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Indeferimento do pedido de reconversão das penas restritivas de direitos em pena privativa de liberdade: análise crítica da decisão do Superior Tribunal de Justiça

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ FACULDADE DE DIREITO

GRADUAÇÃO EM DIREITO

JOEL LACERDA OLIVEIRA

INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE RECONVERSÃO DAS PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS EM PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE: ANÁLISE CRÍTICA DA

DECISÃO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

FORTALEZA 2019

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INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE RECONVERSÃO DAS PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS EM PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE: ANÁLISE CRÍTICA DA DECISÃO

DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Monografia apresentada ao Programa de Graduação em direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial para obtenção do título de bacharel em Direito. Área de concentração: Direito Penal.

Orientador: Prof. Dr. Samuel Miranda Arruda.

FORTALEZA 2019

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INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE RECONVERSÃO DAS PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS EM PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE: ANÁLISE CRÍTICA DA DECISÃO

DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Monografia apresentada ao Programa de Graduação em direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial para obtenção do título de bacharel em Direito. Área de concentração: Direito Penal.

Aprovada em: __/__/____.

BANCA EXAMINADORA

_____________________________________________ Prof. Dr. Samuel Miranda Arruda (Orientador)

Universidade Federal do Ceará (UFC)

_____________________________________________ Prof. Dr. Daniel Maia

Universidade Federal do Ceará (UFC)

_____________________________________________ Prof. Mestre Lino Edmar de Menezes

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Aos meus pais, meu irmão e meus avós, a quem só tenho a agradecer.

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Aos meus pais, Francisco e Moema, por sempre estarem ao meu lado nos momentos difíceis, por todo o amor, carinho, suporte e atenção durante toda essa longa batalha e por nunca terem duvidado do meu potencial.

Ao meu irmão, Daniel, por ser esse exemplo de dedicação e perseverança, sempre me inspirando cada dia a me manter focado, e pelo eterno companheirismo.

Aos meus avós Sebastião, Rosa, Abrahão e Miriam, por todos os ensinamentos de vida, pelo cuidado e afeto constantes, pelo exemplo de fé e por me mostrarem o quão perfeito é o dom da vida.

Ao meu orientador, professor Samuel, pela atenção e disponibilidade durante esses longos meses, pelo incrível aprendizado na cadeira de Criminologia e por servir de inspiração para este projeto.

À minha banca orientadora, pela disponibilidade para ouvir minhas ideias, e por serem grandes referências acadêmicas desde meu primeiro semestre na faculdade.

Aos meu primos e melhores amigos, Antônio Filho e Mariana, pela grande amizade desde nossos primeiros anos de vida, por todas as conversas, viagens, noitadas e jogatinas juntos, e pelos muitos anos que virão.

Às “Cardashias”, Mellina, Raquel (e Mariana, novamente), pela montanha-russa de aventuras pelas quais já passamos, por todas as emoções vividas, pelo nosso constante crescimento juntos e por nossa grande amizade.

Aos meus grandes amigos, Bruno, Vyctoria e Carolina, por terem um bom humor contagiante, pelo companheirismo durante esses anos difíceis, por sempre estarem do meu lado e que nunca percamos contato.

Ao meu ex-chefe, Dr. André, por ter me recebido na minha primeira experiência como estagiário, por me auxiliar a crescer profissionalmente no Direito e por ter sido um exemplo de honestidade e justiça.

E a todos os meus amigos e colegas que não citei, por quem tenho um carinho enorme e por fazerem parte da minha jornada.

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“A verdade tem um peso que nenhuma mentira pode falsificar.” Frank Randall

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A ausência de Casas de Albergado em número suficiente para fazer valer a execução da pena em regime aberto e a permissão dada pelo Superior Tribunal de Justiça para que os condenados a este regime pudessem cumpri-lo sob a forma de prisão domiciliar geraram uma série de problemas para os quais a Lei não traz solução. O debate do tema gira em torno de um desses problemas, qual seja, o surgimento de pedidos formulados por condenados ao cumprimento de penas restritivas de direitos que desejavam reconverter sua pena em privativa de liberdade, no regime aberto, por esta ser mais brando que aquelas. O STJ, mais uma vez, posicionou-se a respeito do assunto, negando o direito subjetivo de escolha da forma de cumprimento da pena imposta em sentença. O problema reside no fato desta decisão indeferir o pedido fundamentando que só caberia a reconversão no caso de descumprimento da pena restritiva de direitos, ou seja, só seria possível a reconversão formal. Tal julgado acabou por oferecer a solução a estes apenados: basta descumprir a pena alternativa imposta que esta será convertida em pena privativa de liberdade. Desse modo, para que a decisão da Corte Superior fosse dotada de eficácia, outros fundamentos deveriam ter sido levados em consideração, como as finalidades da pena, o princípio da individualização da pena, e o modo de funcionamento, na prática, da prisão domiciliar no regime aberto. Para o desenvolvimento da presente monografia foi utilizada vasta bibliografia, englobando artigos científicos, obras de numerosos autores, teses, legislação e jurisprudências de diversos tribunais.

Palavras-chave: Penas restritivas de direito; penas privativas de liberdade; pedido de

reconversão; finalidades da pena; princípio da individualização da pena; regime aberto; prisão domiciliar.

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The absence of open prisons in sufficient number to assert the enforcement of punishment in open conditions and the permission given by the Superior Court of Justice so that the sentenced to this regime could fulfill it under house arrest created a series of problems for which the Law does not provide a solution. The debate of the topic revolves around one of these problems, which is, the appearance of requests formulated by the sentenced to alternative penalties that wish to reconvert it to prison sentence, in open conditions, for this being softer than that. The Superior Court, once again, posed itself on the subject, denying the subjective right to choose the form of execution of the sentence imposed. The problem lies in the fact that this decision dismissed the request stating that only the reconversion based on non-compliance with the alternative penalty would be possible, that is, only the formal reconversion would be possible. Such decision eventually offered the solution to these sentenced: it suffices be non-compliant to the alternative penalty imposed that it will be reconverted into prison sentence in open conditions. Thus, in order for the Superior Court's decision to be effective, other grounds should be taken into account, such as the purpose of the sentence, the principle of individualization of punishment, and how the house arrest under open conditions works, in practice. For the development of this monograph, a large bibliography was used, encompassing scientific articles, works by several authors, theses, legislation and jurisprudence of various courts.

Keywords: Alternative penalties; prison sentences; reconversion request; purpose of the

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BNMP Banco Nacional de Monitoramento de Prisões CF Constituição Federal

