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A parceria como espaço diverso

8. Por qual caminho vou?

8.1. Compreendendo as paradas com.par.t(r)ilhadas:

8.1.3. A parceria como espaço diverso

Eis o que eu aprendi nesses vales onde se fundam os poentes: afinal, tudo são luzes e a gente acende é nos outros. Mia Couto (2003)

Outras palavras são partilhadas na narrativa da professora que se apresenta assim:

Acredito que minha formação aconteceu muito mais na prática, durante o exercício das funções tanto de professora quanto de orientadora educacional, do que na faculdade de pedagogia. No entanto, por trabalhar em escolas que assumiam a formação dos educadores como uma necessidade contínua, minha prática foi sempre acompanhada por análises e estudos.

Certamente a troca de experiências e o estudo entre pares na rotina das escolas foi fundamental para o movimento de constante reflexão, para o entendimento da realidade de turmas, alunos e suas famílias e para a adequação de práticas e buscas de soluções para as dificuldades encontradas.

138 Em termos formais...

Ensino Médio, na época, voltado para Biológicas 1977 - 1º ano de Psicologia na PUC São Paulo

1978 - Reopção para Pedagogia, com especialização em Orientação Educacional e início de estágio na Escola Nova Lourenço Castanho, onde trabalhei por 7 anos

1985 - Inconformada com as dificuldades dos alunos busquei o curso de pós graduação em Psicopedagogia no Sedes Sapientiae

1987 - retomei a sala de aula e passei a fazer atendimento de crianças com dificuldades de aprendizagem

1988 - trabalho como Orientadora Educacional e Coordenadora Pedagógica do Fundamental I, 4º e 5º anos

1993 - mudança para Campinas e volta à função de professora, que exerço até hoje

Durante esses anos de trabalho fiz e continuo fazendo diversos cursos e estudos numa importante e necessária aquisição de conhecimentos, atualizando continuamente essa formação de educadora que nunca está completa.

Entre as muitas pessoas com quem troquei experiências, dúvidas, anseios e descobertas está você, Marissol, com quem aprendi muito.

Estou sempre no seu fã clube, me alegrando com seus sucessos.

Se quiser algo mais ou diferente é só dizer. Grande abraço!

Maria

No trabalho em parceria vejo a diversidade de expressão e de pensamento. Vejo meus colegas e me vejo neles. Sou estimulada, apoiada e também desafiada. Confiante, escolho a exposição, a defesa de princípios e valores e dos meios para atingi-los. Crio. Convido. Negocio. Contribuo.

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O trabalho em parceria alimenta a instituição que é democrática, fundamentada e exercida no respeito mútuo; forma e fortalece cada um de seus profissionais na busca constante da coerência entre filosofia e prática; valoriza o profissionalismo e o trabalho de evolução pessoal.

Assim como para outras práticas que envolvem relacionamentos, é preciso acreditar e dispor-se para que os resultados sejam positivos. E eu acredito. Sempre trabalhei em parceria, com amplos ou modestos resultados, dependentes da configuração da parceria em si e do espaço desta crença na instituição em que estivesse inserida.

No entanto, vejo que se por algum motivo a competitividade é incentivada, o trabalho em parceria, ou em equipe, é abalado. As competências individuais sempre vão aparecer e podem ser valorizadas quando estiverem a serviço do bem comum, sem que para isso seja necessário um se sobrepor ao outro. O ideal é que os objetivos sejam atingidos em parceria, como se o sucesso fosse um bem público, de responsabilidade de todos, e não um bem privado, de responsabilidade individual.

No trabalho em Educação, que tanto exige de percepção, reflexão e atuação, que tanto mexe com os sentimentos, na formação de vínculos com alunos, e suas famílias, que vem e vão, como é bom e enriquecedor poder contar com o olhar da parceira-auxiliar, que traz outras visões ou confirma a minha, com seus ouvidos para o desabafo necessário que antecede a reflexão, que revê ou prepara a ação educacional.

