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O trabalho docente com.par.t(r)ilhado : focalizando a parceria

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Academic year: 2021

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MARISSOL PREZOTTO

O TRABALHO DOCENTE COM.PAR.T(R)ILHADO:

FOCALIZANDO A PARCERIA

CAMPINAS

2015

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Resumo

No trilhar do caminho percorrido, a professora-pesquisadora vai se constituindo e reafirmando que a escola é reconhecida como lugar de formação profissional quando assume o pressuposto do trabalho com.par.t(r)ilhado. Esta pesquisa constitui-se da narrativa tecida a partir de vivências específicas da professora-pesquisadora e de um grupo de professores em diferentes espaços de conversa e de parceria (formais ou não) que foram possibilitando a reflexão, o diálogo e a construção de conhecimento sobre o trabalho com.par.t(r)ilhado evidenciando alguns princípios que o permeiam: confiança, diálogo, negociação, afetividade e escuta sensível. Com o olhar atento e ancorado na Teoria Histórico-Cultural, no Cotidiano e na Reflexividade, a professora-pesquisadora foi buscando compreender o que é parceria e, neste percurso, vivenciou outras parcerias que extrapolaram as consideradas ‘normais’, com os professores, para ampliá-las chamando os alunos e suas famílias para mostrar que outros olhares, registros e linguagens despertam a reflexão e a busca de um trabalho efetivo de colaboração. As principais contribuições trazidas pela pesquisa dizem respeito às possibilidades de trabalho com.par.t(r)ilhado que potencializam o desenvolvimento pessoal-profissional dos sujeitos e favorecem a transformação pelo ensino e pela aprendizagem de todos os envolvidos.

Palavras-chave: Formação docente, trabalho colaborativo, cotidiano, narrativa,

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Abstract

In the tread of the path, the teacher-researcher will constitute and reaffirming that the school is recognized as a place of training when it assumes the assumption of shared work. This research constitutes the narrative woven from specific experiences of teacher-researcher and a group of teachers in different spaces of conversation and partnership (formal or otherwise) that were enabling reflection, dialogue and the construction of knowledge shared work showing some principles that permeate: trust, dialogue, negotiation, affection and sensitive listening. With watchful eye and anchored in the Historic-Cultural Theory in Everyday Life and Reflexivity, the teacher-researcher was trying to understand what partnership and in this way, experienced other partnerships that went beyond those considered 'normal', with teachers, to enlarge them calling students and their families to show that other looks, records and languages evoke reflection and the search for an effective collaborative work. The main contributions of the research concern shared work opportunities that enhance personal and professional development of individuals and promote the transformation in teaching and learning for all involved.

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Sumário

1. Orientações para sentir e percorrer a trilha... 01

2. Memórias e caminhos.. 11

2.1 .Origens...trajetos...caminhos percorridos 16

2.2. Uma pausa no caminho...reencontrando o percurso 34

3. A constituição da professora-pesquisadora 41

4. O caminho trilhado: o cotidiano da escola 53

5. Caminho percorrido...a escola e seu contexto 67

6. O encontro do caminho da reflexividade 87

7. Nos caminhos possíveis...em busca do trabalho com.par.t(r)ilhado 101

7.1. O início da busca 105

8. Por qual caminho vou? 121

8.1. Compreendendo as paradas com.par.t(r)ilhadas:

focalizando a parceria 127

8.1.1. A parceria como caminho 129

8.1.2. A parceria como janela 134

8.1.3. A parceria como espaço diverso 137

8.1.4. A parceria como charneira 142

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8.2. 1ª parada com.par.t(r)ilhada:

O registro e a importância do Outro no olhar 151

8.2.1. Episódio: No meio do caminho teve o seu olhar

que melhorou o meu.. 152

8.3. 2ª parada com.par.t(r)ilhada:

Assembleia Docente e a importância do Outro

no diálogo e nas reflexões 165

8.4. 3ª parada com.par.t(r)ilhada:

A importância do Outro para a partilha 183

8.4.1. O que vejo? O que penso e o que sinto?

O que faço com tudo isso? 190

9. Não era pau. Não era pedra. E não era o fim do caminho –

Lições apre(e)ndidas no caminhar 195

Referências 207

Anexos 227

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Dedico a todos que, assim como eu, acreditam na

formação docente no cotidiano da escola.

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Agradecimentos

Iniciar um agradecimento não é fácil, mas tentarei fazê-lo da melhor forma possível. Digo que não tem em primeiro, segundo lugar, pois todos, cada um a seu modo, tem seu lugar especial em minha vida.

Agradeço aos meus pais por me ensinarem desde pequena que a educação é trans.formadora. Que é nela, por ela que nos formamos e nos tornamos pessoas conscientes do nosso papel na família e na sociedade. Por isso, cheguei aonde cheguei, constantemente me formando na e pela escola pública que me mostrou desde sempre o que é ser professora.

À minha irmã Marilu que esteve presente em todos os dias da minha vida. Presencialmente ou, por telefone, me acolheu nos momentos de alegria e de desespero e, com suas palavras de admiração me fez persistir no caminhar da vida e da profissão.

Minha eterna gratidão ao Alexandre, meu companheiro de tanto tempo que

incessantemente me incentivou a desvendar novos caminhos e a conquistar novos espaços de trabalho. Compreendeu minhas ausências e sempre me lembrou da capacidade que tenho quando, às vezes, duvidava de mim mesma.

Ao João Pedro, meu filho, que mesmo não compreendendo muito o início desse processo, mostrou-se amoroso nos momentos solitários de escrita quando adentrava o escritório e dizia que me amava. No seu olhar e nas suas inquietações, buscava compreender a importância do trabalho vivido na escola e fora dela. Mamãe ama você!

À minha irmã café que comigo partilhou a educação de João Pedro nos momentos em que precisei para trabalhar, para escrever ....e sempre com uma palavra amiga, me encorajava e me mandava seguir em frente. Pois é! Cá estou Luciana!

Aos meus sogros França e Maria Inês e aos meus tios Jonas e Zuleica que me incentivaram a ir atrás dos meus sonhos e do que acredito. Cada um a sua maneira estendeu as mãos nos mais diferentes momentos, seja com a bolsa do

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cursinho, com o carro emprestado, com as palavras incentivadoras... Meu muito obrigada.

À Maria Amália e Gabriela que se dispuseram a ficar com João Pedro em momentos diferentes da vida, mas que possibilitaram minha ausência para dar conta do que era proposto.

À Érica, minha querida prima, que me instigou e me deu forças para continuar quando as forças pareciam estar sumindo.

À Mila que junto com sua família tomou conta de João Pedro nos últimos momentos de imersão da escrita, não há como agradecer, a não ser expressando meu respeito e afeto.

À Nana Haddad, minha eterna parceira de longa caminhada. Não há palavras para descrever o que sinto. Posso dizer que desde 2004 muitas coisas bonitas não podem ser vistas ou tocadas, mas que são sentidas dentro do coração. O que você fez por mim, é uma delas. Estendeu as mãos e juntas nos aventuramos no processo seletivo, nas idas a São Paulo, nas aulas, nas angústias e belezuras da pesquisa e, principalmente, na ousadia de deixarmos a família e irmos nos aventurar em terras portuguesas. Eu agradeço do fundo do coração. Obrigada amore! Que possamos viver muito mais!

À Escola em que atuo, em especial à Coordenação e à Direção, que permitiram a produção de dados e a partilha de minhas inquietações e apreensões que foram amadurecendo e vivenciando que é possível realizar um trabalho coletivo e partilhado.

À Suzi que acreditou em meus desassossegos e juntas fomos experienciando e questionando o trabalho com.par.t(r)ilhado no cotidiano da escola. Com você aprendi, de fato, o que é ter uma parceira que respeita, que questiona independente da situação vivida, sempre com o olhar atento para o trabalho realizado da melhor forma possível. Seremos parceiras para sempre não importa onde cada uma estiver. A parceria transversal sempre acontecerá.