CP Código Penal

CTC Comissão Técnica de Classificação Des. Desembargador

HC Habeas Corpus

LEP Lei de Execuções Penais Min. Ministro

RDD Regime Disciplinar Diferenciado REsp Recurso Especial

STF Supremo Tribunal Federal STJ Superior Tribunal de Justiça

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1 INTRODUÇÃO ………. 13

2 DAS PENAS: CONCEITO, ESPÉCIES E FINALIDADES ………. 15

2.1 Conceito e evolução histórica de pena ………. 15

2.2 Finalidades da pena ...……… 17

2.3 Espécies de pena ……….... 19

2.3.1 Penas privativas de liberdade ………. 19

2.3.1.1 Regime fechado ………... 20

2.3.1.2 Regime semiaberto ………...………... 22

2.3.1.3 Regime aberto ………. 23

2.3.2 Penas restritivas de direitos ……….... 24

2.3.2.1 Prestação pecuniária ……….. 25

2.3.2.2 Perda de bens e valores ……….. 25

2.3.2.3 Prestação de serviço à comunidade ……….... 26

2.3.2.4 Interdição temporária de direitos ………... 26

2.3.2.5 Limitação de fim de semana ………....… 27

2.4 A substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos ………...………...………. 28

3 PRINCÍPIO DA INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA ……….... 31

3.1 Noções gerais de princípios penais ………...…………....……….... 31

3.2 As etapas da individualização da pena ……… 34

3.2.1 Fase legislativa ………... 35

3.2.2 Fase judicial ……….……….. 37

3.2.3 Fase executória ……….. 40

3.2.3.1 Mecanismos de individualização da pena na fase executória ……….... 41

3.2.3.1.1 A Comissão Técnica de Classificação ……… 41

3.2.3.1.2 Progressão e regressão de regime ………... 42

3.2.3.1.3 Livramento condicional ……….. 43

3.2.3.1.4 Indulto ………. 45

4 O PEDIDO DE RECONVERSÃO DA PENA RESTRITIVA DE DIREITOS EM PRIVATIVA DE LIBERDADE ………...…….... 46

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4.2.1 A solução do Superior Tribunal de Justiça ………... 48

4.3 A prisão domiciliar no regime aberto ……….. 50

4.4 A individualização da pena no pedido de reconversão ……….. 51

4.5 As finalidades da pena na execução excepcional do regime aberto …….. 53

5 CONCLUSÃO ………... 55

(13)

1 INTRODUÇÃO

Em 2016, O Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do Habeas Corpus nº 298.465/RS, decidiu ser possível a concessão de prisão domiciliar ao apenado que está no regime aberto quando verificada a falta de vagas em estabelecimentos adequados ao regime, quais sejam, as Casas de Albergado.

É importante ressaltar que, em grande parte das Comarcas, não há Casa de Albergado ou estas encontram-se sobrecarregadas ou em condições precárias, sendo insuficientes para abrigar o crescente número de apenados que cumpre pena em regime aberto. Assim, esses apenados acabam cumprindo suas penas sob o regime de prisão domiciliar, no qual quase não há fiscalização.

No entanto, começaram a aparecer pedidos de condenados que cumpriam penas restritivas de direitos que queriam reconverter suas penas para uma privativa de liberdade, em regime aberto, a fim de ficarem em prisão domiciliar. É notório que cumprir pena nesse regime acaba sendo mais vantajoso que cumprir, por exemplo, uma prestação de serviço à comunidade ou uma prestação pecuniária.

A problemática reside no julgado da 5ª Turma do STJ (REsp º 1.524.484/PE), o qual traça que não existe qualquer direito subjetivo do condenado quanto à escolha entre a sanção alternativa e a pena privativa de liberdade. Foi explicado, na decisão, que a única hipótese de reconversão existente seria a formal, ou seja, por descumprimento à(s) pena(s) alternativa(s) imposta(s).

Tal julgado acabou por oferecer a solução a estes apenados: basta descumprir a pena alternativa imposta que esta será convertida em pena privativa de liberdade. Desse modo, para que a decisão da Corte Superior fosse dotada de eficácia, outros fundamentos deveriam ter sido levados em consideração, como as finalidades da pena, o princípio da individualização da pena, e o modo de funcionamento, na prática, da prisão domiciliar no regime aberto.

O objetivo do presente trabalho é analisar criticamente a decisão do Superior Tribunal de Justiça, apontando outros fatores que seriam determinantes no indeferimento do pedido mas que não foram utilizados.

O referido tema foi escolhido em razão de minha atuação como estagiário do Ministério Público Estadual. Durante o estágio deparei-me com esse assunto em um processo e, ao tentar procurar jurisprudências ou artigos acadêmicos sobre o assunto, pouco pude avistar.

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Como é um tema pouco conhecido e, consequentemente, pouco debatido, faz-se necessário construir uma linha de raciocínio sobre o mesmo, apontando o motivo pelo qual esse pedido ocorre, os argumentos trazidos na decisão e as consequências do julgamento.

A pesquisa será elaborada a partir da legislação nacional pertinente, precipuamente o Código Penal e a Lei de Execuções Penais, de estudos jurídicos existentes e jurisprudência que corresponda ao tema. Far-se-á a coleta de dados e informações de livros, artigos publicados em revistas especializadas, acórdãos de tribunais superiores, textos publicados na Internet, além de outros canais de informações jurídicas.

No primeiro capítulo, serão analisados, o conceito contemporâneo de pena e sua evolução histórica, as finalidades da pena, no tocante às teorias absoluta ou repressiva, relativa ou preventiva e mista, e as espécies de pena privativa de liberdade e de pena restritiva de direitos.

No segundo capítulo, será estudado o princípio da individualização da pena, como princípio limitador do poder punitivo do Estado, suas três fases, com ênfase na fase executória, e suas manifestações na forma de mecanismos de individualização da pena.

No último capítulo, será examinado problema da falta de Casas de Albergado e suas consequências no âmbito jurídico, e a decisão de indeferimento do pedido de reconversão proferido pelo STJ. Além disso, serão analisados fundamentos que dotariam tal decisão da eficácia necessária para o devido indeferimento.

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2 DAS PENAS: CONCEITO, ESPÉCIES E FINALIDADES

2.1 Conceito e evolução histórica de pena

Em termos gerais, pode-se compreender o termo ‘pena’ como sendo a imposição de uma sanção, como resposta ao descumprimento de um preceito jurídico, caracterizando-se pela perda ou diminuição de um bem jurídica, e tendo como finalidades a retribuição, a prevenção e a ressocialização.

Fernando Capez conceitua pena como sendo uma:

Sanção penal de caráter aflitivo, imposta pelo Estado, em execução de uma sentença, ao culpado pela prática de uma infração penal, consistente na restrição ou privação de um bem jurídico, cuja finalidade é aplicar a retribuição punitiva ao delinqüente, promover a sua readaptação social e prevenir novas transgressões pela intimidação dirigida à coletividade.1

Já Guilherme Nucci traz um conceito mais sintético: “trata-se da sanção imposta pelo Estado, valendo-se do devido processo legal, ao autor da infração penal, como retribuição ao delito perpetrado e prevenção a novos crimes”2.

Percebe-se, a partir da leitura das definições trazidas, que o conceito contemporâneo de pena se relaciona fortemente com suas finalidades retributiva e preventiva. Contudo, o conceito que conhecemos hoje é fruto de uma longa evolução do sistema de punições, que teve seu começo nas primeiras sociedades humanas.

As sociedades primitivas acreditavam que as punições aplicadas aos infratores serviam para aplacar a ira dos deuses ante aos crimes cometidos. Nessa época, a forma de retribuição mais aplicada era a de banimento, pois, assim, a comunidade era poupada da ira divina. Esse estilo de pena visava-se satisfazer a vontade dos deuses adorados por essas sociedades.

Com o avanço das sociedades e a crescente centralização do poder, a retribuição procurada não ocorria mais em nome dos deuses, e sim da vítima, de sua família, clã ou tribo. Todos os indivíduos relacionados à vítima se sentiam no direito de se vingarem pelo crime cometido, e, por diversas vezes, esse ciclo de vingança levava à extinção de famílias e tribos inteiras. Neste contexto, surge o Código de Hamurabi, que trazia novas formas de retribuição.

1 CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal: parte geral. 6.ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 332.