É a professora que já exerceu também o cargo de Coordenação que, no registro de suas palavras expressadas faz-me recordar de Pierini (2007) quando trata sobre o registro.

Bom é registrar para expressar, para tornar nas mãos o que se revela de cada um e torná-lo de todos, para materializar o revelado. Bom é

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registrar e trazer a tona fragmentos de momentos em que cada um se afirma, ao afirmar suas verdades, em que cada um ouve as verdades dos outros e melindra-se com elas, incomoda-se, inquieta-se, traz para o outro a sua inquietação, fala, publica as suas convicções, se revê ao rever o outro. (p.82)

É um processo revelador quando assume o quanto o Outro a constitui.

É por isso que a experiência verbal individual do homem toma forma e evolui sob o efeito da interação contínua e permanente com os enunciados individuais do outro. É uma experiência que se pode, em certa medida, definir como um processo de assimilação, mais ou menos criativo, das palavras do outro (e não das palavras da língua). Nossa fala, isto é, nosso enunciado (que inclui as obras literárias) está repleto de palavras do outro, caracterizadas, em graus variáveis, pela alteridade ou pela assimilação, também em graus variáveis, por um emprego consciente e decalcado. As palavras do outro introduzem sua própria expressividade, seu tom valorativo, que assimilamos, reestruturamos, modificamos. (BAKHTIN, 2000, p. 313, 314)

Ao dar-me conta deste processo pela narrativa apresentada, faz um movimento de rememoração evidenciando as suas articulações e significações vividas que também ecoaram em mim e nas escolhas que fiz e faço até então. Ao escrever, a professora potencializou sua subjetividade e proporcionou um distanciamento temporal do que de fato a constituiu e da constituição da parceria a qual estava inserida.

Ao partilhar suas impressões, sentimentos, opções,

permitiu a cada um isolar as diferenças e semelhanças nos meandros das vidas e em particular quanto a maneira de orientar a sua existência, de reagir a acontecimentos, de fazer opções. (JOSSO, 2010, p. 148)

Nessa intensidade de escolhas feitas ao longo dos anos, a professora participa ativamente do processo de formação que provoca em cada um, novas

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interrogações fazendo com que possa avançar continuamente no seu processo de formação individual e coletivo.

Ao ler as palavras de Maria, inicio a procura daquilo que gera a singularidade na generalidade (JOSSO, 2010, p.179) e vou identificando em mim algumas marcas que impulsionam uma reflexividade quando diz que “como é bom e enriquecedor poder contar com o olhar da parceira-auxiliar, que traz outras visões ou confirma a minha, com seus ouvidos para o desabafo necessário que antecede a reflexão, que revê ou prepara a ação educacional.”

Como é raro quando estamos nesta posição de fazer, de viver a docência, de expressar o que fazemos ou vivemos, encontrar pessoas dispostas a partilhar, ao mesmo tempo, a busca e a procura de um ou vários sentidos no trabalho que desenvolvemos no cotidiano da escola que constitui aos poucos o nosso desenvolvimento pessoal e profissional.

Ao dizer sobre a importância do sucesso como bem público, Maria evidencia a competência profissional que envolve “a apropriação de saberes plurais num sentido mais amplo” (FOERSTE, 2005, p. 106) e, consolida assim, um espaço de negociação consigo mesma e com os sujeitos e espaço de trabalho ao qual está inserida.

Ao procurar o Outro para compreender o trabalho que estava sendo realizado - trabalho real - era (ainda é) organizar os novos métodos e regras de trabalho - trabalho prescrito -, ou seja, estava interpretando as experiências resultantes desses confrontos pessoais e coletivos e renormalizando-os.

Como outro trabalhador, quando retoma as normas prescritas, está dando outra dimensão ao trabalho, pois faz julgamentos, interpretações, micro- escolhas e micro-decisões necessárias para encaminhamento do trabalho.

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