Às demais parceiras de série e de segmento que se dispuseram a escrever quando solicitadas, a refletir conjuntamente nos mais variados espaços de conversa (oficiais ou não) e a desvendar comigo o caminho desta pesquisa. Minha eterna

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gratidão pela parceria, pelo diálogo e pela confiança estabelecida. Esse trabalho é nosso!

Meu agradecimento especial aos meus alunos e suas famílias que extrapolaram a relação professora-família. Tornaram-se amigos e parceiros desta pesquisa com as reuniões que fazíamos, com os desabafos feitos em encontros rápidos ou bilhetes enviados. Obrigada pela possibilidade da parceria que me fez outra professora.

Às outras parcerias constituídas no decorrer deste caminhar, aos tutores os quais coordeno; as formadoras, supervisoras e coordenadores do Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (Pacto-Pnaic); ao Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Continuada (GEPEC) que acreditaram em meu projeto de pesquisa desde o início; às Seletas que atentamente ouviram e partilharam momentos de estudo, de alegria, de sofrimento... À Marciene Reis que leu atentamente a escrita desde a qualificação e que hoje vive o trabalho com.par.t(r)ilhando comigo no chão da escola se encantando e me questionando constantemente! À Adriana Pierini que me acolheu nas manhãs com café online escutando sensivelmente minhas inquietudes e encantamentos.

Ao Guilherme, à Renata e à Nana Haddad que, com olhar atento, contribuíram imensamente para a finalização desse trabalho no momento da qualificação da tese. Acreditaram nas minhas escolhas e se colocaram a pensar juntos o caminho possível de trabalho com.par.t(r)ilhado. Espero que possamos viver outras parcerias de trabalho.

À Silvia Rocha, à Ana Guedes, à Jussara Tortella, à Nana Ayoub e à Adriana Koyama que aceitaram o convite para dialogar, abrir e trilhar caminhos. Que daqui possamos continuar a percorrer os possíveis percursos que estão por vir.

Enfim, a você, Ana Aragão que confiou em mim desde o início sem me conhecer e sem saber o que estava vendo de fato. Caminhou com firmeza na escuridão e na certeza de que estava guiando os passos, ora meus, ora seus, ora nossos. Acreditou no que propunha, foi a força que me impulsionou quando precisei e me acolheu sempre. Com você re.aprendi que é preciso ter fruição pessoal para se ter um bom desempenho profissional. Minha gratidão. Simples assim. Sabe por que? Porque uma orientanda sua até pode cair, mas cair em pé, não é mesmo?

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Terminar. Difícil né? Mas é preciso... Agradeço a todos que por mim passaram, desde o início da minha docência em terras piracicabanas e campineiras. Saibam que cada um deixou impresso, em mim, algo que compõe o meu jeito de viver e de trabalhar com.par.t(r)ilhado, pois sou assim e não sei viver eou trabalhar de outro jeito.

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Lista de ilustrações

1. Imagem da janela do Mosteiro de Santa Maria da Vitória capturada por mim em Batalha, Portugal 03 2. Imagem composta por capas de livros literários. Produção digital de própria autoria 20

3. Imagem composta por capas de livros literários. Produção digital de própria autoria 25

4. Imagem captura por mim do bloco de notas do tablet que uso para anotações 74

5. Imagem capturada por mim do Cronograma de janeiro e fevereiro do Colegiado de Professores disponibilizado pela Coordenação de Curso 75

6. Imagem capturada do registro feito por mim de um encontro de CP Coletivo 77 7. Imagem composta pela imagem publicada na página Eu me chamo Antonio, no dia 07 de setembro de 2014 com a imagem produzida pela aluna Giovanna a partir da leitura da mesma. Produção digital de própria autoria 83

8. Imagem composta pelas duas últimas imagens para apresentar os dados. Produção de própria autoria 84

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9. Composição de imagens, capturadas por mim e meus alunos, em 2012, que retratam um pouco do trabalho realizado na minha sala de aula 157

10. Imagem do Diário de Bordo produzido pelos alunos de 2012 158159

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xxi

O que vale na vida

não é o ponto de partida

e sim a caminhada.

Caminhando e semeando,

no fim terás o que colher.

Cora Coralina

1

1 http://www.mensagenscomamor.com/poemas_e_poesias_de_cora_coralina.htm . Acesso em: 08 maio 2014.

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Capítulo 1:

Orientações para sentir e

percorrer a trilha...

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Janela do Mosteiro de Santa Maria da Vitória

A imagem que fotografei em janeiro de 2012, em Batalha, Portugal, no Mosteiro de Santa Maria da Vitória, mais conhecido como Mosteiro da Batalha, revela como sou. Uma pessoa constituída de tantas outras.

É dessa professora-pesquisadora que está na escola básica que investiga a própria prática para compreender a formação de professores desde a época de graduação que falo nesse texto.

Falarei do que anda me inquietando nos últimos tempos: Como se dá o processo de construção da parceria no cotidiano do trabalho docente? Quais são os elementos constitutivos e quais as implicações educacionais desse processo?

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É importante que você, leitor, saiba que o caminho foi e está sendo longo no Memorial de formação apresentado no Mestrado fui percebendo que a parceria já era um tema presente em minhas inquietações desde muito tempo.

Nele, fui vendo as marcas impressas em mim e por mim nos lugares e nas pessoas com as quais convivi/convivo.

E o que fazer diante de tudo isso?

Em um processo de compreensão e reflexão do meu próprio percurso profissional e pessoal, resolvi reimprimir novas marcas ao lado do que já tinha produzido já que, desde 1988, quando iniciei minha docência em um Centro de Convivência Infantil em Piracicaba, como auxiliar de classe, o registro e o trabalho coletivo foram se tornando elementos constituintes do meu jeito de trabalhar.

O registro por uma exigência do local onde o caderno era o começo e o fim do trabalho. O começo pelo planejamento, o fim... Fim, não: meio... pela reflexão diária que ali acontecia...desde uma simples descrição, bem como os encaminhamentos dados de acordo com a situação. Ali também havia a leitura e bilhetes da coordenadora que semanalmente, lia o caderno e fazia intervenções e apontamentos no cotidiano ali tratado.

Reuniões de equipe eram constantes e como eu adorava ouvir e ler o que as pessoas mais experientes do que eu traziam, tinha sede de aprender, de trocar, de realizar um bom trabalho pedagógico.

O tempo passou e a busca pela graduação em Pedagogia se instaurou. Saída de emprego, cursinho no período noturno e Magistério pela manhã... Estudo em grupo para vencer a etapa. Malas prontas, novos ares chegaram... Cá estava em Campinas, na UNICAMP.

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Cheguei e encontrei pessoas que me mostraram a importância do Outro2 no trabalho e isso foi sendo vivenciado intensamente por mim. Na sala de aula, na pesquisa cientifica, nos estágios, no Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), na Dissertação de Mestrado e no mercado de trabalho.

Trabalhar com/no/junto ao Outro foi o eixo principal da minha vivência como professora em terras campineiras. Estar em uma escola onde teria que alfabetizar de maneira diferente da qual fui alfabetizada só poderia dar certo porque o Outro - da academia, da escola, da vida - foi me ajudando a olhar para o que ocorria dentro e fora da sala de aula com lentes teóricas que provocavam uma interlocução constante para entender as minúcias, o que não estava dito, a busca pelo Outro e pelo trabalho significativo...

Registrar constantemente! Com fotos, com poesias, com trabalhos coletivos com as crianças, com as professoras da mesma série, com professoras das outras séries...