2 NUCCI, Guilherme de Souza. Individualização da pena. 6. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 55.

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Baseado na lei de talião, o Código de Hamurabi estabelecia que a sanção aplicada deveria ser proporcional ao crime cometido; o mal causado pelo infrator gerava uma punição da mesma espécie e intensidade. “Não é preciso ressaltar serem as sanções brutais, cruéis e sem qualquer finalidade útil, a não ser apaziguar os ânimos da comunidade, acirrados pela prática da infração grave.”3 Com o tempo, tornou-se comum a estipulação de pagamento em

pecúnia ou animais, fenômeno chamado de composição.

Também pôde-se constatar que, em diversas culturas, o direito penal era imposto por sacerdotes, principalmente em sociedades teocráticas. Nestes casos, a punição tinha um caráter religioso e, como o talião, possuía uma forte tendência retributiva, motivos pelos quais foi chamada de ‘vingança divina’. Aqui preponderava também a visão de que o crime era como um pecado, que feria a vontade de um deus, e, portanto, a punição era tida como um castigo divino que servia para purificar e salvar a alma do pecador.

Posteriormente, com o crescimento do Poder Estatal, surgiram as figuras dos chefes e das assembleias, sobretudo na Roma Antiga, deixando de lado o caráter privado e voltando-se mais para o caráter público. Nesse momento da história romana, a punição é aplicada pela autoridade pública, que buscava proteger a ordem jurídica estabelecida e guardada pelo Estado4.

Contudo, foi com o advento do Iluminismo, no final do século XVIII, que o direito penal pôde se desenvolver e se transformar, servindo de base para o sistema punitivo moderno. Dentre os maiores pensadores da época, destacaram-se Locke, Montesquieu, Bentham, Rousseau e Voltaire, mas foi a obra Dei Delitti e Delle Pene (“Dos Delitos e Das Penas”), de Beccaria, que inovou o meio de interpretação das penas. Seus ensinamentos foram utilizados, inclusive, na Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1789, cujos princípios servem de pilares para o Direito Penal contemporâneo.

O pensamento iluminista trouxe críticas contundentes ao sistema judiciário da época, marcado pela severidade desproporcional, pelo terrorismo punitivo, e também por sua ineficácia. Beccaria buscou trazer um caráter mais humanista às penas, censurando o seu caráter vingativo e a pena de morte, e defendendo o direito de defesa a todos os criminosos.

Além disso, também defendia a tipificação do Direito Penal vigente, em linguagem acessível à população, tendo em vista que não eram especificados quais tipos de pena seriam aplicadas a quais delitos, ilustrando o grau de arbitrariedade dos aplicadores da lei na época.

3 NUCCI, Guilherme de Souza. Op. cit., p. 58.

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Os ideais de liberdade, igualdade e fraternidade, nascidos com o Iluminismo, espalharam-se pela Europa, culminando na Revolução Francesa de 1789, período no qual a pena passou a se revestir de proporcionalidade com o delito praticado. Em síntese, Paolo Prodi ensina que:

das obras de grandes pensadores iluministas e elaboradores de princípios iluminados no projeto de uma sociedade baseada na razão e nas reformas penais nascem as grandes indicações sobre a soberania da lei, sobre a defesa dos direitos subjetivos e, em particular, sobre as garantias necessárias no processo penal e sobre a oportunidade de racionalizar as penas numa relação o mais objetiva possível com a gravidade do delito e o dano infligido à sociedade, repudiando a barbárie da pena como vingança.5

É válido ressaltar que foi durante o período Iluminista, principalmente a partir do pensamento de Beccaria, que diversos estudiosos passaram a estudar as finalidades das penas, que estão intimamente conectadas aos objetivos do Direito Penal e da própria definição de crime. Assim, faz-se necessário tratar das teorias elaboradas para explicar as finalidades das penas.

2.2 Finalidades da pena

Conforme dito acima, antes do Iluminismo, os estudiosos penalistas pouco se preocupavam com os objetivos da pena em si, limitando-se apenas a buscar a melhor forma de punir o criminoso, e era esse o pensamento que fundamentava a teoria absoluta. De acordo com essa teoria, a pena era um fim em si mesma, sendo o principal objetivo a retribuição pelo mal praticado. Foram adeptos a esse pensamento Kant e Hegel.

Defendida pela escola clássica, da qual Beccaria fez parte, a teoria absoluta enxergava apenas a figura da pena, deixando o criminoso de lado. A sanção servia apenas para reparar o dano causado pelo crime e deveria ser proporcional à culpabilidade do agente, de modo a estabelecer limites às penas.

Acerca dessa teoria, Luiz Regis Prado ensina que

Fundamentam a existência da pena unicamente no delito praticado (punitur quia peccatum est). A pena é retribuição, ou seja, compensação do mal causado pelo crime. É decorrente de uma exigência de justiça, seja como compensação da

5 PRODI, Paolo. Uma história da justiça do pluralismo dos tribunais ao moderno dualismo entre a

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culpabilidade, punição pela transgressão do direito (teoria da retribuição), seja como expiação do agente (teoria da expiação).6

Apesar da teoria absoluta ter sido concebida há séculos, é fácil observar resquícios desse pensamento nas sociedades contemporâneas, pois uma parcela da população ainda se satisfaz com a imposição de sofrimento àqueles que cometeram crimes, sem levar em consideração meios mais eficazes de punir e ressocializá-los.

Outra importante teoria é a preventiva ou relativa, cujo propósito é o de prevenir ou inibir o cometimento de delitos e a reincidência. Esta teoria subdivide-se em prevenção geral e prevenção especial, sendo que cada subdivisão pode ser vista sob aspectos negativo ou positivo.

Na prevenção geral negativa, a atuação do Estado se direciona ao ambiente social, de modo que os cidadãos sejam desestimulados a delinquir, por medo da aplicação da sanção, sendo, portanto, uma prevenção por intimidação. Já a faceta positiva essa atuação do Estado tem outro objetivo: “infundir, na consciência geral, a necessidade de respeito a determinados valores, exercitando a fidelidade ao direito; promovendo, em última análise, a integração social”7.

A prevenção especial, por sua vez, é destinada especificamente ao condenado, de modo a diminuir a reincidência. Caracteriza-se como negativa quando retira o agente da sociedade, segregando-o ao cárcere, e impedindo que cometa novos delitos. Já na prevenção especial positiva, a finalidade da pena é ressocializar o indivíduo, fazendo com que reflita sobre seus atos e inibindo, por escolha própria, a reincidência.

Em suma, as teorias absolutas veem a pena como um fim em si própria, ao passo que as teorias preventivas enxergam uma utilidade na aplicação da pena, voltada à prevenção do crime.

A teoria adotada no Brasil é uma junção das descritas acima, e é chamada de teoria mista, eclética ou unificadora. A parte final do art. 59 do Código Penal preceitua que a pena será fixada pelo magistrado conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime. Observa-se, assim, a união do caráter retributivo, das teorias absolutistas, com o caráter preventivo, das teorias relativas.

Também é possível contemplar outra peculiaridade da teoria mista, em se tratando do caráter ressocializador da pena, como foi previsto no art. 1º da Lei de Execuções Penais,

6 PRADO, Luiz Regis. Teoria dos fins da pena: breves reflexões. Revista dos Tribunais Online, v. 0, p. 143, jan. 2004.

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no qual é dito que a execução da pena objetiva proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado.

Ao tratar da teoria mista, Cezar Roberto Bitencourt afirma que:

As teorias mistas ou unificadoras tentam agrupar em um conceito único os fins da pena. Esta corrente tenta escolher os aspectos mais destacados das teorias absolutas e relativas. Merkel foi, no começa do século, o iniciador desta teoria eclética na Alemanha, e, desde então, é a opinião mais ou menos dominante. No dizer de Mir Puig, entende-se que a retribuição, a prevenção geral e a prevenção especial são distintos aspectos de um mesmo e complexo fenômeno que é a pena.8

Diante de todo o exposto acerca das finalidades da pena, pode-se concluir que o aspecto multidimensional da pena, adotado pelo ordenamento jurídico brasileiro, é indispensável para a reprovação das condutas criminosas, na prevenção de novos delitos, e na capacidade de reintegrar os condenados à sociedade.

