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Intervenção humanitária

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA FILIPE FAVARIN RECH

INTERVENÇÃO HUMANITÁRIA:

AS NAÇÕES UNIDAS E O GENOCÍDIO EM RUANDA

Tubarão 2012

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INTERVENÇÂO HUMANITÁRIA:

AS NAÇÕES UNIDAS E O GENOCÍDIO EM RUANDA

Monografia apresentada ao Curso de Graduação em Direito, da Universidade do Sul de Santa Catarina, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel.

Linha de pesquisa: Justiça e Sociedade.

Orientadora: Prof. Carla Aparecida Marinho Borba, Msc.

Tubarão 2012

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Dedico este trabalho aos meus pais, Mario Rech e Maria Favarin Rech, à minhas irmãs Angelita e Ângela e à Deus.

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À Deus, primeiramente, por ter me proporcionado força em todos os momentos da minha vida.

Aos meus pais Mario Rech e Maria F. Rech, por todo o incentivo, por toda a dedicação, por toda a preocupação ao longo da minha vida, muito obrigado por tudo.

A minha orientadora, Carla Aparecida Borba Marinho que me concedeu o privilégio de ser seu orientando, agradeço pela orientação, pela paciência, e principalmente pela força que passou.

A todos os professores que fizeram parte dessa jornada, que me incentivaram e que me apoiaram na busca do conhecimento.

As minhas amigas Samira e Luiza, obrigado por todo o apoio e pela amizade.

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Ele há de julgar as nações e corrigir numerosos povos; estes transformarão suas espadas em arados e suas lanças em foices; não pegarão em armas uns contra os outros e não mais travarão combates. (Isaias, 2,4).

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A presente monografia pretendeu analisar a atuação da Organização das Nações Unidas diante do Genocídio ocorrido em Ruanda em 1994, resultado dos conflitos entre as etnias hutus e tutsis naquele país que culminou no massacre de mais de 800 mil pessoas no ano de 1994. Para tanto, delineado no primeiro capítulo o caminho a ser seguido, abordou-se no segundo capítulo o Direito Internacional Humanitário – vertente da Proteção Internacional dos Direitos Humanos destinada à sua proteção em tempos de Guerra. Na sequência, tratou-se no terceiro capítulo da Convenção para Prevenção e Repressão do Genocídio no âmbito da Nações Unidas, bem como das intervenções humanitárias, enquanto ações armadas autorizadas pelo Conselho de Segurança da ONU para manter a paz e a segurança internacionais. Por fim, no quarto e último capítulo investigou-se a atuação da ONU diante do genocídio ora tratado, constatando-se, por fim, uma inação justificada pela ausência de interesse de países poderosos no cenário internacional para prevenir e reprimir os atos de violência no empobrecido país africano.

Palavras-chave: Direito Internacional Humanitário. Intervenções Humanitárias.

Organização das Nações Unidas. Conselho de Segurança das Nações Unidas. Genocídio. Ruanda.

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This monograph wished to examine the performance of the Organization of the United Nations against the genocide that occurred in Rwanda in 1994, the result of the conflicts between the ethnic hutus and tutsis in the country that culminated in the massacre of more than 800 thousand people in the year 1994. For both, as outlined in the first chapter the path to be followed, was addressed in the second chapter the International Humanitarian Law - strand the International Protection of Human Rights to its protection in times of war. following, was treated in third chapter on the Convention of the Prevention and Punishment of Genocide under the United Nations, and humanitarian interventions while armed action authorized by the UN Security Council to maintain international peace and security. Finally, in the fourth and final chapt We investigated the performance of the UN front of the genocide treaty prays, noting up, lastly, a inaction justified the lack of interest of powerful countries on the international scene to prevent and suppress acts of violence in the impoverished African country.

Keywords: International Humanitarian Law. Humanitarian Interventions. United Nations. Security Council of the United Nations. Genocide. Rwanda.

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AIDS - Síndrome da Imunodeficiência Adquirida art – artigo

CSNU - Conselho de Segurança das Nações Unidas CS – Conselho de Segurança

CICV – Comitê Internacional da Cruz Vermelha DIH - Direito Internacional Humanitário

FPR – Frente Patriótica Ruandesa ONU - Organização das Nações Unidas

OCHA – escritório das nações Unidas para a coordenação de assuntos Humanitários

PNLS - Programa Nacional Ruandês de Luta contra a AIDS RTLM - Rádio Telévision Libre des Mille Collines

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1 INTRODUÇÃO... 11

1.1 DELIMITAÇÃO DO TEMA E FORMULAÇÃO DO PROBLEMA... 11

1.2 JUSTIFICATIVA... 13

1.3 OBJETIVOS... 13

1.3.1 objetivo geral... 13

1.3.2 objetivos específicos... 13

1.4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS... 14

1.5 DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO: ESTRUTURA DOS CAPÍTULOS... 15

2 O DIREITO INTERNACIONAL HUMANITÁRIO... 16

2.1 HISTÓRICO... 16

2.2 DEFINIÇÃO DE DIREITO INTERNACIONAL HUMANITÁRIO... 21

2.3 PRINCÍPIOS... 22

2.4 CORRENTES DO DIREITO INTERNACIONAL HUMANITÁRIO... 23

2.4.1 Direito de Genebra... 24

2.4.2 Direito de Haia... 25

2.5 ÂMBITO DE APLICAÇÃO DO DIREITO INTERNACIONAL HUMANITÁRIO.... 27

2.5.1 Aplicação no âmbito material:... 27

2.5.2 Aplicação no âmbito temporal... 29

2.5.3 Aplicação no âmbito pessoal... 29

2.6 O JUS IN BELLO E O JUS AD BELUM COM O ADVENTO DA ONU... 30

2.7 A ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS E A PROIBIÇÃO AO USO DA FORÇA... 32

3. A ONU E O COMBATE AO GENOCÍDIO... 35

3.1 A CONVENÇÃO CONTRA O GENOCÍDIO... 35

3.1.1 Medidas a serem as tomadas em caso de genocídio... 39

3.2 O CONSELHO DE SEGURANÇA... 40

3.2.1 Composição e organização... 43

3.2.2 Processo decisório... 43

3.3 INTERVENÇÕES HUMANITÁRIAS... 47

3.3.1 As intervenções humanitárias e a soberania estatal... 48

4. GENOCÍDIO EM RUANDA E A (IN) AÇÃO DA ONU... 51

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4.3 CARACTERIZAÇÃO DO GENOCÍDIO... 60

4.3.1 A atuação da ONU e a cooperação dos Estados... 62 4.3.2 Análise e Possiveis causas Para a inação da ONU perante o genocídio em Ruanda... 65 5. CONCLUSÃO... 72 REFERÊNCIAS... 75

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1 INTRODUÇÃO

Durante a história da humanidade, ocorreram diversos conflitos internacionais e não internacionais acarretando em vários massacres e violações de direitos humanos em massa, fazendo com que a comunidade internacional, com intuito de proteger a pessoa humana, criasse dispositivos para prevenir e fazer cessar tais acontecimentos.

Com a criação das Nações Unidas em 1945, foram criadas instituições e normas a serem seguidas pelos Estados e seus combatentes para proteger os direitos fundamentais do homem em conflitos armados. Neste sentido, destaca-se o Direito Internacional Humanitário, uma das vertentes da Proteção Internacional dos Direitos Humanos, no âmbito do qual estão previstas as intervenções humanitárias como meio de assegurar a proteção das garantias básicas da pessoa humana em situações de conflito.

No presente trabalho fez-se um estudo destas normas e princípios, com destaque para a Carta das Nações Unidas, e também sobre a Convenção para a prevenção e repressão ao genocídio, analisando que critérios e fundamentos devem ser seguidos pela ONU através de seu Conselho de Segurança para fazer cessar um conflito em que haja indícios da ocorrência de um genocídio.

Desta forma, foi realizado um levantamento do histórico de conflitos ocorrido durante anos entre duas etnias no país Ruanda, que culminou no massacre de mais de 800 mil pessoas no ano de 1994, fazendo com que a ONU discutisse a possibilidade da intervenção humanitária sob o comando do uso da força.