Dialogar em intervalo, em e-mails, em projetos escritos para realizar com as crianças, em encontros com a Coordenação, nas reuniões mensais. Aos poucos fui estabelecendo parcerias que consolidavam o trabalho realizado na escola. Na escola, porque não posso dizer que só acontecia na sala de aula, já que acredito que o trabalho ultrapassa as paredes de onde estamos inseridos.

Tempo passa... Passa tempo e vivencio novos desafios: outra escola, outras pessoas, outra maneira de organizar o trabalho pedagógico...

Reuniões semanais com a Coordenação, com as outras professoras da série, com as outras professoras da escola.... De imediato, um susto. Susto porque o que era dito que era compartilhado não era tão compartilhado assim... Mas isso é outra parte da historia, não é mesmo?

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A palavra Outro está com letra maiúscula porque assumo que o Outro me constitui e me transforma uma vez que é improvável dizer algo sem me referir ao Outro. Nessa relação dialógica e valorativa com o Outro construo minha identidade, consciência, opinião e visões de mundo.

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Desse jeito mesmo, diferente de olhar e de experienciar, fui me apropriando do que a escola propunha como trabalhar com o meu jeito de compartilhar com os meus pares – alunos, professores, famílias...

Olhando por esse prisma, fui percebendo as marcas do trabalho com.par.t(r)ilhado3 que foi se constituindo, consolidando e inquietando maneiras de ver o que estava posto, o que estava dito e, olhar para o que estava velado nas entrelinhas e compreender o porquê e, principalmente, olhar para as possibilidades do que estava/está por vir e com quem realmente se estabelece a parceria mais profícua. Nessa intensidade vivida dentro da escola e fora dela, procurei me inspirar e dialogar com o livro Abrindo Caminho, de Ana Maria Machado, que despertou em mim uma sensação de incompletude, de caminhos diferentes que bifurcam, mostrando que nem sempre os nossos caminhos são fáceis de trilhar, mas isso não é motivo para desistir. Afinal, grandes são aqueles que não desanimaram diante de uma “pedra no meio do caminho” e abrem um túnel.

Na busca por compreender melhor o que se vive na escola como professora-pesquisadora, tenho buscado perceber como se dá o processo de construção da parceria no cotidiano do trabalho docente e quais são os seus elementos constitutivos e quais as implicações educacionais deste processo.

Caro leitor, para ajudá-lo neste percurso, traçarei algumas orientações para que você possa escolher qual caminho trilhará.

Em Memórias e caminhos: iniciando o percurso, trago meu memorial de formação desde o início da minha escolarização na escola pública, nos anos 1980 passando pelas minhas primeiras experiências docentes e os diferentes

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Brinco com a palavra: com.partilhar ou ainda com.par.t(r)ilhar que pareceu ser um jogo interessante que talvez consiga deslocar o olhar para as variáveis da formação docente, o que mostra outras possibilidades de interpretação daquilo que parecia ser uma constante, como o trabalho cotidiano. O com.partilhar me remete ao estar junto na partilha e o com.par.t(r)ilhar faz com possa estar com o outro na caminhada que se estabelece ao longo do caminho percorrido ou até mesmo o isolamento que vivemos quando estamos realizando o trabalho docente.

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lugares pelos quais imprimiram suas marcas em mim e reafirmaram minhas escolhas profissionais.

Em A constituição da professora-pesquisadora, retomo e esclareço os caminhos e escolhas teórico-metodológicas que fiz. Rockwell & Ezpeleta, Cortesão, Stenhouse, Elliott, Carr, Kemmis, Fiorentini, Souza Jr & Melo contribuíram muito com o jeito de olhar, perceber e sentir a pesquisa e a maneira como esta foi interferindo e contribuindo na minha formação como professora-pesquisadora.

Em O caminho trilhado: o cotidiano da escola busco nas palavras de Esteban, Ferraço, Certeau, compreender e refletir sobre a escolha de falar da formação do professor que acontece no chão da escola, no cotidiano. É pela narrativa apresentada que procuro dar sentido à experiência vivida, mostrando como o professor-pesquisador vai se constituindo nas minúcias do trabalho desenvolvido na escola.

Em Caminho percorrido...a escola e seu contexto apresento a escola em que estou inserida como professora-pesquisadora e como os momentos de encontro dos professores são organizados. Atenta à importância da produção de dados, os inventario para dar a dimensão do trabalho realizado

Em O encontro do caminho da reflexividade, há o entrelaçamento de teoria e da prática na experiência singular de cada sujeito. Neste sentido, nenhuma experiência significativa acontece sem a reflexão. Dialogar com Alarcão, Aragão e Schön, me ajudou a compreender como se dá a reflexão e a constituição do professor reflexivo.

Nos caminhos possíveis... em busca do trabalho com.par.t(r)ilhado, faço uma imersão teórica para compreender as diferentes nomeações para o trabalho docente coletivo e como o professor se organiza diante de tantas solicitações. Aponto ideias iniciais de alguns princípios que facilitam a concretização de uma parceria de trabalho docente na escola

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Em Por qual caminho vou? indico qual caminho escolho percorrer. Apresento cinco narrativas produzidas pelas professoras com as quais trabalho para mostrar como estou compreendendo o que é parceria. Compõe este momento três paradas com.par.t(r)ilhadas que procuro evidenciar as implicações da parceria na minha formação como professora ampliando o diálogo com que está sendo dito e o que reverbera em mim.

Você também verá que, no decorrer do caminho, trago em alguns momentos, o recurso da caixa de texto para explicitar uma ideia ou esclarecer um conceito que está sublinhado na página.

Enfim, este foi o meu jeito de delinear o caminho, mas nada impossibilita que você o percorra de outra forma perante novas orientações que possa dar ou descobrir.

Com o intuito de provocar as possibilidades de caminhos, convido-o a ler o poema de Fernando Pessoa.

QUALQUER CAMINHO LEVA A TODA PARTE

Fernando Pessoa (2007) Qualquer caminho leva a toda parte.

Qualquer ponto é o centro do infinito. E por isso, qualquer que seja a arte De ir ou ficar, do nosso corpo ou ‘spr’rito, Tudo é ‘stático e morto. Só a ilusão Tem passado e futuro, e nela erramos. Não há ‘strada senão na sensação É só através de nós que caminhamos. Tenhamos p’ra nós mesmos a verdade De aceitar a ilusão como real

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9 E, eternos viajantes, sem ideal Salvo nunca parar, dentro de nós, Consigamos a viagem sempre nada Outros eternamente, e sempre sós; Nossa própria viagem é viajante e ‘strada. Que importa que a verdade da nossa alma Seja ainda mentira, e nada seja

A sensação, e essa certeza calma De nada haver, em nós ou fora, seja Seja inutilmente a nossa consciência? Faça-se a absurda viagem sem razão, Porque a única verdade é a consciência E a consciência é ainda uma ilusão. E se há nisto um segredo e uma verdade Os deuses ou destinos que a demonstrem Do outro lado da realidade,

Ou nunca a mostrem, se nada há que mostrem O caminho é de âmbito maior

Que a aparência visível do que está fora, Excede de todos nós o exterior

Não pára como as cousas, nem tem hora. Ciência? Consciência? Pó que a ‘strada deixa E é a própria ‘strada, sem ‘strada ser.

É absurda a oração, é absurda a queixa. Resignar(- se) é tão falso como ter. Coexistir? Com quem, se estamos sós? Quem sabe? Sabe o que é ou quem são? Quantos cabemos dentro de nós? Ir é ser. Não parar é ter razão.

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Capítulo 2:

Memórias e caminhos:

iniciando o percurso

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No meio do caminho de Dante tinha uma selva escura.

No meio do caminho de Carlos tinha uma pedra.

No meio do caminho de Tom tinha um rio.

Era pau.

Era pedra.

Era o fim do caminho?

Cada um no seu canto

com o seu canto

nos chamou.

E nenhum de nós,

nunca mais, ficou sozinho.