2.3 Espécies de pena

As espécies de pena encontram-se expressas no art. 32 do Código Penal, e são divididas em três tipos: penas privativas de liberdade, penas restritivas de direitos e pena de multa.

Não se mostra pertinente, para o desenvolvimento do presente trabalho, a abordagem da pena de multa, visto que o tema se refere ao pedido de reconversão da pena restritiva de direitos em privativa de liberdade. Apesar de sua importância na seara da Execução Penal como forma de retribuição ao crime cometido, com o objetivo de melhor analisar o tema da presente monografia, não será debatida a pena de multa.

2.3.1 Penas privativas de liberdade

Consideram-se penas privativas de liberdade aquelas que retiram do sentenciado o seu direito de locomoção por tempo determinado. O Código Penal traz duas modalidades deste tipo de pena em seu art. 33, caput, quais sejam, as penas de reclusão e de detenção. A Lei das Contravenções Penais (Decreto-Lei nº 3.688/41), por sua vez, também traz uma

8 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: parte geral, 1. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 88.

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modalidade, a de prisão simples, elencada no art. 5º, inciso I, da referida lei. Cabe, portanto, diferenciar os três tipos de privação de liberdade.

A pena de reclusão, nos termos do art. 33, caput, do Código Penal, deve ser cumprida em regime fechado, semiaberto ou aberto, enquanto que a pena de detenção deve ser cumprida em regime semiaberto ou aberto, salvo necessidade de transferência a regime fechado.

Outra diferenciação entre esses dois tipos é que, no caso de concurso material, aplicando-se cumulativamente as penas de reclusão e de detenção, executa-se primeiro aquela (arts. 69, caput, e 76 do Código Penal9).

É possível encontrar a reclusão e a detenção como formas de sanção a diversos crimes previstos no Código Penal. Contudo, o Direito Penal não é o único que se utiliza desses meios punitivos. Na Lei de Crimes Ambientais (Lei nº 9.605/98) são tipificadas várias condutas puníveis com reclusão (v.g.: provocar incêndio em mata ou floresta). Já o Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90) impõe pena de detenção para os crimes nele tipificados (v.g.: fazer ou promover publicidade que sabe ou deveria saber ser enganosa ou abusiva).

A pena de prisão simples, por sua vez, está prevista na Lei de Contravenções Penais e, consequentemente, só se aplicam às condutas descritas como contravenções. É, portanto, medida sancionatória a infrações penais de menor gravidade, e deve ser cumprida, nos termos do art. 6º do referido Decreto-Lei, em estabelecimento especial ou seção especial de prisão comum, em regime semi-aberto ou aberto.

Para melhor compreensão dos regimes de cumprimento de pena citados, faz-se premente abordar suas peculiaridades, para, ao fim, tratar de suas diversas finalidades.

2.3.1.1 Regime fechado

Considera-se regime fechado, de acordo com o art. 33, § 1º, “a”, do Código Penal, a execução da pena em estabelecimento de segurança máxima ou média, dependendo da gravidade do delito. Além disso, o condenado a pena superior a oito anos reclusão deverá começar seu cumprimento neste regime, como dispõe o art. 33, § 2º, “a”, da referida lei. Não

9 “Art. 69, CP: Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplicam-se cumulativamente as penas privativas de liberdade em que haja incorrido. No caso de aplicação cumulativa de penas de reclusão e de detenção, executa-se primeiro aquela.”

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obstante, o Magistrado também pode fixar o regime inicial fechado ao condenado a pena inferior a oito anos, a depender do processo de dosimetria da pena.

Acerca dos estabelecimentos penitenciários onde os condenados ficam recolhidos, dispõe a LEP que estes serão alojados em celas individuais com dormitório, aparelho sanitário e lavatório. Estas celas, em tese, deverão possuir aeração, insolação e condicionamento térmico adequados à existência humana, como propõe o art. 88 da LEP.

No entanto, não é o que se observa nas penitenciárias brasileiras. Sobre o tema, Rogério Greco faz a seguinte crítica:

Não é preciso ser operador do direito para ter perfeita noção de que não há cela individual e os presos, na maior parte dos estabelecimentos penais, ficam amontoados em lugares insalubres e pequenos. Diante desse quadro estarrecedor, como se pode dizer que o Estado brasileiro respeita o princípio da humanidade, não aplicando penas cruéis? O Judiciário tem perfeita ciência dessa realidade, mas nada faz de concreto, não interditando presídios desse péssimo nível, sob o argumento de que o ruim pode ficar pior. Com essa complacência de um Poder de Estado em relação ao desleixo do outro, a situação carcerária não sai do lugar.10

Além disso, é próprio do regime fechado que o condenado seja submetido a exame criminológico para obtenção dos elementos necessários a uma adequada classificação e com o objetivo de tornar a execução individualizada, como preveem os arts. 34, caput, do Código Penal, e 8º, caput, da LEP.

Conforme o art. 34, §§ 1º a 3º, do CP, uma vez ingresso no regime fechado, o condenado fica sujeito a trabalho durante a manhã e a isolamento durante a noite, conforme suas aptidões ou ocupações anteriores, contanto que o trabalho seja compatível com a execução de sua pena, como forma de garantir o direito ao trabalho ao preso.

Admite-se, inclusive, que o condenado em regime fechado exerça trabalho externo em serviços ou obras públicas realizadas por órgãos da Administração Pública ou por entidades privadas, sob a condição de que sejam tomadas as cautelas para evitar fugas e para manter a disciplina (art. 36, caput, da LEP).

Por fim, destaca-se a presença do Regime Disciplinar Diferenciado (RDD). Criado pela Lei nº 10.792/03, o RDD consiste em uma forma de cumprimento excepcional no regime fechado, no qual o apenado, seja ele provisório ou condenado, permanece em isolamento, tendo seus direitos de visita e de saída restringidos.

10 NUCCI, Guilherme de Souza. Curso de direito penal: parte geral: arts. 1º a 120 do Código Penal. Rio de Janeiro: Forense, 2017, p. 761.

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Este regime diferenciado pode possuir natureza de sanção disciplinar, no caso do art. 52, caput, da LEP11, ou natureza de medida cautelar, no caso do art. 52, § 1º e § 2º da mesma lei12. Ele pode durar até trezentos e sessenta dias, podendo se repetir por nova falta grave de mesma espécie, até o limite de um sexto da pena aplicada. As visitas são restritas a duas pessoas semanalmente, sem contar crianças, com duração de duas horas, enquanto que a saída da cela é restrita a duas horas diárias para banho de sol.

2.3.1.2 Regime semiaberto

A pena no regime semiaberto deve ser executada em colônia agrícola, industrial, ou estabelecimento similar, e destina-se, inicialmente, aos condenados não reincidentes a penas de reclusão entre quatro e oito anos e aos condenados a penas de detenção, conforme art. 33, caput e § 1º, “b”, do CP.

Ademais, o condenado que inicia o cumprimento de pena em regime semiaberto deve ser submetido ao exame criminológico para individualização de sua execução, da mesma forma como ocorre no regime fechado. No entanto, a Lei de Execuções Penais dispõe que a realização deste exame é facultativo para os que ingressam no semiaberto.