Importa ressaltar que no decorrer do trabalho não foram feitas distinções terminológicas entre as expressões "direitos humanos”, "direitos fundamentais do homem", "garantias fundamentais" e "direitos inerentes à pessoa humana", e todas serão utilizadas como sinônimos.

1.1 DELIMITAÇÃO DO TEMA E FORMULAÇÃO DO PROBLEMA

Para que as intervenções sejam legítimas, é preciso que elas estejam de acordo com a Carta das Nações Unidas e sejam autorizas pelo Conselho de Segurança da ONU, devendo ser destinadas à defesa da paz e segurança

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internacionais e, dentro deste conceito, à proteção dos direitos fundamentais do homem.

A efetividade de tais ações necessita contar com a cooperação da comunidade internacional que assume, com a criação da ONU e seus tratados subsequentes, o compromisso de assegurar a proteção dos direitos humanos; mas para que isso aconteça é preciso que se desprendam de interesses políticos e econômicos.

Diante dos crimes contra a humanidade um possui tratamento específico, qual seja, o genocídio, objeto da Convenção para a prevenção e repressão a este crime. Aprovada e assinada pelas Nações Unidas em 1948, esta Convenção prevê a atuação do Conselho de Segurança da ONU, com a utilização dos meios contidos na Carta das Nações Unidas, nos casos em que se verifique indícios ou atos de genocídio, para que tal crime não perpetue, fazendo-o cessar o mais rápido possível.

Neste contexto, Ruanda, um pequeno país da África, viveu no ano de 1994, um dos maiores massacres da história da humanidade, onde o ódio cultivado durante anos entre duas etnias pertencentes a este país, hutus e tutsis, levou os hutus, que eram a maioria, a cometer o crime de genocídio, tentando exterminar a etnia tutsi de Ruanda através de uma chacina que levou à morte mais de 800 mil pessoas em cem dias – tudo noticiado pela mídia internacional.

Diante deste acontecimento estavam evidenciados os motivos e fundamentos para que a ONU colocasse em prática a intervenção humanitária naquele Estado, para pôr fim a violações massivas de direitos humanos, restabelecer a paz no local e assegurar a segurança internacional.

O objeto deste trabalho consiste, portanto, na análise de como se deu a atuação da ONU e seu Conselho de Segurança no genocídio ocorrido em Ruanda, com o intuito de responder à seguinte pergunta: afinal, como se deu a intervenção humanitária e qual a postura da ONU diante do genocídio ocorrido em Ruanda no ano de 1994?

Para responder a este questionamento, parte-se então da hipótese de que a resposta da ONU ao genocídio ocorrido em Ruanda pode ser definida como um fracasso resumido na falta de recursos e de vontade política dos Estados membros em assumir o compromisso necessário para prevenir ou cessar o genocídio.

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1.2 JUSTIFICATIVA

Inicialmente, ressalta-se que a escolha do tema decorreu do interesse em saber quais os motivos que levaram a um dos episódios mais terríveis de nosso tempo, o extermínio de um décimo da população de Ruanda, num genocídio comparável ao holocausto, sendo este episódio acompanhado pela indiferença da chamada comunidade internacional.

No trabalho, se faz presente o questionamento para à inabilidade da ONU em compreender os sinais da tragédia que se anunciava e à letargia da Organização em autorizar a ação dos soldados da ONU no início do massacre dos Hutus para com os Tutsis, ou mesmo enviar reforços que pudesse impedir ou por fim a matança. Por isso, o trabalho procura trazer a reflexão sobre a efetividade de normas como o Direito Internacional Humanitário e a convenção para a prevenção e repressão ao crime de genocídio frente a interesses particulares de Estados membros da Organização das Nações Unidas que tem a resistência em não comprometerem suas seguranças e seus interesses econômicos. Assim como se procura discutir a cooperação dos Estados para que não ocorra ou ponha fim violações de direitos humanos em um conflito dentro de um Estado que não dispõe de atrativos econômicos ou particulares.

1.3 OBJETIVOS

1.3.1 Objetivo geral

Analisar a intervenção humanitária e a postura da ONU diante do genocídio que ocorreu em Ruanda no ano de 1994.

1.3.2 Objetivos específicos

Demonstrar o que é o Direito Internacional Humanitário procurando defini-lo através de sua história, princípios, fontes e como se deve aplica-defini-lo.

Descrever as ações que devem/deveriam ser tomadas em caso de genocídio segundo a convenção para a prevenção e repressão do crime de genocídio de 1948.

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Identificar o papel do Conselho de Segurança das Nações Unidas e a forma com que atua.

Verificar quais os requisitos necessários para que haja uma intervenção humanitária e a possibilidade para o uso da força.

Investigar os motivos que levaram ao genocídio de Ruanda e como ocorreu.

1.4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Marconi e Lakatos (2003, p. 83) definem método como:

[...] o conjunto das atividades sistemáticas e racionais que, com maior segurança e economia, permite alcançar o objetivo – conhecimentos válidos e verdadeiros –, traçando o caminho a ser seguido, detectando erros e auxiliando as decisões do cientista, não há ciência sem o emprego de métodos científicos.

Para o desenvolvimento da pesquisa utilizou-se o método científico indutivo. O método indutivo ou o indutivismo é um método científico que obtém conclusões gerais a partir de premissas individuais. Trata-se do método científico mais usual, que se caracteriza por quatro etapas básicas: a observação e o registo de todos os factos: a análise e a classificação dos factos; a derivação indutiva de uma generalização a partir dos factos; e a contrastação/verificação. Por meio da indução chega-se a conclusões que são apenas provaveis. (GIL, 2006).

O presente trabalho é, quanto ao nível, uma pesquisa explicativa, que, preocupa-se em identificar os fatores que determinam ou que contribuem para a ocorrência dos fenômenos. É o tipo de pesquisa que aprofunda o conhecimento da realidade, pois pretende explicar o porquê das coisas. (GIL, 2006).

O presente trabalho fará uso da pesquisa bibliográfica, haja vista que esta pesquisa “é desenvolvida com base em material já elaborado, constituído principalmente de livros e artigos científicos.” (GIL, 2006). O referido trabalho terá como base livros, artigos e utilização de informações advindas da internet, este importante meio de compartilhamento de informações, como fonte de bibliografia.

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1.5 DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO: ESTRUTURA DOS CAPÍTULOS

O desenvolvimento da monografia foi estruturado em quatro capítulos. O trabalho apresentará de forma introdutória no primeiro capítulo as delimitações do tema com seus objetivos traçados pelo projeto monográfico.

No primeiro capítulo, faz-se presente uma introdução ao trabalho monográfico contendo a delimitação do tema, problema, hipótese, justificativa, problema, objetivos e estrutura do trabalho. Em seguida, no segundo capítulo, define-se, a partir de levantamento histórico e bases doutrinarias os princípios do Direito Internacional Humanitário e o surgimento da organização das Nações Unidas.

No terceiro capítulo, serão abordados as normas e instrumentos internacionais para o combate ao genocídio no âmbito da ONU, como a convenção para combater o genocídio de 1948 e a intervenção humanitária com o devido Controle do Conselho de Segurança das Nações Unidas.

Por fim, o quarto capítulo destina-se, primeiramente, a fazer uma contextualização histórica do conflito étnico em Ruanda chegando assim, ao massacre de 1994. Em seguida, se fará a analise da atuação da ONU neste caso apontando os possíveis erros da organização e de seus estados membros.

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2. O DIREITO INTERNACIONAL HUMANITÁRIO

2.1 HISTÓRICO

O direito Internacional Humanitário como atualmente é conhecido, teve como colaboração para a sua formação, as normas e leis de guerras dos primórdios da civilização. Os meios de se conduzir as hostilidades estão presentes em todas as culturas, tais regras foram repercutidas em maior ou menor escala através de obras literárias ou religiosas. (ESTRELA BORGES, 2006).