No meio do caminho de Dante teve uma estrada.

No meio do caminho de Carlos teve um túnel.

No meio do caminho de Tom teve uma ponte.

No meio do caminho de Cris tinha um oceano.

No meio do caminho de Marco tinha um inimigo e deserto.

E tinha muita lonjura pelo caminho de Alberto.

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A maior riqueza do homem é a sua incompletude. Nesse ponto sou abastado. Palavras que me aceitam como sou - eu não aceito.

Não aguento ser apenas um sujeito que abre portas, que puxa válvulas, que olha o relógio, que compra pão às 6 horas da tarde, que vai lá fora, que aponta lápis, que vê a uva etc. etc.

Perdoai Mas eu preciso ser Outros. Eu penso renovar o homem usando borboletas.

Manoel de Barros

Como falar de mim sem retomar minhas experiências pessoais e profissionais ao longo do percurso que venho trilhando como mulher e professora?

Impossível não recuperar em minha memória momentos marcantes que foram compondo a pessoa que sou/estou: professora-pesquisadora. Para mim, há um enfoque emotivo-volitivo, como nos coloca Bakthin (2000), cheio de emoções e identificações quer permitem uma volta a mim mesma, recuperando o lugar de onde narrei para iniciar um acabamento do meu próprio eu.

Mas como fazer este percurso sem esquecer-se do que já foi escrito no Mestrado? Reescrevo, retomo, anuncio momentos.... dúvidas que sempre estiveram presentes até que lembrei-me das palavras de João Wanderlei Geraldi no Exame de Qualificação do Doutorado de Claudia Roberta Ferreira, na Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), quando a questionou: “Cadê a Claudia do Mestrado? Ela tem que estar aqui presente no texto do Doutorado!”4

.

4

FERREIRA, Cláudia Roberta. "Labirinto de perguntas: reflexões sobre a formação de professores na e a partir da escola". 2013. 274f. Tese (Doutorado em Educação) - Faculdade de Educação da UNICAMP. Universidade Estadual de Campinas, São Paulo.

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Tomada pelas palavras de Geraldi, resgatei o memorial de formação apresentado na minha Dissertação de Mestrado5, mas, que neste momento, houve a necessidade de pequenas adaptações ao final do texto. É importante dizer que ao reler, percebi marcas de parcerias estabelecidas por mim e, senti a necessidade de inserir algumas imagens e complementar com algumas informações ou aspectos com a caixa de texto ao lado para que, assim, evidenciasse as reflexões suscitadas no instante da leitura que possibilitou uma ampliação dos meus horizontes de referência brindando com outras formas de afabilidade nem sempre percebidas ou sentidas nopelo percurso que fui trilhando ao longo da minha vida pessoal e profissional.

Então, vamos lá!

2.1. Origens...Trajetos...Caminhos percorridos

A experiência é uma lanterna dependurada nas costas

que apenas ilumina o caminho já percorrido.

Confúcio6

Iniciei minha escolarização na escola pública quando o Brasil estava vivenciando o fim da ditadura militar, no início dos anos 1980. A escola pública foi minha única opção – desde a 1a série, em 1980, até o ensino superior, no fim da década de 1990.

Recordo-me da dificuldade de minha família em obter uma vaga em uma escola perto de minha casa e também da própria estrutura da escola, que

5 PREZOTTO, Marissol. A professora e os usos de si: entre o trabalho prescrito e o trabalho real na sala de aula. 2003. 121f. Dissertação (Mestrado em Formação de Professores) – Faculdade de Educação, UNICAMP, Campinas.

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funcionava em uma sala improvisada no Centro Comunitário do bairro, em um contêiner anexo.

Junto com a alfabetização que estava se consolidando através das diferentes experiências vividas por mim - escola, catecismo, clubinho (espaço de leitura e recreação), brincadeiras com meus amigos e primos, os programas de televisão que despertavam a imaginação (como o “Sítio do Pica-Pau Amarelo”) - tive meus primeiros ensaios como professora. Brincar de ensinar e de ser professora era uma rotina no meu cotidiano. O quadro negro e o giz já eram recursos utilizados por mim, quando dava aulas para outras crianças e para minhas bonecas.

Como todas as pessoas que passam pela escola, seja ela pública ou privada, tive professores mais compromissados que outros com a educação. Lembro-me de que alguns simplesmente transmitiam conteúdos (Dona Sônia e Dona Lina) – estavam ali para repassar informações - e outros (Leonete, Lúcia, Dona Nair) que, de uma maneira ou de outra, construíam coletivamente conhecimento em suas aulas, junto aos alunos.

Nesse período, a literatura já fazia parte da minha vida através dos livros. As leituras aconteciam muito ligadas ao contexto escolar. Relacionavam-se às atividades desenvolvidas em sala de aula, orientadas pelas professoras.

Literatura vista como gênero literário conforme BAKHTIN (2000, p. 279) define: “Qualquer enunciado considerado isoladamente é, claro, individual, mas cada esfera de utilização da língua elabora seus tipos relativamente estáveis de enunciados, sendo isso que denominamos gêneros de discurso”. Este estudo vai referir-se diversas vezes à literatura infantil, mas não tem como objetivo entrar no campo da teoria literária. Apenas tomo a literatura para destacar a prática pedagógica.

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Ao terminar o Ensino Fundamental I7 e ao me mudar de escola, iniciei outro percurso como leitora, que até hoje marca minha atuação em sala de aula.

Durante o Ensino Fundamental II8 tive uma professora de Português (a mais temida do colégio – D. Conceição) que exigia seminários de livros de literatura. Nesses seminários, trabalhava a língua portuguesa, a literatura e explorava os gêneros discursivos. A leitura obrigatória dos livros exigidos por D. Conceição fez com que eu descobrisse a biblioteca da escola, que passou a ganhar um papel importante em minha vida. As obras consideradas clássicas para a escola e os livros “contemporâneos” (Coleção Vaga-Lume, Para Gostar de Ler e outras), lidos por prazer, foram se fundindo e, com o passar do tempo, a leitura era pura fruição.

No curso de Magistério, deparei-me com uma diversidade de práticas pedagógicas entre os professores. Havia aqueles que não se desgrudavam de seus cadernos amarelados pelo tempo, provavelmente velhos de tanto manuseio para olhar os “pontos” para as aulas, e outros que mostravam que a leitura era instrumento de formação (dos professores e dos alunos). Através da professora de Literatura Infantil, que fazia um curso de especialização em uma universidade, fui tomando conhecimento das produções teóricas sobre Educação que se destacavam naquela época.

7

Refiro-me as séries iniciais do Ensino Fundamental. 8

Refiro-me as séries finais do Ensino Fundamental II.

A leitura fruição está relacionada ao deleite e à experiência estética da palavra proporcionando ao leitor um aspecto formativo evidenciando a emoção, o sentimento, o desenvolvimento pessoal e profissional, o autoconhecimento e, assim, ter o desvelamento do mundo com novas possibilidades de caminhos a serem percorridos.

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Por meio das falas dos professores em sala de aula ou das conversas nos corredores da escola, das reflexões que faziam e compartilhavam conosco, das leituras e cursos que realizavam fora do ambiente escolar, fui percebendo que o comprometimento político-pedagógico com a Educação ultrapassava o ambiente escolar. Mostravam-se inquietos com a profissão, com as políticas educacionais, com as novas diretrizes vindas de cada governo, com a política salarial.

Buscar auxílio no sindicato, reivindicar melhores condições de trabalho, ter acesso à formação continuada, utilizar os recursos disponíveis da melhor forma possível eram (e ainda são) alguns dos aspectos impressos por eles em mim.

Durante o curso de Magistério (1988 – 1991), trabalhei em um Centro de Convivência em Piracicaba. Iniciei como auxiliar de professora (sem sala específica), depois tornei-me auxiliar de professora de maternal em 1989 e, finalmente, professora titular de uma classe de maternal (1989 a 1991).

