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notas evento seminário resgata experiência do poeta italiano ungaretti no brasil

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Academic year: 2021

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notas

evento

seminário resgata experiência do poeta italiano ungaretti no brasil

entrevista

o crítico boris schnaiderman comenta seu livro sobre a cultura russa atual

diálogo literário

o romancista cristovão tezza analisa a trajetória de sérgio sant’anna

poéticas

livro de davi arrigucci jr. interpreta manuel bandeira e murilo mendes ensaios de lezama lima propõem decodificação literária do mundo

arte

documenta de kassel explora reflexos da política sobre a arte

livros trazem ensaios de clement greenberg, maior crítico americano

bienal do livro

rio de janeiro recebe mais importante acontecimento editorial do ano

na ponta da língua

uma conjugação verbal

que provoca muita confusão

capa

ensaio de george steiner disseca o “guia literário da bíblia”

memória em revista

cláudio giordano evoca a beleza sutil da figura feminina nos anúncios antigos

turismo literário

uma viagem pela lisboa de fernando pessoa e josé saramago

dossiê

biografia de dostoiévski renova leituras do mestre russo

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Fotos/Divulgação

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O ensaísta Boris Schnaiderman

fala sobre a cultura que emergiu na Rússia após a perestroika

George Steiner escreve sobre o Guia literário da Bíblia, que será lançado em setembro

O Dossiê explora

os labirintos da vida e da obra de Dostoiévski

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A O L E I T O R

Diretor: Paulo Lemos Gerente geral: Silvana De Angelo Editor: Manuel da Costa Pinto Diretor de arte: Maurício Domingues Diagramação e arte: Sonia Maria Oliveira Silva, Fabricio Menossi de Paula, Fabiana Fernandes, Adriano Montanholi, Eduardo Martim do Nascimento Produção editorial: Antonio Carlos De Angelo Revisão: Izabel Moraes Baio, Karina Yoko Makiyama Colaboradores: Aurora F. Bernardini, Camila Viegas, Cláudio Giordano, Cristovão Tezza, George Steiner, Heitor Ferraz, João Alexandre Barbosa, José Guilherme Rodrigues Ferreira, Len Berg, Luciana Artacho Penna, Mônica Cristina Corrêa, Pasquale Cipro Neto, Reynaldo Damazio Redator: Marcos Paulo Morales Produção gráfica: José Vicente De Angelo Circulação e assinaturas: Márcia Monteiro Cordás Dept. comercial: Idelcio D. Patricio, Jorge Rangel, Exalta de Camargo Dias, Jefferson Motta Mendes, Julio Cesar dos Santos, Elieuza P. Campos Dept. financeiro: Regiane Mandarino, Roberta Alves dos Santos Jornalista responsável: Manuel da Costa Pinto Periodicidade: mensal ISSN 1414-7076

Lemos Editorial e Gráficos Ltda. – Rua Rui Barbosa, 70, Bela Vista – São Paulo, SP

O

lançamento da revista CULT e a pronta resposta que tivemos da parte de editores, professores, estudantes e, principalmente, de um número enorme de pessoas que buscam o prazer da leitura em todo o Brasil desmentiram um mito há muito tempo arraigado em nosso país: a idéia preconceituosa de que os brasileiros não se interessam pela literatura, de que nosso precário sistema educacional criou uma população de “videotas” que só respondem aos apelos fáceis da cultura de massa – transformando irremediavelmente a alta cultura num “produto” para consumo somente das elites.

Não há erro nessas premissas. De fato, o ensino no Brasil é vergonhoso e o apoio à produção cultural foi nulo até pouco tempo atrás. Mas as conclusões são falsas. O elitismo é uma postura cômoda e conservadora que alimenta o mito de que a cultura é e deve, por uma fatalidade histórica, permanecer inacessível à maioria.

Entretanto, qualquer pessoa atenta pode observar como um pequeno gesto de estímulo à cultura e à produção artística e intelectual tem resposta imediata do público. E as cartas, os pedidos de assinatura e as palavras de incentivo à CULT, vindos de Belém ou do interior do Rio Grande do Sul, são demonstrações de um interesse latente pelos raros canais de expressão que surgem no país.