Conforme menciona Pictet (1986, apud. CHEREM, 2003), as sociedades primitivas não tinham limites, o que imperava era a lei da selva, e o triunfo do mais forte sobre o mais fraco se dava de maneira desmedida. O guerreiro devia vencer ou morrer sem qualquer possibilidade de rendição.

Já nas grandes civilizações da antiguidade, nota-se a mudança na conduta do vencedor com o vencido, em sociedades como a egípcia, grega e romana existia o trabalho escravo onde era mais vantajoso fazer de seu inimigo derrotado um escravo do que simplesmente mata-lo. Por mais desumano que possa parecer, a escravidão se tornava um tratamento ainda considerado como de compaixão para a época frente à possibilidade de morte. (CHEREM, 2003).

Em povos como a dos sumérios, civilização que viveu entre os anos 4.000 e 1950 a.C. ao sul da Mesopotâmia, o pensamento humanitário era mais desenvolvido em relação aos inimigos, para eles a guerra era uma instituição organizada, eles tinham um código, o código de Hamurabi, um dos conjuntos mais antigos de leis escritas já encontradas, criado pelo rei da Babilônia, dizia: “prescrevo estas leis para impedir que o mais forte oprima o mais fraco”. Algumas codificações antigas como o conjunto de leis do mundo indiano chamado de código de Manu e o código de Mahabharata tratavam de forma especifica algumas leis de guerra, trazendo disposições normativas muito avançadas para a época, como a proibição de matar o inimigo desarmado ou rendido, os feridos deviam ser levados ao seu lugar de origem e alguns meios de combate eram ilícitos como, por exemplo, o uso da flecha envenenada. (PICTET, 1986, apud CHEREM, 2003).

Ao se chegar à Idade Média, o pensamento humanitário não teve grande evolução, devido a alguns conceitos da época propagados pelo cristianismo como a

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guerra justa e a guerra santa onde os exércitos cometiam em nome de Deus os mais bárbaros atos. Sendo a guerra santa motivada por diferenças religiosas, isso a tornava em uma guerra justa, ou seja, uma guerra moralmente aceitável. (CHEREM, 2003).

As ideias cristãs como amar ao próximo como a si mesmo não eram consideradas em relação aos chamados inimigos de Deus, que não eram vistos como semelhantes, por isso deveriam ser destruídos. (CHEREM, 2003).

O império romano estava assolado pelas ideias cristãs devido ao Edito de Milão, onde por volta de 313 d.C, Constantino, então imperador de Roma, resolveu agregar oficialmente o cristianismo em religião oficial; uma das consequências do Edito de Milão foi justamente autorizar a igreja a legitimar a guerra. (CHEREM, 2003).

No inicio do século V, um dos maiores pensadores da Idade Média, santo Agostinho confirmava que alguns atos praticados em nome de Deus, como o homicídio, não eram considerados criminosos, tomando emprestada a ideia dos romanos de guerra justa, em que justificava a guerra aos olhos dos fiéis, aliando ideias morais às necessidades políticas; assim, sendo considerados como atos cometidos pela guerra santa, estavam longe de serem considerados crimes, pois eram merecidos os castigos impostos aos pecadores. Estas ideias e outras frearam em muito o desenvolvimento do DIH por toda a Idade Média. (CHEREM, 2003).

Cherem (2003, p.48) expõe um exemplo do que foi mencionado sobre as guerras por motivação religiosa:

Muitos dos que hoje são considerados crimes de guerra foram cometidos nas Cruzadas, em nome da propagação da fé. Os mulçumanos, melhor do que ninguém, conheceram a ira dos defensores armados da fé cristã. Neste período, não se cogitava poupar inimigos rendidos, mulheres, enfermos e crianças. Todos eram inimigos de Deus, e todos tinham que ser castigados. Não se trata de dizer que os cruzados não conheciam uma normatização humanitária. Isto sequer era considerado.

Durante a Idade Média as ideias de direito Humanitário passaram praticamente em branco. Com o fim deste período histórico, com o surgimento das armas de fogo, e com o poder do Estado se sobrepondo ao poder da igreja, muitas guerras foram abolidas, como as de servidão e as guerras privadas. Ao mesmo tempo passou-se a dar atendimento aos feridos e a haver certa solidariedade para com os prisioneiros de guerra, o que fez com que o pensamento humanitário

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voltasse a ganhar corpo. (PICTET, 1986, apud CHEREM, 2003).

No século XVII, foram divulgadas pelo pensador e, considerado, o fundador do direito internacional Hugo Grotius, ideias que formaram as bases do Direito Internacional e do Direito de Guerra moderno. Para Grotius, existiam direitos inerentes à pessoa Humana que deveriam ser protegidos pela comunidade internacional, pois os direitos essenciais não eram garantidos aos cidadãos dos países em conflito, seria então necessária a criação de uma ordem internacional que garantisse o respeito a esses direitos.

Nascia o moderno direito das gentes. Grotius continuava a crer na guerra justa, mas não sob o ponto de vista do motivo do conflito, e sim, sob o ponto de vista da competência para se fazer a guerra. Grotius foi o primeiro jurista a afirmar que, embora houvesse um motivo que autorizasse o Estado a fazer a guerra, este não podia ser alheio a seu dever de observar as leis que delimitavam o conflito. (PICTET, 1986, apud CHEREM. p. 49).

No século XVIII, surgia a Revolução Francesa, fundamentada nas ideias jus naturalistas, com uma constituição que garantia os direitos naturais, inalienáveis e sagrados do homem. Esta legislação revolucionária passava a dispensar aos soldados feridos o mesmo tratamento que era dispensado aos soldados nacionais, e estendia aos prisioneiros de guerra à proteção da lei. Apesar disso, alguns destes ideais não foram respeitados por alguns governantes franceses, como Napoleão, que chegou a matar quatro mil soldados turcos que já haviam se rendido ante a promessa do imperador de que suas vidas seriam poupadas. (PICTET, 1986, apud CHEREM, 2003).

Ainda que não tenha havido uma codificação especifica quanto ao DIH até a primeira Convenção de Genebra em 1864, e tantos atos contrários tenham sido cometidos às normas humanitárias, alguns exemplos de limitação à ação dos exércitos em combate se fizeram presentes até o inicio da Idade contemporânea.

Neste sentido afirma Cherem (2003, p. 50) que:

Certamente o numero de exemplos contrários às normas humanitárias é muito maior, na história da humanidade, que o numero de exemplos de observância de seus princípios. O Direito Humanitário pelo menos até a Revolução Francesa era muito mais consuetudinário que formalizado. E não é de se estranhar que apenas um século depois tenha surgido a ideia de codificar de forma universal as normas de guerra, com a primeira Conferência Internacional de Genebra e o nascimento da Cruz vermelha Internacional, afinal os que fazem a guerra sempre tentam escapar do controle da lei.

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O DIH como atualmente é concebido, teve em grande parte de sua codificação e universalização iniciado no século XIX. Isto se deve a experiências traumáticas vividas por duas pessoas, Francis Lieber e Henry Dunant, durante a passagem por determinadas guerras. (ESTRELA BORGES, 2006).

Lieber era um jurista alemão radicado nos Estados Unidos, que a pedido do presidente Lincoln, criou um sistema normativo de regras de condutas destinado às tropas em campanha na Guerra da Secessão. Esse manual ficou conhecido como o Código de Lieber, cujo nome oficial é “instructions for the Government of armies of the United States in the field”. Este código serviu como fonte material para uma série de esforços normativos que se iniciou, na sociedade internacional, no século XIX, trazendo em seu conteúdo uma série de disposições relativas à condução das hostilidades que no futuro se consagrariam em costumes ou diplomas normativos. O primeiro resultado desta influência se deu na Declaração de São Petersburgo em 1868, banindo, em tempo de guerra, o emprego de projéteis explosivos e inflamáveis. (ESTRELA BORGES, 2006).