No período diurno, o apenado deve trabalhar na colônia agrícola, industrial, ou estabelecimento similar onde estiver recolhido, sendo permitido o trabalho externo e, inclusive, a freqüência a cursos supletivos profissionalizantes, de instrução de segundo grau ou superior, como preleciona o art. 36, § 1º e § 2º.

No entanto, a realidade é totalmente diferente do que a legislação prevê, em se tratando do regime semiaberto, pois não há locais suficientes para acolher tamanho número de condenados. Grande parte deles acabam ficando recolhidos em estabelecimentos penitenciários destinados ao regime fechado, e, quando há colônias disponíveis, elas acabam funcionando como casas de albergado, em que o apenado sai para realizar trabalho externo pela manhã e permanece recolhido à noite.

11 “Art. 52, LEP: A prática de fato previsto como crime doloso constitui falta grave e, quando ocasione subversão da ordem ou disciplina internas, sujeita o preso provisório, ou condenado, sem prejuízo da sanção penal, ao regime disciplinar diferenciado [...]”

12 “Art. 52, LEP. § 1o: O regime disciplinar diferenciado também poderá abrigar presos provisórios ou condenados, nacionais ou estrangeiros, que apresentem alto risco para a ordem e a segurança do estabelecimento penal ou da sociedade. § 2o Estará igualmente sujeito ao regime disciplinar diferenciado o preso provisório ou o condenado sob o qual recaiam fundadas suspeitas de envolvimento ou participação, a qualquer título, em organizações criminosas, quadrilha ou bando.”

(23)

Para se ter uma ideia, hoje existem cerca de 74 colônias agrícolas, industriais ou similares no Brasil13, enquanto que, pelos dados do Banco Nacional de Monitoramento de Prisões (BNMP 2.0) do dia 06 de agosto de 2018, o número de condenados ao regime semiaberto ultrapassa 86 mil14. Ou seja, em cada colônia deveriam ficar recolhidos, em média,

mais de 1100 condenados, o que tornaria inviável o cumprimento de suas penas.

2.3.1.3 Regime aberto

Caracterizado por uma maior inserção do condenado na sociedade, a execução da pena em regime aberto é realizada nas Casas de Albergado, e destina-se, inicialmente, a sentenciados a pena inferior a quatro anos e, também, aos condenados a pena de detenção, como prevê o art. 33, caput e § 1º, “c”, do CP.

A lei prevê que em cada região haverá pelo menos, uma Casa de Albergado, a qual deverá conter, além dos aposentos para acomodar os apenados, local adequado para cursos e palestras, e deverá situar-se em centro urbano, separada dos demais estabelecimentos, sem obstáculos físicos contra fuga, nos termos dos arts. 94 e 95 da LEP.

Além disso, o apenado só ficará recolhido no período noturno, visto que, pela manhã, o mesmo deverá trabalhar, frequentar curso ou exercer outra atividade autorizada fora do estabelecimento e sem vigilância. Assim dispõe o art. 36, § 1º, do CP, ilustrando a autodisciplina e o senso de responsabilidade do condenado que devem servir de base ao regime aberto.

Contudo, é ínfimo o número de Casas de Albergado no Brasil, em relação ao número de condenados em regime aberto. Adeildo Nunes critica a inexistência desses estabelecimentos ao afirmar que:

Embora LEP tenha sido aprovada em 1984, esses estabelecimentos penais jamais foram construídos em todo o território nacional, motivo pelo qual é fácil concluir que o regime aberto, no Brasil, simplesmente inexiste, diante da ausência injustificada dessas casas, que deveriam servir para acomodar aqueles que iniciam o cumprimento da pena em regime aberto ou que atingem o regime pela progressão. Nem a União nem os estados, infelizmente, desde a aprovação da LEP,

13 BRASIL. Projeto transfere recursos do Fundo Penitenciário para construção de colônias agrícolas e industriais.

Câmara dos Deputados, Brasília, 2019. Disponível em

<https://www2.camara.leg.br/camaranoticias/noticias/SEGURANCA/570860-PROJETO-TRANSFERE- RECURSOS-DO-FUNDO-PENITENCIARIO-PARA-CONSTRUCAO-DE-COLONIAS-AGRICOLAS-E-INDUSTRIAIS.html>. Acesso em: 13 abr. 2019.

14 BRASIL. Banco Nacional de Monitoramento de Prisões – BNMP 2.0: Cadastro Nacional de Presos. Conselho

Nacional de Justiça, Brasília, agosto de 2018. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/files/conteudo

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demonstraram vontade política para a construção e a manutenção dessas casas, que, como se viu, também devem ser utilizadas por aqueles que são submetidos à limitação de fim de semana, que é uma pena restritiva de direitos.15

As soluções judiciais da falta de estabelecimento adequado para execução da pena em regime aberto serão tratadas mais adiante, dentro da problemática que gerou o tema do presente trabalho.

2.3.2 Penas restritivas de direitos

As penas restritivas de direitos caracterizam-se por serem sanções penais autônomas e substitutivas, em razão de substituírem pena privativa de liberdade, por decisão do juiz em sede de sentença condenatória, e em razão de remanescerem após ter havido a substituição.

Apesar do caráter substitutivo, é possível encontrar tipos penais em que a pena alternativa é aplicada cumulativamente com a pena privativa de liberdade. Um exemplo é o disposto no art. 292 do Código de Trânsito Brasileiro (Lei nº 9.503/97), no qual é disposto que “a suspensão ou a proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor pode ser imposta isolada ou cumulativamente com outras penalidades.”

Outra exceção ao caráter substitutivo é a trazida pelo art. 28 da Lei de Tóxicos. Tal artigo trouxe a tipificação da posse de droga para consumo pessoal, contudo, não não foi estipulada aplicação de pena privativa de liberdade, apenas de penas restritivas de direitos, senão vejamos:

Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas:

I - advertência sobre os efeitos das drogas; II - prestação de serviços à comunidade;

III - medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.

Ante o exposto, cabe analisar os tipos de penas restritivas de direitos elencados no art. 43 do Código Penal, quais sejam, a prestação pecuniária, a perda de bens e valores, a prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas, a interdição temporária de direitos e a limitação de fim de semana.

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2.3.2.1 Prestação pecuniária

Criada pela Lei nº 9.714/98 e expressa no art. 45, § 1º, do CP, a prestação pecuniária consiste no pagamento em dinheiro à vítima, a seus dependentes ou a entidade pública ou privada com destinação social, de importância fixada pelo juiz, com valor entre 1 e 360 salários mínimos. Tal sanção, quando o pagamento é feito à vítima ou a seu dependente, visa antecipar a reparação do dano causado pelo crime àquela.

No entanto, o § 2º do art. 45 faz uma observação de que, se aceito pelo beneficiário, a prestação pecuniária pode consistir em prestação de outra natureza. Essa disposição gerou controvérsias na interpretação da expressão ‘prestação de outra natureza’, pois:

Ao estabelecer ser possível essa substituição, deu-se origem a uma pena indeterminada, que se pode tornar ilegal, quando abusiva e inadequada. O juiz está autorizado a transformar a prestação em pecúnia em prestação de outra natureza, ou seja, de natureza não pecuniária, podendo representar a entrega de um bem ou valor (o que a confundirá com a perda de bem ou valor), equivalente ao montante da prestação (1 a 360 salários mínimos, conforme a fixação do magistrado), ou mesmo, segundo informou a Exposição de Motivos da Lei 9.714/98, consistente em entrega de cestas básicas ou fornecimento de mão de obra.16

Já uma parte da doutrina entende que, por se tratar de pena indeterminada, essa prestação de outra natureza seria inconstitucional, em razão de ir contra o princípio constitucional da legalidade. De qualquer forma, não são raros os casos em que o apenado não possui condições financeiras para arcar com a prestação pecuniária. Nesses casos, os tribunais trazem duas soluções: o parcelamento da pena, a fim de que se adeque à situação econômica do apenado17, ou sua conversão em pena privativa de liberdade18.