Hoje, felizmente, algumas empresas clarividentes descobriram que a cultura é, a curto prazo, um bom negócio (pois efetivamente atrai o interesse do público) e, a longo prazo, um instrumento de qualificação humana que nenhum país pode menosprezar. A tendência cada vez mais forte do marketing cultural, a existência do Ática Shopping Cultural (onde foi lançada a CULT, no dia 21 de julho) e o sucesso das Bienais do Livro (como a que está ocorrendo no Rio de Janeiro) mostram que existe espaço cada vez maior para a expansão desse mercado. Afinal, a cultura talvez seja a única matéria-prima cujas fontes são inesgotáveis e que, ao ser consumida, se reproduz.

Nesses tempos tão neoliberais, esse pode ser um bom argumento para que o Estado e as empresas patrocinem a cultura. De nossa parte, preferimos mesmo o argumento do prazer, da cumplicidade com os milhares de leitores que partilham conosco o prazer de ler Dostoiévski, Manuel Bandeira, Murilo Mendes, José Saramago, Lezama Lima, George Steiner, Boris Schnaiderman, Sérgio Sant’Anna..., enfim, estes mestres da palavra que estão nas páginas do segundo número da CULT.

Paulo Lemos

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No lançamento da CULT:

1.O poeta português Ernesto de Melo e Castro e Elza Miné, professora da USP. 2. Ney Alves (esq.), diretor do Banco Pontual, e o psiquiatra Jorge Amaro Wohney. 3. O jornalista e crítico de cinema Celso Sabadin.

4. Marcelo Levy, diretor de marketing da Companhia das Letras.

5. A jornalista Leonor Amarante, diretora de publicações do Memorial da América Latina.

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C U L T 3

Ateliê de poesia

Na programação de seus Cafés Filosóficos, a livraria Cultura promove também, na última terça-feira de cada mês, o Ateliê Cultura de Novos Poetas. Sob a coordenação do poeta Régis Bonvicino, o ateliê abre espaço para autores inéditos lerem suas poesias. O primeiro ateliê será no dia 26 de agosto às 19h30. Os interessados devem enviar no máximo cinco poemas inéditos para Sonia Goldfeder, na livraria Cultura (endereço na nota à esquerda). Três autores serão selecionados por uma comissão composta por Bonvicino, pela poeta e jornalista Miriam Paglia Costa e pelo professor de literatura Haquira Osakabe, da Unicamp.

N O T A S

Paul Zumthor

A obra do medievalista Paul Zumthor (foto) está sendo discutida na PUC-SP entre os dias 13 e 15 de agosto, em colóquio coordenado pela professora Jerusa Pires Ferreira. Participam do encontro críticos como Leyla Perrone-Moisés, Luiz Costa Lima e Lorenzo Mammì, que abordam o papel fundamental do historiador na valorização da cultura oral. O evento marca também o lançamento dos livros Introdução à poesia oral (Hucitec/Educ) e Tradição e esquecimento (Hucitec), ambos de Zumthor (1915-1995). A editora Hucitec publicará os textos do colóquio no primeiro número da revista Poéticas da oralidade.

Bobbio

A editora Campus anunciou a compra dos direitos de tradução da Autobiografia do cientista político e filósofo italiano Norberto Bobbio. Em sua edição anterior, a CULT publicou alguns trechos da obra, recém-editada na Itália, mas não noticiou o fato, ocorrido após o fechamento da revista. A Campus já havia editado neste ano O tempo da memória: “De Senectute” e outros escritos autobiográficos e, com a publicação do novo título, estará lançando no Brasil o conjunto dos textos memorialísticos de Bobbio.

Café

Filosófico 1

A Aliança Francesa do Rio de Janeiro reativa este mês seus Cafés Filo – como são conhecidas na França as reuniões informais de discussão filosófica em bares e cafés. No dia 22 de agosto, o geneticista e pensador Albert Jacquard fala sobre “Os novos poderes da ciência”; no dia 26, o psicanalista Tobie Nathan aborda as relações psicanálise-antropologia; e, em 8 de setembro, o sociólogo Alain Touraine apresenta o tema “As ciências sociais entre o possível e o inaceitável”. Os encontros acontecem na Maison de France (av. Pres. Antonio Carlos, 58, salão do 3º andar, tel. 021/532-1323).