Porém, coube a Henry Dunant o papel de grande criador do DIH. Em junho de 1859, Dunant, que era um jovem empresário suíço vai até ao norte da Itália na cidade de Solferino, para se encontrar com Napoleão III a fim de obter auxilio financeiro para seus investimentos realizados na Argélia. Na ocasião, Henry se depara com o terrível combate entre franceses, italianos e austríacos, que ao final do dia resultou em mais de 40.000 vitimas, entre mortos e feridos. (ESTRELA BORGES, 2006).

De volta a Genebra, Henry publica um livro intitulado Un souvenir de solferino, em que relata os horrores que presenciou e assinala duas ações que deveriam ser adotadas para que esse tipo de situação pudesse ser evitado, a primeira seria a criação de sociedades de socorro privadas, que atuariam nos locais de conflito independentemente do vinculo com qualquer das partes; e a segunda seria a aprovação de um tratado internacional que facilitasse a sua atuação. (ESTRELA BORGES, 2006).

Dessa forma, Henry Dunant e mais cinco pessoas fundam o chamado “Comitê Internacional de Ajuda aos Feridos”, que mais tarde, em 1880 se transformaria no “Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV)”. Em agosto de 1863 o comitê convoca uma conferência diplomática com a ajuda do governo suíço, para que se reunissem um ano depois dando origem ao primeiro tratado

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internacional do DIH, foi realizada então, a Convenção de Genebra para melhorar a sorte dos militares feridos em campanha. (ESTRELA BORGES, 2006).

Aconteceu o que se pode chamar de “fato gerador” do moderno DIH, através da iniciativa de determinados cidadãos e do governo suíço, que resolveram adotar em uma conferência um corpo de normas que vincularia os Estados em situações de conflito. A partir daí os Estados respeitariam um acordo universal, aplicável em qualquer tempo. (CHEREM, 2003).

Segundo Cherem, (2003) a partir de então o DIH começa a ter mais caráter de norma imperativa e universal, de 1864 aos dias atuais vários tratados foram pactuados sob a proteção do CICV (Comitê Internacional da Cruz Vermelha) cuja sua atividade está associado o DIH e sua evolução. Dentre os importantes acordos que foram estabelecidos ao longo de mais de um século, destacam-se:

 1864 – Convenção de Genebra para melhoramento da sorte que sofrem os militares feridos dos exércitos em campanha;

 1868 – Declaração de São Petersburgo (proibição do uso de determinados projéteis em tempos de guerra);

 1899 – Convenções de Haia sobre as leis e costumes de guerra terrestre e sobre a adaptação à guerra marítima dos princípios da Convenção de Genebra de 1864;

 1906 – Revisão e aprimoramento das Convenções de Genebra de 1864;

 1907 – Revisão das Convenções de Haia de 1899 e aprovação das novas convenções;

 1925 – Protocolo de Genebra sobre a proibição de emprego, na guerra, de gases asfixiantes, tóxicos ou similares e de métodos bacteriológicos;

 1929 – duas convenções de Genebra: Revisão e aprimoramento da Convenção de Genebra de 1906, e convenção de Genebra relativa ao trato dos prisioneiros de guerra;

 1949 – Quatro Convenções de Genebra: I) Convenção de Genebra de 12 de agosto de 1949 para a melhoria das condições de feridos e enfermos das forças armadas em campanha; II) Convenção de Genebra de 12 de agosto de 1949 para a melhoria das condições de feridos, enfermos e náufragos das forças armadas do mar; III) Convenção de Genebra de 12 de agosto de 1949 relativa ao tratamento de prisioneiros de guerra; IV) Convenção de Genebra de 12 de agosto de 1949 relativa a proteção dos civis em tempo de guerra;

 1954 – Convenção de Haia para a proteção dos bens culturais em caso de conflito armado;

 1972 – Convenção sobre a proibição de desenvolvimento, produção e armazenamento de armas bacteriológicas e tóxicas e sobre a sua destruição;

 1977 – Dois protocolos adicionais às Convenções de Genebra de 1949 que promove a proteção das vitimas dos conflitos armados internacionais (protocolo I) e não-internacionais (protocolo II);

 1980 – Convenção sobre proibições e restrições ao uso de certas armas convencionais que podem ser consideradas excessivamente nocivas ou de efeitos indiscriminados.

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 1993 – Convenção sobre proibição de desenvolvimento, produção, armazenamento e emprego de armas químicas e sobre sua destruição;  1995 – Protocolo sobre as armas laser que causem cegueira;

 1996 – Protocolo emendado sobre proibições e restrições ao emprego de minas e outros artefatos;

 1997 – Convenção sobre a proibição ao emprego, armazenamento, produção e transferência de minas pessoais e sua destruição; (CHEREM, 2003, p.51).

Logo, o DIH tem caráter imprescindível para a sobrevivência da comunidade internacional, por isso é considerado norma de jus cogens, ou seja, tem status de norma imperativa, isto quer dizer que qualquer tratado que seja firmado de forma que venha a violar ou conflitar com uma norma desta será considerado nulo. O DIH é formado por acordos entre Estados, pelos princípios gerais de Direito e pelo Direito Consuetudinário internacional, que por sua vez se compõe da prática dos Estados, que estes reconhecem como obrigatória. Todas as regras, portanto, que advém dos costumes consolidados dos países possuem caráter universal e imperativo. (CHEREM, 2003).

2.2. DEFINIÇÃO DE DIREITO INTERNACIONAL HUMANITÁRIO

No DIH existe uma conclusão, desde o inicio, de que se trata de um direito voltado para a proteção da pessoa humana, esta parece ser a força motriz do DIH, a pessoa humana e sua proteção quando em situação de conflito armado. (CHEREM, 2003).

O DIH poderia então ser definido, de forma especifica como o ramo do Direito Internacional Público que tem por fundamento, em tempos de conflitos armados, garantir proteção aos indivíduos ou categoria de indivíduos que não participam ou que já não participam de forma ativa do conflito. (Ibid, p. 34).

O DIH integra a proteção Internacional dos Direitos Humanos. Contudo, este é acima de tudo, um direito autônomo, que tem por finalidade promover a paz e proteger a pessoa humana em conflitos armados. Tem-se a caracterização temporal – em tempo de conflito armado – ou seja, é destinado especificamente a ser aplicado nos conflitos armados, internacionais ou não-internacionais. Assim é observada a implementação de um sistema de freios à serem empregados às ações bélicas estatais. (ENCICLOPÉDIA DIGITAL DE DIREITOS HUMANOS, 2004).

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demais é o fato de ela possuir um objeto especifico, limitado e preciso de estudo, que é a proteção da pessoa humana em conflitos armados. Porém, deverá possuir princípios que o definam e caracterizem, cabendo assim, nortear toda e qualquer interpretação de suas regras jurídicas. (ESTRELA BORGES, 2006).

Assim o DIH será definido e delimitado quanto ao seu objeto, tendo como finalidade os meios e métodos possíveis de serem utilizados em uma situação de enfrentamento armado, estabelecendo o tipo de armamento e o tratamento que as partes conflitantes possam se valer, preservando a dignidade da pessoa humana. Veremos a seguir quatro princípios fundamentais do DIH.

2.3 PRINCÍPIOS

No DIH existem determinados princípios que são de fundamental importância para a realização das suas finalidades, que são: o principio da humanidade, o principio da necessidade, o principio da proporcionalidade e o principio da distinção. (ESTRELA BORGES, 2006).

O principio da humanidade é aquele que orienta o DIH, em que se deve sempre preservar a dignidade da pessoa humana, mesmo em situação de guerra. Mantendo as condições básicas de bem estar e individualidade dos seres humanos em conflitos, com o propósito de evitar e aliviar o sofrimento e as adversidades causadas, através da proteção à vida, saúde e pelo respeito ao ser humano em sua totalidade. (ESTRELA BORGES, 2006).

Já o principio da necessidade determina que os ataques dos combatentes devam ater-se a finalidade militar específica e que sua aplicação deva ser feita de maneira restritiva, usado quando realmente for preciso, sem a ocorrência de eventos prejudiciais ao bem estar humano não envolvido diretamente no conflito. Os ataques devem ser estritamente limitados aos objetivos militares, que são aqueles que, pela sua natureza, localização, destino ou utilização contribuam efetivamente para a ação militar e cuja destruição total ou parcial, captura ou neutralização ofereça, na ocorrência, uma vantagem militar precisa como, por exemplo, estradas, pontes e rodovias, mas que estes objetivos sejam escolhidos entre aquele cujo ataque resulte em um menor dano e perigo para as pessoas e objetos civis. (CIVC, 1992 apud OCHA, 2009).