Nesse novo percurso, enveredei entre um coro de vozes – a professora de Português do ginásio, a professora de Literatura Infantil, as companheiras de curso de Magistério e de trabalho, as professoras com as quais realizava estágio, os teóricos da Educação que lia na época – que foram compondo a professora que se iniciava na carreira docente.

Aprendizados do início da docência:

- planejamento como norteador das ações cotidianas na escola; - registro como relato das experiências vividas e como uma das possibilidades de organização do trabalho; - revisitar o registro para reorganizar as ações (reflexão);

- literatura como eixo norteador do trabalho; - compromisso político-pedagógico.

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A literatura infantil marcou presença, novamente, quando trabalhei como professora de crianças do curso maternal em Piracicaba. Os livros faziam parte do material fixo de cada sala de aula e assim me utilizava deles sem pretensões, fazia a leitura pela leitura. Na época, lia muita coisa da Editora Ática, principalmente os livros de autores como Eliardo França e Fernanda Lopes de Almeida. Diariamente fazia leitura em voz alta dos livros das histórias e releituras das imagens, contando as histórias para os pequenos alunos.

Nesses anos iniciais de docência, mesmo sem possuir experiência docente, tive que aprender a fazer planejamento das tarefas e relatórios diários dos alunos que passavam por mim. O registro das atividades e dos acontecimentos servia de instrumento de reflexão e de auxílio na elaboração de um relato mais complexo do aproveitamento escolar dos filhos, para os pais. Escrever para registrar para mim mesma e para a responsável pelo Centro de Convivência foi um exercício que constituiu a minha prática inicial de trabalho. E, a partir dessa experiência, fui, aos poucos, apropriando-me desse modo de ser professora.

Hoje, posso identificar alguns fatores ainda presentes no meu cotidiano escolar. Planejar as atividades a serem feitas rotineiramente, compartilhando esse planejamento com os alunos, possibilita a construção de um tempo próprio na relação pedagógica. O que me intriga, ao olhar para essa ‘rotina escolar’, é perceber que isso era feito por uma exigência da escola em que trabalhava e hoje não é mais uma obrigação, mas um pressuposto do meu trabalho como professora. Apropriei-me dessa prática. Hoje ela constitui parte do meu ser professora.

Imagem composta por capas de livros de literários

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Interromper a experiência de trabalho para voltar aos estudos foi uma das escolhas que fiz, ao optar por cursar Pedagogia na UNESP, em Araraquara. Porém, devido a questões pessoais, resolvi desistir da Faculdade e voltei para Piracicaba, onde comecei a dar aulas no Estado como professora substituta. Voltar à escola em que tinha estudado quando pequena, agora no papel de professora e poder reencontrar pessoas importantes na minha vida - que me marcaram, como professores/profissionais da Educação - foi essencial para que outras escolhas sobre as quais, naquele momento, eu refletia, se consolidassem.

Nessa época, dava aulas todos os dias e nos dois períodos, nas mais variadas escolas da cidade. Convivi com o melhor e o pior ensino, com a riqueza e a pobreza das crianças. Exercitar o magistério nas escolas do Estado, como professora substituta, implicava (e ainda implica) ir para qualquer unidade de ensino que me convocasse e a qualquer hora do dia evidenciando assim a precarização do trabalho docente. Dei aulas em escolas consideradas boas na cidade, ou seja, escolas bem localizadas, com prédios bem conservados, materiais (desde os textos fotocopiados até recursos como vídeo e televisão) à disposição do professor, bibliotecas com excelentes acervos e um corpo docente permanente. Já, em outros momentos, fui para escolas na periferia da cidade, onde o prédio escolar mais se parecia com uma prisão: grades nas portas e janelas, móveis acorrentados

Quando Bezerra & Silva, (2006) e Abonizio (2012) falam de precarização do trabalho docente, o professor é visto como executor de atividades que qualquer indivíduo pode realizar desde que seja treinado para tal. Aqui a prática pedagógica que compreende o observar o fazer, aprender como fazer e fazer com reflexividade é desconsiderada uma vez que que o trabalho pedagógico é visto a partir de uma lógica sequencial e em uma temporalidade a que todas as profissões foram sujeitadas na história das sociedades modernas.

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ou chumbados; corpo docente flutuante, giz como único instrumento de trabalho, crianças sem materiais básicos e, para mim, o pior: grande parte dos profissionais que trabalhava com essa realidade encarava a Educação como assistencialismo. Para a grande maioria deles parecia ser suficiente deixar as crianças na escola e dar a merenda.

Essas realidades distintas faziam com que vários questionamentos florescessem.

Que metodologia adotar? Como trabalhar com as crianças, sem um vínculo mais constante? Como trabalhar com salas lotadas, sem materiais e sem estrutura de trabalho deixada pela professora titular da sala? Como atrair a atenção das crianças?

Os incômodos se tornaram desafios que me foram indicando outros caminhos de trabalho junto à literatura. Muitas vezes, os livros eram minha “tábua de salvação”, quando me via diante de uma classe de alunos que mal conhecia e precisava desempenhar o papel de professora. A literatura, então, me servia de “fiel escudeira”, fornecendo-me o caminho, ainda meio nebuloso, de como agir em sala de aula. Aqui, a literatura começou a ganhar espaço como eixo de trabalho.

Novamente, as vozes dos sujeitos que me constituíram no passado voltam a ecoar, o que me fez olhar para as aprendizagens anteriores e retirar, delas, encaminhamentos que me auxiliassem naquele novo caminho que iniciava a percorrer - o de professora das séries iniciais do ensino fundamental. A prática de ler literatura, vivenciada por mim no início da escolarização, no Ginásio, no Magistério e na prática pedagógica exercida no Centro de Convivência, foi aos poucos aflorando quando me envolvia nas salas como professora substituta. Esse foi um processo lento e gradativo: com o passar do tempo, experimentando-me como professora, e através da observação do cotidiano do ensino escolar, fui me identificando com uma prática pedagógica específica.

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Assim, fui à busca de livros didáticos e de literatura em editoras, sebos, bibliotecas e no meu pequeno acervo: essas eram as fontes para “fazerem brotar” as atividades que realizaria com as crianças.

Debruçar-me sobre o material que tinha em mãos e mergulhar na realidade das crianças com as quais estava trabalhando foi um dos maiores aprendizados por que passei. Pensar em atividades que trouxessem a atenção delas para uma pessoa ‘estranha’, diferente da professora efetiva de sala, e que não destoasse do conteúdo trabalhado no cotidiano escolar era o meu desafio. Assim, fiz algumas escolhas para sobreviver como professora substituta e ‘ganhar’ a confiança das pessoas responsáveis pela atribuição de aulas. Optei por trabalhar com a leitura, interpretação e elaboração de textos e erros de grafia através de jogos, fichas e imagens encontradas em jornais e revistas. Com base nessas opções, passei um ano inteiro (1992) trabalhando com classes do denominado Ciclo Básico, 3a e 4a séries. O Ciclo Básico foi uma iniciativa formal de organização em ciclos no estado de São Paulo que se deu por meio de um decreto que atingiu todas as escolas da rede. O Ciclo Básico integrava as duas séries iniciais em um único bloco, sem reprovação na passagem do 1º ano para o 2º ano. Assim, o ensino estava dividido em dois grandes ciclos: 1º ao 4º ano e 5º ao 8º ano.9

Essa experiência trouxe de volta a ideia de retornar à faculdade10, pois muitas questões me incomodavam e intrigavam desde a época do Magistério, no tempo em que atuava como auxiliar de sala...