Café

Filosófico 2

Dentro do mesmo espírito e seguindo uma tendência que se espalha por cidades como Bruxelas, Tóquio e Nova York, a livraria Cultura promove a partir deste mês em São Paulo um Café Filosófico coordenado pela jornalista Sonia Goldfeder e pela filósofa Olgaria Matos. O encontro acontece todas as terças-feiras, às 19h30, no mezanino da loja principal da Cultura (av. Paulista, 2073, loja 153, CEP 01311-940, tel. 011/285-4033 r. 2245, e-mail: soniagold@livcultura.com.br). A entrada é franca e não é preciso fazer inscrição prévia.

Canadá nas Gerais

Belo Horizonte acolhe entre os dias 3 e 14 de setembro o melhor da cultura canadense contemporânea. Depois de eventos semelhantes no Rio de Janeiro (95) e em São Paulo (96), o “Canadá nas Gerais” vai trazer ao Brasil a escritora canadense de origem chinesa Evelyn Lau, a dança de Margie Gillis e do Les Grands Ballets Canadiens, a música do St. Lawrence String Quartet e a Semana do Cinema Canadense – além de um festival gastronômico. Durante o evento será inaugurada a Fundação Cultural Brasil-Canadá, para incentivar o intercâmbio cultural entre os dois países. Informações pelo tel. 031/229-6565.

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Seminário discute a obra do escritor e

suas relações com o Brasil, onde fundou

o curso de italiano da USP e manteve

intenso diálogo com poetas modernistas

Mônica Cristina Corrêa

A pátria humana de

Ungaretti

“C

oube-me por sorte dever pertencer a várias pátrias; e não é sorte que seja facilmente suportável. (...) O Egito é a minha pátria nativa. (...) A França é minha pátria de formação. (...) A Itália é minha pátria natural, pois que sou de velho sangue italiano, antes luquese. (...) O Brasil é minha pátria humana”. Essas são as palavras do poeta italiano Giuseppe Ungaretti por ocasião de uma viagem ao Brasil, em 1968. O poeta se refere a sua experiência de seis anos (1937-1942) como fundador e professor da cadeira de literatura italiana da USP – experiência reconstituída no livro Invenção da poesia moderna. Lições de literatura no Brasil, 1937-1942 (Ática).

E é com o intuito de retomar suas relações com a “pátria humana” e abrir espaço para a releitura de sua poesia que a área de literatura italiana da USP promove, entre 8 e 11 de setembro, o seminário “Ungaretti, poeta de três continentes”, em comemoração dos 60 anos do início da carreira docente do poeta no país.

Nascido na cidade de Alexandria (Egito) em 1888 e morto em Milão (Itália) em 1970, Ungaretti veio ao Brasil na década de 30, a convite do governo do Estado de São Paulo, como membro de uma missão universitária que ajudou a fundar a faculdade de Filosofia e Letras da USP – e só

deixou o país em 1942, quando, durante a Segunda Guerra, o Brasil rompeu relações diplomáticas com os países do Eixo.

Duas mesas-redondas do seminário se propõem a discutir a influência ungarettiana na formação da faculdade e, de modo mais geral, sua atividade como professor: “Memória de Giuseppe Ungaretti no Brasil” (coordenação de Aurora F. Bernardini) terá participação de Antonio Candido, Bruna Bianco, Lázaro de Almeida Prado e Rudá de Andrade – além da apresentação um filme inédito de Davi Neves, com uma entrevista com Ungaretti realizada pelo crítico Paulo Emílio Salles Gomes; a mesa “Ungaretti professor” (coordenação de Andrea Lombardi) terá a presença de Alfredo Bosi, Augusto Massi, Alexandra Zingone (Roma), Isabel Picon (Paris) e Marco Lucchesi (Rio de Janeiro).

Além disso, destaca-se a mesa-redonda “Ungaretti e as vanguardas”, coordenada por Maria do Rosário Toschi, com os poetas Haroldo de Campos, Nelson Ascher, Lello Voce e Arnaldo Antunes. Além de discutir sua obra do ponto de vista da produção contemporânea, a mesa terá apresentação de trechos de filmes e vídeos sobre o escritor e declamações (em italiano e português) de seus poemas – ressaltando assim a oralidade

Evento

da poesia de Ungaretti, que encontra ecos atuais no poeta italiano Lello Voce e no brasileiro Arnaldo Antunes, dois artistas que procuram justamente explorar a vocalização da palavra em apresentações públicas e na música.