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princípio da proporcionalidade, de acordo com este princípio, nenhum alvo, mesmo que seja militar, deve ser atacado se os prejuízos e sofrimento forem maiores que os ganhos militares que se espera da ação. (ESTRELA BORGES, 2006).

Os militares não só devem utilizar a proporcionalidade como também são os principais responsáveis por minimizar os efeitos causados pelos ataques, ficando estritamente proibidos métodos que envolvam deslealdade e o uso de armamentos que gerem sofrimentos desnecessários aos combatentes. (CIVC, 1992 apud OCHA, 2009).

E por fim, o principio da distinção, procura assegurar o respeito e a proteção da população civil, as partes em conflito devem sempre fazer a distinção entre população civil e o objeto militar. Por este principio é possível definir quais são aqueles que possuem o direito de participarem do conflito, onde os civis, enquanto não membros das forças armadas, não possuem autorização a pegarem em armas e participarem dos embates, caso isso ocorra, estes poderão ser punidos. (CIVC, 1992 apud OCHA, 2009).

Os princípios regedores do DIH, de forma geral, são aqueles em que só podem ser atacados os objetivos militares. Recolher e dar assistência aos feridos aos doentes e aos náufragos, sem discriminação alguma. Tratar com humanidade o adversário que se rende ou é capturado, assim como os prisioneiros ou detidos. Respeitar os civis e seus bens. Não causar danos ou sofrimentos excessivos. Não atacar o pessoal médico ou sanitário nem suas instalações e permitir que façam seu trabalho, e não colocar obstáculos ao pessoal que desempenhar funções humanitárias. (CIVC, 1992 apud OCHA, 2009).

O DIH não visa, com sua aplicação, tornar um conflito armado mais justo, mas sim, diminuir ao máximo o sofrimento daqueles que são afetados por essa situação. Apesar dos esforços da sociedade internacional em manter a paz, os conflitos armados existem desde a Antiguidade, sendo uma constante em nossa história, algo difícil de ser erradicado. Por isso pretende-se aliar a necessidade militar com os objetivos humanitários visando a diminuição dos resultados perversos. (ESTRELA BORGES, 2006).

2.4 CORRENTES DO DIREITO INTERNACIONAL HUMANITÁRIO

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Direito de Genebra.

Á medida que a sociedade internacional progredia na codificação do Direito de Guerra, surgiu a ideia de dividi-lo em duas categorias. O Direito de Haia trataria das regras estabelecidas entre os Estados para limitar e regulamentar o uso da força; já o Direito de Genebra trataria da proteção que deveria ser dispensadas as pessoas quando os Estados usassem da força como forma de resolução de controvérsias. O primeiro da à ideia de relação Estado a Estado; o segundo, do Estado para com os indivíduos. (CHEREM, 2003, p.32)

Para Swinarski (1990, apud CHEREM, 2003) o conceito de DIH é uma junção do Direito de Haia e do Direito de Genebra. Entende este autor que o DIH ocupa o lugar das normas que antes eram conhecidas como Direito de Guerra. Porém, o DIH tem um objetivo mais especifico que é a proteção da pessoa humana. A corte Internacional de Justiça, que é o principal órgão judiciário da ONU, chegou a conclusão de que não existe distinção entre o direito de Haia e o de Genebra, ao determinar que:

Estes dois ramos do direito aplicáveis em conflitos armados desenvolveram relações tão estreitas que são vistos como tendo se fundido gradualmente em um único sistema complexo, que chamamos atualmente de direito internacional humanitário. As disposições dos protocolos Adicionais de 1977 expressam e atestam a unidade e a complexidade deste direito. (ESTRELA BORGES, p. 34).

O processo de confluência se verifica no papel ativo da ONU em seu Conselho de Segurança no estabelecimento de tribunais competentes para julgar infrações de DIH, onde a distinção entre essas correntes torna-se cada vez menos nítida. (SOARES, 2004).

2.4.1 Direito de Genebra

O Direito de Genebra se constitui de uma série de tratados que definem as leis internacionais relativas as normas do DIH, tratados estes que estabelece os direitos e deveres de pessoas, combatentes ou não, em tempo de guerra. Estas convenções aconteceram no período de 1864 a 1949.

Em 1949, todas as convenções foram revistas e atualizadas com o intuito de dar certa uniformidade aos textos, onde cada uma identifica uma categoria de

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vitima a qual deve ser estendida a proteção. (ESTRELA BORGES, 2006). Estas são as categorias de vitimas conforme a convenção Genebra:

A I convenção se dirige aos combatentes feridos e enfermos; a II, aos combatentes feridos, enfermos e náufragos; a III se direciona aos prisioneiros de guerra; e a IV se dirige a proteção da população civil. (CHEREM, 2003).

Entende-se, portanto, que os objetivos essenciais do DIH são os de proteger os que não participam dos conflitos, como exemplo os civis, e os que estão impossibilitados de participar de um conflito armado, como os enfermos, prisioneiros de guerra e feridos, limitando o uso da violência para atingir o resultado desejado com o conflito. (CHEREM, 2003).

Dentre os principais acordos do Direito de Genebra, Estrela Borges destaca os de 1864 onde foi realizada a primeira Convenção de Genebra que apresentou como grande novidade a neutralidade dos médicos e enfermeiros nas operações de Ajuda Humanitária, para que estivessem isentos de captura, e reafirmou princípios anteriormente consagrados pelos costumes, como respeitar os feridos e prestar assistência inclusive aos inimigos; em 1929, na revisão da Convenção de Genebra, resultou em duas Convenções: Convenção para revisão e aprimoramento da Convenção de Genebra de 1906 que trata dos feridos e doentes das forças armadas em campanha e outra relativa ao tratamento dos prisioneiros de guerra; Já em 1977 foram assinados os dois Protocolos Adicionais às Convenções de Genebra de 12 de Agosto de 1949. O protocolo I que reforça a proteção das vítimas dos conflitos armados internacionais e amplia a definição dos mesmos às guerras de libertação nacional e Protocolo II que por sua vez reforça a proteção das vítimas dos conflitos armados não internacionais. (ESTRELA BORGES, 2006).

O artigo 1° da Convenção de Genebra de 1949 estabelece a obrigação de respeitar e fazer respeitar, em todas as circunstâncias as normas humanitárias codificadas neste instrumento, estabelecendo o interesse jurídico de todos os Estados em ver as normas do DIH respeitadas. Há diversas medidas que os Estados podem e devem tomar a fim de cumprir com suas responsabilidades, como, por exemplo, pressão diplomática ou, mesmo, denúncia pública das violações cometidas. (VIOTTI, 2005).

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O Direito de Haia são disposições que tem a finalidade de regulamentar a condução das hostilidades entre os combatentes, limitando os meios de ferir o inimigo e os meios e métodos de guerra. Este direito recebeu tal nome pelo fato de suas normas jurídicas terem sido originadas na cidade de Haia, Holanda, em duas conferências realizadas em 1899 e 1907. (SOARES, 2004).

Estas disposições tiveram como base declarações anteriores como a de São Petersburgo, que foi o primeiro instrumento internacional a regular métodos e meios de combate. Proibiu o ataque a não combatentes, a utilização de armas que agravem inutilmente o sofrimento dos feridos ou que tornem a sua morte inevitável e o emprego de projéteis com peso inferior a 400 gramas que sejam explosivos e contenham uma carga explosiva ou substâncias incendiárias. A proibição aos projéteis inflamáveis, no entanto, não foi observada na Segunda Guerra Mundial. No preâmbulo da Declaração de São Petersburgo formulou-se pela primeira vez, de forma clara e precisa, o princípio fundamental do direito da guerra.