2.3.2.2 Perda de bens e valores

Quanto à pena de perda de bens e valores, esta consiste em uma sanção de natureza confiscatória, em favor do Fundo Penitenciário Nacional, que recai sobre os bens e valores de origem lícita do condenado, sendo o limite dessa sanção o prejuízo total causado

16 NUCCI, Guilherme de Souza. Individualização da pena. 6. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 292.

17 Vide julgado “TJ-GO - APR: 342218920168090044, Relator: DES. LEANDRO CRISPIM, Data de Julgamento: 29/05/2018, 2A CAMARA CRIMINAL, Data de Publicação: DJ 2522 de 12/06/2018”.

18 Vide julgado “STJ - HC: 431009 RS 2017/0334262-0, Relator: Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, Data de Publicação: DJ 21/03/2018”.

(26)

pelo crime ou o proveito obtido pelo agente ou por terceiro, nos termos do art. 45, § 3º, do CP. Tal pena não se confunde com o confisco dos instrumentos e produtos do crime, pois trata-se de efeito genérico da condenação, previsto no art. 91, II, do CP19.

2.3.2.3 Prestação de serviço à comunidade

Seguindo a ordem do art. 43 do CP, tem-se uma das mais relevantes penas restritivas de direitos no ordenamento jurídico brasileiro: a prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas. Essa pena consiste na atribuição de tarefas gratuitas ao condenado em uma entidade assistencial, hospital, orfanato ou outro estabelecimento semelhante, em programas comunitários ou estatais.

As tarefas devem ser atribuídas conforme as aptidões do condenado, e o prazo de execução da reprimenda será fixado à razão de uma hora por dia de condenação. É essencial que não seja prejudicada a jornada normal de trabalho do apenado, a fim de que possa manter seu sustento, como dispõe o art. 46 do referido Código.

A fiscalização do cumprimento dessa sanção recai sobre a entidade beneficiada pelos serviços do condenado, devendo encaminhar mensalmente, ao Juízo da execução, relatório circunstanciado das atividades do condenado, bem como, a qualquer tempo, comunicação sobre ausência ou falta disciplinar, nos termos do art. 150 da LEP.

Nesta espécie de pena alternativa, prepondera como finalidade o caráter retributivo da punição, tendo em vista que, se cumprida com eficiência, a prestação de serviço à comunidade permite que o autor do crime repare o dano causado por meio de seu trabalho. Também merece destaque sua natureza ressocializadora, fundamental para a integração do apenado na comunidade beneficiada por seu trabalho.

2.3.2.4 Interdição temporária de direitos

Outra pena restritiva de direitos disposta no Código Penal é a interdição temporária de direitos. Ao contrário das outras penas alternativas, esta é específica, aplicando-se apenas a determinados crimes, e consistindo na restrição temporária do exercício de determinada função ou atividade relacionada ao crime praticado.

19 “Art. 91, CP: São efeitos da condenação: [...] II - a perda em favor da União, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé: a) dos instrumentos do crime, desde que consistam em coisas cujo fabrico, alienação, uso, porte ou detenção constitua fato ilícito; b) do produto do crime ou de qualquer bem ou valor que constitua proveito auferido pelo agente com a prática do fato criminoso.”

(27)

As penas de interdição temporária de direitos são, conforme o art. 47 do CP: I) proibição do exercício de cargo, função ou atividade pública, bem como de mandato eletivo, aplicada a fatos delituosos relacionados ao exercício funcional (art. 56 do CP20);

II) proibição do exercício de profissão, atividade ou ofício que dependam de habilitação especial, de licença ou autorização do poder público, no mesmo prisma profissional/funcional trazido no inciso anterior;

III) suspensão da autorização ou de habilitação para dirigir veículo, aplicável aos crimes de trânsito, como determina o art. 57 do CP21;

IV) proibição de frequentar determinados lugares, que, na opinião de Nucci, “afigura liberalização indevida e extremada do caráter repressor da pena – e mesmo preventivo, por falta de intimidação necessária, nem tampouco efeito reeducativo”22;

V) proibição de inscrever-se em concurso, avaliação ou exame público, criada pela Lei nº 12.550/11 como punição ao crime de fraude em certame de interesse público, previsto no art. 311-A do CP.

2.3.2.5 Limitação de fim de semana

Por fim, há a pena de limitação de fim de semana, que consiste na imposição de que o condenado permaneça, aos sábados e domingos, por cinco horas diárias, em Casa de Albergado ou outro estabelecimento adequado, onde poderão ser ministrados cursos e palestras ou atribuídas atividades educativas.

Na prática, essa pena alternativa tem se mostrado ineficiente pelo mesmo motivo presente no regime aberto: a inexistência de Casas de Albergado suficientes. Se fosse corretamente aplicada, essa sanção evitaria que o condenado se afastasse de sua família, do trabalho e de outras atividades eventualmente desenvolvidas, além da diminuição da

20 “Art. 56, CP: As penas de interdição, previstas nos incisos I e II do art. 47 deste Código, aplicam-se para todo o crime cometido no exercício de profissão, atividade, ofício, cargo ou função, sempre que houver violação dos deveres que lhes são inerentes.”

21 “Art. 57, CP: A pena de interdição, prevista no inciso III do art. 47 deste Código, aplica-se aos crimes culposos de trânsito.”

22 NUCCI, Guilherme de Souza. Individualização da pena. 6. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 290.

(28)

segregação social ocasionada com a pena privativa de liberdade e da redução de gastos públicos, como infraestrutura penitenciária23.

2.4 A substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito.

A substituição da pena ocorre, no Brasil, principalmente, para tentar desafogar o já caótico sistema prisional que aqui existe. A realidade subumana dos estabelecimentos penitenciários brasileiro impede que a função ressocializadora seja efetivamente cumprida. Além disso, cada estado possui sua própria forma de organizar o sistema judicial de fiscalização do cumprimento de pena, o que, por vezes, dificulta a atuação do Governo Federal.

A solução encontrada foi a adoção das penas restritivas de direitos, em substituição às penas privativas de liberdade. Seu principal fundamento está na proteção à dignidade da pessoa humana, proporcionando ao condenado uma chance de permanecer no seio familiar e no seu trabalho. Caracteriza-se, inclusive, por ser uma importante ferramenta na prevenção da criminalidade e na diminuição da reincidência.

Para que o magistrado possa substituir a pena privativa de liberdade imposta por pena restritiva de direitos, no momento da sentença, é necessário que o condenado preencha os requisitos objetivos e subjetivos presentes no art. 44 do Código Penal, que segue:

Art. 44. As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade, quando: I – aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou, qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo; II – o réu não for reincidente em crime doloso; III – a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente.

Os requisitos objetivos referem-se à quantidade da pena aplicada e à natureza do crime cometido. É necessário que a pena privativa de liberdade aplicada tenha montante igual ou inferior a quatro anos, no caso de condenação por crime doloso cometido sem violência ou grave ameaça. Caso a condenação seja por crime culposo, é possível haver substituição sem qualquer ressalva em relação ao tempo da pena aplicada.