Por tudo isso, o papel de Ungaretti como formador da universidade não é apenas a de um professor, mas de um artista e intelectual que iria dialogar de maneira intensa com a poesia de vanguarda brasileira. Desse diálogo surgem suas traduções, para o italiano, de poetas brasileiros como Tomás Antonio Gonzaga, Gonçalves Dias, Manuel Bandeira e Vinicius de Moraes, e os prefácios a edições italianas de Memórias sentimentais de João Miramar (de Oswald de Andrade) e da Siciliana (de Murilo Mendes).

Relembrar sua missão na universidade brasileira significa, portanto, devolver com gratidão a consideração que Ungaretti reservou ao país, conforme disse em seu discurso em 1968: “Eis porque chamo o Brasil de minha pátria humana. Deu-me ele, pela experiência que nele pude fazer, a medida do homem: imensurável de dignidade, de poderio e, ao mesmo tempo, um ser que não é nada.”

Mônica Cristina Corrêa

mestranda em tradução em língua e literatura francesa na USP

In galleria

Un occhio di stelle

ci spia da quello stagno

e filtra la sua benedizione ghiacciata

su quest’acquario

di sonnambula noia.

Giuseppe Ungaretti

Na galeria

Um olho de estrelas

nos espia daquele charco

e filtra sua bênção gelada

sobre este aquário

de tédio sonâmbulo.

Tradução de Sérgio Wax

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C U L T 5

A

PALAVRA ABSOLUTA

É do contato com a cultura francesa que Ungaretti criou uma poesia da palavra absoluta, centrada no significante, influenciada por Mallarmé (que Ungaretti traduziu para o italiano), que ficou conhecida como “poesia hermética” e teve como seguidores Eugenio Montale e Salvatore Quasimodo.

“Seria difícil explicar em poucas palavras” – diz o crítico Alfonso Berardinelli – “o que foi o hermetismo, mas talvez se possa resumi-lo nesta fórmula: especializar a linguagem lírica, afastá-la tanto quanto possível da prosa e da língua comum, e, enfim, reencontrar Petrarca e o Stilnovo passando por Mallarmé e Góngora” (“La poesia italian dopo il 1945”, in 50 Anni della letteratura Italiana, UNAM, México). Mas Ungaretti também foi um poeta que a guerra levou à vivência paradoxal da transitoriedade, da observação extasiada da beleza da vida. É essa percepção da inconsistência humana que ele vai representar em sua obra-prima, A alegria (tradução de Sérgio Wax, editora Cejup), cujo título, em si mesmo, afasta a idéia de pessimismo. Trata-se antes de expressar uma certa explosão sensual promovida pela consciência da fragilidade da condição humana, da precariedade dos projetos.

A dor – que de fato veio ao poeta com a perda do filho de nove anos (incidente que se deu no Brasil, por causa de uma apendicite mal diagnosticada), com a morte de um irmão e com a eclosão da Segunda Guerra – será a temática da fase posterior (após 1947), em Il dollore, La terra promessa, Taccuino del vecchio, Un grido e paesaggi. (M.C.C.)

S

EMINÁRIO

“U

NGARETTI

,

POETA DE TRÊS CONTINENTES

”

Dia 8 – Segunda-feira

19h30 – Biblioteca Mário de Andrade (r. da Consolação, 94, São Paulo)

Coquetel de abertura e inauguração da exposição de obras de Ungaretti, sobre Ungaretti e de autores estudados e/ou traduzidos por Ungaretti.

20h00 – Biblioteca Mário de Andrade

Mesa-redonda “Memória de Giuseppe Ungaretti no Brasil”

Coordenadora: Aurora F. Bernardini. Participantes: Antonio Candido, Bruna Bianco, Antonio Lázaro de Almeida Prado, Rudá de Andrade.

21h45 – Biblioteca Mário de Andrade

Filme de Davi Neves com Ungaretti sendo entrevistado por Paulo Emílio Salles Gomes.