A primeira conferência em Haia de 1899 teve como objetivo maior o de criar mecanismos para impedir a eclosão de novas guerras, tratou-se das normas e costumes da guerra em terra. Dentre as disposições que representaram avanços e que não foram revistas em 1907 pode-se citar as proibições do uso de gás asfixiante e de balas que se dilatam no corpo humano, as chamadas balas “dum-dum”.

Nesta conferência, a de 1907, foi realizada uma revisão das disposições precedentes e a aprovação de outras normas. Foram realizadas ainda, 13 convenções com o objetivo de Completar a Obra da Conferência de Paz que elaborou a Convenção de Haia. Estas novas Convenções dispunham, entre outros, sobre o início das hostilidades e direitos e deveres dos Estados neutros. A maior parte das convenções tratou da guerra no mar, como as relativas a guerra naval, as relativas a colocação de minas submarinas; e as referentes a proteção da navegação comercial. (ESTRELA BORGES, 2006).

No período entre guerras o direito de Haia realizou alguns avanços, como a criação do protocolo sobre a proibição do emprego de gases asfixiantes, tóxicos ou similares e de meios bacteriológicos, pois devido ao uso de agentes químicos na Primeira Guerra Mundial, mostrou que a proibição do emprego de venenos e armas envenenadas presentes na conferência de 1899, não foram suficientes. Pós 1945

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houveram inovações significativas ao desenvolvimento direito de Haia, sempre refletindo os avanços tecnológicos posteriores (ESTRELA BORGES, 2006).

Faz-se necessário citar alguns dos mais importantes diplomas normativos deste período como o de 10 de abri de 1972 que trata da proibição de desenvolvimento, produção e armazenamento de armas bacteriológicas e tóxicas e sobre sua destruição; a de 1980 quanto a proibição ou a limitação da utilização de armas específicas capazes de produzir danos excessivos ou indiscriminados e por fim, a de 1997 que traz a proibição ao emprego, armazenamento, produção e transferência de minas pessoais e sobre sua destruição. (ESTRELA BORGES, 2006).

Existe ainda, mais recentemente, o Direito de Nova York, que pode ser tratado como a evolução atual da codificação do DIH, que por meio de iniciativas da ONU, a partir de 1968, corresponde à matéria de Direitos Humanos aplicáveis em situações de conflitos armados e com a adoção de convenções relativas à limitação ou proibição de certas armas convencionais. (ESTRELA BORGES, 2003).

O que distingue o Direito de Haia do Direito de Nova York é que enquanto o primeiro trata apenas do uso das armas nos conflitos bélicos, o segundo pretende delimitar e controlar também a produção, estocagem, o deslocamento e a destruição destas armas. (SWINARSKI, 1991).

Não existe uma linha divisória claramente definida entre as três correntes. Existe um movimento cada vez mais forte de junção entre elas, dando a criação de um único corpo de normas jurídicas que engloba as disposições de proteção das vítimas dos conflitos, as regras de limitação aos meios e métodos de combate, e a proteção internacional dos direitos humanos nos conflitos armados. (SOARES, 2004).

2.5 ÂMBITO DE APLICAÇÃO DO DIREITO INTERNACIONAL HUMANITÁRIO

É preciso destacar o âmbito de aplicação do DIH, delimitando as situações em que esse conjunto de normas é aplicável, assim, citaremos a aplicação no âmbito material, temporal e pessoal. (SWINARSKI, 1991).

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Nos casos de conflitos de ordem internacional, a aplicação do DIH se dá nos casos de guerra declarada ou de qualquer outro conflito armado que possa surgir entre dois ou mais Estados, mesmo que uma das partes não reconheça o estado de guerra. (DINH; DAILLIER; PELLET, 2003).

O DIH será aplicado em todos os casos de ocupação total ou parcial do território de um Estado, mesmo se a ocupação não encontrar resistência militar. A autoridade que representa o estado pode através do art. 96. 3 do protocolo I das Convenções de Genebra, comprometer-se a aplicar o DIH mediante uma declaração unilateral, existindo a possibilidade de ambos os lados em conflito respeitarem e aplicarem as normas do direito internacional humanitário. (SWINARSKI, 1991).

Já no que se refere aos conflitos armados não internacionais, o que antigamente, eram considerados assuntos de jurisdição interna e qualquer intervenção era considerada uma afronta à soberania do Estado; por isso não eram aplicadas as regras de direito internacional, hoje Isso passou a ser mudado a partir das convenções de 1949, mas ainda não havia uma definição clara do que poderia ser considerado um conflito armado não internacional. Assim ficou definido pelo II protocolo adicional de 1977 em que esta situação trata-se de um conflito que tem lugar no território de um Estado, entre suas forças armadas dissidentes ou grupos armados organizados que, sob direção de um comando responsável, exerçam sobre uma parte desse território um controle tal que lhes permita realizar operações militares continuas. (SWINARSKI, 1991).

Esta disposição legal internacional diz respeito a preceitos humanitários que não passariam longe de conflitos que não estivessem perfeitamente delimitados nas Convenções de Genebra de 1949 e nos Protocolos adicionais de 1977, como as situações de tensões internas. (SWINARSKI, 1991).

Neste interim, os conflitos de identidade são os conflitos étnicos, que acontecem geralmente por propagação de campanhas de violência e ódio contra determinada categoria de pessoas dentro de um mesmo Estado, em detrimento do que seria uma identidade nacional. (CHEREM, 2003).

O protocolo II ainda determina que em situações de atos hostis praticados por certos grupos contra o Estado, cuja violência não chega a caracterizar um conflito armado, o DIH não se aplique às situações de tensão e perturbação internas, tais como motins, atos de violência isolados e esporádicos e outros atos análogos. (SWINARSKI, 1991).

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2.5.2 Aplicação no âmbito temporal

Via de regra, o DIH não tem caráter de continuidade temporal, isto é, suas normas e princípios são aplicáveis apenas a partir do inicio do conflito armado, afastando a sua exigência tão logo essa situação tenha fim. (SWINARSKI, 1991).

Existindo um ato jurídico formal de uma declaração de guerra, o direito internacional passa imediatamente a ser aplicado, mesmo se ainda não houver atos de hostilidade entre as partes.

Mas o conflito armado é um fato, muito mais que uma intenção. De acordo com o artigo 2° comum as convenções de Genebra de 1949, suas disposições se aplicam em caso de guerra declarada ou de qualquer outro conflito armado que possa surgir entre dois ou mais Estados, ainda que o estado de guerra não seja reconhecido por uma delas. (ESTRELA BORGES, 2003).

Nos casos de ocupação como consequência de um conflito armado aplica-se o DIH desde o primeiro ataque; já nos casos de ocupação sem resistência militar, aplica-se desde o começo da ocupação. Nos casos de guerra civil, exige-se um nível de intensidade mínimo das hostilidades para que haja a necessidade de aplicação das normas do DIH. (ESTRELA BORGES, 2003).

Quanto ao fim da aplicação das regras de DIH, torna-se difícil determinar. As hostilidades podem acabar por um tratado de paz ou com uma celebração de um acordo formal.

Em caso de celebração de tratado de paz, a aplicação das disposições do DIH se dá por fim a partir da celebração, a menos que este tratado tenha sido realizado mediante coação ou emprego de força por um dos Estados ao outro, ocasionando na permanência das normas de direito humanitário. (ESTRELA BORGES, 2003).

Em casos de termino por situações de fato, onde não há um tratado de paz, torna-se difícil determinar o fim da aplicação do DIH. Desta forma, em casos de guerra declarada ou de qualquer conflito armado entre dois Estados, o DIH cessa com o fim geral das operações militares. Em situações de ocupação total ou parcial, o DIH termina com a efetiva desocupação e o fim das operações militares. (ESTRELA BORGES, 2003).

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De início se afirma que o DIH é aplicável à vítima, sendo qualquer pessoa afetada por um conflito armado, seja civil ou combatente fora de batalha. Não cabe nestes casos qualquer debate moral, ético, cultural ou religioso. (CHEREM, 2003).