9

Para outras informações consulte DURAN, Marília Claret Geraes & ALVES, Maria Leila. Ciclos e progressão continuada na rede pública do estado de São Paulo: avanços ou retrocessos? In Revista Múltiplas Leituras, v. 4, 1, 2010, pp 23-35.

10

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Novamente, precisei encarar a realidade do vestibular e, dessa vez, eu tinha um objetivo específico: ir para Campinas, fazer Pedagogia na UNICAMP, pois percebia, em algumas professoras do curso de Magistério que participavam de cursos nessa Universidade, uma visão mais flexível e inovadora com relação à Educação.

Durante os anos do curso de Pedagogia, tive aulas com professoras/professores que utilizavam a literatura para despertar o interesse das alunas adultas que ali estavam e, com esse procedimento de trabalho, nos mostravam que isso era possível com as crianças. A busca por aliar o prazer da leitura ao conteúdo necessário a ser trabalhado tornou visível uma prática e uma necessidade: a importância da leitura e do registro no processo de formação no qual eu estava inserida e a qual já tinha sido experienciada nos anos iniciais da docência em terras piracicabanas.

Esse momento de “reencontro” com o uso da literatura na escola foi significativo em minha formação, já que até hoje me recordo do livro lido por uma professora no primeiro semestre do curso: Uxa, Ora fada, ora bruxa, de Sylvia Orthof, Ed. Nova Fronteira, foi muito marcante, pois, até hoje, ao lê-lo sozinha ou com meus alunos, vejo a imagem da professora entusiasmada com o texto que lia, mostrando as possibilidades de leitura junto ao referencial teórico que assumia – histórico-cultural. Cada início de aula daquela disciplina era marcado por uma nova leitura feita pela docente, que suscitava reflexão

Ao dialogar com Schön, Alarcão (1996) nos coloca que pode-se iniciar a profissão de forma diferenciada, seja por si só ou junto de outro profissional, como ao artesão que aprende fazendo, sentindo o que está diante dele. Ou ainda, imitando-o, que também é um espaço de verificação de possíveis alternativas para agir em determinadas situações que também serão refletidas.

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sobre o ser professora e a prática pedagógica vivenciada por cada uma das alunas, futuras pedagogas.

Nos semestres seguintes, outras professoras apresentaram outros textos do gênero literário e nos fizeram vivenciar a literatura como uma possibilidade de dialogar com as questões educacionais. Nas pesquisas e práticas pedagógicas, nas aulas sobre alfabetização, nas didáticas de História e de Língua Portuguesa, em todos os momentos estava presente a literatura... ‘Era urso?’11

, ‘O frio pode ser quente?’12, ‘O menino marrom’13, ‘A bruxinha Atrapalhada’14

, ‘O jogo do contrário’15, ‘Manual de tapeçaria’,16 ‘Vidas Secas’17

, ‘Contos de Grimm’18, ‘Contos de Perrault’19

... As narrativas entrelaçavam-se umas às outras e, principalmente, formavam novas leituras e registros de práticas, que ali se iniciavam, sob a forma de pequenas participações nas salas de aula onde estagiávamos, permitindo, com isso, futuros encaminhamentos pedagógicos.

11 NASCIMENTO, Esdras do & TASHLIN, Frank. Era Urso?. SP, Ediouro – Sinergia. 12

MASUR, Jandira, O frio pode ser quente?. SP, Ed. Ática. 13

PINTO, Ziraldo Alves. O menino marrom. SP, Ed. Melhoramentos. 14

FURNARI, Eva. A bruxinha atrapalhada. SP, Global Editora. 15

MASUR, Jandira. O jogo do contrário. SP, Ed. Ática.

16 LACERDA, Nilma. Manual de tapeçaria. Rio de Janeiro: Philobiblion, 1986. 17

RAMOS, Graciliano. Vidas Secas. José Olympio Editora. 18

GRIMM, Jacob e GRIMM, Wilhelm. Contos de Grimm. SP, Ed. Cia das Letrinhas. 19

Coletânea de textos com os contos Chapeuzinho Vermelho, O Barba azul, O pequeno polegar...

Imagem composta por capas de livros de literários.

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Da vivência de aluna em sala de aula para a prática em sala de aula, na disciplina de estágio supervisionado, passei por um momento de desafio. Novamente, as indagações surgiam e as possibilidades de trabalho com a literatura, de novo, me salvavam. Mais uma vez, “fiel escudeira”. Acredito que, naquele momento, uma parceria tornava-se mais sólida. Devido aos desencontros vividos com a professora da sala de aula onde realizava o estágio obrigatório, encontrava-me desacreditada com o mesmo. O livro “O frio pode ser quente”, de Jandira Masur, permitiu-me que a porta para o trabalho com as crianças fosse aberta e, principalmente, possibilitou o entendimento de toda a diversidade e contradição presentes na escola na qual estava inserida naquele momento.

Junto a essas práticas vivenciadas durante a graduação, aprendi que o compromisso político-pedagógico precisa estar presente em qualquer área de atuação do professor. Tive também a oportunidade de vivenciar o papel da pesquisadora em formação, ao atuar em projetos na área de História da Educação e na área de meu interesse particular, Formação de Professores. Aliar essas diferentes áreas de conhecimento e as vivências que tinha como docente / professora-estagiária / aluna fez com que reencontrasse a importância do registro das experiências vividas na escola. O uso do diário de campo era fundamental no desenvolvimento desse tipo de trabalho, pois, através das anotações detalhadas dos

Momento em que a palavra parceria aparece pela primeira vez em meus registros com o sentido de companhia. No dicionário encontramos o significado: reunião de indivíduos para alcançar um objetivo comum; companhia, sociedade.

Fonte: HOUAISS, Antonio e

VILLAR, Mauro de Salles.

Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.

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acontecimentos e das relações que se teciam na escola, tinha condições de retomar o vivido e enfrentar os desafios e as tensões característicos do processo de formação da professora.

Assim, ao me formar, no ano de 1997, comecei a trabalhar em uma escola particular de Campinas, como professora de Educação Infantil. Tinha, como parceira de trabalho, uma professora “da casa” que já havia lecionado anteriormente nas séries iniciais do Ensino Fundamental, mas que, naquela época, estava de volta à Educação Infantil. Ou seja, para aquela professora, retornar a lecionar naquele segmento de ensino representava, além de um rebaixamento salarial significativo20, não ter mais o horário de lanche junto ao grupo de professores todos os dias, não ter “janela” para preparar as aulas, não ter horário com a coordenadora e até mesmo não ter tempo para atender os pais.

Naquele momento específico, minha condição de trabalho igualava-se à de minha parceira de série; no entanto, o meu era um "olhar não-viciado" para o cotidiano que a escola nos apresentava. Sendo nova no colégio e na profissão em Campinas21, tinha o desejo de colocar em prática aquilo que ouvira durante a faculdade,

20

As professoras de 1a a 4a série daquela escola eram mensalistas, como as professoras do Infantil, mas o valor da hora/aula era maior. Além disso, possuíam aulas vagas, as janelas para atenderem os pais, organizarem o trabalho. As professoras do Infantil recebiam um valor menor e não possuíam momentos vagos para se dedicarem a outros aspectos do trabalho pedagógico.

21

Como disse anteriormente, já havia lecionado em Piracicaba no período de 1988-1992.

Desde aquele

momento, já buscava uma parceria na escola enquanto possibilidade de interlocução e de troca de práticas. Mesmo seguindo meus princípios e as possibilidades que tinha no momento, tinha muito a aprender e a ensinar quando partilhava meu ponto de vista com meus pares. Assim, era nas brechas do cotidiano que procurava e instaurava a parceria possível para poder refletir sobre minhas escolhas e ações.

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lera nos livros, recolhera do contato com as crianças, dos acontecimentos que vivenciara em sala de aula, na escola, nos encontros com colegas e professores da faculdade... Mas, acima de tudo, ter uma parceira de trabalho, alguém com quem compartilhar as minhas dúvidas, os meus fracassos e acertos, significava uma possibilidade de construir um trabalho conjunto.