Dia 9 – Terça-feira

10h00 – Prédio de Letras/USP (Cidade Universitária,

São Paulo)

Palestra da Profª Alexandra Zingone (Universidade de Roma): “A Aventura Egípcia de Ungaretti”

11h00, 13h00, 14h30 e 16h30 – Comunicações 19h30 – Anfiteatro da História/USP (Cidade Universitária, São Paulo)

Mesa-redonda “Ungaretti professor”

Coordenador: Andrea Lombardi. Participantes: Alfredo Bosi, Augusto Massi, Alexandra Zingone (Universidade de Roma), Isabel Violante Picon (Universidade de Paris), Marco Lucchesi (UFRJ).

Dia 10 – Quarta-feira

19h30 – Biblioteca Mário de Andrade Mesa-redonda “Ungaretti e as Vanguardas” Coordenadora: Maria do Rosário Toschi. Participantes: Haroldo de Campos, Lello Voce, Nelson Ascher, Márcia Teóphilo, Arnaldo Antunes.

Declamação de poemas de Ungaretti e de suas traduções de poetas brasileiros; filmes e vídeos da RAI (televisão italiana) sobre Ungaretti.

Dia 11 – Quinta-feira 10h00 – Prédio de Letras/USP

Palestra da Profª Isabel Violante Picon (Sorbonne, Univ. Paris I): “Ungaretti tradutor”.

11h00, 13h00, 14h30 e 16h30 – Comunicações 19h30 – Anfiteatro de História/USP

“Ungaretti e as relações culturais ítalo-brasileiras” Coordenadora: Lucia Wataghin. Apresentação de trechos de filmes sobre Ungaretti e audição de CDs com declamações do poeta, seguidas de debate com Zilda Iokoi, Nicolau Sevcenko, Irene Cardoso, Oswaldo Coggiola, Marcello Tassara, Renata Pallottini. Informações Seção de Atividades e Cursos Extracurriculares da FFLCH-USP (011/818-4645) R e p ro d u ç ã o 5 C U L T

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e n t r e v i s t a

B

O

R

I

S

F o to s /D iv u lg a ç ã o

S C H N A I D E R M A N

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C U L T 7

Boris Schnaiderman é o maior intérprete da cultura russa no Brasil. Foi graças a esse ensaísta e tradutor que o grande público conheceu as obras de Púchkin, de Maiakóvski e de importantes lingüistas soviéticos como Lótman e Ivanov. Agora, aos 80 anos, ele mais uma vez renova nossa visão da cultura russa. Em Os

escombros e o mito, recém-lançado

p e l a C o m p a n h i a d a s L e t r a s , Schnaiderman analisa o impacto do fim da União Soviética sobre o panorama intelectual do país, com a redescoberta de autores e livros antes banidos pelo regime comunista. Nessa entrevista para a CULT, Boris Schnaiderman fala sobre o significado dessas descobertas, sobre o meio cultural russo e sobre sua trajetória – que se inicia em 1917 (ano de seu nascimento e da revolução bolchevique) e que, desde dezembro de 1925 (data da chegada de sua família ao Rio de Janeiro) está indissoluvelmente ligada ao Brasil e a São Paulo, onde foi o responsável pela criação do curso de língua e literatura russa da USP.

Aurora F. Bernardini

Manuel da Costa Pinto

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CULT Os escombros e o mito nos apresenta obras que reapareceram no cenário russo nos anos 1985-1992, de autores como Mikhail Bulgakov (O mestre e Margarida), Anatóli Ribakóv (Os filhos da rua Arbát), Wassili Grossman (Vida e destino), Sacha Sokolóv (Escola de bobos), Andréi Bitov (A casa de Púchkin), Vassíli Aksionov (A gema do ovo) e A.M. Piatigórski (A filosofia de um beco). No livro, o sr. afirma que essa literatura manifesta uma ligação especial entre o ficcional e o histórico. Como se dá isso?

Boris Schnaiderman Na literatura russa, sempre foi muito forte a presença da história, da crítica do momento, vivida com muita intensidade. E o que me parece muito interessante na literatura que surgiu de 1985 para cá é justamente essa ligação. Nas revistas russas às vezes se vê uma crítica a isso. Diz-se que isso aproxima a literatura da reportagem e torna as coisas muito efêmeras. Mas acontece que o momento exigia esta atitude. Tretiakóv – um escritor da década de 20 que foi fuzilado nos anos 30 – chegou a escrever que jornal é a epopéia de nosso tempo. Curiosamente, essa afirmação coincide com o poema Carta a Stalingrado, em que Drummond escreve que “A poesia fugiu dos livros, agora está nos jornais”. Mas o fato é que houve essa tendência na Rússia, quando surgiu, em fins da década de 20, o que foi chamado de litieratura facta, “literatura do fato real” – que era contra a ficção, contra o fantasiar, e que tinha um apego ao imediato, que procurava fixar o efêmero.