Ser vítima é requisito fático daquele que deve ser protegido, cabendo aos Estados o dever, assumido quando da ratificação das convenções de Genebra de 1949, de garantir a proteção de indivíduos enquadrados nas normas humanitárias, do início ao fim das hostilidades. (CHEREM, 2003).

Por isso, as pessoas protegidas não podem, em nenhum caso, renunciar, parcial ou totalmente, aos direitos outorgados a elas pelas Convenções e pelos protocolos, constituindo um elemento fundamental deste sistema internacional de proteção. (SWINARSKI, 1991).

Todavia, as garantias a conceder aos indivíduos são muito diferentes segundo se trate de combatentes ou de não combatentes. Os primeiros não podem esperar uma certa atenção senão após se encontrarem feridos ou feitos prisioneiros; os segundos devem a todo momento ser poupados dos horrores da guerra mas não estão protegidos como os combatentes postos fora de combate se eles participam episodicamente nos combates. (DINH, DAILLIER e PELLET, 2003).

2.6 O JUS IN BELLO E O JUS AD BELUM COM O ADVENTO DA ONU

Os termos jus in bello e jus ad bellum não eram comuns em debates e documentos sobre o Direito da Guerra até a década anterior à Segunda Guerra Mundial. No entanto, os conceitos que abrangem certamente apareceram no debate jurídico antes, mas sem a clara distinção que a adoção dos termos ocasionou. (FERNANDES, 2006).

Jus in bello é a expressão latina que se refere ao conjunto de normas - primeiro costumeiras, depois convencionais - que floresceram no domínio das gentes quando a guerra era uma opção lícita para resolver conflitos entre Estados.(FERNANDES, 2006).

De acordo com o Jus in bello, as regras costumeiras passaram a regular as condutas de proteção das vítimas advindas da guerra, dando ênfase às que protegiam os feridos e os enfermos, que não deveriam ser tratados como prisioneiros, e sim, após o devido tratamento, ser devolvidos a seus exércitos.

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Ressalta-se, ainda, que a população civil, hospitais, médicos, enfermeiros e capelães estavam isentos de aprisionamento, consignando no dever moral de serem poupados dos ataques inimigos.(FERNANDES, 2006).

O Jus ad bellum, por seu turno, se refere ao direito à guerra, ou seja, o direito de fazer a guerra quando esta parecesse justa. Diz respeito às hipóteses em que a necessidade admite a guerra enquanto legítima defesa real contra uma agressão armada e também na luta pela autodeterminação de um povo contra a dominação colonial. (FERNANDES, 2006).

Após a II Guerra Mundial, a normatização da conduta na guerra foi recriada no sistema jurídico da Carta das Nações Unidas, assinada em 26 de junho de 1945. Esta Carta é o acordo que estabelece a criação da Organização das Nações Unidas (ONU) fundada oficialmente em 24 de outubro de 1945, tendo à época 51 Estados fundadores e contando hoje com um total de 193 Estados membros. A carta das nações unidas consiste em um acordo constitutivo a que todos os membros estão sujeitos, e postula que as obrigações das nações Unidas prevalecem sobre quaisquer outras estabelecidas em tratados diversos. Possui um total de 111 artigos divididos em 19 capítulos. (MIGUEL, 2010).

A Guerra Clássica, com base no Jus ad Bellum e no Jus in Bello, fundamentava-se nos princípios de necessidade e humanidade, através da ação direta do Estado. Com o advento da ONU, os Estados cederam à Organização seu papel fundamental de agente internacional bélico, conferindo-lhe exclusividade na legitimação de levantes armados, ao menos teoricamente. (MATTOS, 2012).

A Organização das Nações Unidas, um organismo internacional de cunho político, dotado de personalidade jurídica e com capacidade de efetiva manutenção da paz e da segurança internacionais, surgiu com o objetivo, por parte da comunidade internacional, de domar a força bruta da guerra, reduzir as disparidades, promover os direitos humanos e fomentar a igualdade e solidariedade cooperativa internacional. (LASMAR; CASARÕES, 2006).

O preâmbulo do artigo 1° da Carta das Nações Unidas especifica os propósitos gerais da ONU, cujo principal objetivo é a manutenção da paz internacional, mas para isso existe uma dependência muito grande das relações pacificas entre os povos, para que assim, possam ser realizados os demais propósitos da ONU, como o progresso social e o respeito aos direitos humanos. (TSCHUMI, 2009).

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A ONU tem sede em Manhattan, Nova Iorque, e é o centro administrativo de um amplo conjunto de Organismos Internacionais, programas e agências especializadas em todos os continentes que, juntos, compõem o Sistema de forma ampliada. Este organismo internacional veio a substituir no pós Segunda Guerra a Liga das Nações, antiga organização internacional cujo papel era o de assegurar a paz, em que tendo ela fracassado devido a segunda guerra, acabou por ser dissolvida em 1942. (LASMAR; CASARÕES, 2006).

Na área de direitos humanos, a ONU atuou de forma marcante na redação, negociação e adoção de importantes Declarações e Convenções. Uma vez transferido o poder bélico dos Estados para a ONU, ocorreu a revitalização e fortalecimento de mecanismos para a resolução pacífica de controvérsias, por meio da prevenção e criação de novos meios para assegurar a observância do Direito Internacional - como a supervisão internacional dos direitos humanos. Além disso, determinou também a responsabilidade estatal pelas violações às normas humanitárias e também pelo genocídio. (VIOTTI, 2005).

A relação da ONU com o Direito Internacional Humanitário é marcada por desconfiança e ambiguidade. A carta, por exemplo, não se refere ao DIH, essa relação, no entanto, começa a mudar por volta da década de 1960, após a I Conferência Mundial dos Direitos Humanos (Teerã, 1968) e sua declaração sobre o respeito aos direitos do homem em períodos de conflito armado. Desde então, o conceito de DIH foi progressivamente empregado pelas Nações Unidas, a ponto de a organização agir, atualmente, com amplo reconhecimento desse campo jurídico e influir, de modo significativo, em seu desenvolvimento. Em 1998, a ONU estabeleceu o escritório para a Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA, em inglês), que tem como função mobilizar e coordenar ações de assistência humanitária. (VIOTTI, 2005).

2.7 A ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS E A PROIBIÇÃO AO USO DA FORÇA

O jus ad bellum, ou direito à guerra tratado anteriormente, foi extinto do Direito Internacional pelas Nações Unidas com a proibição do uso da força, exceto três situações específicas que serão tratadas na sequência. Portanto, atualmente, o

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Direito Internacional Humanitário abrange basicamente o jus in bello e as exceções à proibição do jus ad bellum.

A proibição do uso da força esta positivada no artigo 2.4 da Carta da ONU, pois assim declara:

Todos os Membros deverão evitar em suas relações internacionais a ameaça ou o uso da força contra a integridade territorial ou a dependência política de qualquer Estado, ou qualquer outra ação incompatível com os Propósitos das Nações Unidas. (Carta das Nações Unidas, p. 6).

Toda e qualquer guerra ou uso da força armada é proibido, porém, em cada caso convém verificar se o emprego da força é ou não compatível com os objetivos das Nações Unidas. A resposta encontra-se na própria Carta, onde descreve os motivos para as exceções, conforme o artigo 51 que diz:

Nada na presente Carta prejudicará o direito inerente de legítima defesa individual ou coletiva no caso de ocorrer um ataque armado contra um Membro das Nações Unidas, até que o Conselho de Segurança tenha tomado as medidas necessárias para a manutenção da paz e da segurança internacionais. As medidas tomadas pelos Membros no exercício desse direito de legítima defesa serão comunicadas imediatamente ao Conselho de Segurança e não deverão, de modo algum, atingir a autoridade e a responsabilidade que a presente Carta atribui ao Conselho para levar a efeito, em qualquer tempo, a ação que julgar necessária à manutenção ou ao restabelecimento da paz e da segurança internacionais. (Carta das Nações Unidas, p. 30).