No início das minhas atividades naquela escola, mesmo sem horário para compartilhar o trabalho com minha parceira de série, com a coordenadora e com o grupo, procurava momentos para estabelecer a troca (os minutos antes da entrada, o intervalo, bilhetes, em que se comentava o trabalho realizado em sala de aula...). Vivenciei muitos encontros e confrontos com a estrutura e organização da escola e os professores que ali estavam. Não era fácil construir uma relação de trabalho com uma estrutura que inviabilizava os encontros entre os professores - desde a Educação Infantil ao Ensino Fundamental I.

Nessa realidade, novamente a literatura voltou a ocupar espaço e importância na minha prática pedagógica. Por meio dos livros de literatura infantil, pude ir constatando o que já havia aprendido na Faculdade de Educação a importância de tê-los em mãos. Primeiro, porque serviam, em diversas ocasiões, de vínculo com as crianças, pois estas se aproximavam de mim, sentadas em círculo, para a leitura feita por mim e, provocadas pelas histórias e pelo próprio contexto particular da leitura,

Como diz Marisa Lajolo (1997, p.7), “ninguém nasce sabendo ler: aprende-se a ler à medida que se vive.” As palavras presentes em um texto vão compondo o seu jeito de olhar e sentir o mundo. A leitura acontece na escola, mas não se pode encerrar nela, pois quanto mais se lê, mais se abre os horizontes diante do mundo em que se vive.

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confidenciavam suas emoções, suas experiências familiares. Em outras situações, a literatura disparava outras leituras e discussões que faziam com que a sistematização dos conteúdos se tornasse mais prazerosa e significativa para todos nós.

Durante os anos de 1998 e 1999, trabalhei com a 3a série nas áreas de Português, História e Geografia, com parceiras que possuíam não apenas referenciais teóricos diferentes dos meus, como também sistema de trabalho distinto.

Tornar-me professora da 3a série do Ensino Fundamental, em 1998, gerou um desconforto em algumas pessoas do grupo ao qual pertencia, pois a outra professora da Educação Infantil, aquela mais velha “de casa”, de experiência profissional mais antiga, permaneceu no mesmo posto de trabalho (professora de Educação Infantil). Ou seja, eu, professora iniciante "estava ‘ocupando’ o lugar que era dela por direito" (palavras ouvidas nos burburinhos da sala de professores). Os olhares atravessados e a pouca confiança no trabalho que desenvolvia eram constantes.

Em 1999, a escola passou a adotar o material apostilado do sistema de ensino do qual fazia parte. Utilizar o material apostilado implicava que o professor tivesse domínio sobre todo o conteúdo a ser desenvolvido no ano, uma vez que este já viria planejado aula a aula, com objetivos a serem trabalhados. Além do mais, a escola adotaria um calendário e um cronograma sem flexibilidade. O calendário compartilhado com o usuário do sistema - os alunos e suas famílias - já trazia agendadas as datas das entregas dos cadernos/apostilas, as provas bimestrais, as reuniões de pais, as festas comemorativas, as recuperações e as entregas de boletins. Isso quer dizer que o professor, nesta forma de gestão e organização do trabalho, necessita cumprir o que foi estabelecido no cronograma definido no início de cada ano letivo.

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Com essas mudanças vindas “de fora”, aplicadas à minha prática pedagógica, sentia necessidade de compartilhar minhas angústias e, nesse momento, tentei buscar interlocutores por meio da participação em cursos de formação continuada, em outro espaço que não a escola; não encontrei, porém, respostas às minhas indagações e angústias.

Em 1998, trabalhei na 1a série em outra escola da rede particular de Campinas. Ali vivenciei reuniões coletivas (com o grupo de 1a a 4a séries) e de duplas (a coordenadora do curso e eu) que me possibilitaram perceber que a “minha” sala de aula estava inserida num projeto político-pedagógico maior, ou seja, havia conteúdos, posturas assumidas em grupo, leituras a serem trabalhadas que desencadeariam o trabalho da série seguinte. Assim, os trabalhos que desenvolvia precisavam ser pensados a partir dessa premissa.

Com a experiência de alfabetizar na Educação Infantil e os estágios realizados em várias outras séries, inclusive naquela em que estava como professora, pude iniciar o planejamento do trabalho que desenvolveria no decorrer do ano.

Outro aspecto em que me empenhei durante o ano de 1998, em ambas as escolas em que trabalhava, foi a organização da sala e a disponibilidade dos materiais para os alunos, como os livros de literatura infantil e informativa, jogos, sucatas e muitos outros. Não foi fácil aprender e apreender a importância de organizar os

A parceria efetiva foi se instaurando e o registro partilhado ora individual, ora coletivo foi se se tornando essencial no processo de investigação e reflexão sobre nossas práticas e as condições de trabalho vividas. Posso dizer que um ambiente formativo foi sendo construindo já que era permeado de uma aprendizagem individual, coletiva e colaborativa. (ARAGÃO, 2010, p.61 e 62)

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materiais dos e para os alunos e, assim, deixar a sala de aula mais “arrumadinha”, como diria R., Coordenadora de uma das escolas.

Com o passar do tempo, dar aula em duas escolas veio a prejudicar meu trabalho, pois priorizava uma em detrimento da outra. Mas, me dei conta disso quando a Coordenadora de uma dessas escolas me chamou a atenção, em uma das reuniões individuais para falar da 1a série.

Segundo ela, o trabalho com a linguagem na 1a série desenvolvia-se com tranquilidade, porém as atividades com matemática revelavam-se deficitárias. Propus-me a rever meu trabalho e tentei reverter a situação. No final de ano, junto à Coordenadora, pudemos analisar e concluir que as crianças estavam alfabetizadas e dominando as operações básicas de matemática, mas que eu poderia ter caminhado mais com os alunos no raciocínio matemático. Saí de lá com uma lição de casa para as férias: estudar e preparar um projeto de matemática. Infelizmente, no ano seguinte, ao voltar com todo o planejamento, fui informada de que estava sendo desligada da escola, por questões administrativas e financeiras, a escola sofreu uma diminuição no número de matrículas e minha dispensa, por ser eu a mais nova no grupo, seria menos onerosa para escola.

Em 2000, trabalhei na escola que utilizava o material apostilado, em uma 1a série, em parceria com uma professora que compartilhava comigo os mesmos referenciais teóricos. Mediada, é claro, por seu olhar, por sua história de vida, por seus próprios limites, fui percebendo a importância de os momentos compartilhados serem sistematizados pelo registro, pela análise conjunta entre nós e com nossa coordenadora. Essa experiência me levou a buscar indicadores e olhares de como se estabeleciam as relações de parcerias efetivas, pois estas surgiam e tornavam-se importantes, já que até o que era incômodo, era ”ressignificado” e retomado como novas possibilidades de trabalho.

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Em 2001 e 2002, estive novamente com a 1a série. No entanto, sem parceira de série. Trabalhar sozinha e em outro momento da minha vida profissional foi um desafio que exigiu muita reflexão teórica e prática. Desenvolver projetos de trabalho com os alunos, além do uso do material apostilado adotado pelo colégio, tornou-se, aos poucos, um encontro de desejos e provocações.

Essas “ausências de sintonia”, se assim posso nomear, ficaram mais claras e presentes em algumas atitudes que passei a observar nas famílias e na própria linha de atuação da direção da escola.

Mas para quê você precisa de álbum de fotos da família? (fala de uma mãe – 2001 –, referindo-se ao álbum de fotos da família para que a criança compreenda e conheça melhor as suas origens).