CULT Esta seria a grande literatura russa encoberta nas últimas décadas? B.S. A meu ver, esta “literatura do fato real” não se realizou exatamen-te naquela época. Um de seus pontos altos é sem dúvida a autobiografia do Maiakóvski, Eu mesmo, um grande livro em que o poeta se volta contra a ficção, contra o fantasiar, contra os romances etc. Mas esse tipo de literatura ligada à história imediata e ao fato, próxima ao jornalismo, só se realizou plenamente em época bem mais recente, em textos que estavam sendo escritos em pleno stalinismo, num período no qual não podiam ser publicados. Estes textos vieram à tona agora e formam em conjunto uma literatura muito forte, marcada justamente pelo acontecimento histórico.

CULT Como o leitor brasileiro – que está mais familiarizado com autores como Dostoiévski, Tolstói, Tchekhov ou Maiakóvski, e que vê a literatura do período soviético como um bloco marcado pelo dirigismo estatal – pode distinguir a “literatura do fato real” do realismo socialista?

B.S. Em primeiro lugar, é preciso observar que o mal do realismo socialista não era a literatura em si, mas o fato de ela ter sido a única permitida. Um escritor dessa tendência como Mikhail Chólokhov, por exemplo, é um romancista importante e, mesmo que houvesse liberdade de expressão, seus romances também seriam grandes em comparação com os outros que pudessem aparecer.

CULT Então o realismo socialista nada tinha a ver com a “literatura do fato real”?

B.S. Não. Muitos dos escritores da “literatura do fato real” foram perseguidos. O realismo socialista se caracterizava pela exaltação do sistema, e a “literatura do fato real” não visava a isso. Tanto que só veio a se realizar plenamente agora. Eles começaram a escrever quando se começava a apertar os parafusos, quando não havia liberdade de expressão. O real tinha que ser o real que o sistema queria.

CULT Como a descoberta dessas obras muda a tradição literária russa? Elas significam uma revisão do cânone literário russo?

B.S. Isso muda completamente a perspectiva. Antes se estudava a grande literatura russa do passado e grandes obras surgidas após a revolução – como se tivesse acontecido uma transformação radical. Agora, temos uma perspectiva bem diferente. Não temos mais uma verdade canônica do realismo socialista, que seria a única tendência desejável. Quando vemos que, na segunda metade da década de 20, era produzida na Rússia uma “literatura do absurdo” de alto nível, antes mesmo de Beckett e Ionesco, isso altera a perspectiva universal da literatura. Surgem escritores que eram totalmente desconhecidos do público – como por exemplo Daniil Kharms, um grande autor da literatura do absurdo que recentemente teve um conto

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C U L T 9

Guerra em surdina (ficção publicada em 1964), Brasiliense, 1995 (3ª edição) A poética de Maiakóvski através de sua prosa, Perspectiva, 1971

Projeções: Rússia/Brasil/Itália, Perspectiva, 1978 Dostoiévski prosa poesia, Perspectiva, 1982 Tolstói: antiarte e rebeldia, Brasiliense, 1983

Turbilhão e semente – Ensaios sobre Dostoiévski e Bakhtin, Livraria Duas Cidades, 1983 Dostoiévski: a ficção como pensamento (ensaio publicado na coletânea Artepensamento, org. de Adauto Novaes), Companhia das Letras, 1995

Os escombros e o mito – A cultura e o fim da União Soviética, Companhia das Letras, 1997 Além destas obras, traduziu do russo mais de 30 livros e organizou diversas coletâneas de escritores como Górki, Tchekov e Tolstói – entre as quais se destacam:

Poemas de Maiakóvski (de 1967), com Augusto e Haroldo de Campos. Perspectiva, 1994 (5ª edição)

Poesia russa moderna (de 1968), com Augusto e Haroldo de Campos. Brasiliense, 1991 (5ª edição)

Semiótica russa, organização, prefácio e algumas traduções. Perspectiva, 1979

Contos reunidos, de Rubem Fonseca, organização e prefácio. Companhia das Letras, 1995

Obras de Boris Schnaiderman

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publicado pela Revista USP (nº 10, 1991, Dossiê URSS-Glasnost/ Cultura). O que se conhecia até então de Daniil Kharms era a literatura infantil, que ele produzia para não morrer de fome.

