao Código Penal tipificações que incriminam velhos costumes dos governadores, tais quais a contratação de operações de crédito sem 39.

Referências

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