Eu fiz todo o livro da vida porque você sabe, professora, a minha filhinha, ainda não escreve bem, bonito e bastante (fala de uma mãe – 2001 –, quando questionada sobre o por quê de a própria filha não fazer o registro como havia sido solicitado em bilhete de orientação).

Mas essa escola cansa, hein!? O que essa professora quer? Um poema! Eu não tenho tempo! (fala de uma mãe – 2002 –, resposta dada à orientadora da escola quando solicitei que a mesma ligasse para a casa de alguns alunos que não haviam trazido a poesia pedida).

Nossa! Trabalhar na 1ª série dá um trabalhão! Como vocês inventam coisas.. .Faz aqui, manda pra casa e depois trabalha em cima... (fala do Diretor escolar – 2001)

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Vivenciar o ambiente escolar com um leque variado de interferências – posicionamentos dos pais, dos diretores, das crianças, de outros professores, decisões administrativas e pedagógicas –, somado aos próprios conflitos e desejos de constituir um trabalho articulado, fez com que eu registrasse minhas indagações durante esse processo, para que pudesse aprofundá-las e refletir sobre elas, tendo em vista o processo de constituição da professora, em mim...

Olhando o ano de 2003, para esse caminho percorrido, percebo que a prática do uso sistemático da literatura em minhas aulas e a prática do registro do que desenvolvo sempre têm se constituído como recursos do meu fazer de professora. Tendo o material apostilado como prescrição, tenho-me utilizado das brechas, tenho buscado, junto a outras pessoas, alternativas para realizar o trabalho paralelamente à prescrição. E, aí, encontro-me novamente diante da literatura – é ela que me tem apontado possibilidades de saídas. Presente diariamente na prática pedagógica, tornou-se eixo de trabalho, a fim de encontrar um caminho. Seja na leitura em roda, nos textos para trabalhar linguagem, nas informações lidas em diferentes fontes, ela tem-se feito presente no meu cotidiano escolar como professora.

Nesse movimento, o registro do cotidiano passou a constituir-se o interlocutor da minha prática, com algumas reflexões feitas por mim - seja o sucesso ou o fracasso, seja o prescrito ou não prescrito. Acredito que esse

A literatura, na sua mais variada forma que se apresenta - poesia, contos, romances, peças de teatro, jornais, quadrinhos, ensaios longos - provoca no sujeito um movimento de pensamentos que podem ser relançados a

atividade de

simbolização, de construção de sentido, permitindo assim, que cada um se torne narrador da própria história. (PETIT, 2003)

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34

registro tem historiado o processo do meu fazer pedagógico e certamente indica como tenho me constituído, ao longo do tempo, como professora das séries iniciais do Ensino Fundamental.

Nos registros que faço, uma das marcas constantes tem sido o uso frequente da literatura como eixo de trabalho, o que, muitas vezes, em uma escola cuja linha já estava prescrita pelo material apostilado, causava muitos momentos de tensão. Assim, nesse movimento entre a opção por seguir as possibilidades de trabalho abertas pelo uso da literatura e a necessidade de seguir um plano de trabalho já definido, percorri certos caminhos que foram discutidos em minha Dissertação de Mestrado e que aqui também se fará presente.

2.2. Uma pausa no caminho...reencontrando o

percurso

Fazer da interrupção um caminho novo. Da queda um passo de dança, do medo uma escada, do sonho uma ponte, da procura um encontro!

Fernando Sabino (2005)

Uma pausa no caminho foi necessária. Diante dos trajetos feitos, olhei e selecionei alguns deles para compreender onde estou/cheguei.

Em 2002, tive minha primeira experiência docente no ensino superior em uma faculdade de Sumaré, no curso de Pedagogia. Fiquei encantada pela maneira que fui apresentada ao Ensino Superior e pela possibilidade de trabalho com futuras professoras. Em um único semestre experimentei oficialmente o que era ser professora de professoras e me espelhei nas

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professoras com as quais estabeleci parceria na Faculdade, aquelas que liam os livros de literatura para provocar discussões e, fui aos poucos percebendo que o caminho não era somente flores. Havia espinhos que me cortavam amargamente: a escrita precária dos alunos, o descaso da instituição com o curso em si, a ausência de diálogo entre as pessoas envolvidas. Experiência vivida e decisão tomada: estar com as crianças me satisfazia mais do que nunca.

Em 2003, continuei o percurso de professora titular na escola apostilada e, paralelamente, comecei a trilhar um novo caminho, o de professora auxiliar22 em uma escola que trabalhava com projetos.

Nesta nova função, comecei a ouvir o termo parceria, como forma de organização do trabalho. Semanalmente, as professoras do Ensino Fundamental se reuniam para trabalhar em períodos de duas horas. Ora as professoras da série, que geralmente era entre seis e oito, para discutirem os encaminhamentos dados e pensar em possibilidades de trabalho, ora era com a Coordenação do curso que propunha formação através de textos teóricos relacionados à prática.

Aos poucos, fui percebendo que os caminhos se cruzavam e que alguns desvios eram encontrados em ambos, mas que podiam ser contornados para que a caminhada fosse contínua e com aprendizados.

Novamente vivenciei o novo que era olhado com estranheza ou curiosidade pelas pessoas. Quem era aquela pessoa que estava chegando? Devido a minha experiência na escola com o sistema apostilado, a clareza e a praticidade da organização do trabalho eram fatores que geraramgeram certa desconfiança e a trilha a ser percorrida era questionada.

22

Nesta escola, a professora auxiliar trabalha junto com a professora titular da classe. É responsável por atuar com as crianças com dificuldades, de assumir a sala quando necessário, de fazer correções e preparar atividades e de acompanhar uma das aulas de Educação Física durante a semana. A professora auxiliar tem um salário menor da titular e tem seu horário de trabalho dividido entre as salas da série.

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Mas, em ambos os caminhos, o acolhimento foi tão significativo que as pessoas com as quais trabalhava enriqueceram meu jeito de ser professora que continuava pautado no uso da leitura da literatura agregando as novas mídias como forma de organizar e registrar o trabalho que foi apresentado em minha dissertação de mestrado, defendida no final do ano.

Em 2004, logo no início do ano me tornei mãe e, assim como no livro ‘Se as coisas fossem mães’, de Sylvia Ortof, fui percebendo e vivenciando um novo jeito de ser e de ver o mundo. A licença-maternidade me trouxe uma grande surpresa na escola apostilada: uma parceria de trabalho que enriqueceu e solidificou o que estava realizando no 2º ano. Ora a professora que me substituiria assumia, ora eu, a professora titular. Arte e literatura se encontraram e novos rumos foram traçados e, assim, a arte do cotidiano foi sendo instaurada como mola propulsora do trabalho docente ali desenvolvido. A razão foi dando mãos para a emoção que foram sendo articuladas e expostas de uma maneira que começou a invadir o outro caminho, o da escola com projetos.

A escuta sensível foi instaurada, não que ela não estivesse em mim, mas acredito que o encontro com a maternidade e com a nova parceira, fez com ela ganhasse corpo, imaginação, razão e afetividade em uma relação de totalidade com o Outro.

A maternidade, experiência única e singular, mas que, ao mesmo tempo, está ligada a outras mulheres que constituem uma rede em permanente movimento, fez com que a afinidade essencial potencializasse uma busca individual e coletiva pelo qual eu passava naquele momento. Algumas atitudes e sentimentos foram desvelados e fazendo com que o olhar e a escuta sensível para as situações cotidianas da escola e da vida fossem mostrando outras possibilidades de trabalho docente. Hoje vejo que a maternidade me fez ter uma leitura mais emocional, captando o conteúdo sensível em vez de aprender ou avaliar os conceitos linearmente. Tornei-me uma pessoa/profissional com um olhar mais amplo e sutil aos que estavam ao meu redor e comigo mesma, permitindo que o que não me servia, seguisse seu caminho sem me distrair do que realmente me tocava naquele instante.

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