Cada vez que uma operação de força envolve os Estados, podemos temer uma ameaça à paz, senão mesmo a ruptura da paz. Todo o ato de coação constitui um perigo para a segurança internacional. Nestas condições, a ordem internacional deve aperfeiçoar-se para tentar conciliar a defesa do direito com a defesa da paz. (DINH; DAILLIER; PELLET, 2003).

Existem casos em que se permite o uso da força contra um ou mais Estados sem o consentimento dos respectivos governos locais, são eles: a legitima defesa contra ataque armado e medida de segurança coletiva contra um Estado que represente uma ameaça a paz e/ou segurança internacionais. (SWINARSKI, 1991).

A legítima defesa é um assunto muito delicado que gera muita polêmica entre os Estados. A Carta das Nações Unidas faz referência a este respeito em seu art. 51 conforme citado anteriormente. Lembrando que o art. 2

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6 da Carta cria obrigações para os Estados que não são membros da ONU, pois a garantia da

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segurança internacional é uma questão essencial a todos os Estados. (TSCHUMI, 2009). Enquanto os Estados só podem fazer o uso da força no plano externo em caso de legitima defesa, o Conselho de Segurança não esta sujeito a esses limites, podendo utilizar a força em qualquer caso que represente ameaça à paz. (LASMAR; CASARÕES, 2006).

Já as medidas de segurança coletiva, correspondem às intervenções humanitárias, objeto do presente trabalho, e serão abordadas com mais detalhe no capítulo subsequente.

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3. A ONU E O COMBATE AO GENOCÍDIO

O crime de genocídio foi reconhecido em 1946, quando a Organização das Nações Unidas debateu pela primeira vez, no âmbito internacional, o preconceito e as diversas formas de exclusão.

O genocídio tem origem remota. Nos primórdios, os grupos se dizimavam como forma de vingança divina, privada ou pública. Não havia proteção jurídica. Assim, o genocídio continuou a ser praticado durante o século XX, nessa época ocorreram eliminações de grupos étnicos ou religiosos de grandes proporções, como podemos observar em alguns casos, como o ocorrido em 1904 quando morreram 60 mil hereros (um povo banto que habitava o Sudoeste Africano Alemão, a atual Namíbia) por eles terem se levantado contra os senhores coloniais durante a partilha da África. Este é considerado o primeiro genocídio do século XX. Anos depois, cerca de 1,5 milhão de armênios cristãos foram assassinados pelos turcos em decorrência da campanha otomana contra as minorias cristãs do Império entre 1914 e 1923. Outro caso ocorreu no sistema repressivo stalinista onde milhões de pessoas encontraram a morte na Rússia devido a suas opiniões políticas ou por pertencerem a minorias étnicas, mas o maior de todos ocorrido no século XX se deve a execução de 6 milhões de judeus pelo regime nazista na Alemanha, entre 1933 e 1945. (LEITURAS DA HITÓRIA, 2008).

Para evitar que tragédias como essas se repetissem, é que a Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas reconheceu oficialmente o genocídio como crime, tendo sua redação em 1948 na convenção da Organização das Nações Unidas sobre Prevenção e Repressão do crime de genocidio. (PEDROSO, 2008).

3.1 A CONVENÇÃO CONTRA O GENOCÍDIO

O termo genocídio sequer existia antes do século XX, até que o jurista polonês Raphael Lemkin, veio a combinar a palavra grega genos (raça, tribo), com a latina occidere (matar), a partir da necessidade de se criar uma nova palavra, pois o termo “assassinato em massa” não abrangia todas as diferentes atividades que se verificava em um Genocídio. (CANÊDO, 1999).

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O crime de genocídio envolve uma grande variedade de ações, incluindo não apenas a extinção da vida, propriamente, mas ações que a tornem especialmente difícil. Todas essas ações estão subordinadas a uma intenção criminal de destruir ou permanentemente alijar um determinado grupo humano. Esses atos são direcionados a determinados grupos, e indivíduos são escolhidos à extinção única e exclusivamente por pertencerem a esse grupo.

O preâmbulo da Convenção declara o genocídio crime internacional, condenado pelo mundo civilizado, e que vem infligindo enormes perdas a humanidade, merecendo que a comunidade internacional se una no seu combate. O art. 1° reafirma ser o genocídio um crime internacional, não importando se em tempo de guerra ou de paz, já os artigos 2° e 3° da Convenção para prevenção e repressão ao genocídio são de capital importância, já que tratam, respectivamente, da definição de genocídio e das ações a serem punidas. (CANÊDO, 1999).

De acordo com o Artigo II da convenção de prevenção e punição ao crime de genocídio das Nações Unidas de 1948, define-se genocídio como:

Qualquer dos atos que se seguem, cometidos com a intenção de destruir, em parte ou totalmente, uma nação, etnia, raça, ou grupo religioso, da seguinte forma:

a) Assassinato de membros do grupo;

b) Dano grave à integridade física ou mental do grupo;

c) Submissão intencional do grupo a condições de existência que lhe ocasionem a destruição física total ou parcial;

d) Medidas destinadas a impedir os nascimentos no seio do grupo; e) Transferência forçada de menores do grupo para outro grupo. (Convenção para a prevenção e a repressão do crime de genocídio de 1948, p. 1).

O artigo 3° descreve as ações a serem punidas:

Art. III – serão punidos os seguintes atos: O genocídio;

a) O conluio para cometer o genocídio;

b) A incitação direta e pública a cometer o genocídio; c) A tentativa de genocídio;

d) A cumplicidade no genocídio. (Convenção para a prevenção e a repressão do crime de genocídio de 1948, p. 2).

Na perspectiva sociológica, Fein (apud VEZNEYAN, 2009, f. 35) desenvolveu um modelo para a identificação de genocídios onde inclui os seguintes pontos:

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a) Houve um ataque sustentável, ou um conjunto de ataques imputados pelos algozes com vistas a fisicamente destruir membros do grupo;

b) O algoz é um ator coletivo ou organizado, ou ainda, o lideres de atores organizados;

c) As vitimas foram selecionadas por serem membros de uma coletividade;

d) As vitimas estavam indefesas, e foram mortas independentemente de se terem rendido ou resistido;

e) A aniquilação de membros do grupo foi realizada sob a sanção dos algozes, exclusivamente.

Através desta identificação, se verifica que não existe genocídio não intencional ou acidental, existindo, portanto, a intenção (dolo). O genocídio poderá ser praticado de forma tentada, sendo cometido de forma fracionada. O objeto a ser atacado é a vida, onde não importa necessariamente a extinção de uma, mas podendo ser considerado genocídio impedir o nascimento de novas pessoas de um determinado grupo. Pode ser praticado por qualquer pessoa, podendo ser praticado até mesmo por uma única pessoa. Pode ainda ser instantâneo, se consumando no momento da ação ou omissão delituosa. Mesmo que uma única pessoa seja atingida, é necessário que a intenção seja de exterminar determinado grupo, portanto, mais de uma vida estará sendo visada. (JÚNIOR, 2012).

Existem algumas espécies de genocídio, espécies estas que são: física (compreende assassinatos e atos que possam causar a morte); biológica: (se caracteriza por se esterilizar pessoas, ou miscigenar membros do grupo, extinguindo-o);e cultural (o ato de destruir o patrimônio artístico, cultural, histórico ou pensamento religioso). A ordem jurídica moderna não reconhece o genocídio cultural e nem o político, pois a convenção, na época, considerou que a definição que constituiriam esses grupos era bastante vaga, porém o reconhecimento de tais ideias é ainda muito discutido. (JÚNIOR, 2012).

Considerando a letalidade do crime de genocídio, por atentar contra grupos geralmente minoritários ou excluídos de alguma forma das práticas políticas ou religiosas habituais, podemos enquadrar suas ações dentro do conceito de crime contra a humanidade, que é um termo do direito internacional que descreve atos de perseguição, agressão ou assassinato contra um grupo de indivíduos. (PEDROSO, 2008). Dautricourt, em exposição feita na conferência para a Unificação do Direito Penal, em Bruxelas, exterioriza posição emblemática no que diz respeito à definição dos crimes contra a humanidade:

Referências

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