23 TABOSA, Gabriela Montezuma. Limitação de fim de semana, pena restritiva de direitos e (in)eficiência

de seu cumprimento na Comarca de Macapá-AP. 2014. 50 f.. Dissertação (Trabalho de Conclusão de Curso)

(29)

Há, no entanto, certo debate a respeito dos crimes de menor potencial ofensivo praticados com emprego de violência ou grave ameaça, tendo em vista que uma das finalidades da substituição de pena é propriamente a descarcerização dos condenados a penas de curta duração. Sobre esse tema, Rogério Greco defende que:

se as infrações penais se amoldam àquelas consideradas de menor potencial ofensivo, sendo o seu julgamento realizado até mesmo no Juizado Especial Criminal, seria um verdadeiro contrassenso impedir, justamente nesses casos a substituição. Assim, se a infração penal for da competência do Juizado Especial Criminal, em virtude da pena máxima a ela cominada, entendemos que, mesmo que haja o emprego de violência ou grave ameaça, será possível a substituição.24

Com razão, prevalece o entendimento exposto acima, tendo em vista que, se podem ser aplicados institutos mais benéficos que a substituição, como a composição de danos civis e a transação penal, não seria adequado vedá-la e limitar-se à fixação de regime aberto ou sursis.

O primeiro requisito subjetivo é a não reincidência em crime doloso. Entende-se, a partir da leitura do inciso II do citado art. 44, que a reincidência em crime culposo não impossibilita a substituição da pena. para que ocorra esse óbice, é necessário que o indivíduo tenha sido condenado por um crime doloso e, dentro dos cinco anos seguintes, condenado por outro crime doloso.

Contudo, o § 3º deste artigo apresenta uma exceção a esse impedimento: se o condenado for reincidente em crime doloso, o juiz ainda assim pode substituir sua pena, desde que, em razão de condenação anterior, a medida seja socialmente recomendável e a reincidência não tenha ocorrido pela prática do mesmo crime (reincidência específica).

A concessão desse benefício para condenados reincidentes busca, mais uma vez, atingir sua finalidade de evitar o encarceramento desnecessário daqueles cujas penas são consideradas leves, e impedindo, assim, o contato com o ambiente hostil do sistema penitenciário.

Já o segundo requisito subjetivo prevê que a pena privativa de liberdade será substituída por restritiva de direitos quando a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente. Trata-se, portanto, de análise feita pelo magistrado, que aplicará a substituição para que se atendam os interesses do condenado e da sociedade.

Acerca das finalidades desse requisito, Luiz Flávio Gomes comenta que:

24 GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: parte geral, volume I. 19. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2017, p. 685-686.

(30)

Uma vez mais, deixou o legislador por conta dos operadores jurídicos a tarefa de individualizar o instituto alternativo da substituição em cada caso concreto. É preciso que se faça um juízo de valor sobre a ‘suficiência’ da resposta alternativa ao delito. Essa valoração deve ter em mira a repressão e prevenção do delito. É sempre importante enfatizar que essa valoração deve ser objetiva e descritiva, isto é, fundamentada, para se possibilitar o seu democrático controle.25

Convém apontar que esses requisitos do inciso III do art. 44 fazem parte do rol de circunstâncias judiciais previstas no art. 59 do Código Penal, que trata da primeira fase de dosimetria da pena. Ao final das três fases de fixação da pena, não sendo esta superior a quatro anos e não sendo o condenado reincidente em crime doloso, o magistrado reavalia a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, e decide se concede ou não a substituição da pena.

25 GOMES, Luiz Flávio. Penas e medidas alternativas à prisão. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 116.

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3 PRINCÍPIO DA INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA

3.1 Noções gerais de princípios penais

Todo ordenamento jurídico é composto por normas, que podem ser divididas em princípios e regras, com o objetivo de formar um sistema único, racional e harmonioso. A palavra ‘princípio’ é dotada de diversos significados, importando-nos, no presente momento, apenas seu sentido jurídico. Conforme ensina José Afonso da Silva, “juridicamente, o princípio é uma norma de conteúdo abrangente, servindo de instrumento para a integração, interpretação, conhecimento e aplicação do direito positivo.”26

Já nas palavras do professor Celso Antônio Bandeira de Mello:

Princípio é, pois, por definição, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas, compondo-lhes o espírito e servindo de critério para a exata compreensão e inteligência delas, exatamente porque define a lógica e racionalidade do sistema normativo, conferindo-lhe a tônica que lhe dá sentido harmônico.27

Percebe-se, assim, que o conceito de princípio, qualquer que seja, traz sempre consigo a figura da ideia central de um sistema. A coerência interna de um sistema jurídico decorre dos princípios sobre os quais se organiza.

Os princípios gerais são a harmonização, a organização, os valores idealizados pela sociedade. Já os princípios especiais são uma subdivisão dos princípios jurídicos a serem observados em cada disciplina jurídica, conforme a sua especificidade e finalidade. Eles completam um conjunto normativo, orientam sua aplicação, e têm função informativa, interpretativa e normativa.

Esses princípios não se opõem às normas, mas, sim, funcionam como fontes de direito e revelam a ideia de justiça na aplicação da lei. Assim, prestigiam a segurança jurídica, pois a atividade legislativa e a judicante lhe devem observância, sendo considerados norma de introdução ao sistema jurídica brasileiro.

No âmbito do Direito Penal, área na qual se baseia o tema do presente trabalho, os princípios constituem, de acordo com Guilherme Nucci:

26 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. São Paulo: Malheiros, 1992, p. 85. 27 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 17 ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 451.

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A face orientadora da aplicação das normas abstratamente previstas em lei aos casos concretos emergentes dos conflitos sociais, legitimadores da interveniência do poder repressivo estatal, aplicando, como decorrência, a mais grave das sanções, a penal, formatada através da pena, em suas múltiplas feições.28

Esses princípios penais são, ao mesmo tempo, os fundamentos e as diretrizes do sistema jurídico penal, uma vez que definem as peculiaridades, a natureza e a aplicação da legislação penal. A Constituição Federal de 1988 trouxe diversos princípios informadores do Direito Penal, que integram as garantias dos cidadãos como forma de limitação do poder punitivo do Estado.

Essas limitações ao jus puniendi do Estado são condições essenciais para a existência de qualquer Estado Democrático de Direito, pois este não pode adentrar as esferas de direitos individuais e fundamentais de seus cidadãos de maneira arbitrária. Neste sentido, o entendimento de Bitencourt é de que:

As idéias de igualdade e de liberdade, apanágios do Iluminismo, deram ao Direito Penal um caráter formal menos cruel do que aquele que predominou durante o Estado Absolutista, impondo limites à intervenção estatal nas liberdades individuais. Muitos desses princípios limitadores passaram a integrar os Códigos Penais dos países democráticos e, afinal, receberam assento constitucional, como garantia máxima de respeito aos direitos fundamentais do cidadão. Todos esses princípios, hoje insertos, explícita ou implicitamente, em nossa Constituição (art. 5º), têm a função de orientar o legislador ordinário para a adoção de um sistema de controle penal voltado para os direitos humanos, embasado em um Direito Penal da culpabilidade, um Direito Penal mínimo e garantista.29

A partir do exposto acima, é oportuno destacar alguns princípios constitucionais penais limitadores do poder punitivo estatal, tais como os da dignidade da pessoa humana, da proporcionalidade, da legalidade, da insignificância, da intervenção mínima, da humanidade das penas, e da adequação social.

