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N-SB * Oceano Pacífico, 13 de março de Silvio Sguizzardi

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Academic year: 2021

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110313-N-SB672-164*

Oceano Pacífico, 13 de março de 2011.

Silvio Sguizzardi

Figura 1

Uma casa japonesa é avistada à deriva. Navios e aeronaves do grupo de salvamento do porta-aviões Ronald Reagan estão à busca de sobreviventes nas águas costeiras próximas a Sendai, no Japão. Fotografia tirada pelo especialista em comunicação de 3a classe da marinha norte-americana Dylan McCord.

Quem nunca esteve no meio de um desastre natural de proporções bíblicas, apenas pode imaginar a sensação de impotência de um homem diante das ondas devastadoras de um tsunami, o medo de ser arrastado pela lama que desce a encosta do morro ou a tristeza de se ver séculos de história destruídos por uma enchente.

A fotografia que escolhemos para identificar o 3º Simpósio de Arquitetura e Urbanismo do Centro Universitário Senac representa esta impotência, este medo e esta tristeza. Ela representa a batalha perdida entre o indivíduo e a imensidão do mar aberto. Olhamos para a foto na esperança de que esta casa esteja desocupada, que seus habitantes tenham conseguido escapar.

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Por outro lado, a foto nos faz ver que há esperança de sobrevivência mesmo quando tudo está desmoronando. O fato de a casa vagar inteira, ou quase inteira, pelo oceano Pacífico nos dá esperança de que nem tudo foi devastado e que a escapatória desta tragédia poderia sim, de certa forma estar ligada à arquitetura.

O que fez daquela casa um objeto especial? Porque ela se manteve inteira durante o desastre? O uso de materiais de qualidade superior? Será que esta casa foi projetada com mais precisão e capricho que as demais? Não podemos precisar o que a diferencia das inúmeras construções que foram destruídas em Sendai, mas podemos especular sobre a realidade em torno desta imagem.

Figura 2

A possibilidade de sobrevivência de uma simples construção de madeira remete a uma série de eventos um tanto surreais e fictícios. Ao analisarmos a situação, podemos dizer que esta casa adquiriu novo significado ao sair à deriva. Sua relação com o mar faz emergir uma nova condição de sua existência que nos remete ao Teatro del Mondo, de Aldo Rossi. O teatro, que foi projetado como uma construção simbólica, resgatava valores tradicionais da arquitetura ao mesmo tempo em que gerava situações inesperadas. Ele era parte de um evento público concebido para ocorrer durante a Bienal de Arquitetura em

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Veneza, em 1979; uma obra temporária, cujo significado se alterava constantemente de acordo com sua ocupação. Fosse como um teatro ou como um ponto de observação, sua presença causava estranhamento, pois suas formas eram familiares ao observador, em uma situação inusitada.

A casa de Sendai, assim como o teatro, se encontra despida de seu significado tradicional. A função de lar exercida por ela durantes anos é subvertida. Porém, sua forma tipológica ainda nos remete a um ideia familiar de abrigo e proteção. Esta situação adversa e inesperada faz com que a casa seja entendida como uma cápsula de sobrevivência, cuja forma traria conforto aos ocupantes. Uma forma que escapa do arquétipo da casa tradicional, mas que leva consigo valores tradicionais.

Figura 3

Como uma cápsula futurista sobrevivente ao impacto da tragédia, construida à forma e semelhança daquilo que a sociedade imagina como a mais indefesa das casas, esconde-se uma estrutura autônoma de sobrevivência. Projetada para resistir aos impactos dos ventos e das águas, esta estrutura pode ser vista como uma chance de salvação, um bote salva-vidas para áreas de risco. Dotada de equipamentos de segurança, provisões e sistemas de localização, a casa protegeria seus ocupantes até o resgate.

Ao longo do século XX, vemos a ideia de cápsulas de sobrevivência, surgir com freqüência, desde os abrigos antibombas das famílias norte-americanas da década de 1950, dos módulos habitacionais da arquitetura metabolista e das propostas radicais de Buckminster Fuller e do grupo Archigram.

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Figura 4

Em 1965, o Archigram, grupo inglês liderado pelo arquiteto Peter Cook, defendia a ideia de que a casa deveria ser algo móvel. Ela poderia ser levada de uma cidade para outra e, então, plugada a uma infraestrutura existente, uma versão futurista de antigas comunidades nômades. Podemos afirmar que eles já planejavam as cidades que poderiam servir de base para as cápsulas de sobrevivência, uma base para se conectar a casa de Sendai. As unidades desenhadas por eles, como o Living-pod ou o Cushicle, poderiam ser adaptadas para resistir a um desastre ambiental. As unidades pertenceriam a um sistema capaz de se reorganizar, conectado ao DART (Deep-ocean Assessment and Reporting of

Tsunamis), que analisa as ondas por meio de boias medidoras e encaminha as informações

via satélite para os centros de alerta de tsunamis. Em cidades conectadas, as casas estariam prontas para enfrentar as situações de emergência, e a da foto poderia facilmente ser reinserida à infraestrutura local quando resgatada.

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Será que um dia olharemos a casa de Sendai com menos espanto e mais esperança? Será que uma cidade poderia ser realmente composta de partes móveis que manteriam as pessoas protegidas? Algo como a casa de Dorothy de “O Mágico de Oz” que foi levada por um furacão até seu destino na estrada de tijolos dourados?

Como arquitetos, não conseguimos prever algo desta magnitude. Não sabemos nem quando e nem onde as tragédias irão acontecer. Porém, podemos sonhar, imaginar e projetar um futuro mais seguro, planejando a ocupação de áreas de risco de maneira a minimizar seu impacto sobre as cidades.

Figura 6

*110313-N-SB672-164 é o número de identificação da fotografia do poster do simpósio.

Referências

Figura 1 - www.navy.mil/view_photos_top.asp Figura 2 - www.atelierjournal.com

Figura 3 – imagem do autor

Figura 4 - atomic-annhilation.blogspot.com Figura 5 - www.archigram.net

Figura 6 - files.myopera.com

Silvio Sguizzardi. Arquiteto e Urbanista formado pela Universidade Presbiteriana Mackenzie em 2000, mestre pela

FAU/USP em 2011. É professor universitário desde 2001 e, desde formado, mantém escritório próprio de arquitetura (Nave Arquitetos Associados, 2000-2004 / Sguizzardi.Coelho Arquitetura, desde 2009), tendo concomitantemente trabalhado no Escritório Tero Engenharia e Design de 2003 a 2005.

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