CULT Então as obras recém-descobertas mostram que a verdadeira ruptura com o passado não estava no realismo socialista, como pregava a versão oficial, mas na literatura proibida?

B.S. No período stalinista, dizia-se que a literatura era completamente diferente do passado. Na verdade eram diferenças de conteúdo. Fazia-se questão de escrever à maneira do século XIX. Tanto que os melhores romances do realismo socialista eram continuações daquela época, eram escritos naquele espírito. Hoje nós sabemos que não há essa divisão entre forma e conteúdo, e percebe-se melhor como a literatura russa foi sendo criada. Na segunda metade da década de 20, surgiu em Leningrado todo um grupo de escritores e artistas que estavam avançados em relação à cultura da época – e não só em relação à cultura russa, mas também do mundo ocidental. O pintor Malévitch, por exemplo, estava ligado a esse grupo de vanguarda ao qual pertencia Daniil Kharms.

CULT É o caso também de Bulgakov, de quem surgiram recentemente obras que eram desconhecidas, como Os ovos fatais e Coração de cachorro? B.S. Eram obras que tinham sido publicadas em russo no ocidente, pois eram proibidas na Rússia. Eram livros que saíam clandestinamente. O mestre e Margarida saiu publicado na década de 60 na revista Nóvi Mir, mas com trechos cortados. A versão integral tinha saído no ocidente. As coisas passavam do ocidente para a Rússia e da Rússia para o ocidente. Eles fiscalizavam muito, mas a fiscalização era precária. Eu mesmo fui barrado várias vezes em minhas viagens. Desconfiavam que eu estivesse levando manuscritos para o ocidente.

CULT E confiscaram alguma coisa?

B.S. Sim. Eu estava levando cartas e eles disseram que não poderia. Afinal, ali havia correio...

CULT Essa fiscalização não parece atingir os críticos e teóricos russos, pois sempre tivemos contato com Propp, Bakhtin e com semioticistas como Lotman, Ivanov e Mieletínski.

B.S. O crítico Mikhail Bakhtin, por exemplo, só pôde publicar até 1929; depois, publicou com o nome de seu aluno Volochinov. Marxismo e filosofia da linguagem, assinado por Volochinov, é de autoria de Bakhtin (embora se saiba que Volochinov acrescentou alguma coisa...). Depois de 29, ele foi preso e só foi editado novamente na década de 60.

CULT Foi nessa época que apareceram os semioticistas russos? B.S. Sim, eles apareceram em fins da década de 50 e começo de 60. Mas estes semioticistas estavam em situação bastante estranha. O grupo ficou conhecido como Escola de Tártu e Moscou, porque se reunia na Universidade de Tártu, na Estônia, onde Lotman era professor de literatura russa e promo-via seminários de verão com participação de estudiosos moscovitas. Daí surgiram trabalhos notáveis, mas com tiragem muito limitada. Eu tenho o primeiro livro que eles publicaram, Lições de poética estrutural, de Lotman. O trabalho foi publicado no ocidente e teve repercussão formidável no meio universitário, mas na Rússia só existiu uma edição de 500 exemplares. As outras publicações de Tártu também tiveram tiragens muito limitadas. CULT Então não existia proibição formal, como no caso da literatura, mas as obras eram circunscritas a um universo próprio.

B.S. Sim, e eram muito atacadas pela imprensa oficial. Os livros não circulavam, as pessoas liam a crítica e não tinham acesso às obras por causa da tiragem limitada. Por isso, circularam muito as cópias datilografadas – e eram datilografadas uma a uma, pois os aparelhos de xerox e os mimeógrafos eram muito controlados.

CULT Sua família deixou a URSS por razões políticas, para fugir a este tipo de controle?

B.S. Não, nós saímos legalmente, o que era uma exceção na época, pois a maioria migrou na clandestinidade. Houve um curto período, um pouco

Referências

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