O princípio da dignidade da pessoa humana, previsto no art. 1º da Constituição Federal, garante que todo cidadão tem direito a um mínimo existencial para uma vida digna, com o atendimento de suas necessidades básicas, e com o devido respeito a sua integridade física, psíquica e moral. Esse princípio, juntamente com o princípio da humanidade das penas, deu fundamento ao art. 5º da Convenção Americana de Direitos Humanos, da qual o Brasil é signatário, exprimindo que “ninguém pode ser submetido a torturas, nem a penas ou tratos

28 NUCCI, Guilherme de Souza. Individualização da pena. 6. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 22-23.

29 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral, 1. 14. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2006, p. 10, grifo no original.

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cruéis, desumanos ou degradantes. Toda pessoa privada de liberdade deve ser tratada com o devido respeito à dignidade inerente ao ser humano.”30

Já o princípio da proporcionalidade conduz que a pena deverá ser proporcional à conduta do agente, tanto no âmbito legislativo quanto no judiciário. O legislador arbitrará as penas mínima e máxima para cada crime, enquanto que o juiz irá analisar os requisitos previsto no art. 59 do Código Penal31, estabelecendo as penas aplicadas dentre as cominadas.

O que se busca com este fundamento é o equilíbrio entre a circunstâncias do delito e a punição imposta.

O princípio da legalidade, previsto no art. 5º, XXXIX, da Constituição Federal e no art. 1º do Código Penal, exprime que não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal. A partir da compreensão desse princípio, verifica-se a sua subdivisão entre os princípios da reserva legal e da anterioridade. Ou seja, qualquer fato que não seja definido expressamente como delito não pode ser considerado como tal. Além disso, é vedada a retroatividade da lei penal, para evitar que fatos pretéritos à vigência da lei sejam criminalizados.

Analisando o princípio da insignificância, também conhecido como princípio da bagatela, percebe-se que se trata de um instrumento de política criminal. Ora, é necessário que a conduta seja minimamente ofensiva ao bem jurídico protegido, para que seja exigida a intervenção do Estado. Cabe ressaltar que esse princípio não se confunde com os crimes de menor potencial ofensivo e as contravenções penais, pois estas não são consideradas, teoricamente, insignificantes.

A partir da compreensão do princípio supracitado, cabe pontuar também o da intervenção mínima, que objetiva deixar para o Direito Penal apenas as lesões mais graves aos bens jurídicos mais relevantes. O Direito Penal torna-se a ultima ratio da proteção jurídica aos bens tutelados pelo Direito, ou seja, se outros ramos do Direito forem capazes de tutelar o bem jurídico lesado, aquele não deve intervir.

30 BRASIL. DECRETO Nº. 678/92. Promulga a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de

São José da Costa Rica), de 22 de novembro de 1969. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D0678.htm>. Acesso em: 14 mar. 2019.

31 “Art. 59,CP: O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime: I - as penas aplicáveis dentre as cominadas; II - a quantidade de pena aplicável, dentro dos limites previstos; III - o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade; IV - a substituição da pena privativa da liberdade aplicada, por outra espécie de pena, se cabível.“

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Por fim, o princípio da adequação social versa que uma conduta tipificada como crime pode se adequar como se fosse uma conduta permitida ou admissível, nos casos em que for socialmente aceita. Esse princípio procura:

restringir o âmbito de abrangência do tipo penal e orientar o legislador em duas matrizes, devendo estabelecer a seleção das condutas que devem ser proibidas, numa concepção de tutela dos bens mais importantes para a sociedade, e de outro lado repensar algumas condutas já tipificadas que devem sair do ordenamento jurídico, em função da dinamicidade social.32

Existem diversos outros princípios que limitam o poder punitivo do Estado com o propósito de respeitar as garantias fundamentais e individuais dos cidadãos. Os que foram aqui citados serviram de ilustração para mostrar como os princípios orientadores do Direito podem guiar a atuação do Estado, seja na esfera Executiva, na Legislativa ou na Judiciária.

Ante o exposto, passa-se a tratar do princípio que dá base ao presente estudo, que trata da individualização da pena.

3.2 As etapas da individualização da pena

Cabe, primeiramente, definir o conceito do que vem a ser ‘individualização’. Individualizar é, pois, o ato de tornar particular o que antes era generalizado, considerar ou apresentar algo de maneira individualizada, isoladamente, dentro de um cenário ou contexto.

A individualização da pena, como garantia constitucional, portanto, compõe um importante pilar da Justiça criminal, pois é a partir desse princípio que se determina a justa e adequada punição ao sentenciado, resguardando as particularidades de cada indivíduo e de cada conduta delituosa que lhe é imputada. Esta garantia individual, prevista no art. 5º, LXVI, da CF33, por causa de sua importância, constitui também cláusula pétrea, de acordo com o texto do art. 60, §4º, IV, do referido texto constitucional34.

Historicamente, a individualização do indivíduo no âmbito penal é fruto de um processo gradual, tendo em vista que a Lei nº 7.209 de 1984, que trata da aplicação da lei

32 PEREIRA, Jeferson Botelho. Princípios limitadores do poder punitivo do Estado. Jus, 2016. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/54146/principios-limitadores-do-poder-punitivo-do-estado/>. Acesso em: 15 de mar. de 2019.

33 “Art. 5º, CF: Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...] XLVI - a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes: a) privação ou restrição da liberdade; b) perda de bens; c) multa; d) prestação social alternativa; e) suspensão ou interdição de direitos;”

34 “Art. 60, CF. § 4º: Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: [...] IV - os direitos e garantias individuais.”

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penal, alterou significativamente a parte geral do atual Código Penal de 1940, ao introduzir tal princípio. Conforme a exposição de motivos da Lei nº 7.209/84, essa alteração da lei penal foi necessária para:

assegurar a individualização da pena sob critérios mais abrangentes e precisos. Transcende-se, assim o sentido individualizador do Código Vigente, restrito à fixação da quantidade da pena, dentro de limites estabelecidos, para oferecer ao arbitrium iudicis variada gama de opções, que em determinadas circunstâncias pode envolver o tipo da sanção a ser aplicada.35

A partir desse momento, foi concedido ao juiz a discricionariedade, também, quanto à fixação do regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade. Vale ressaltar que essa individualização da pena não se encerra com a sentença, mas perdura enquanto durar a fase de execução da pena, havendo a possibilidade de regressão e progressão de regime, além da aplicação de outros institutos da execução.

Percebe-se, assim, que a individualização da pena não atua tão somente na fase judiciária, quando da prolação da sentença, mas também na fase executória e na fase legislativa, com a cominação de penas mínima e máxima no texto da norma penal.

3.2.1 Fase legislativa

Neste primeiro momento, cabe ao legislador definir quais são as condutas que merecem repressão e intervenção estatal. Aqui se definem os bens jurídicos que serão protegidos pelo Direito Penal, resguardando uma maior proteção aos bens jurídicos mais importantes, ou seja, aplicando penas mínima e máxima proporcionais à gravidade dos delitos.

É por esse motivo que temos, por exemplo, o crime de homicídio36 com penas mínima e máxima maiores que as do crime de dano37. Nesse caso, foi decidido que a vida humana mereceria maior proteção que o patrimônio.

Para certos delitos, o legislador, inclusive, definiu diretrizes para posteriores momentos de individualização da pena, como o tipo de ação penal, o cabimento de multa, o

35 BRASIL. Exposição de motivos 211, de 09 de maio de 1983. Disponível

em:<https://www2.camara.leg.br/legin/fed/declei/1940-1949/decreto-lei-2848-7-dezembro-1940-412868-exposicaodemotivos-148972-pe.html>. Acesso em: 25 mar. 2019.

36 “Art. 121, CP: Matar alguém: Pena - reclusão, de seis a vinte anos.”

Referências

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